Capa da publicação Judiciário x arbitragem: vantagens e desvantagens
Artigo Destaque dos editores

Judiciário X arbitragem: vantagens e desvantagens

11/12/2018 às 14:40

Resumo:


  • O Poder Judiciário possui como função típica a resolução de conflitos de forma imparcial, com uso da coerção para efetivar suas decisões;

  • Entre as vantagens do Poder Judiciário estão a manifestação estatal, o poder de coerção e o princípio do duplo grau de jurisdição;

  • Por outro lado, as desvantagens incluem a falta de escolha do julgador, a morosidade, a burocracia, o excesso de custos e a possibilidade de falta de expertise do julgador.

Resumo criado por JUSTICIA, o assistente de inteligência artificial do Jus.

Ainda se mostra em construção a arbitragem pátria, quando comparada à arbitragem internacional – sólida e pujante. Porém, cada vez mais, sobretudo com as evoluções legislativas, a arbitragem nacional tem se destacado por suas vantagens na resolução de conflitos, em detrimento do Judiciário.

1. Introdução

Este artigo apresenta, de forma objetiva e sucinta, as vantagens e desvantagens de recorrer ao Poder Judiciário, meio tradicional de resolução de conflitos, ou à via arbitral, na qual a resolução de contendas é decidida por árbitro(s), capaz(es) e que tenha(m) a confiança das partes, conforme o art. 13 da Lei nº 9.307/96.

Cabe ressaltar que há diversos prismas sob os quais podem ser analisadas as vantagens e desvantagens de acessar a Justiça pública ou a privada. Especificamente no tocante a este artigo, a abordagem utilizada baseia-se em aspectos gerais e teóricos, sem querer esgotar um tema tão rico e em constante evolução.


2. Poder Judiciário

O Poder Judiciário integra os poderes da União, os quais são independentes e harmônicos entre si, conforme art. 2º da Constituição Federal, e possui como função típica a jurisdicional e como funções atípicas as de natureza executivo-administrativa e legislativa.

Assim, cabe ao Poder Judiciário, por meio do Estado, a resolução dos conflitos de forma imparcial e com justiça, utilizando-se de um processo estabelecido e com capacidade de usar a coação como forma de efetivar suas decisões.

2.1 Vantagens

Caso a via judicial seja escolhida para a resolução de conflitos, as seguintes vantagens são destacadas:

  • manifestação do Estado: o Poder Judiciário representa a manifestação estatal com vistas à pacificação social e à busca de segurança jurídica para as partes e, de forma ampla, para os cidadãos. São décadas de formação e construção contínua do Direito brasileiro (doutrina, jurisprudência e ordenamento jurídico) até a vigência de um Estado Democrático de Direito. Dessa forma, o Poder Judiciário é reflexo de evoluções e retrocessos, chegando a um ponto de maturidade e aparato que a arbitragem brasileira está distante de alcançar; 
  • poder de coação: o Estado está autorizado a utilizar o poder coercitivo, dentro dos limites legais, para que haja cumprimento de suas decisões. Esse poder coercitivo é proibido ao particular, pois a violência é reprimida pelo Estado. Nesse mesmo sentido, a sentença arbitral não pode ser efetiva se a parte não quiser cumpri-la, sendo necessário recorrer ao Estado para o seu cumprimento; 
  • princípio do duplo grau de jurisdição: a doutrina majoritária entende que esse princípio de base constitucional garante ao cidadão o direito de recorrer da sentença, sendo, em regra, a instâncias superiores formadas por colegiados de juízes. O Pacto de São José da Costa Rica, incorporado em nosso ordenamento com status constitucional - Decreto nº 678 de 6 de novembro de 1992 -, dispõe o seguinte: "Art. 8º h - Direito de recorrer da sentença a juiz ou tribunal superior". Dessa forma, a possibilidade de reexame de mérito diminui as injustiças e os erros materiais e formais;
  • garantia do princípio da imparcialidade: a distribuição do processo, em regra, de forma aleatória, pode colaborar para a igualdade de julgamento e a imparcialidade do julgador, sendo uma garantia de justiça para as partes (observar desvantagem a seguir em sentido oposto). No processo arbitral, a escolha do julgador pelas partes pode ser benéfica no sentido da confiança e da especialização, mas também pode trazer parcialidade em alguns casos.

2.2 Desvantagens

Por outro lado, há as seguintes desvantagens:

  • não pode ser escolhido o julgador: como modo de efetivação do princípio do juiz natural - art. 5º, incisos LIII e XXXVII da Constituição Federal -, a legislação em vigor no tocante a diversas searas do Direito consagrou, como regra, a forma de distribuição ou sorteio para a escolha do magistrado que julgará determinado processo. O art. 285 do Código de Processo Civil, por exemplo, dispõe que: "A distribuição, que poderá ser eletrônica, será alternada e aleatória, obedecendo-se rigorosa igualdade" (grifo nosso). Dessa forma, diferentemente da arbitragem, não há escolha do(s) julgador(es), não permitindo que as partes previamente estabeleçam uma relação de confiança; 
  • possibilidade de falta de expertise do julgador: em virtude de as partes não poderem escolher o julgador, há possibilidade de determinados casos serem julgados por quem detém conhecimento jurídico, mas não de fato sobre o objeto em discussão. Casos, por exemplo, que necessitam de um julgamento técnico e negocial ou com base na equidade não encontrarão guarida na via judicial;
  • morosidade: um sério problema enfrentado pelo Judiciário brasileiro é a morosidade processual. Grande parte das reclamações está relacionada a esse tema, conforme relatórios do Conselho Nacional de Justiça. Isso reflete em uma Justiça que descumpre o princípio da duração razoável do processo - art. 5º, inc. LXXVIII, da Constituição Federal - e aumenta a descrença da sociedade, à medida que não satisfaz os anseios daqueles que buscam a resolução de seus conflitos;
  • burocracia: cada vez mais o Poder Judiciário busca incluir meios alternativos de resolução de conflitos, como a mediação e a arbitragem, em processos judiciais. Isso ocorre devido aos processos judiciais, que têm uma série de procedimentos, dentre os quais as decisões interlocutórias do juiz, as possibilidades recursais das partes e as várias consequências negativas de uma sobrecarga de ritos burocráticos, como: a prescrição de crimes no âmbito penal, a falta de assistência à saúde resultando em morte do paciente no âmbito cível e casos gerais de duração e custo desarrazoados dos processos;
  • excesso de custos: um processo judicial pode acarretar custos financeiros excessivos para as partes, principalmente se o processo transitar por todas as instâncias. A Tabela de Honorários de 2016 da Ordem dos Advogados do Brasil (OAB) do Distrito Federal, por exemplo, apresenta diversos valores que vão desde a advocacia perante tribunais (sustentação oral, representação, medidas cautelares, dentre outros) até as diligências e serviços em audiência (audiências, consulta de processos, requerimentos, entrega de memoriais, dentre outros), que podem, mesmo para aqueles com condições financeiras, sobrecarregar as suas despesas.

3. Arbitragem

A arbitragem é um meio compositivo de solução de controvérsias, por meio do qual as partes buscam a resolução do conflito por intermédio de um ou mais árbitros, e não mais por elas próprias, que profere uma sentença dentro do prazo estipulado pelas partes.

A decisão proferida pelo(s) árbitro(s) é obrigatória, não cabendo, em regra, o duplo grau de jurisdição. Há, porém, a possibilidade de interposição de recurso semelhante aos embargos de declaração, visando a esclarecimentos ou correção de erro material, conforme art. 30 da Lei nº 9.307/96, e a possibilidade de pleitear ao Judiciário a declaração de nulidade da sentença arbitral (art. 33), nos casos previstos no art. 32 da referida lei.

3.1 Vantagens

Caso a arbitragem seja escolhida para a resolução de conflito, as seguintes vantagens são destacadas:

  • flexibilidade de escolha quanto à forma e ao tipo de arbitragem: com base no princípio da autonomia da vontade, as partes são livres para decidir, por exemplo, se as regras da arbitragem serão estabelecidas por uma instituição ou de forma ad hoc, por elas próprias. Ademais, as partes podem decidir se utilizarão regras de direito ou equidade, ou seja, de acordo com o que os árbitros considerem justo, sem necessidade de regramentos legais. Ressalta-se, porém, que, independentemente das regras decididas para a arbitragem, não pode haver violação aos bons costumes e à ordem pública - art. 2º da Lei nº 9.307/96; 
  • especialidade do árbitro e confiança das partes: diferentemente do Judiciário, na arbitragem as partes podem escolher um ou mais árbitros, sendo pessoa(s) capaz(es) e com base na confiança - art. 13 da Lei nº 9.307/96. Como exemplo, além da confiança, o árbitro poderá ser escolhido com base na sua expertise em resolução de conflitos relacionados a contratos de grande vulto ou à área petrolífera;
  • celeridade: com a prolação da sentença arbitral, não caberá uma segunda análise de mérito, reduzindo o tempo de duração do processo. Assim, a arbitragem baseia-se, sobretudo, no princípio da irrecorribilidade das sentenças arbitrais;
  • sigilo: diferentemente do Judiciário, em que o processo e os julgamentos são, em regra, públicos - art. 93, IX, da Constituição Federal -, as partes, com base no princípio da autonomia da vontade, podem utilizar da confidencialidade durante o trâmite do processo arbitral;
  • princípios do contraditório e da ampla defesa: à arbitragem é garantida a observância aos princípios constitucionais do contraditório, ao passo que as parte devem tomar conhecimento da existência da ação e de todos os atos do processo arbitral e também a garantia do direito de manifestação e do contraditório, alicerçado na disponibilidade de todos os meios legalmente utilizáveis para provar o direito de cada parte no processo - art. 5º, LV, da Constituição Federal. Além desses princípios constitucionais, o procedimento arbitral deve respeitar os princípios da igualdade das partes, da imparcialidade do árbitro e de seu livre convencimento, conforme art. 21, parágrafo 2º, da Lei nº 9.307/96. A sentença arbitral que desrespeitar os princípios citados será considerada nula - art. 32, VIII, da Lei nº 9.307/96;     
  • equiparação da sentença arbitral a título executivo judicial: com a promulgação da Lei nº 9.307/96, a sentença arbitral (antigo laudo arbitral) não precisa mais ser validada por um juiz de direito. Essa inovação garantiu atratividade à Lei de Arbitragem e trouxe celeridade aos processos arbitrais, à medida que, aliada ao princípio da irrecorribilidade das sentenças arbitrais, demanda tempo drasticamente inferior aos processos judiciais - art. 31 da Lei nº 9.307/96;
  • economicidade: um processo arbitral pode representar custos financeiros infinitamente inferiores a um processo judicial. Isso ocorre devido às características da arbitragem, como processos mais céleres aliados à irrecorribilidade das sentenças arbitrais. Os custos são referentes aos honorários dos árbitros e a outras despesas porventura necessárias ao longo da arbitragem - art. 11, V e VI da Lei nº 9.307/96; 
  • preservação do relacionamento contratual: a escolha da arbitragem, por meio de uma decisão de árbitro(s) especialista(s) no assunto alvo da necessidade de pacificação, demonstra que as partes escolheram esse meio alternativo de resolução de conflitos visando à manutenção de um  relacionamento entre elas. A rapidez e a confiança nos árbitros permitem a possibilidade da preservação do relacionamento contratual;
  • continuidade da relação prévia: geralmente, as partes que escolhem a arbitragem, seja por meio de cláusula compromissória ou compromisso arbitral, desejam manter a relação prévia. Hodiernamente, há diversas câmaras arbitrais nacionais e internacionais que julgam diariamente diversos conflitos de forma rápida e com a anuência das partes no tocante às regras definidas, sejam elas da própria instituição ou “customizadas”, que garantem o restabelecimento e a continuidade das relações contratuais entre as partes.

3.2 Desvantagens

Em sentido oposto, a opção pela arbitragem revela as seguintes desvantagens:

  • falta de poder de coação: a arbitragem ainda depende do Judiciário para, no curso do processo arbitral, promover diligências que necessitam de coação para serem efetivadas - art. 22, parágrafo 2º, da Lei nº 9.307/96. Ademais, caso a parte não cumpra a sentença arbitral, será necessário que a outra parte recorra ao Judiciário para dar efetividade à decisão. Assim, os árbitros não possuem poder de coação, sendo necessário, caso a parte não cumpra voluntariamente as decisões, que a outra parte recorra ao Poder Judiciário;
  • risco de anulação por parte do Poder Judiciário: caso o procedimento arbitral não cumpra as regras e os princípios estabelecidos pela Lei nº 9.307/96, há possibilidade de anulação da arbitragem - arts. 32 e 33 da Lei de Arbitragem. O Superior Tribunal de Justiça corrobora com o positivado na legislação, por meio do REsp 693219 / PR Recurso Especial 2004/0124717-5: "Não é possível a análise do mérito da sentença arbitral pelo Poder Judiciário, sendo, contudo, viável a apreciação de eventual nulidade no procedimento arbitral" (grifo nosso);
  • possibilidade de parcialidade dos árbitros: na arbitragem, como o árbitro é escolhido pelas partes, há a possibilidade da escolha de árbitro parcial, prejudicando alguma das partes. Dessa forma, a parte prejudicada poderia recorrer ao Judiciário para anulação da sentença arbitral, nos motivos apresentados no art. 21, parágrafo 2º da Lei nº 9.307/96, acarretando perda de tempo e de recursos;
  • possibilidade de custos financeiros maiores para determinados processos: a escolha da via arbitral em detrimento de partes amparadas pela justiça gratuita ou pelos atos processuais mais céleres nos Juizados Especiais (Lei nº 9.099/95) podem representar investimentos financeiros que sobrecarregarão as partes.

4. Conclusão

Ainda mostra-se em construção a arbitragem pátria quando comparada à arbitragem internacional - sólida e pujante. Porém, cada vez mais, precipuamente com as evoluções legislativas, a arbitragem nacional tem se destacado por suas vantagens, resultando em um aumento da procura desse tipo de resolução de conflito em detrimento da Justiça Pública.

Outrossim, a Justiça Pública não tem respondido da forma esperada aos que pleiteiam por meio da via judicial, seja pelo assoberbamento dos tribunais e varas estatais ou pela burocracia procedimental e ritualística preponderantes.

Espera-se que, ao longo dos anos, a arbitragem se consolide como uma verdadeira opção a litigantes e se transforme em via sólida para resolução de conflitos, diante do empoderamento atual dos cidadãos e demais pleiteantes.


5. Referências bibliográficas

BRASIL. Constituição Federal de 1988. Promulgada em 5 de outubro de 1988. Disponível em: <http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/constituicao/constituição.htm>. Acesso em: 03/11/2016.

BRASIL. Lei nº 9.099, de 26 de setembro de 1995. Dispõe sobre os Juizados Especiais Cíveis e Criminais e dá outras providências. Disponível em: <http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/leis/L9099.htm>. Acesso em: 03/11/2016. 

BRASIL. Lei nº 9.307, de 23 de setembro de 1996. Dispõe sobre a arbitragem. Disponível em: <http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/leis/L9307.htm>. Acesso em: 01/11/2016.

BRASIL. Lei nº 13.105, de 16 de março de 2015. Código de Processo Civil. Disponível em: <https://www.planalto.gov.br/ccivil_03/_ato2015-2018/2015/lei/l13105.htm>. Acesso em: 04/04/2017. 

BRASIL. Resolução OAB/DF nº 04, de 06 de agosto de 2015. Aprova tabela de honorários para todo o Distrito Federal. Disponível em: <http://www.oabdf.org.br/wp-content/uploads/2015/08/004-ResolucaodaTabeladeHonorarios.pdf>. Acesso em: 05/04/2017.

CNJ. Morosidade da Justiça é a principal reclamação recebida pela Ouvidoria do CNJ. Disponível em: <http://www.cnj.jus.br/noticias/cnj/62126-morosidade-da-justica-e-a-principal-reclamacao-recebida-pela-ouvidoria-do-cnj>. Acesso em: 05/04/2017.

JESUS, Paulo Roberto Rocha. Coerção, Coação e Imperatividade: Como distingui-las? Artigojus, 2012. Disponível em: <http://www.artigojus.com.br/2012/04/coercao-coacao-e-imperatividade.html>. Acesso em: 06/04/2017.

LENZA, Pedro. Direito Constitucional Esquematizado. 17ª ed. São Paulo: Saraiva, 2013.

LIMA. Cláudio Vianne de. Autonomia do Juízo Arbitral. Revista de Arbitragem e Mediação, 2012. Disponível em: <https://ls.cursos.fgv.br/content/centro_rec/docs/autonomia_juizo_arbitrarial.pdf?_&d2lSessionVal=8Dp6AzAWdMgq4QaXRTjXqRtUN>. Acesso em: 05/04/2017.

Assuntos relacionados
Sobre o autor
Thiago da Costa Cartaxo Melo

Graduado em Direito pela Universidade de Fortaleza (Unifor). Especialista em Análise Política e Relações Institucionais pela Universidade de Brasília (UnB). MBA Executivo em Direito: Gestão e Business Law pela Fundação Getulio Vargas (FGV).

Como citar este texto (NBR 6023:2018 ABNT)

MELO, Thiago Costa Cartaxo. Judiciário X arbitragem: vantagens e desvantagens. Revista Jus Navigandi, ISSN 1518-4862, Teresina, ano 23, n. 5641, 11 dez. 2018. Disponível em: https://jus.com.br/artigos/60380. Acesso em: 27 dez. 2024.

Leia seus artigos favoritos sem distrações, em qualquer lugar e como quiser

Assine o JusPlus e tenha recursos exclusivos

  • Baixe arquivos PDF: imprima ou leia depois
  • Navegue sem anúncios: concentre-se mais
  • Esteja na frente: descubra novas ferramentas
Economize 17%
Logo JusPlus
JusPlus
de R$
29,50
por

R$ 2,95

No primeiro mês

Cobrança mensal, cancele quando quiser
Assinar
Já é assinante? Faça login
Publique seus artigos Compartilhe conhecimento e ganhe reconhecimento. É fácil e rápido!
Colabore
Publique seus artigos
Fique sempre informado! Seja o primeiro a receber nossas novidades exclusivas e recentes diretamente em sua caixa de entrada.
Publique seus artigos