A Emenda Constitucional da vaquejada e os casuísmos

07/06/2017 às 22:13
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A nova EC/96 revela algo que se mostra a cada dia mais evidente: emendas por mero casuísmo. Além do lobby já conhecido, agora temos de enfrentar as modificações na CF por mero capricho do legislador que encontra na PEC uma forma de burlar o controle da CF.

A prática da vaquejada e rodeio agora assumem status constitucional.

Se de um lado o judiciário oportuniza casuísmos com a Constituição, não é surpresa ver o que fez o legislativo com a elaboração da PEC 96, hoje EC/96 -- e fê-lo com requintes de vindita.

Sem adentrar no debate sobre os maus tratos aos animais, minha inquietude, por ora, é quanto à circunstância política incorporada nas propostas de emenda à Constituição a que estamos [quase] nos habituando.

Recapitulando: em 2016 o STF julgou inconstitucional uma lei cearense que regulamentava a prática da vaquejada.

Como de praxe, sempre que o STF julga uma norma infraconstitucional materialmente incompatível com a Constituição, e sendo tal lei do interesse político do Congresso (ou de um grupo político graúdo lá de dentro), a manobra utilizada pelos parlamentares é a de alçar a essência daquela lei à CF por meio de uma EC.

Isto porque, estando a norma inserta na Lei Maior, extingue-se a possibilidade da propositura de uma ação de controle de constitucionalidade visando nulificá-la. Esse drible já fora feito pelo Congresso em diversas ocasiões com outras leis barradas pelo Supremo. Nada de tão novo.

O que causa estranheza e merece nossa especial atenção é que a Constituição virou um espécie de bunker onde são guardados e protegidos os desígnios políticos mais alheios aos ditames da CF.

Se isso for admitido profusamente sem qualquer óbice por parte da sociedade civil, logo em breve mais e mais leis ultrajantes aos alicerces normativos da Constituição serão posicionadas onde não lhes cabem: indevidamente disfarçadas de EC.

Embora nossa Carta Política tenha aspiração analítica, não consiste a afirmativa de que podemos emendá-la por tudo quanto for, a bel prazer do legiferante. Tampouco quando o delegatário do poder constituinte reformador utiliza-se de artimanhas pérfidas para malograr uma decisão da Corte Suprema.

Foi justamente por isso que a Constituição cuidou devidamente de tornar o rito de modificação de seu texto deveras dificultoso, exigindo-se o consenso de 3/5 dos parlamentares, nas duas casas do Congresso e em dois turnos. Por isso a rigidez dela.

Para além dos limites materiais de reforma da CF (v.g., vedação do retrocesso - efeito cliquet), hemos de considerar outras balizas de natureza lógica, mas não imperativa, tais como: a pertinência da proposta, sua necessidade diante do contexto fático porque passa o Estado e principalmente sua identidade congênere ou, no mínimo, equivalente com o que manda a Constituição.

Como expressei, tais delimitações não podem ser imperativas, pois pertencem à dialética, algo que é por demais subjetivo; e limitar o legislador para além dos já determinados limites seria um entrave perigoso.

Contudo, assevero que a similaridade normativa entre a PEC e a CF extirparia, à farta, qualquer possibilidade midiática, eleitoreira e casuística de interposição de normas completamente estranhas à Constituição, sobrando somente o colégio Pedro II (vide art. 242, § 2º) como um Alien no texto constitucional.

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