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Direito Tributário e Internet

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12/10/2004 às 00:00
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Capítulo 2

3 PROBLEMAS JURÍDICOS TRIBUTÁRIOS SUSCITADOS PELA INTERNER E O COMERCIO ELETRÔNICO

3.1 Introdução

Quando pensamos em e-commerce, a primeira pergunta que nos devemos formular é: como a Internet pode modificar tanto a tributação do comércio e a forma de prestação de serviço em geral? Ao se questionar, a resposta pode ser simples, mas a explicação e fato a ser empregado são muito complicados.

Ao falamos da tributação no comércio eletrônico ou dos serviços prestados, é necessário destacar que podem ocorrer atividades que são sujeitas à tributação do Estado, e outra, que sua implementação tem dificultado, em virtude de a legislação tributária ser rígida e da descentralização dos sistemas tributários Estaduais e Municipais.

Um dos fatos importantes a ser levantado é que, através da Internet, elimina-se o meio físico, que antes era utilizado como fiscalização para eventuais tributos. Outro problema é quanto ao conceito de mercadoria e serviço, estabelecimento e local de prestação de serviço, os quais poderiam identificar o poder de tributação.

Devemos também levar em consideração algumas premissas para que sejam analisados e apontados os problemas concretos da fiscalização do Código Tributário Nacional e a Constituição Federal de 1988.

As premissas são:

• se houver capacidade jurídica, pode existir tributação, conforme o § 1º do art. 145 da CF/88. Cabe ressaltar que ela integra o conjunto de princípios básicos do Sistema Tributário Brasileiro.

• neutralidade é a relação de incidência do meio eletrônico e à respectiva carga tributária, partindo dessa rápida análise, podemos dizer então que os meios informáticos não podem levar tributação maior, nem menor do que estão submetidas.

• conhecer a técnica consiste em conhecer o ambiente técnico e o funcionamento da máquina, para sabermos em que fato a lei deve incidir.

• Aplicar a legislação existente neste caso, o que fala-se é que a lei alcança o fato, uma vez que a legislação pode ser adequada ao fato existente. Como afirmou o Exmo. Sr. Ministro Sepúlveda Pertence, ao julgar um processo em que se debatia uma questão ligada a um crime de informática, a invenção da pólvora não tornou necessário alterar a lei que define o homicídio para prever o uso de arma de fogo. (HC 76.689-PB, 1ª turma, DJ 06.11.1998).

Na Internet, um dos grandes desafios para a tributação é a movimentação dos bens de consumo que é uma grande novidade. O consumidor não mais quer o que lhe é trazido, mas sim ele próprio vai a busca do que melhor lhe convém, uma vez que o critério não é mais o espaço, mas sim o tempo. Isso dificulta a legislação tributária, uma vez que o foco da incidência deverá atingir o consumidor e não mais o produtor.

Vale ressaltar que "nos países europeus, a existência de um único imposto sobre o valor agregado (Value Added Tax – VAT) simplifica, em muito, a tributação do e-commerce, principalmente quanto aos provedores de acesso e de conteúdo. No Brasil, em razão de haver uma divisão de competências impositivas entre Estados e Municípios, especificamente em relação ao ICMS e ao ISS, surgem conflitos a respeito de qual tributo deve incidir sobre as atividades dos provedores de serviços". [24]

Acrescenta-se, ainda que alguns serviços de comunicação passaram a sujeitar-se ao ICMS, enquanto outras sujeitaram-se à tributação do ISS, de acordo com a CF/88. Assim, podemos obrigar que as atividades de (tele)comunicações são suficientes para deixar evidente a existência de dupla tributação dos serviços prestados por compras no ramo da Internet.

3.2 A tributação das atividades da empresa de acesso e de conteúdo

Na incidência tributária pela Internet, é necessário saber qual é o imposto que poderá incidir, sendo que a empresa independe de ela ser civil ou comercial, o que vem fazer a diferença é os fatos geradores, ao qual será definido quanto a espécie de imposto que incidirá na operação. Como já verificou no decorrer dos capítulos, poderão ocorrer Impostos sobre Circulação de Mercadorias (ICMS), Imposto Sobre Serviço (ISS) e até imunidade de tributação, ou seja, não-tributação ou não-incidência. Neste caso, fala-se em ICMS em operações de serviço de comunicação ou de telecomunicações, o ISS em caso de valor adicionado e a Imunidade nos casos de serviço de valor adicionado não previsto na legislação federal do ISS. Assim, para checarmos ao imposto que vai incidir nas empresas de acesso ou conteúdo, devemos entender as suas atividades realizadas.

É através do provedor que temos acesso à Internet, sendo de um prestador de serviços, pois necessita de equipamentos e softwares para efetivar a ligação entre clientes e provedor.

Quando se menciona o software, fala-se no sentido de que o provedor serve como troca de informações. Um exemplo disso são as mensagens (e-mails), arquivos, programas e até as páginas de informação e entretenimento. Então, pode-se dizer que esses serviços utilizam o sistema de telecomunicação existente para interconectar diversas redes remotas sob o mesmo protocolo (o protocolo Internet), criando a World Wide Web – WWW (teia mundial). Assim, devemos analisar se o provedor de conteúdo está de acordo com a legislação aplicável às atividades prestadas através da rede mundial.

3.3 Da tributação pelo ICMS pelo serviço de acesso

"Atualmente, a corrente que entende ser tributável pelo ICMS o serviço de provimento de acesso à Internet tem como principal argumento o fato de que o serviço reinicia requisitos para ser caracterizado como serviço de comunicação, conforme preceitua a Constituição Federal de 1988 ao alargar o fato gerador do antigo ICM". [25]

No texto acima, pode-se dizer que incidia imposto sobre a mercadoria devido o serviço prestado ser de "comunicação" e ter caráter oneroso (negocial/comercial).

Um dos argumentos que sustenta essa incidência é o fato do serviço pelo ICMS versar sobre a utilidade que o provedor de acesso proporciona aos usuários da rede, ao se comparar à operadora de telefonia com o provedor de acesso. Uma vez que o primeiro tem acesso local, enquanto que o segundo conecta-se com todo mundo, assim estaria criando e oferecendo um novo tipo de comunicação.

Mais é na visão do criador da "teoria do meio físico x meio lógico" que a tributação pelo ICMS se faz presente pelo fato de o serviço de Internet proporcionar um meio próprio que se diferencia dos serviços de telefonia existente, e também por oferecer ao usuário novas utilidades. Dessa forma, o provedor prestaria serviço de comunicação.

É assim que essa corrente defende o Imposto sobre mercadoria e afasta a disposição do art. 61, da Lei Geral das Telecomunicações – LGT, que diz que o provimento de acesso não é serviço de telecomunicação, mais sim serviço de valor adicionado.

3.4 Da tributação do ISS pelo serviço de acesso

A corrente que se diferencia da primeira justifica-se pelos seguintes argumentos:

1. existe lei específica definidora do conceito de serviço de telecomunicação, comunicação à distância;

2. os serviços de valor adicionado, dentre os quais se classifica o serviço de acesso a Internet, não são classificados como serviço de telecomunicação;

3. o direito tributário é orientado pelo princípio constitucional da estrita legalidade. Assim, a incidência tributária deve justificar-se por uma perfeita conformação do fato gerador à norma. A existência de dúvida ou lacunas impede a incidência tributária.

Através desses argumentos, devemos analisar então o que é a telecomunicação e como esta abrange ou não o âmbito da Internet. Assim define-se telecomunicação como o conjunto de atividades que afetam telecomunicação, que é feita através de transmissão, emissão ou recepção por fio, radioeletricidade, meios ópticos em qualquer outro processo eletromagnético de símbolos, caracteres, sinais, escritos, imagens, sons ou informações de qualquer natureza.

Para concluir, o fato de que o serviço de valor adicionado, também nos termos da Lei Geral de Telecomunicações, é atividade que acrescenta um serviço de telecomunicações, e atividade que acrescenta, a um serviço de telecomunicações que lhe dá suporte e com o qual não se confunde, novas utilidades relacionadas ao acesso, armazenamento, apresentação, movimentação ou recuperação de informações. Ou seja, o serviço de valor adicionado não constitui serviço de telecomunicação, classificando-se o seu provedor como usuário de telecomunicação que lhe dá suporte, com os direitos e deveres inerentes a essa condição.

3.5 Da não-incidência de ISS no Serviço de Acesso à Internet

Neste caso, os autores argumentam que não há incidência de ISS devido o serviço de acesso à Internet não se encontrar previsto dentro dos serviços listados no rol dos serviços tributáveis do Decreto-Lei nº 406, de 31 de dezembro de 1968. Assim, para que fosse autorizada a cobrança do ISS sobre este serviço, deveria ser editada Lei Complementar para alterar a lista de serviço.

A este argumento sustentam a tese de que os tribunais consideram taxativa a lista referente ao Decreto-Lei, e que seria impossível exigir imposto sobre serviço, excluindo-o. O próprio Supremo Tribunal Federal entendeu que a extensão da lista de serviços, sem definição na lei, feriria o princípio constitucional da legalidade.

Outra argumentação é que os impostos para a rede não poderiam ter uma tributação mais rigorosa do que as dos jornais e livros, que são veiculadas as informações.

Um exemplo de não-incidência de impostos sobre serviço é de um provedor de acesso que se livrou no 1º Tribunal de Alçada Civil (TAC/ de São Paulo de cobrança de 5% do ISS da Prefeitura de Jundiaí).

A legislação complementar que traz regras gerais para a cobrança do ICMS e do ISS determina que o imposto será devido sobre o valor da operação. Se o serviço é gratuito, não há o que se falar em tributação.

3.6 Quanto à aquisição pela Internet e sua tributação

Esta aquisição deve ser analisada com muito cuidado, para que seja determinado se há incidência ou não sobre as mercadorias adquiridas através da Internet, uma vez que, o meio físico, Internet, nada se diferencia de um pedido feito pelo representante comercial, por fax, por telefone ou por correio, cuja operação não há ocorrência de fato jurígeno de imposto.

No entanto, quando a mercadoria se desloca do estabelecimento representa o fato gerador de ICMS, de acordo com o art. 1º, inciso I, do Decreto-Lei nº 406/68:

"Art. 1º - O imposto sobre operações relativas a circulação de mercadorias tem como fato gerador:

I – A saída de mercadorias de estabelecimento comercial, industrial o produtor". [26]

Agora podemos concluir que enquanto a aquisição ocorrer pela Internet não ocorre o fato gerador, no entanto, quando o produto sair de tal estabelecimento ocorre o fato gerador, cujo qual incide ICMS, que será devido ao Estado antes de encontrar o comerciante.

Uma observação importante que deve-se ser identificada é quanto a aquisição de programas via download (quando determinada pessoa adquire via Internet software de empresa que pode ser gratuita ou onerosa) e aqueles distribuídos em prateleiras.

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De acordo com a Lei 9.610 que conceitua programa de computador, definiu:

"Art. 1º. Programa de computador é a expressão de um conjunto organizado de instruções em linguagem natural ou codificada, contida em suporte físico de qualquer natureza, de emprego necessário em máquinas automáticas de tratamento de informações, dispositivos, instrumentos ou equipamentos periféricos, baseados em técnica digital ou análogo, para fazê-los funcionar de modo e para fins determinados".

A definição mencionada no artigo acima deve ser diferenciada da seguinte forma: quanto a criação intelectual e quanto ao plano físico. Na primeira situação, deve-se levar em conta que a criação intelectual é um bem intangível e imaterial, que precisa de um suporte físico para ser comercializado como é o caso dos livros, uma partitura etc. Surge disso a dúvida quanto à incidência. Para ilustrar, recorro ao Supremo Tribunal Federal que seriam tributados ICMS (RE-19.464. SP, Min. Ilmar Galício, 1ª Turma, DJ, 30.04.99), que explica, assim dizendo: o software, como programa elaborado por encomenda enseja ISS e se o software for de prateleira, incide ICMS, uma vez que o mesmo é produzido em escala e comercialização no varejo, porém esse questionamento jurisprudencial não é unânime.

3.7 Tribunal de Justiça

Em contribuição a este assunto de incidência tributária, trago algumas decisões de Estados brasileiros referentes ao comércio eletrônico, provedor de acesso e conteúdo, programa de computador.

- Paraná: Não recolhe imposto relativamente ao programa de computador, mas, apenas relativamente ao meio físico que o contém, ou seja, os disquetes – Programa de computador são isentos de impostos em conformidade com o art. 79 do anexo I do Decreto nº 2736/90 do RICMS/PR. [27]

- Rio Grande do Sul: O ICMS é recolhido apenas em relação aos meios físicos que o contém, ou seja, os disquetes ou CD’s – Programa de computador são isento de ICMS em acordo com inciso XXI, do art. 9º do RICMS. [28]

- Rio Grande do Sul: Reexame necessário, empresaprestadora de serviço de comunicação, acesso a Internet, provedor presta serviço de comunicação sujeito à incidência de ICMS, exclusão da incidência do ISS por expressa disposição legal. Art. 156, inciso II, da CF. [29]

- Pará: Reexame de sentença em Ação Ordinária de débito fiscal. Improcedência da ação. ICMS. Tributo de competência dos Estados. Mantida sentença do juízo a quo que condenou a fazenda municipal. A unanimidade. [30]

3.8 Superior Tribunal de Justiça

O Supremo Tribunal de Justiça, a decisão 0056816-9 de 2001, diz que o provedor de Internet é um agente interveniente prestador de serviço de comunicação.

- INCIDÊNCIA, ICMS, PRESTAÇÃO DE SERVIÇO, COMUNICAÇÃO DE DADOS, INTERNET, DECORRÊNCIA, PROVEDOR DE ACESSO, GERAÇÃO DE DADOS, EMISSÃO, RECEPÇÃO DE DADOS, ARMAZENAGEM, TRANSMISSÃO, RETRANSMISSÃO, DADOS, EXISTÊNCIA, CONTRATO ONEROSO, SERVIÇO DE COMUNICAÇÃO, CARACTERIZAÇÃO, FATO GERADOR, TRIBUTO. (Processo número 0056816-9). [31]

Por outro lado, a decisão 0099939-5 de 2002, contrariando a anterior, ressalta que os serviços prestados pelos provedores de acesso a Internet, embora considerados pelo CONFAZ como serviços de telecomunicações, pela definição dada no art. 60 da Lei 9.472/97, que dispôs sobre a organização dos serviços de telecomunicações, não podem ser assim classificados.

- NÃO-INCIDÊNCIA, ICMS, EMPRESA PRESTADORA DE SERVIÇO, PROVEDOR DE ACESSO, INTERNET, INDEPEDÊNCIA, CONFAZ, DEFINIÇÃO, SERVIÇO DE TELECOMUNICAÇÃO, DECORRÊNCIA, LEI GERAL, REGULAMENTAÇÃO, SERVIÇO DE COMUNICAÇÃO, PREVISÃO EXPRESSA, SERVIÇO DE VALOR ADICIONADO, CARACTERIZAÇÃO, INTERMEDIARIO, USUÁRIO, INTERNET, DESNECESSIDADE, AUTORIZAÇÃO, UNIÃO FEDERAL, NÃO CARQACTERIZAÇÃO, NATUREZA JURÍDICA, SERVIÇO DE TELECOIMUNICAÇÃO. [32]

3.9 Supremo Tribunal Federal

O Supremo Tribunal Federal em sua decisão encontrada, datadas 2002, número 224531, descreve a não autorização de ICMS.

- INEXISTÊNCIA, DIREITO, CRÉDITO, IMPOSTO SOBRE CIRCULAÇÃO DE MERCADORIAS E SERVIÇOS (ICMS), OPERAÇÃO, COMPRA, BEM, INTEGRALIZAÇÃO, ATIVO PERMANENTE IMOBILIZADO, CONSUMO AUSÊNCIA, OFENSA, PRÍNCIPIO DA NÃO-COMULATIVIDADE // SUPERVENIÊNCIA, JULGADO, SUPERAÇÃO, ENTENDIMENTO, ACORDÃO CITADO, AGRAVANTE. (RE. 224531). [33]

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Sobre o autor
Olsimary de Sousa Fernandes

Bacharel em Direito pela ULBRA e Tecnólogo em Processamento de dados pela UFPA

Como citar este texto (NBR 6023:2018 ABNT)

FERNANDES, Olsimary Sousa. Direito Tributário e Internet. Revista Jus Navigandi, ISSN 1518-4862, Teresina, ano 9, n. 462, 12 out. 2004. Disponível em: https://jus.com.br/artigos/5799. Acesso em: 20 abr. 2024.

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