Direito Internacional Público: origem, elementos e desafios

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28/06/2017 às 19:04
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Panorama geral sobre o Direito Internacional Público, desde sua criação, evolução, autores importantes e a influência que as mudanças mundiais trouxeram ao tema.

Resumo:O presente trabalho visou fazer um panorama geral sobre o Direito Internacional Público, desde sua criação, evolução, autores importantes e a influência que as mudanças mundiais trouxeram ao tema. Por fim, elencamos quais desafios que o Direito Internacional Público deve enfrentar para conseguir implementar totalmente todas as suas conquistas.

Palavras-chave: Direito Internacional Público, evolução histórica, desafios.

Abstract:The present work aimed to make an overview of Public International Law, since its creation, evolution, important authors and influence global changes brought to the subject. Finally, we highlight what challenges that Public International Law must face to be able to implement fully all its achievements.

Keywords: Public International Law, historical evolutions, challenges.


Introdução

O presente artigo definiu como meta fazer uma análise sucinta e objetiva sobre o Direito Internacional Público, atendo-se à parte histórica, de forma a acompanharmos sua evolução e os principais autores que contribuíram para o seu cerne.

Analisaremos também os fundamentos que basearam a matéria e quem são aqueles que a protagonizam, entendendo a dinâmica que forma o Direito Internacional Público.

Por fim, analisaremos as perspectivas do século XXI para o Direito Internacional Público e os principais obstáculos que devem ser transpostos, de forma que a ação do Direito Internacional seja mais efetiva.


1.Origem do Direito Internacional Público.

O Direito Internacional Público surgiu a partir do século XVII, quando se formaram os Estados-Nação com as características que conhecemos hoje. O ponto limite foi o fim da Guerra dos 30 anos (em 1648), por meio do tratado de Vestfália, quando nasce a soberania nacional. [2]

Dessa origem podemos destacar o trabalho de dois grandes autores, Francisco de Vitória e Hugo Grócio. Vitória acreditava na liberdade dos mares, na guerra justa, e já admitia a intervenção humanitária de forma a defender os direitos humanos de homens, mulheres, crianças e etc. Partilhava a ideia de uma sociedade internacional orgânica e solidária em que os Estados têm sua soberania limitada. Abominava profundamente as atrocidades cometidas por Carlos V.

Grócio acreditava que o homem deseja viver em sociedade de forma ordenada e pacífica, então dessa ideia surge um direito que se internacionaliza para promover sociabilidade entres os Estados. Defendia a guerra justa, regulamentada e que acontecesse apenas quando estritamente necessário. Utilizou precedente bíblicos e da história antiga, grega e romana para estabelecer normas de direito internacional.


2.         Evolução histórica do Direito Internacional Público.

Em 1780 surge a expressão Direito Internacional (International Law) com Jeremias Bentham, utilizada em oposição ao Direito Nacional (national law) ou Direito Municipal (municipal law). A partir disso tivemos uma divisão daquilo que seria público ou privado dentro do Direito Internacional, Valério Mazzuoli afirma “ser o Direito Internacional Público aquele ramo do Direito capaz de regular as relações interestatais, bem como as relações envolvendo as organizações internacionais e também os indivíduos”[3]. No presente trabalho trataremos apenas da parte pública.

Muito se discute qual seria o marco histórico da criação do direito Internacional, Grócio remonta à época bíblica para explicar aquilo que seria hoje entendido como jus cogens, como as normas de Direito internacional dos direitos humanos. Voltando um pouco mais, vemos características de um ius inter gentes nas tribos da Antiguidade, porém de forma não homogênea, dado o isolamento entre as tribos e os diferentes graus de civilização que cada uma tinha.

Um marco importante remonta à época das cidades-estado da Mesopotâmia, em um trato firmado entre Lagash e Umma para fixar fronteiras. Mas segundo o jurista Francisco Rezek:

 “O primeiro registro seguro da celebração de um tratado, naturalmente bilateral, é o que se refere à paz entre Hatusil III, rei dos hititas, e Ramsés II, faraó egípcio da XIXª dinastia. Esse tratado, pondo fim à guerra nas terras sírias, num momento situado entre 1280 e 1272 a.C., dispôs sobre paz perpétua entre os dois reinos, aliança contra inimigos comuns, comércio, migrações e extradição. Releva observar o bom augúrio que esse antiquíssimo pacto devera, quem sabe, ter projetado sobre a trilha do direito internacional convencional: as disposições do tratado egipto-hitita parecem haver-se cumprido à risca, marcando seguidas décadas de paz e efetiva cooperação entre os dois povos.” [4]

Entretanto, a partir de quando podemos dizer que existiu o Direito Internacional? Filiamo-nos ao pensamento de Accioly que afirma que o direito internacional só surgiu nos moldes como conhecemos após a Paz de Vestfália, cujos tratados primaram pelo princípio da igualdade jurídica dos estados, estabelecendo as bases do princípio do equilíbrio europeu, onde apareceram os primeiros indícios de uma regulamentação internacional positiva. E o Direito Internacional Público? Segundo o mesmo autor:

Foi só, entretanto, no começo do século XVII que o direito internacional público apareceu, na verdade, como ciência autônoma, sistematizada. Nesse novo período, destaca-se GRÓCIO, cujas obras, Mare liberum (parte da De jure praedae), vieram a lume em 1609, e especialmente por sua obra-prima, publicada em 1625, O direito da guerra e da paz (De jure belli ac pacis).[5]

A partir disso, a evolução do Direito Internacional Público se deu de forma rápida. Segundo Cançado Trindade (2002, p. 1087, apud. Accioly, 2012 p. 73):

 “na medida em que o direito internacional, a partir de meados do século XX, logrou desvencilhar-se das amarras do positivismo voluntarista, que teve uma influência nefasta na disciplina e bloqueou por muito tempo sua evolução. O direito não é estático, nem tampouco opera no vácuo. Não há como deixar de tomar em conta os valores que formam o substratum das normas jurídicas. O direito internacional superou o voluntarismo ao buscar a realização de valores comuns superiores, premido pelas necessidades da comunidade internacional”[6]

Ao longo dos séculos seguintes podemos elencar alguns autores que contribuíram de forma muito importante para o direito internacionalista. São eles:

Samuel PUFENDORF (1632-1694), alinhando-se com Grócio, acreditava em um direito internacional baseado na razão, de forma que o direito natural influi no direito das gentes. Entretanto, tem como baliza recebida de Hobbes a ideia de igualdade jurídica entre os Estados. Pufendorf conceituou dois enunciados polêmicos e que foram muitos criticados na época, o primeiro afirma que nenhuma ação pode ser caracterizada como boa ou má de forma pura, primeiro a ação deve ser contextualizada.

Afirmava também que todo direito natural deve ser entendido como forma de buscar a conservação da sociedade. Puffendorf é criticado justamente por dar deveras importância ao direito natural em detrimento do direito positivo.

Christian WOLFF (1679-1754) foi responsável pelo movimento que desencadeou a coleta e sistematização de tratados internacionais. Para Wolff era possível resolver conflitos entre estados sob a mediação de um terceiro não-envolvido, algo como  aquilo que a Sociedade das Nações e, mais tarde, a Organização das Nações Unidas faz em termos de controvérsias entre estados, encaminhando-as a órgãos superiores, como a Corte Internacional de Justiça.

Outra contribuição se refere a ideia de que a comunidade internacional não é a vontade individual dos estados. Necessitando-se de mediação por uma entidade imparcial, capaz de arbitrar de forma, como surgiu no século XX.

Por último, citamos Georg-Friedrich Von MARTENS (1756-1821), importante sistematizador de tratados e casos de direito internacional, cujo progresso é devido ao estudo da evolução histórica e transformações sociais, de forma que o próprio Estado se interessa em cumprir as obrigações internacionais. Von Martens primava pelo direito positivo, admitindo o direito natural somente em casos cuja matéria não seja regulada pela normatização positiva.

Tais autores supracitados firmaram as bases históricas do direito internacional, dando a ele caráter europeu, primando sempre pela coexistência e mútua abstenção.

Após isso, o mundo entrou em processo de grandes guerras e revoluções, cujas ideias abalaram a ordem mundial vigente, derrubando o que a Paz de Vestifália havia erguido. Dessa forma, até o tratado de Versalhes em 1919, todos os conflitos foram regidos pelo o que foi acordado no Congresso de Viena em 1815.

Nessa época vimos uma ordem mundial baseada no consenso e na acomodação de interesses, a coexistência diplomática e a expansão do colonialismo europeu. Temos monarquias unidas e equilibradas e mecanismo de concertação que ajustavam os interesses dos estados.

Entretanto, a guerra eclodiu e levou à reformulação do sistema internacional, baseando-se na confrontação de ideias. Nessa época a Europa se tornou um campo de batalha, com disputas reais e políticas. Versalhes instituiu um novo sistema, que em muito poderia remontar ao supracitado Wolff, propondo uma institucionalização de relações internacionais como forma de preservar a sociedade e evitar conflitos.  Nesse tratado havia condições de paz e a responsabilização da Alemanha e seus aliados pela totalidade da Primeira Grande Guerra Mundial, sancionando-os de forma profunda.

Os estados começaram a se expandir individualmente e alguns, como a União Soviética, entraram em decadência. A guerra eclodiu novamente e o nazi-fascismo assombrou o mundo e o seu fim proclamou os Estados Unidos da América como grande vencedor e auxiliar na retomada do equilíbrio europeu. As atrocidades nazistas e o seu total desrespeito a dignidade humana faz surgir o projeto que levou a criação das Nações Unidas. Nesta época surge Comissão do Direito Internacional das Nações Unidas, em 1947, que teve como resultado importantes codificações do direito internacional. Vemos um direito internacional se tornar tridimensional abrangendo além da terra e do mar, o espaço aeronáutico, o mar e fundos oceânicos e o meio ambiente.

Após isso, o mundo mais uma vez se reformula devido a Guerra Fria, o mundo se vê bipolarizado num confronto politico-ideológico-militar entre EUA e União Soviética. Dessa época destacamos o plano Marshall e a Organização do Tratado do Atlântico Norte- OTAN e Pacto de Varsóvia, o mundo viveu sob influência desses acordos e com medo de uma terceira guerra mundial até a queda da União Soviética em 1991.

Atualmente, o direito internacional visa a universalidade, mas teme a fragmentação que realidade pode impor. Avançamos de forma extensa, porém não o suficiente, o mundo continua em conflito, há fundamentalismo regendo as relações internacionais e regionais, há um terrorismo que se expande, crime organizado, tráfico de drogas, de órgãos e seres humanos, é necessária adequação para saber como agir entre a teoria e a prática. Como acertadamente Celso Lafer afirma:

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O internacionalista é, por definição, um realista[7].

Precisamos arranjar meios de implementar o que conseguimos firmar como direito internacional, ampliando e se adaptando à um leque de questões que muda rapidamente.


3.Fundamentação do direito internacional público.

Saber qual o fundamento do Direito Internacional significa desvendar de onde vem a sua legitimidade e sua obrigatoriedade; ou os motivos que justificam e dão causa a essa legitimidade e obrigatoriedade.

 Sistema jurídico autônomo, onde ordenam as relações entre Estados soberanos, o direito internacional público, ou direito das gentes, no sentido de direito dos povos, repousa sobre o consentimento[8].

 Desde a época de Francisco de Vitoria e Francisco Suarez ha doutrinas que pretendem responder a questão do fundamento do direito internacional público.

Para tentar explicar a razão de ser do direito internacional público, elencamos duas correntes doutrinárias. A primeira, voluntarista, influenciada pelo direito positivo, pelos tratados, aceitação dos costumes internacionais e do ordenamento jurídico interno, afirma que a vontade dos Estados baseia o Direito Internacional. Entretanto, como depender apenas da vontade de um estado que pode se manifestar negativamente e se desligar unilateralmente a posteriori? Dessa forma, deixaria o Direito Internacional de existir.

Já a doutrina objetivista faz do pacta sun servanda o seu maior baluarte, visando normas internacionais cujas regras sejam menos subjetivas, de forma que passem mais segurança. Baseia-se no direito natural, no normativismo jurídico kelseniano e as teorias sociológicas do direito. Entretanto, é uma doutrina que minimiza a vontade soberana dos Estados, que também contribuem na criação das regras do direito internacional público.


4. Sujeitos de direito internacional público.

Sujeitos são todos aqueles cujas ações estão ligadas ou previstas no direito internacional público. A conduta desses sujeitos pode ser passiva, quando o sujeito é destinatário da norma; ativa, quando o sujeito tem capacidade para atuar no plano internacional. Ou seja, a personalidade jurídica tem íntima ligação com a conduta ativa ou capacidade de agir.

Os sujeitos em si podem ser classificados como Estados; coletividades interestatais; coletividades não-estatais e indivíduos. O Estado surgiu primariamente, são sujeitos clássicos, eram, inclusive, os únicos "atores" que faziam parte do direito internacional público até os meados do século XX, o centro das discussões e de onde emanavam as regras. Estado, segundo Mazzuolli:

 "é um ente jurídico, dotado de personalidade internacional, formado de uma reunião de indivíduos estabelecidos de maneira permanente em um território determinado, sob a autoridade de um governo independente com a finalidade prévio ou a de zelar pelo bem comum daqueles que o habitam"[9].

O Estado é formado por quatro elementos, os quais são, povo; território; governo e finalidade.  Povo é o conjunto de nacionais, natos ou naturalizados; território é a fração do planeta delimitada por fronteiras, rios, lagos, mares interiores, espaço aéreo, subsolo, mar territorial e plataforma submarina; governo é o dirigente autônomo e independente, que decide os rumos que o Estado toma sem influência de autoridade externa; por fim a finalidade, elemento não reconhecido por parte da doutrina, sendo elemento social, bem comum a ser alcançado.

As coletividades interestatais são aquelas formadas por Organizações Internacionais, dependem de tratado constitutivo para existir e podem ser beligerantes, insurgentes e de movimento de libertação nacional. Beligerantes são movimentos que se utilizam da luta armada para agir politicamente; insurgentes são grupos que pretendem tomar o poder de um Estado, constituindo guerra civil ou zona livre; por fim, os movimentos de libertação nacional visam a independência de povos.

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Texto elaborado quando eu estava no oitavo período da faculdade.

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