DEFINIÇÕES SOBRE AÇÃO E PROCESSO
DA AÇÃO
A ação é a provocação que tira a jurisdição de seu modo inerte através de um processo. Ela é um direito ou um poder do sujeito que se interesse pela tutela jurisdicional.
Coube aos doutrinadores o estudo das teorias da ação e vamos falar um pouco de seis delas, quais são: Teoria Imanentista ou Civilista, A Polêmica Windscheid-Muther, Teoria da Ação Como Direito Autônomo, A Ação Como Direito Autônomo e Concreto, A Ação Como Direito Autônomo e Abstrato e A Doutrina de Liebman.
Pela Teoria Imanentista ou Civilista, nas palavras de Cintra, Grinover e Dinamarco, entende-se que a ação seria uma qualidade de todo direito ou o próprio direito reagindo a uma violação. Por meio dela, entende-se ainda que não existe direito sem ação, que a ação segue a natureza do direito.
Acerca da polêmica de Windscheid-Muther, os autores supramencionados disseram que:
O ponto de partida para a reelaboração do conceito de ação foi a célebre polêmica entre os romanistas Windscheid e Muther, travada na Alemanha em meados do século passado. Muther, combatendo algumas ideias de Windscheid, distinguiu nitidamente direito lesado e ação. Desta, disse, nascem dois direitos, ambos de natureza pública: O direito do ofendido a tutela jurídica do Estado (dirigido contra o Estado) e o direito do Estado a eliminação da lesão, contra aquele que a praticou. Apesar de aplicar com veemência, Windscheid acabou por aceitar algumas ideias do adversário, admitindo um direito de agir, exercível contra o Estado e contra o devedor. Assim, as doutrinas dos dois autores antes se completam do que propriamente se repelem, desvendando verdades até então ignoradas e dando nova roupagem ao conceito de ação. (CINTRA; GRINOVER;DINAMARCO, 2005. p. 258)
Pela Teoria da Ação como Direito Autônomo tem-se a demonstração da autonomia da ação e a separação do direito de ação do direito subjetivo material que será tutelado.
A partir desse entendimento surgiram três correntes com base na Teoria da Ação como Direito Autônomo que são: a) a que a considerava como um direito autônomo e concreto; b) a que a qualificava como direito potestativo; e c) a que a classificava como direito autônomo e abstrato.
Sobre a Ação Como Direito Autônomo e concreto, também chamada de Teoria Eclética da ação, temos que:
Para os defensores da ação como direito concreto à tutela jurisdicional, este direito público subjetivo, embora diverso do direito material lesado, só existe quando também exista o próprio direito material a tutelar. Em outras palavras, para essa corrente, embora o direito material seja agora desvinculado do direito de ação, aquele é pressuposto para esse. Assim, a ação seria o direito à sentença favorável, isto é, o direito público voltado contra o Estado, de obter uma proteção pública para o direito subjetivo material. Os maiores expoentes dessa teoria foram, entre outros, Wach, Bulow, Hellwig e Chiovenda (THEODORO JÚNIOR, 2010, p. 65).
Esta teoria foi elaborada por Wach, na Alemanha. Pode ser conhecida também como Teoria da Ação Como Direito Potestativo, formulada por Chiovenda, doutrinador que, como citado acima, foi adepto desta teoria.
Temos também a Teoria da Ação Como Direito Autônomo e Abstrato, que nas palavras de Cintra, Grinover e Dinamarco é o que segue:
Segundo essa linha de pensamento, o direito de ação independe da existência efetiva do direito material invocado: não deixa de haver ação quando uma sentença justa nega a pretensão do autor, ou quando uma sentença injusta a acolhe sem que exista na realidade o direito subjetivo material. A demanda ajuizada pode ser até mesmo temerária, sendo suficiente, para caracterizar o direito da ação, que o autor mencione um interesse seu protegido em abstrato pelo direito. É com referência a esse direito que o Estado está obrigado a exercer função jurisdicional, proferindo uma decisão, que tanto poderá ser favorável. Sendo a ação dirigida ao Estado, é este o sujeito passivo de tal direito. (CINTRA; GRINOVER; DINAMARCO, 2005. p. 260)
Já Liebman foi um processualista italiano que consagrou a Doutrina de Liebman. Para Cintra, Grinover e Dinamarco, a definição mais exata da Doutrina é um direito subjetivo instrumental podendo ir além e ser um poder que não corresponde à obrigação do Estado.
Todas essas teorias cooperaram para o crescimento da Toeria Geral do Processo, optando cada doutrinador por uma corrente de pensamento acima disposta.
DO PROCESSO
Processo significa no latim seguir adiante. É ele quem move a máquina judiciária, e por meio dele que se obtém a tutela jurisdicional. Não pode ser confundido com procedimentos, visto que, ele é um ajuntamento dos procedimentos com a relação das partes. O procedimento pode ser encarado como a manifestação do processo extrinsecamente.
Cintra, Grinover e Dinamarco, 2005, observam que, o procedimento é o aspecto formal do processo e os autos, que também não podem ser confundidos com processo, são a materialidade dos documentos ajuntados.
Processo é conceito que transcede ao direito processual. Sendo instrumento para o legítimo exercício do poder, ele está presente em todas as atividades estatais (processo administrativo, legislativo) e mesmo não-estatais ( processos disciplinares dos partidos políticos ou associações, processos das sociedades mercantis para aumento de capital etc.). (CINTRA; GRINOVER; DINAMARCO, 2005. p. 286)
O processo no seu estudo histórico apresenta diversas teorias, das quais falaremos um pouco a seguir.
Temos primeiramente a Teoria do Processo como Contrato, onde havia um entendimento de que as partes se submetiam voluntariamente ao judiciário. Essa doutrina é verdadeira pois o que sabemos é que as partes não possuem direito de escolha.
O criador e sustentador desta teoria é Pothier, que buscou inspiração em Ulpiano e Rosseau. Confirma-nos, Alvim prolatando que a fonte de inspiração foi um texto de Ulpiano, que, traduzido, resulta “em juízo se contrai obrigações, da mesma forma que falsa, pois bem sabemos que as partes sofrem imposição para se submeterem ao judiciário nas estipulações” (ALVIM, 2003, apud, PINTO, 2008, p.1).
Para Rosseau, “Enquanto os cidadãos se sujeitam às condições que eles mesmos pactuaram, ou que eles poderiam ter aceito por decisão livre e racional, não obedecem a ninguém mais que à sua própria vontade”.
Entendem os estudiosos que essa teoria tem base no direito Romano onde se falava do litiscontestatio, que é a aceitação das partes perante a decisão judicial. Nesse fundamento consiste a maior crítica desta teoria, pois, no judiciário hoje, não se tem mais o juiz como arbitro, mas sim como alguém munido de função estatal, não havendo dentro do pocesso hierarquia entre as partes.
Com a ideia de que o processo não poderia ser caracterizado por um contrato e nem como um delito, a partir de Arnault de Guényvau e Savigny surgia a Teoria do Processo Como Quase Contrato.
Segundo Cintra; Grinover e Dinamarco, 2005, tal teoria partia de um erro metodológico que cria que o processo devia ser incluído nas categorias do direito privado, havendo na teoria a omissão da lei.
Esta se diferencia da teoria anterior, que entende o processo como contrato, conforme observação do autor inframencionado:
Esta teoria houve uma singela modificação do entendimento de litiscontestatio, que antes era uma convenção das partes perante o juiz que proferiria uma decisão que seria acatada. Para Savigny e Guényva o consentimento não era inteiramente livre, motivo este que levou os autores a acreditar que o processo “não era um contrato, que pressupõe vontade livre, sendo algo semelhante a um contrato, algo como se fosse um contrato, embora contrato não fosse” (ALVIM, 2003, apud, PINTO, 2008, p.3)
Em 1868, com a publicação de seu livro Teoria dos pressupostos processuais e das exceções dilatórias, Bülow trouxe à baila a Teoria do Processo como Relação Jurídica. Esta ainda é uma teoria predominante na confecção de leis processuais e códigos.
O criador da teoria chegou ao entendimento que no processo existem duas relações jurídicas, quais são as de direito material, discutida no processo e a de direito formal, que é formada entre as partes. Vejamos:
No processo, o autor pleiteia o pagamento de uma quantia que lhe é devida; antes de peticionar em juízo, já existia entre este mesmo autor e o mesmo réu um vínculo, ou seja uma relação jurídica de direito material, fundada num contrato, no qual o autor figura como credor e o réu como devedor; somente depois de vencido o prazo, e não paga a dívida, é que o titular do direito de crédito veio a juízo reclamar o inadimplemento do contrato, iniciando-se a relação jurídica processual, que só se completou com o chamamento do réu a juízo através da citação. (COLUCCI; ALMEIDA, 1999, apud, PINTO, 2008, p.3)
Vários processualistas lançam críticas contra essa teoria no que diz respeito à introdução da relação jurídica no conceito de processo, contudo, não foram suficientes para acabar com o uso desta no Brasil. Como manifestação crítica foi lançada a Teoria do Processo Como Situação Jurídica.
Construída por Goldschimidt, a Teoria do Processo Como Situação Jurídico, como supramencionado, veio para criticar a teoria anterior que era a do Processo Como Relação Jurídica.
Entende Davi Souza De Paula Pinto, 2008, que essa teoria foi criada pois Goldschimidt não admitia que houvesse relação entre as partes e o juiz, e nem mesmo entre as próprias partes, entendendo assim, que o processo era um relação jurídica que os ligava.
Goldschimidt, não admite tal relação entre os sujeitos (juiz, autor, réu) porque para ele “o juiz atua por dever funcional, de caráter administrativo, e as partes simplesmente estão sujeitas à autoridade do órgão jurisdicional” (ALVIM, p.158, 2003). Portanto, as partes no processo, atuam como sujeitas ao órgão da jurisdição, enquanto que o juiz atua no processo por dever de sua função. Vê-se que não se relacionam. Sob este ponto de vista, observa-se que nem mesmo as partes se relacionam. (PINTO, 2008, p.4)
Apesar de ter grande índice de rejeição em sua teoria, Goldschimidt pregava que o que anteriormente no processo era um direito hoje eram consideradas apenas chances, esse foi o ponto de ataque à teoria encontrada por Cintra; Dinamarco e Ada Pellegrini.
As criticas não deixaram de alvejar a presente teoria. Todos os pontos abordados pelo teórico foram perseguidos. O primeiro e o mais criticado refere-se à relação jurídica processual. Alvim, doutrina que é um equivoco Goldscimidt sustentar que o “juiz exerce suas funções por delegação do Estado, não havendo relações jurídicas entre o julgador e as partes” (ALVIM, p. 160, 2003). Mais uma vez o processo como relação jurídica, demonstra ser mais considerável pelos doutrinadores. (PINTO, 2008, p.5)
Elio Falazzari, jurista italiano criou a Teoria do Processo como Procedimento em Contraditório. Em sua teoria fez a distinção de processo e procedimento e incorporou o contraditório em sua definição, visto que, ele que traz a paridade de armar para o processo.
É lícito dizer, pois, que o processo é o procedimento realizado mediante o desenvolvimento da relação entre os sujeitos, presente o contraditório. Ao garantir a observância do contraditório a todos os “litigantes em processo judicial ou administrativo e aos acusados em geral”, está a Constituição (art. 5º, inc. LV) formulando a solene exigência política de que a preparação de sentenças e demais provimentos estatais se faça mediante o desenvolvimento da relação jurídica processual. (CINTRA; GRINOVER; DINAMARCO, 2005. p. 293)
A crítica nessa teoria tem seu ápice no entendimento de alguns doutrinadores que Falazzari ao criar a teoria não respeitou a norma constitucional ao integralizar o contraditório à definição do processo e procedimento.
O professor Rosemiro Pereira Leal, utilizando Popper como fonte, após diversas pesquisas fez surgir uma nova teoria: A Teoria Neo-Institucionaloista do Processo.Ela é muito estudada e comentada no meio dos doutrinadores processualistas e em nada se parece com as demais teorias. Leal ao criá-la, baseou-se no período em que vivemos que é a pós-modernidade e também fundado em pesquisa em escritos de diversos doutrinadores.
Nesta pós-modernidade o Processo como instituição se infere “pelo grau da autonomia jurídica constitucionalizada a exemplo do que desponta no discurso do nosso texto constitucional” (LEAL,p 51, 2005). Portanto é considerável a conquista da fundamentação do processo em princípios e institutos que repudiam a repressão e concentração política.
Davi Souza de Paula Pinto, 2008, escreveu que Leal entendia que a jurisdição na pós-modernidade se baseava na igualdade, e também que não podia haver hierarquia no meio das instituições jurídicas.
Outro ponto de sustentação de Rosemiro Leal foi a cidadania, conforme falado a seguir:
Sustenta Rosemiro um importante elemento para a formulação de sua teoria: a cidadania. Em síntese, a Cidadania se apresenta como uma garantia e um direito fundamental intitulado na Constituição. Portanto, pode se afirmar que a cidadania é constitucionalizada, que se dá também pelo Processo, lembrando que sem distinção ou dicotomia de Processo infraconstitucional ou Processo constitucional. Rosemiro afirma a importância da cidadania (soberania popular) em sua teoria da seguinte maneira. (PINTO, 2008, p.7)
Entendeu Rosemiro que a busca de um processo no pós-modernismo cooperaria para uma jurisdição com base nas instituições constitucionais do processo. E suas sustentações foram feitas e sustentadas com base em equívocos que outros autores cometeram e na busca por saná-los, apesar de sua teoria não ser um pensamento acabado, ela muito coopera para o estudo da Teoria Geral do Processo.
Adotando a concepção de processo como instituição com base nas ciências sociais, o doutrinador Guasp criou uma a Teoria do Processo Como Instituição. Ele entendia que o processo tinha função de resolver as questões pendentes de uma sociedade, e que uma instituição também funcionava em prol da estabilidade de uma comunidade, e por isso, poderia o processo ser entendido como uma instituição.
Como a concepção de instituição é muito elástica e abrangente, a critica a essa teoria consiste que não é cabível reduzir uma instituição à definição de processo, enquanto não houverem conceitos precisos.
Por fim, veremos a teoria que trata o da Teoria Constitucionalista do Processo que entende que o processo para a sua eficácia deve obedecer as garantias e os princípios garantidos na Constituição.
Consideram-se direitos materiais aqueles diretamente outorgados pelo texto constitucional, o qual define, também, o seu conteúdo. (...) Consideram-se garantias formais aquelas que, sem definir o conteúdo do direito, asseguram a ordem jurídica, os princípios da juridicidade, evitando o arbítrio, banalizando a distribuição dos direitos em geral (...) Consideram-se garantias instrumentais ou processuais as disposições que visam assegurar a efetividade dos direitos materiais e das garantias formais, cercando por sua vez, sua aplicação de garantias” (GRECO, 2008, apud, PINTO, 2008, p.8)
Tal teoria baseia-se simplesmente na aplicação das garantias constitucionais na instituição do processo.
De todas as teorias exibidas, a mais relevante para a natureza jurídica do processo é a da relação processual. Pois, por muito tempo, o processo foi confundido com a simples sucessão de atos processuais, ou seja, com o procedimento. Daí surgiram os estudos das teorias expondo as posições privatistas e publicistas, e as demais teorias se mostraram fracas ante a supracitada.
O Estado e a parte estão interligados no processo e agem por meio de atos de procedimento, mas isso não significa que as definições de processo e procedimento estejam diluídas uma na outra.
É a teoria que falamos acima que melhor explica essa diferença e mais se adéqua à definição da natureza jurídica do processo.
REFERÊNCIAS
CINTRA, A. C. A.; GRINOVER, A. P.; DINAMARCO, C.R. Teoria Geral do Processo. 21. Ed. São Paulo: Editora Malheiros, 2005. 368 p.
JÚNIOR, Humberto Theodoro. Curso de Direito Processual Civil. 50. Ed. Rio de Janeiro: Editora Forense, 2009, 790 p.
PINTO, Davi Souza de Paula. Teoria Geral do Processo: As Diferentes Visões Teóricas que Surgiram no Decorrer da História do Direito Sobre o Processo. http://www.jurisway.org.br/v2/dhall.asp?id_dh=822. No prelo.