Os princípios do Código Civil inerente às faces da sociedade

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Entendimento dos princípios norteadores do Direito Civil, bem como a sua resolução no caso concreto.

Princípio vem do latim principium e tem significado variado, este pode ser entendido como o começo de tudo, é o nascedouro das coisas e seres, é o que vem antes, início, origem, ponto de partida, regra a seguir, La Norma Primaria. Princípio significa normas elementares ou requisitos primários instituídos como base que mostram o conjunto de regras ou preceitos que se fixaram para servir de norma a toda espécie de ação jurídica, traçando, assim, a conduta a ser tida em qualquer operação jurídica. O princípio é norma de conduta inabalável, deverá ser aplicado quando houver uma norma positiva específica, pois em caso contrário, caracterizaria uma ofensa ao Estado de direito. Desta forma, o princípio saiu do abstrato para o concreto, haja vista que este independe de norma infraconstitucional para a sua aplicação.

Dos princípios que norteiam o Novo Código Civil, temos três principais que surgiram com a edição do Código de 2002, assim destacados: Princípio da Eticidade, da Socialidade e da Operabilidade. Esses princípios não são trazidos de forma explícita na Constituição Federal, mas como todo princípio, eles também são de fundamental importância para que se mantenha o Estado Democrático de Direito e se preserve os direitos humanos fundamentais.

De acordo com Miguel Reale, a atual codificação está baseada em três princípios fundamentais:

Socialidade: O Código Civil de 2002 distancia-se do caráter individualista da codificação anterior. O “nós” prevalece sobre o “eu”. Todos os institutos civis têm função social, é o caso do contrato e da propriedade.

Eticidade: A codificação atual preocupou-se precipuamente com a ética e a boa-fé, sobretudo com a boa-fé objetiva, aquela que existe no plano da conduta de lealdade dos participantes negociais.

 Operabilidade: O princípio tem dois sentidos. Primeiro, o de simplicidade dos institutos jurídicos, como ocorreu com a prescrição e decadência. Segundo, o de efetividade, por meio do sistema de cláusulas gerais e conceitos indeterminados adotados pela atual codificação.

Como os princípios da eticidade, socialidade e operabilidade receberam vida somente com as alterações do código civil de 2002, devemos ressaltar que o Código Civil de 1916 (que foi inspiração do Código Francês) tratava dos indivíduos de forma isolada, diferentemente do que acontece com o Código Civil de 2002 (que sofreu influência do Código Alemão) que trata do indivíduo enquanto membro de uma coletividade, valorizando os direitos individuais sob o ângulo social e, é por isso que os doutrinadores o consideram o Código do Juiz, pois ele contém inúmeras cláusulas abertas que quer dizer, normas de conteúdo indeterminado deixando ao magistrado a escolha da sua aplicação ao caso concreto. Desta forma, para evitar, o que alguns denominam de engessamento do direito, foi dado mais poderes aos juízes, pelas cláusulas abertas. O juiz terá muito mais liberdade de agir, é claro que tendo como diretriz a própria lei, com o intuito de resolver cada caso individual de forma mais favorável e rápida, sempre se embasando nos princípios que regem cada caso em especial. Então o código civil de 2002 trouxe certa simbiose para o direito, onde os seus aplicadores utilizarão as cláusulas abertas, mas embasados nas cláusulas fechadas preestabelecidas pelo legislador, com o objetivo de dar uma solução a cada caso concreto, sempre aplicando os princípios que são a diretriz do direito civil, pois eles, mesmo não sendo lei, são a luz que guia o ordenamento jurídico.

Eticidade:

 A palavra Eticidade tem como raiz a palavra ética, que em latim ethica e do grego ethos, quer dizer um conjunto de regras, condutas e princípios que têm fundamento na moral, os quais deverão ser seguidos tanto na vida profissional quanto na vida privada das pessoas.

Aurélio Buarque define a ética como a apreciação das condutas do ser humano, que seriam qualificadas levando-se em conta o juízo de apreciação que se referem a toda conduta humana que seja susceptível de qualificação, isso se forem observadas do ângulo do bem e do mal. E Moral, para esse mesmo autor, ela vem do latim moralis, que é relativo aos costumes, à moral, correto, descente, íntegro etc. Seria um conjunto de princípios e de regras que regulam as condutas das pessoas, também observadas do ângulo do bem e do mal. Para Ramos a ética, seria o estudo dos significados e das justificativas das normas jurídicas que seriam diferentes da moral por apresentarem uma propriedade obrigatória-coercitiva, enquanto que a moral social estipula as normas que o indivíduo deverá seguir para viver tranquilamente na sociedade, pois ela não tem limites, e as pessoas podem nem saber o significado de moral, mas agem de acordo com um patamar comum de condutas para todos que vivem no mesmo ciclo social. Já a moral individual ou pessoal, seria um conjunto de regras que surgem do comportamento social que pauta a vida individual da pessoa, que seriam regras de foro íntimo baseado nas normas da própria sociedade em que vive, e mesmo essas regras, no caso de sua transgressão, não terem caráter repressivo, trarão um resultado social, conforme a conduta praticada.

O Princípio da Eticidade ou da boa-fé traz uma ideia de que os negócios estabelecidos entre as partes devem ser tratados com honestidade, sinceridade e lisura, lealdade conforme os padrões estabelecidos culturalmente em certo local e tempo (boa-fé, quer dizer, sem qualquer intenção escondida ou sem intenção de enganar), para que desta forma não haja prejuízo de nenhuma das partes, pois é na boa-fé objetiva que encontramos outros valores como, por exemplo, os deveres de cooperação, de informação e de proteção, entre as partes.

Socialidade:

Segundo Reale é justamente a de afastar a mera aplicação do Direito Civil às relações entre os particulares afastando a visão individualista do Código Civil anterior, e aplicar o direito em prol de toda sociedade e não somente a classes privilegiadas. Diante disso, pode-se afirmar que a finalidade do princípio da Socialidade é a busca da função social do contrato promovendo certo equilíbrio entre a função individual e a função do contrato na sociedade, com a finalidade de se alcançar o bem comum da sociedade como um todo e não como um ser apartado (individual). Para Reale a função social não tem a finalidade de castrar a manifestação de vontade individual ou a livre-iniciativa de quem está contratando, mas sim, de restabelecer o equilíbrio, entre individuo e própria sociedade, pois mesmo o contrato sendo o resultado da autonomia da vontade das partes, deverá passar por um controle, devendo haver uma correlação entre o valor do indivíduo e o valor da coletividade, uma vez que é na sociedade que o contrato será executado e receberá essa medida, seja ela contrabalanceada ou não, e se não houver um equilíbrio, um contrapeso, poderá haver sérios gravames para a sociedade, pois os efeitos contratuais se projetam na sociedade.

Operabilidade:

O princípio da operacionalidade tem a finalidade de tornar o direito mais prático, e conforme adverte Maciel (2007), o direito tem a finalidade de ser exercido, efetivado, operado, e esse princípio tornou tudo muito mais simples e prático, uma linguagem mais acessível e simples à população em geral e também aos aplicadores do direito. Reale, que a Comissão encarregada pelas alterações do novo código quis na verdade, escolher uma linguagem que fosse atual e precisa, que deixasse de lado os modelos clássicos que já estão completamente superados nos dias atuais, mas esse modelo deveria ficar fiel aos valores de beleza e de correção que tornam o código atual distinto do código anterior. Desta forma, o Código Civil de 2002, traz vários exemplos de sua aplicabilidade, vale salientar que é embasado nele, que o magistrado decidirá aplicando a norma in concreto conforme as circunstâncias de cada caso, sendo que os poderes do juiz na aplicação da lei foram ampliados.

Para Godoy (2004, p. 118), é pelo princípio da operabilidade que:

“Procura-se a superação de divergências teoréticas e formais, acerca de institutos de direito, pela sua capacidade de ser executado. Por outra, prefere-se à vinculação da norma a um conceito por vezes tecnicamente discutível, o seu tratamento de modo a, fugindo desse liame teórico, permitir a sua mais fácil realização – sentido da operabilidade. No caso, é o do tratamento da prescrição e da decadência, sobre cuja distinção teórica diverge, de há muito, os autores.”

O Princípio da operabilidade impõe soluções operáveis, viáveis e fáceis na solução dos problemas e assim, na aplicação do direito. A regra precisa ser aplicada do modo mais efetivo, mais simples e menos oneroso o possível. Há, todavia a possibilidade de se recorrer a elementos exteriores para se conseguir Justiça, isso é por meio das cláusulas gerais.

Hentz apud Delgado (2007), diz que o princípio da operabilidade, concedeu mais poderes aos juízes com a finalidade de garantir a busca da solução mais justa para o caso concreto e dar maior executividade às sentenças e decisões judiciais.

O Princípio da Operabilidade nasceu para descomplicar o direito, para que o direito pudesse ser exercido de forma simples e eficaz. O código Civil de 1916 trazia artigos complicados e quase que inoperantes, pois geravam dúvidas a respeito da sua aplicação. O código civil de 2002 teve a intenção tornar simples o que estava complexo a fim de facilitar a vida dos aplicadores do direito tornando a vida de todos pelo menos um pouco mais operável. O princípio da operabilidade tem por objetivo diminuir as complicações jurídicas e dar mais praticidade à lei, pois esta deverá facilitar a interpretação e aplicação tanto das regras jurídicas como dos princípios jurídicos pelos operadores do Direito, e para isso o legislador, com a finalidade de tornar o direito mais prático, instituiu conceitos abertos, tornando as normas jurídicas muito mais abrangentes, a fim deque elas tenham uma melhor aplicação em cada caso concreto.

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Concretude:

Somente três princípios foram analisados na visão geral do projeto do novo código civil, a sociabilidade (ou socialidade), eticidade e operabilidade, a palavra concretude é originada da raiz, concreto, que vem do latim concretus, que quer dizer, consistente, sólido, que é o oposto de abstrato, perceptível aos sentidos do ser humano, que é particular ou determinado.

Reale, (2002, p. 1), esclarece que:

“Somente assim se realiza o direito em sua concretude, sendo oportuno lembrar que a teoria do Direito concreto, e não puramente abstrato, encontra apoio de jurisconsultos do porte de Engisch, Betti, Larenz, Esser e muitos outros, implicando maior participação decisória conferida aos magistrados. Como se vê, o que se objetiva alcançar é o Direito em sua concreção, ou seja, em razão dos elementos de fato e de valor que devem ser sempre levados em conta na enunciação e na aplicação da norma.” Como o próprio nome diz o princípio da concretude ou da concretitude, quer que o caso concreto tenha a melhor e mais efetiva solução, e na visão de Reale (2000, p.10), o Princípio da Concretude é derivado do princípio da operabilidade, e, concretas são as normas flexíveis que poderão ser interpretadas pelo juiz e adequadas de caso a caso, seria a obrigação que o juiz tem, de não legislar em abstrato, e sim em casos concretos, reais, atendendo às situações sociais normais e corriqueiras, “um direito subjetivo abstrato, mas uma situação subjetiva concreta”. O direito tem que ser aplicado em casos concretos, do dia a dia das pessoas.

Santos (2002, p. 2), ao se referir a esse princípio, diz que:

“É certo que o legislador, diferentemente do julgador, cria a regra para os casos em geral, segundo a característica da generalidade. Sem embargo disso, deve - tanto quanto possível - legislar com vistas a alcançar as pessoas, concretamente. A abstratividade da lei, pois, deve ser entendido não como um culto às abstrações, uma falta de compromisso com a realidade, mas apenas como uma função da norma, que nasce para atingir fatos futuros (aí o sentido de abstrato), ou seja, que irão ou não acontecer.” Isso quer dizer que a lei tem que se aplicada em casos concretos, no dia a dia das pessoas, ou seja, a lei mesmo sendo abstrata, tem que servir para regular os casos concretos. A lei tem que ter concretude, operabilidade e funcionalidade, pois com a evolução dos tempos, a generalidade e a abstração da lei cedem espaço aos fatos concretos.

A concretude vem inserida na operabilidade, o legislador deu um breve enfoque também ao princípio da concretude. Assim, o legislador tece alguns comentários sobre o princípio da concretude, como ora destacamos, para mostrar a sua tamanha importância nos casos sociais, ou seja, nos casos em que envolvam as pessoas, o ser humano. O trecho abaixo foi parte da conversa entre os legisladores sobre visão geral do projeto do novo código civil. Então vejamos: Reale (2000, p. 1), diz que o legislador tem por obrigação de para casos concretos, e cita como exemplos concretos do dia a dia das pessoas como: “o homem enquanto marido; a mulher enquanto esposa; o filho enquanto um ser subordinado ao poder familiar”. Quer dizer que o direito tem que cuidar do que acontece na sociedade enquanto envolva o ser humano como protagonista, ser individualizado, sujeito concreto e não um ser abstrato. O Direito tem que ser concreto para atingir os casos concretos, por isso o nome do princípio de concretude ou concretitude.

Ítalo Miqueias da Silva Alves

Referências:

RODRIGUES, Silvio. Direito civil, Parte Geral Vol. 1. Ed. Saraiva, 2007.

CARDOSO, Rodrigo Eduardo Rocha, Princípios norteadores do direito das obrigações no contexto do direito civil, 2008.

Código civil, lei no 10.406, de 10 de janeiro de 2002.

CASTRO, José de Ribamar. Código civil: eticidade, sociabilidade, operabilidade, conceitos legais indeterminados e cláusulas gerais, 2007.

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Sobre o autor
Ítalo Miqueias da Silva Alves

Jurista. Pós Graduado em Direito Processual Penal, Direito Processual Civil, Direito, Direito Constitucional e Direito Digital. Especialista em Direito Civil, Direito Penal e Direito Administrativo. Pesquisador. Palestrante. Escritor e autor de diversas obras na seara jurídica.

Informações sobre o texto

Este texto foi publicado diretamente pelos autores. Sua divulgação não depende de prévia aprovação pelo conselho editorial do site. Quando selecionados, os textos são divulgados na Revista Jus Navigandi

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