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Processo do trabalho: efeito devolutivo em profundidade no recurso ordinário

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15/07/2017 às 16:55
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3. Jurisprudência Trabalhista e alteração da Súmula 393 do TST

De início, jurisprudência é norma jurídica criada pelos tribunais, para aplicação restrita em determinadas matérias do direito, apesar do entendimento de que as normas de direito são criadas apenas pelo legislativo, não se deve afastar a idéia de resolução de normas através do judiciário, neste sentido expõe Hans Kelsen:

Aplicação do Direito existe tanto na produção de normas jurídicas gerais por via legislativa e consuetudinária como nas resoluções das autoridades administrativas e ainda - como veremos – nos atos jurídico-negociais; e os tribunais aplicam as normas jurídicas gerais ao estabelecerem normas individuais, determinadas, quanto ao seu conteúdo, pelas normas jurídicas gerais, e nas quais é estatuída uma sanção concreta: uma execução civil ou uma pena47.

Neste sentido, o Judiciário cria normas de modo concreto, com a finalidade de uniformizar seu entendimento quanto à aplicação de determinada matéria no ordenamento jurídico, não sendo por acaso, fonte de direito, talvez não em sua totalidade, mas em diversos ramos das ciências jurídicas é vista a jurisprudência como norma em sentido estrito.

Com efeito, no ordenamento brasileiro e na seara trabalhista, as súmulas representam à exteriorização da interpretação de normas pelo Judiciário, através da jurisprudência. Assim, vêm decorrem atualizações em especial as súmulas do TST, conforme as necessidades da sociedade atual, fatos estes que ocorrem de modo visível com a vigência do Novo Código de Processo Civil em 2015. No trabalho em questão, é analisa-se ao conteudo da Súmula 393 do TST, que em sua redação antiga limitava a profundidade do efeito devolutivo, com justificativa na supressão de instância nos termos do art. 515. do CPC de 197348.

A pretérita redação da Súmula trazia em sua interpretação a seguinte idéia, ao transferir de oficio a apreciação dos fundamentos da inicial, aqueles não observados no julgamento pelo juiz singular, no tribunal estes pedidos não poderiam ser analisados, sem antes, ocorrer o esclarecimento pela via de embargos de declaração no próprio juízo de primeiro grau. Ainda, no caso de interposição de recurso ordinário seriam remetidos pelo tribunal ao juiz singular originário para julgar a respeito dos pedidos49. Assim, somente após a edição da resolução n. 169/2010 do TST que se incluiu a aplicação do §3º do art. 515. do CPC/73, deste modo, entendo possível a verificação dos pedidos da inicial pelo Tribunal50, conforme descreve a redação da antiga súmula 393 do TST abaixo:

O efeito devolutivo em profundidade do recurso ordinário, que se extrai do § 1º do art. 515. do CPC, transfere ao Tribunal a apreciação dos fundamentos da inicial ou da defesa, não examinados pela sentença, ainda que não renovados em contrarrazões. Não se aplica, todavia, ao caso de pedido não apreciado na sentença, salvo a hipótese contida no § 3º do art. 515. do CPC51.

Neste sentido, com a vigência da resolução n. 169/2010 publicada em 23 de novembro de 2010, estendeu-se à profundidade do efeito devolutivo aos pedidos, ressaltando ainda que o texto original da Súmula surgiu da conversão da OJ. 340. da SBDI-1, através da Resolução n. 129/2005 do TST.

Em seguida com o advento do Novo Código de Processo Civil, em 2015, o Tribunal Superior do Trabalho, iniciou a atualização inúmera Súmulas que adotavam os dispositivos do antigo código de processo civil. Neste contexto, a Súmula 393 passou pela atualização de sua redação compactuando-se com o novo Diploma Processual Civil, conforme transcrição in verbis:

RECURSO ORDINÁRIO. EFEITO DEVOLUTIVO EM PROFUNDIDADE. art. 1.013, § 1º, do cpc de 2015. ART. 515, § 1º, DO CPC de 1973. (nova redação em decorrência do CPC de 2015) – Res. 208/2016, DEJT divulgado em 22, 25 e 26.04.2016

I - O efeito devolutivo em profundidade do recurso ordinário, que se extrai do § 1º do art. 1.013. do CPC de 2015 (art. 515, §1º, do CPC de 1973), transfere ao Tribunal a apreciação dos fundamentos da inicial ou da defesa, não examinados pela sentença, ainda que não renovados em contrarrazões, desde que relativos ao capítulo impugnado.

II - Se o processo estiver em condições, o tribunal, ao julgar o recurso ordinário, deverá decidir desde logo o mérito da causa, nos termos do § 3º do art. 1.013. do CPC de 2015, inclusive quando constatar a omissão da sentença no exame de um dos pedidos52.

Neste sentido, a nova redação da Súmula fruto da resolução n. 208/2016, surge com as adaptações aos dispositivos do Código de Processo Civil de 2015, na doutrina existem divergências a respeito das alterações da Súmula, como por exemplo, Sergio Pinto Martins, que diz “A nova redação da súmula mostra que o efeito devolutivo em profundidade diz respeito tanto à inicial como à defesa. Antes da redação só fazia referência à defesa” 53 . O que não condiz com a realidade, bastando a simples leitura da antiga redação a qual demonstra a possibilidade de aplicação do efeito tanto na inicial como na defesa.

Ainda, a respeito do item II da súmula, que faz referência à teoria da causa madura54, o referido Jurista diverge quanto a sua utilização ao dizer que “Entretanto, o TST tem utilizado o referido parágrafo quando afasta a prescrição e passa a examinar matéria unicamente de direito” 55 , entendo-se que a aplicação da teoria da causa madura nos julgamentos seria mitigada na esfera trabalhista, utilizado o tribunal apenas para analisar a matéria de direito, ao invés de devolver os autos à origem para julgamento naquela instância.

O item I da súmula 393 do TST tem como precedentes os seguintes recursos: ERR 405994-18.1997.5.19.555 Relator Min. Carlos Alberto Reis de Paula; ERR 208313-28.1995.5.04.5555 Relator Min. Vantuil Abdala; ERR 181482-34.1995.5.15.5555 Relator Min. Francisco Fausto Paula de Medeiros; ERR 130918-48.1994.5.02.5555 Relator Min. Vantuil Abdala, entre outros recursos encontrados na pagina oficial do TST56, o primeiro precedente descrito acima, reitera o entendimento de que não ocorre a supressão de instâncias quando o tribunal decide a respeito dos fundamentos e pedidos não analisados pelo juízo singular, conforme ementa abaixo:

EMBARGOS EM RECURSO DE REVISTA. SUPRESSÃO DE INSTÂNCIA. NÃO-CONHECIMENTO. Se o julgador de 1º grau, para reconhecer a existência de coisa julgada e extinguir o processo sem julgamento de mérito, averiguou a existência, ou não, do objeto que fomenta o pedido, não há supressão de instância pelo Regional ao afastar a coisa julgada e julgar o próprio mérito, sem determinar o retorno ao 1º grau para apreciar o mérito em si. Embargos não conhecidos57.

Neste entendimento, o Tribunal Superior do Trabalho decide pacificando a questão da profundidade do efeito devolutivo nos recursos ordinários na esfera trabalhista, apesar da ocorrência de diversas controvérsias, inclusive dos Tribunais regionais do país, onde em determinados regionais afastou-se a análise dos fundamentos e pedidos no recurso ordinário com a justificativa do evento da supressão de instância. Com efeito, o precedente do TST ERR 208313-28.1995.5.04.5555, pacificou a divergência entre os Regionais, conforme ementa transcrita in verbis:

RECURSO. DEVOLUTIVIDADE. AMPLITUDE. Se o reclamado em sua defesa articulou mais de um fundamento, mas apenas um deles foi acolhido pela sentença de primeiro grau, o recurso ordinário interposto devolverá ao Tribunal o conhecimento dos demais fundamentos da defesa, ainda que não apreciados pela Junta de Conciliação de Julgamento. Inteligência do art. 515. do CPC. Recurso conhecido e provido58.

Assim, atualizando-se a redação da súmula 393, com harmonia aos dispositivos do NCPC e principalmente esclarecendo as dúvidas advindas da redação anterior, questões estas divergentes nos regionais, como exemplo, o ilustre Sergio Pinto Martins ao lecionar no sentido da aplicação da profundidade apenas nas questões da defesa59 e Bruno Klippel que diverge ao interpretar a jurisprudência da sumula onde somente os fundamentos da exordial seriam abrangidos pela súmula 393, excluído-se os pedidos, com fundamentos na resolução n. 169/201060.

Por fim, após a atualização pelo tribunal superior do trabalho da súmula 393, utiliza-se de forma clara a nova redação no contexto atual, conforme trecho do acórdão no processo n. 0020400-92.2015.5.04.0383 proferido pelo TRT-4 “Em face do efeito devolutivo em profundidade (Súmula 393 do TST), cabe a análise das teses defensivas nos itens nos quais a sentença é reformada para prover o recurso da reclamante. Assim, em relação às horas extras, os embargos são acolhidos para acrescer fundamentos ao julgado(...)” 61 , decisão proferida em 30/01/2017, ou seja, sobre a vigência da nova atualização da súmula, a qual esta em perfeita coerência e harmonia adotada na amplitude do efeito devolutivo.

3.1. Instrução Normativa 39 do TST

O Código de Processo Civil em vigência tem aplicação de forma supletiva ao processo do trabalho através da Instrução Normativa 39 do TST, instrução esta analisada neste tópico, antes de adentrar no conteudo específico da instrução, é necessário esclarecer alguns questionamentos, o que é uma instrução normativa? Qual sua finalidade? É direcionada a quem? Para responder a estas questões buscam-se respostas no direito administrativo.

Deste modo, Instrução Normativa são os atos administrativos de órgãos públicos que direcionam-se a aplicação de determinada legislação na melhor forma cabível, dentro da esfera que ela esteja incorporada, atingindo todos os envolvidos indistintamente62. Neste sentido Fernanda Marinela leciona dizendo “Atos normativos são aqueles atos que contêm comando geral e abstrato, visando à correta aplicação da lei, detalhando melhor o que a lei previamente estabeleceu. São eles: regulamentos, decretos, instruções normativas, regimentos, resoluções e deliberações” 63 .

Assim, as instruções normativas podem ser utilizadas não somente pela administração pública, mas também pelos demais órgãos do estado, quando referir-se a aplicação e execução de leis, com fundamentos no art. 87. da Constituição Brasileira, dispositivo explicado pela professora Fernanda Marnela:

Instruções normativas: são atos administrativos expedidos pelos Ministros de Estado para a execução das leis, decretos e regulamentos, art. 87, parágrafo único, inciso II, mas também podem ser utilizados por outros órgãos para o mesmo fim64.

Com efeito, o Judiciário através de instruções normativas, regula a aplicação das leis e regulamentos em sua esfera de competência, sendo assim, na justiça do trabalho a competência em âmbito nacional para edição de Instruções Normativas é do Tribunal Superior do Trabalho, órgão este que destina e aprova seus atos através de seu Pleno, remetendo-os a todos os órgãos subordinados da Justiça do Trabalho e seus operadores de forma ampla.

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Esclarecida as peculiaridades em questão, o TST em 15 de Março de 2016, através da resolução 203, editou a Instrução Normativa 39 que destina-se as normas CPC de 2015, interpretando quais dispositivos seriam aplicados no processo do trabalho, a respeito descreve em seu art. 3º, as normas aplicáveis ao processo do trabalho, em especial, quanto ao efeito devolutivo do recurso ordinário no inciso XXVIII, conforme descrito abaixo:

Art. 3° Sem prejuízo de outros, aplicam-se ao Processo do Trabalho, em face de omissão e compatibilidade, os preceitos do Código de Processo Civil que regulam os seguintes temas:

(...)

XXVIII - arts. 1013. a 1014 (efeito devolutivo do recurso ordinário - força maior) 65.

Neste sentido, o Tribunal Superior do Trabalho, regulou a aplicação dos supracitados artigos no âmbito processual trabalhista, especificamente, ao recurso ordinário, forçando a atualização da súmula 393 e inúmeras outras, para adaptá-las ao novo regulamento e ao Código de Processo Civil em vigência a partir de 15 de março de 2016, após a diluição do período de sua vacância legal.

Deste modo, deve o operador do direito, ater-se não somente as súmulas do TST, mas também as Instruções Normativas, Regulamentos Internos dos Tribunais, portarias e outros meios de conduzir a execução das Normas do ordenamento jurídico pátrio que são direcionadas a todos, inclusive na esfera da justiça do trabalho.


Conclusão

A aplicação do instituto processual civil em questões processuais trabalhistas, sempre envolve debates e opiniões, especialmente na visão doutrinaria, não foi diferente com o advento do Código de Processo Civil em 2015, apesar da existência pacifica trazida pelos entendimentos jurisprudenciais dos tribunais a respeito da aplicação subsidiaria, ainda permaneceu algumas duvidas quanto a determinados pontos passiveis de aplicação, deste modo o efeito devolutivo em profundidade aplica-se no processo do trabalho há bastante tempo, o que não estava cristalizado de forma clara até então debatido neste trabalho era o alcance quanto à matéria.

Sendo assim, em síntese, o presente trabalho foi elaborado na tentativa de esclarecer os pontos mais divergentes do instituto em questão, o que se acredita ter superado, após esta curta exposição de fatos históricos e posicionamentos diversos, alguns favoráveis e outros contrários a idéia, apesar da amplitude e repercussão que gera ao instituir alcance maior a um efeito especifica de um ramo processual. Deste modo, tratou-se de forma pontual os limites da matéria, não deixando de observar as peculiaridades da profundidade horizontal e vertical do efeito devolutivo, ambas limitadas por parâmetros concretos, analisados através da súmula 393 e da Instrução Normativa 39, ambas do TST.

Isto posto, com segurança entende-se que a aplicação do referido instituto não agride a idéia do duplo grau de jurisdição, pelo contrario a devolução em profundidade abre a possibilidade de o Tribunal rever todos os fundamentos e pedidos, muitos destes, sequer analisados na sentença do juízo singular, o que afasta claramente a dúvida existente quanto à ocorrência, ou não da supressão de instâncias, assim, a própria IN 39 explanada na parte final do trabalho destaca os pontos primordiais do código de processo civil que podem ser aplicados de forma supletiva ao processo do trabalho, de forma compatível com o grupo principiológico do processo trabalhista.

Por fim, a própria CLT é omissa em inúmeros pontos, no capítulo dos recursos e meios de execução, o que permite à adaptação as normas processuais gerais, que respeitem principalmente o estado democrático de direito e as normas constitucionais do nosso ordenamento, fundamentos estes que são claramente respeitados, e garantidos ao aplicar o efeito devolutivo em profundidade nos recursos ordinários do âmbito trabalhista.

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Sobre o autor
Fabio Cesar Orlandi

Acadêmico em Direito, cursando o 9º Semestre na Uniritter - Laureate International Universities - Campus Canoas/RS. Estudos direcionados ao Direito do Trabalho e Processo do Trabalho. Participante do Grupo de Estudos da Uniritter Laureate International Universities - Campus Canoas - Direitos Humanos: Entre Justiça Material e Justiça Procedimental - coordenado pelos professores Dr. João Paulo Kulczynski Forster e Dr. Mártin Perius Haeberlin

Informações sobre o texto

Este texto foi publicado diretamente pelos autores. Sua divulgação não depende de prévia aprovação pelo conselho editorial do site. Quando selecionados, os textos são divulgados na Revista Jus Navigandi

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