Competência legislativa para supressão de vegetação nativa

26/09/2017 às 10:28
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Esse artigo traz em seu escopo a dicotomia entre a Lei Estadual do Estado da Bahia e a Lei Federal, sob o aspecto da competência a respeito da supressão da vegetação nativa.

1. LEGISLAÇÃO

Primeiramente, a Lei 11.428 de 22 de Dezembro de 2016 é uma Lei Federal que “dispõe sobre a utilização e proteção da vegetação nativa do Bioma Mata Atlântica, e dá outras providências.”.

Esta lei traz especialmente, em seu Art. 14: A supressão de vegetação primária e secundária no estágio avançado de regeneração somente poderá ser autorizada em caso de utilidade pública, sendo que a vegetação secundária em estágio médio de regeneração poderá ser suprimida nos casos de utilidade pública e interesse social, em todos os casos devidamente caracterizados e motivados em procedimento administrativo próprio, quando inexistir alternativa técnica e locacional ao empreendimento proposto, ressalvado o disposto no inciso I do art. 30 e nos §§ 1o e 2o do art. 31 desta Lei.

 Já em seu § 2o o “modus operandi” da supressão de vegetação no ESTÁGIO MÉDIO DE REGENERAÇÃO SITUADA EM ÁREA URBANA, dependerá de autorização do órgão ambiental municipal competente, desde que o município possua conselho de meio ambiente, com caráter deliberativo e plano diretormediante anuência prévia do órgão ambiental estadual competente fundamentada em parecer técnico (grifos aditados).

No artigo ora vergastado, a União delega autorização à orgão ambiental municipal, mediante anuência prévia do orgão ambiental estadual competente fundamentada em parecer técnico.

No âmbito estadual, qual seja, sua anuência prévia por meio de orgão ambiental para suprimir vegetação no estágio médio de regeneração situada em área urbana, deve ser efetivada por meio de regulamento estadual próprio.

No Estado da Bahia, existe a Lei Estadual 10431/2006 que dispõe sobre a política do meio ambiente e de proteção a biodiversidade do Estado da Bahia e da outras providências.

Em seu Capítulo V, artigo 139, inciso I, explicita que a supressão de vegetação nativa, conforne dispuser o regulamento depende de prévia autorização do orgão executor da política estadual de biodiversidade.

Ocorre que, por meio da Lei 13457/2015 sancionada em 13 de dezembro de 2015 restou acrescido em seu artigo 139, o §2°: “Fica delegado ao órgão executor de política ambiental do município, que possua conselho de meio ambiente, a prática dos atos administrativos, desde que cumpridos os requisitos, como previstos no §2° do artigo 14 da Lei Federal n° 11.428, de 22 de dezembro de 2006, nos processos de licenciamento ambiental de impacto local e autorização de supressão de vegetação nativa para TODOS os estágios de regeneração da Mata Atlântica na área urbana”. (grifos aditados).

Ao fazer um comparativo das competências Federal e do Estado da Bahia observa-se que a legislação estadual ampliou ao órgão executor de política ambiental do Município a supressão de vegetação nativa para TODOS OS ESTÁGIOS de regeneração da Mata Atlântica na área urbana, agindo de maneira dissonante da legislação federal que trouxe a competência ao órgão municipal apenas a supressão de vegetação do ESTÁGIO MÉDIO de regeneração situada em área urbana, envolvendo por óbvio uma questão de competência que passaremos a analisar.


2. COMPETÊNCIA AMBIENTAL

O ordenamento Jurídico pátrio vaticina a competência de cada ente da Administração Pública Direta e o faz de maneira concorrente quando se trata de conservação, defesa e proteção ao meio ambiente, é o que se vê no inciso VI, do artigo 24, da CF/88 “in literis”:

“Art. 24. Compete à União, aos Estados e ao Distrito Federal legislar concorrentemente sobre:

VI - florestas, caça, pesca, fauna, conservação da natureza, defesa do solo e dos recursos naturais, proteção do meio ambiente e controle da poluição;”.

Quando se trata de competência legislativa concorrente, entretanto, é fundamental que sejam determinados limites para que se evite conflitos. Por isso, aliás, que a competência estadual em matéria ambiental é de natureza suplementar,

 A competência da União para legislar sobre normas gerais não exclui a competência suplementar dos Estados.

Diante do parágrafo exposto alhures, restando claro que cabe ao Estado criar apenas normas específicas de aplicação, já há um concenso doutrinário no sentido de que, havendo choque entre normas federais e estaduais, prevalecem as regras da UNIÃO.

Para Paulo Afonso Leme Machado: Não se suplementa uma regra jurídica simplismente pela vontade de os Estados inovarem diante da legislação federal. A capacidade suplementar está condicionada a necessidade de aperfeiçoar a legislação federal, ou diante da constatação de lacunas ou de imperfições da norma geral federal ( Direito Ambiental Brasileiro 25ª Edição pp. 149.)

Mas não é só isso! Quando trata-se de meio ambiente, deve-se levar em conta que o aspecto suplementar deve respeitar o caráter mais restritivo da norma Federal, não sendo adimitida que a Legislação Estadual inove de forma que traga prejuizo.

Por ora a expressão utlizadada pelo Estado da Bahia, qual seja TODOS OS ESTÁGIOS de supressão amplia o que se apresenta na Legislação Federal, que é: suprimir vegetação no ESTÁGIO MÉDIO, devendo inclusive ser declarada inconstitucional. É, aliás, esse o entendimento de Romeu Thomé, que, em seu Manual de Direito Ambiental, traz:

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 “Na hipótese de a União estabelecer normas específicas para aplicação nos Estados e DF, sua atuação será inconstitucional, por invasão da competência desses entes federativos. A União deve respeitar as especificidades de cada ente da federação.

Da mesma forma, os Estados e DF, ao suplementarem as normas gerais, não poderão contrariá-las, sob pena de inconstitucionalidade, por existir entre elas uma relação de subordinação.“.

A título exemplificativo podemos trazer excerto do Ministro Eros Grau que, com relação a competência suplementar destinada aos Estados e Distrito Federal, considerou inconstitucional lei editada pelo Estado de Pernambuco, que proibia a comercialização e utilização do silicato, vedação esta que não estava contida na norma geral.

 Materiais de Amianto: Proibição e Competência Legislativa.

 O Tribunal iniciou julgamento de ação direta de inconstitucionalidade ajuizada pela Confederação Nacional dos Trabalhadores na Indústria - CNTI contra a Lei 1 2.589/2004, do Estado de Pernambuco, de iniciativa parlamentar, que proíbe a fabricação, o comércio e o uso de materiais, elementos construtivos e equipamentos constituídos por amianto ou asbesto, no âmbito daquela unidade federativa, e impõe que as licitações para contratação de serviços tenham explícita a proibição desse uso. O Min. Eros Grau, relator, julgou procedente o pedido formulado por entender que a lei em questão invade a competência da União para legislar sobre normas gerais sobre produção e consumo, meio-ambiente e controle de poluição, proteção e defesa da saúde, bem corno extrapola a competência legislativa suplementar dos Estados-membros (CRFB/1 988, art. 24, V, VI, e XII, § 2°). Ressaltou que a legislação federal em vigor (Lei 9.055/95), que tra­ça as normas gerais a esse respeito, nos termos do art. 24, § 1°, da CRFB/1988, não veda a comercialização nem o uso do referido silicato. Além disso, considerou que a norma, ao obstar que os órgãos públicos estaduais adquiram materiais que contenham o amianto, usurpa a área de atuação do Chefe do Poder Executivo, a quem cabe a direção, a organização e o funcionamento da Administração (CRFB/1 988, art. 84, II e VI, a) . Após, o julgamento foi suspenso em virtude do pedido de vista do Min. Joaquim Barbosa. (STF, ADI 3356/PE, rel. Min. Eros Grau, 26. I 0.2005, Informativo 407).


3. CONCLUSÃO

Por isso a Legislação Ambiental, tem a obrigação de buscar resultados benéficos para a coletividade, devendo sempre, em conflitos legislativos no âmbito do meio ambiente, respeitar o preceito do “in dubio pro natura”.

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Sobre o autor
Rafael Ribeiro

Procurador do Município de Camaçari-BA. Atuando na área Administrativa mais especificamente Licitações e Contratos. Pós Graduado em Direito Administrativo.

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