Todas as vezes que nos colocamos a observar um objeto ocorre em nós um processo de exploração da coisa sob várias perspectivas/ângulos/posições, sempre na busca incessante de desvendar o item investigado, a fim de compreendê-lo.
Quando nos propomos a falar de conceitos de crime, buscamos compreendê-lo, e assim podemos fazê-lo sob diversos ângulos, em especial, três formas clássicas: formal, material e analítica.
CONCEITO FORMAL: explora o crime partindo da lei, enquanto instrumento padronizador e norteador daquilo que podemos ou não, que devemos ou não. Daí, sob ângulo formal, crime é a conduta definida em lei como tal, isto é, só haverá crime se o fato ocorrido na realidade possuir perfeita identidade com aquilo que está definido em lei como crime[1].
Ainda no conceito formal, é importante advertir que mesmo realizado o que está descrito na lei, o fato é contrário a ela. Esclarecendo: é que a junção da conduta com a sanção nos traz como resultado um comando normativo, qual seja: não devemos fazer aquilo senão seremos punidos[2].
Exemplo, no caso do homicídio, definido no art. 121 do Código Penal, ninguém em sã consciência vai afirmar que matar alguém está de acordo com a lei. O comando normativo que dali se extrai é que não devemos matar.
A síntese que propomos para compreensão é a que sinaliza ser o crime a conduta prevista em lei que, quando realizada, representa ofensa ao comando normativo e, portanto, à própria lei.
CONCEITO MATERIAL: Agora passamos a investigar se além de a conduta estar prevista em lei como crime, ela também, de fato (concretamente) revela ofensa ao que é protegido pela norma (bem jurídico)[3].
Vejam, os holofotes voltam-se aqui para o bem jurídico protegido pela norma. Exemplo: no homicídio a vida; no furto o patrimônio.
Assim, sob esta perspectiva o crime pode ser definido como uma conduta que resulta em uma lesão ou perigo de lesão ao bem jurídico[4].
CONCEITO ANALÍTICO: embora o crime sintetize em si uma verdadeira unidade, sua compreensão impõe uma decomposição didática de suas estruturas elementares.
Sob este ângulo, o estudo do crime se dedica aos chamados elementos do crime.
A depender da concepção adotada o crime pode ter dois (fato típico e antijuridicidade), três (fato típico, antijuridicidade e culpabilidade); quatro (fato típico, antijuridicidade, culpabilidade e punibilidade) ou cinco (conduta, tipicidade, antijuridicidade, culpabilidade e punibilidade) elementos.
Não é prudente aqui apontar qual seria a teoria correta. O tema é muito e rico e recheado de discussões mais profundas que não cabem neste espaço, dado o propósito. Vale, por enquanto, apenas saber como o crime é observado sob o conceito analítico e as principais correntes que existem.
[1] “Para se praticar um crime, formalmente, o agente precisa realizar a conduta descrita na lei pelo legislador, violando desse modo a correspondente norma penal. (...) O conceito formal de delito está vinculado ao princípio da legalidade (‘nullum crimen nulla poena sine lege’)”. (GOMES, Luiz Flávio; MOLINA, Antônio García-Pablos de; CUNHA, Rogério Sanches. Direito Penal : parte geral, 2 ed. – São Paulo : Editora Revista dos Tribunais, 2009, p. 126)
[2] “Sob o aspecto formal, podem-se citar os seguintes conceitos de crime: ‘Crime é o fato humano contrário à lei’ (Carmignani); ‘Crime é qualquer ação legalmente punível’; ‘Crime é toda ação ou omissão proibida pela lei sob ameaça de pena; ‘Crime é uma conduta (ação ou omissão) contrária ao Direito, a que a lei atribui uma pena’. Essas definições, entretanto, alcançam apenas um dos aspectos do fenômeno criminal, o mais aparente, que é a contradição do fato a uma norma de direito, ou seja, sua ilegalidade como fato contrário à norma penal. Não penetram, contudo, em sua essência, em seu conteúdo, em sua matéria”. (MIRABETE, Júlio Fabbrini. Manual de Direito Penal, 17 ed., São Paulo : Atlas, 2001, p. 95)
[3] “É certo que sem descrição legal nenhum fato pode ser considerado crime. Todavia, é importante estabelecer o critério que leva o legislador a definir somente alguns fatos como criminosos. É preciso dar um norte ao legislados, pois, de forma contrária, ficaria ao seu livre alvedrio a criação de normas penais incriminadoras sem esquema de orientação, o que, fatalmente, viria lesar o jus libertatis dos cidadãos” (JESUS, Damásio Evangelista de. Direito Penal: Parte geral. 24 ed. São Paulo : Saraiva, 2001, p. 151).
[4] “Conceito material de crime: o mais difundido conceito material de crime é o que o enfoca como fato ofensivo (grave) desvalioso a bens jurídicos muito relevantes. Ele realça seu aspecto danoso (sua danosidade social) e o descreve como lesão ou perigo de lesão ao bem jurídico. Crime, portanto, seria, o fato humano lesivo ou perigoso (ofensivo) a um interesse relevante” (GOMES, Luiz Flávio; MOLINA, Antônio García-Pablos de; CUNHA, Rogério Sanches. Direito Penal : parte geral, 2 ed. – São Paulo : Editora Revista dos Tribunais, 2009, p. 127).