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A transformação do ensino jurídico no Brasil:

os caminhos percorridos do Império à contemporaneidade

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24/12/2004 às 00:00
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Notas

1 A concepção inicial da expressão academia está atrelada à escola filosófica de Platão, que tinha como costume estudar junto aos jardins de Academo (herói ateniense), daí a origem do termo academia, atualmente, utilizado para designar estabelecimentos de ensino superior. [...] Há que se fazer considerações sobre a prática da filosofia, visto que a academia tem suas origens na construção da própria filosofia. Assim, sendo a filosofia, no âmbito da relação entre teoria e prática, o pensamento inicialmente contemplativo, em que o ser humano busca compreender a si mesmo e a realidade circundante, e que irá determinar, em seguida, o seu caráter prescritivo ou prático, voltado para a ação concreta e suas conseqüências éticas, políticas ou psicológicas. (HOUAISS, Antonio; VILLAR, Mauro de Salles; FRANCO, Francisco Manoel de Mello. Dicionário Houaiss da Língua Portuguesa. 1. ed. Rio de Janeiro: Objetiva, 2001, p. 36).

Neste sentido, cabe referirmo-nos a interpretação de que a academia deve ser o espaço para se adquirir conhecimentos e a partir deles estrutura-se a compreensão do eu, como agente de tais ensinamentos, que estarão fadados à prescrição ou à prática, esta sendo desenvolvida, necessariamente, com base na realidade circundante, o que determina a relação entre ensino, pesquisa e extensão.

2 Assim como acontecia na Academia, os discípulos de Liceu aprenderam a conviver como amigos e assistiam aos cursos matutinos acromáticos ministrados por Aristóteles, que lecionava conteúdo de retórica e dialética [...] De maneira geral, todo o caráter filosófico de Aristóteles, pensador dotado de todas as características de um verdadeiro filósofo, é impresso à organização do Liceu, local em torno do qual gravitavam os maiores ideais intelectuais de Atenas para a nova geração (BITTAR, Eduardo C. B.. A justiça em Aristóteles, 1999, p. 21-22).

3 Na época imperial o sistema de ensino romano compreendia os seguintes graus: 1. as escolas dos ludi-magister, que ministravam a educação elementar; 2. as escolas do gramático, que ensinavam grego e latim, e que correspondem ao secundário; 3. os estabelecimentos de educação terciária, que se iniciam com a escola do retórico e que, acolhendo o ensino do Direito e da Filosofia, converteram-se numa espécie de universidade. (PILETTI, Claudino, História da educação, 7 ed. São Paulo: Ática, 1997).

4 BITTAR, Eduardo C. B.. Direito e Ensino Jurídico: legislação educacional. São Paulo: Atlas, 2001. p. 49.

5 Os cursos jurídicos no Brasil foram criados a partir da Constituição de 1824, efetivados através da Lei de 11 de agosto de 1827, em volto à construção histórica, onde D. João VI, recém falecido, abria espaço a D. Pedro I que deveria assumir o trono em Portugal. Entretanto, pressionado pela opinião publica brasileira, abdica ao trono português em nome de sua filha D. Maria da Glória. Por ser ainda uma menina, o trono de Portugal fica sob a regência de D. Miguel, irmão de D. Pedro I. No ano de 1828, D. Miguel destitui a sobrinha e anula a Constituição editada por D. Pedro I, proclamando-se como rei e restaurando o absolutismo em Portugal.

Muitos constitucionalistas portugueses refugiaram-se no Brasil, que se tornou o principal centro de oposição ao reinado de D. Miguel. D. Pedro financia incansavelmente a luta contra o irmão, ficando claro que estava mais preocupado com a sucessão do trono português do que com o futuro do Brasil. Neste contexto, o Banco do Brasil requer falência no ano de 1829.

No ano de 1831, no dia 7 de abril, D. Pedro I abdica do trono em nome de seu filho, D. Pedro de Alcântara, um menino de cinco anos de idade. A abdicação simbolizou a vitória do Partido Brasileiro, consolidando, historicamente, o poder dos grandes proprietários de terra e escravos. (SILVA, Francisco de Assis. História do Brasil: Colônia, Império, República. São Paulo: Moderna, 1992, p. 132-133).

6 A universidade é uma instituição medieval, com vestígios oriundos da antiguidade grega. Sua história, suas transformações, suas características ao longo do tempo têm sido, cada vez mais, objeto de estudos e análises ao desenvolvimento intelectual. A universidade é uma instituição criada pela civilização ocidental e cujo nascimento se dá na Itália, na França e na Inglaterra, no início do século XIII. Ao longo do tempo as universidades foram se estabelecendo, garantindo-se em uma concepção mais pragmática e profissionalizante. Nesse percurso, destaca-se o esforço histórico das universidades na busca pela sua autonomia. De um modo geral, a autonomia das universidades se enfraquece na medida em que aumenta a sua dependência à Igreja e ao Estado. (BITTAR, Eduardo C. B.. Direito e Ensino Jurídico: legislação educacional. São Paulo: Atlas, 2001, p. 47-61).

7 RODRIGUES, Horácio Wanderlei. Novo Currículo Mínimo dos Cursos Jurídicos. São Paulo: Editora Revista dos Tribunais. 1995, p. 09 -10.

8 ______. Ensino Jurídico e Direito Alternativo. 1993, p. 13.

9 ADORNO, Sérgio. Os aprendizes do poder: o bacharelismo liberal na política brasileira. 1988, p. 6

10 BASTOS, Aurélio Wander. O Ensino Jurídico no Brasil. 2000, p. 01-02.

11 Op. Cit. (nota 4), p. 66-68.

12 A Academia de Direito de São Paulo, assim como a de Olinda, tem suas raízes atadas à independência política. Com a emergência do Estado Nacional, suscitou-se o delicado problema da autonomização cultural da sociedade brasileira, além da necessidade de formar quadros para o aparelho estatal. (ADORNO, Sérgio. Os Aprendizes do poder: bacharelismo liberal na política brasileira, 1988, p.79).

13 Op. Cit. (nota 11), p 68.

14 Op. Cit. (nota 10), p. 35.

15 Op. Cit. (nota 10), p. 45.

16 ______ p. 48.

17 Op. Cit. (nota 10), p. 55.

18 ______, p. 55.

19 ______, p. 58.

20 OLIVEIRA, José Sebastião de. O perfil do profissional do Direito neste início de século XXI. Jus Navigandi, Teresina, Disponível em <http://jus.com.br/revista/doutrina/texto.asp?id=4745>. Acesso em 20 ago. 2004.

21 Neste modelo, o estudante passa a ter uma postura mais processualista e positivista, já que o seu centro de atenções está em solucionar as questões jurídicas, ou seja, o domínio da prática forense. A especialização ganha bastante destaque neste modelo, uma vez que é a partir da segmentação do direito que se estará encaminhando a solução dos casos. As disciplinas de cunho processual e de prática forense ganham destaque. Enfim, constituem disciplinas básicas neste modelo: Direito Constitucional, Direito Civil, Direito Penal, Direito Comercial, Direito Administrativo, Direito Internacional, Direito Financeiro e Tributário, Direito do Trabalho e Previdenciário, Direito Processual Civil, Direito Processual Penal, Prática Forense Civil e Prática Forense Penal.

22 Op. Cit. (nota 20).

23 Perfil e habilidades desejadas com base na Portaria 1.886/94 determina um perfil baseado nos seguintes pontos:

1- formação humanística, técnico-jurídica e prática, indispensável à adequada compreensão interdisciplinar do fenômeno jurídico e das transformações sociais;

2- senso ético-profissional, associado à responsabilidade social, com a compreensão da causalidade e finalidade das normas jurídicas e busca constante da libertação do homem e do aprimoramento da sociedade;

3- capacidade de apreensão, transmissão crítica e criativa do Direito, aliada ao raciocínio lógico e à consciência da necessidade de permanente atualização;

4- capacidade para equacionar problemas e buscar soluções harmônicas com as exigências sociais;

5- capacidade de desenvolver formas extrajudiciais de prevenção e solução de conflitos individuais e coletivos;

6- visão atualizada de mundo, em particular, consciência dos problemas de seu tempo e de seu espaço.

24 Por universidade temos a definição de qualidade ou condição de universal, instituição de ensino e pesquisa constituída por um conjunto de faculdades e escolas destinadas a promover a formação profissional e científica de pessoal de nível superior, e a realizar pesquisa teórica e prática nas principais áreas do saber humanístico, tecnológico e artístico e a divulgação de seus resultados à comunidade científica mais ampla (HOUAISS, Antonio; VILLAR, Mauro de Salles; FRANCO, Francisco Manoel de Mello. Dicionário Houaiss da Língua Portuguesa. 1. ed. Rio de Janeiro: Objetiva, 2001, p. 2807).

25 Infelizmente, durante o primeiro e o segundo Império Brasileiro, a política educacional optou pelo ensino superior em escolas isoladas, e não se chegou a ver concretizada nenhuma aglutinação de escolas de ensino superior, que pudesse receber o nome de Universidade na acepção jurídica do termo, em nosso país, até o ano de 1920. (OLIVEIRA, José Sebastião de. O perfil do profissional do Direito neste início de século XXI. Jus Navigandi, Teresina, Disponível em <http://www.jus.com.br/doutrina/texto.asp?id=4745>. Acesso em 20 ago. 2004).

O Brasil ao receber sua Independência, em 7 de setembro, de 1822, não tinha nenhuma tradição cultural. O poder português colonizador, ao contrário do espanhol em suas colônias, não permitiu o desenvolvimento de escolas de nível superior na sua Colônia americana. O reino espanhol, por sua vez, inicialmente, instalou duas Universidades, uma em São Domingos em 1538 (Atual República Dominicana) e ainda outra em Lima, no Peru (Universidade de São Marcos), e, posteriormente, uma terceira, na cidade do México, com professores oriundos de sua famosa Universidade de Salamanca (Espanha). No período Colonial brasileiro, os nossos profissionais do Direito, eram de duas matizes: ou tinham o título de bacharel para o exercício profissional da magistratura, da procuradoria ou advocacia, ou não tinham o título e se limitavam ao exercício da advocacia, quando autorizados ou provisionados. Os que tinham o título, na sua grande maioria, obtido na Europa, mais especificamente na Universidade de Coimbra, sendo certo que alguns poucos também o obtinham na Bélgica e na Alemanha (Heidenberg). As Ordenações do Reino de Portugal, ou seja, o Código Filipino de 1603, no Título XLVIII, do seu Primeiro Livro, que prescrevia in verbis: mandamos, que todos os Letrados, que houverem de advogar e procurar em nossos Reinos tenham oito annos de studos cursados na Universidade de Coimbra em Direito Canonico, ou Civel ou em ambos. Sob penas severas de multas, prisão, desterro ou degredo para os infratores. (Ordenações e Leis do Reino de Portugal. Tomo I, Duodécima edição. Coimbra: Imprensa Universitária, 1858, p.137).

26 Op. Cit. (nota 20).

27 A turma de 1866, em São Paulo, formou Rui Barbosa, Castro Alves e Afonso Pena. Bastaria uma só dessas pessoas para marcar época numa faculdade de Direito. Prudente de Morais, primeiro presidente civil do Brasil, formou-se nas arcadas da paulicéia. As arcadas deram ao Brasil, nove Presidentes da República, sendo Jânio Quadros o último deles. Já Rui Barbosa, em 1878, faria a primeira grande proposta de inovação ao ensino jurídico, propondo a inclusão da disciplina de sociologia, sendo o primeiro jurista a questionar o ensino estritamente dogmático e positivista. A formação do advogado, segundo ele, deveria voltar-se também para as questões circunstanciais da vida, daí a importância da sociologia. A proposta de Rui Barbosa tornou-se realidade na Resolução de nº 3, de 1972, quase cem anos depois. (BOPP, Ester Toaldo. O Estágio de Prática Jurídica nas Universidades do Estado do Rio Grande do Sul. Porto Alegre: PUC/RS, 2002. Dissertação de Mestrado, Pontifícia Universidade Católica do Rio Grande do Sul, 2002, p. 08).

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28 Estruturado no pandectismo alemão, da filosofia de Tobias Barreto e de Silvio Romero, mantendo-se firme como uma escola de pensadores.

29 Op. Cit. (nota 10), p. 144.

30 Op. Cit. (nota 10), p. 147.

31 A reforma de Leôncio de Carvalho, em 1879, que pregava o ideal do ensino livre, livre do controle do poder legislativo imperial, até então dominante, possibilitou a criação de diversas faculdades de Direito, no país. Foram criadas duas faculdades na cidade do Rio de Janeiro, que foram unificadas com a Criação da Universidade do Rio de Janeiro em 1920 e se transformaram posteriormente na famosa Faculdade Nacional de Direito, uma em Porto Alegre, em 1900, uma em Fortaleza, no ano de 1903, uma em Ouro Preto, em 1892, posteriormente, transferida para Belo Horizonte, em 1898 e uma em Curitiba, no ano de 1912, o que provocou a primeira expansão do ensino jurídico no Brasil. (BASTOS, Aurélio Wander. O Ensino Jurídico no Brasil. 2000).

32 Op. Cit. (nota 20).

33 A Reforma de Francisco Campos eliminou do currículo jurídico o ensino do Direito Romano e do Direito Natural, incluindo, por outro lado, a disciplina de Introdução à Ciência do Direito, como disciplina de formação básica e, ainda, fortaleceu o ensino da Economia Política, priorizando o ensino do Direito como ciência. (BOPP, Ester Toaldo. O Estágio de Prática Jurídica nas Universidades do Estado do Rio Grande do Sul. Porto Alegre: PUC/RS, 2002. Dissertação de Mestrado, Pontifícia Universidade Católica do Rio Grande do Sul, 2002, p. 10).

34 RODRIGUES, Horácio Wanderlei. Novo currículo mínimo dos cursos jurídicos. São Paulo: Editora Revista dos Tribunais, 1995, p.11.

35 Assim como Rui Barbosa, San Tiago Dantas foi um dos grandes nomes brasileiros preocupado com a formação jurídica nas faculdades de Direito do Brasil. Em 1955, repercuti de forma estrondosa a aula inaugural ministrada na Faculdade Nacional de Direito, sob o título "A educação jurídica e a crise brasileira", destacando o problema da educação jurídica que já se encontrava em processo de perda de credibilidade. (BOPP, Ester Toaldo. O Estágio de Prática Jurídica nas Universidades do Estado do Rio Grande do Sul. Porto Alegre: PUC/RS, 2002. Dissertação de Mestrado, Pontifícia Universidade Católica do Rio Grande do Sul, 2002, p. 11).

Para San Tiago Dantas o raciocínio jurídico deve ser desenvolvido no aluno, deve ser a base do aprendizado. O estudante precisa aprender a pensar juridicamente, a refletir juridicamente os acontecimentos e a própria lei. (BASTOS, Aurélio Wander. O Ensino Jurídico no Brasil. 2000, p. 247-259).

36 Op. Cit. (nota 20).

37 Op. Cit. (nota 20).

38 SILVA, Francisco de Assis. História do Brasil: Colônia, Império, República. São Paulo: Moderna, 1992, p. 275-289.

39 Op. Cit. (nota 10).

40 Percentual de 10% (OLIVEIRA, José Sebastião de. O perfil do profissional do Direito neste início de século XXI. Jus Navigandi, Teresina, Disponível em <http://jus.com.br/revista/doutrina/texto.asp?id =4

745>. Acesso em 20 ago. 2004).

41 Atualmente, o curso de Direito é um dos quatro cursos que estão recebendo maior atenção do Conselho Nacional de Educação. Isso porque, segundo dados do MEC, o Direito, a Contabilidade, a Economia e a Administração reúnem, juntos, 41% das matrículas em graduação no Brasil. A intenção é criar, para esses cursos superiores, um cadastro próprio de professores e estabelecer avaliação mais rigorosa e mudanças na sistemática de tramitação de processos de abertura de novos cursos.

A realidade do ensino jurídico no Brasil, país com população de 173 milhões de habitantes, apresenta hoje 662 faculdades de Direito em funcionamento, temos quase quatro vezes mais cursos jurídicos do que os norte-americanos, onde há 292 milhões de habitantes, disparidades legislativas entre os Estados federados em quase todos os campos jurídicos, havendo, por exemplo, os que adotam e os que não adotam a pena de morte, sendo ainda uma sociedade com volume gigantesco de conflitos e demandas judiciais, existem hoje 180 faculdades. (LOBATO, Anderson Orestes C. A crise do Ensino Jurídico: mitos e perspectivas. Textual, Ensaio, Porto Alegre, vol. 1, nº 02, p. 28 – 33, ago. 2003).

42 Op. Cit. (nota 20).

43 NEGRÃO, Sonia Maria Vieira. O perfil do profissional do Século XXI. Maringá: Ensino in Foco, 2002, p. 54.

44 AGUIAR, Roberto A. R. de. A crise da advocacia no Brasil: diagnóstico e perspectivas. São Paulo: Editora Alfa – Omega, 1994, p. 91-92.

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Sobre o autor
Vitor Hugo do Amaral Ferreira

bacharelando em Direito pelo Centro Universitário Franciscano, em Santa Maria (RS)

Como citar este texto (NBR 6023:2018 ABNT)

FERREIRA, Vitor Hugo Amaral. A transformação do ensino jurídico no Brasil:: os caminhos percorridos do Império à contemporaneidade. Revista Jus Navigandi, ISSN 1518-4862, Teresina, ano 9, n. 535, 24 dez. 2004. Disponível em: https://jus.com.br/artigos/6089. Acesso em: 22 dez. 2024.

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