De início, importante mencionar que, conforme o artigo 722, do Código Civil, a corretagem se refere à atividade em que “uma pessoa, não ligada a outra em virtude de mandato, de prestação de serviços ou por qualquer relação de dependência, obriga-se a obter para a segunda um ou mais negócios, conforme as instruções recebidas”.
Apesar das condições entre consumidor e construtora/incorporadora serem diversas do quanto mencionado no artigo 722, do Código Civil, os consumidores adquirentes de imóvel na planta são responsáveis por arcar, além dos valores devidos em virtude do contrato de compra e venda, também com os valores referentes a corretagem da pessoa que o atendeu, bem como uma taxa denominada SATI (serviço de assessoria técnico-imobiliária).
Ocorre que, para ser caracterizado um contrato típico de corretagem, o corretor deve ser pessoa livre de vínculo de dependência com o vendedor. No entanto, nas vendas de imóveis na planta, a própria construtora/incorporadora é quem instala stand de vendas, ocorrendo evidente subordinação entre as partes.
Além disso, também não há intermediação, tendo em vista que o “corretor” assume a figura de vendedor da construtora/incorporadora, não intermediando a relação do comprador com o vendedor.
Por fim, o suposto corretor não presta um serviço, já que, por lei, é dever do próprio fornecedor prestar informações acerca de preços e condições.
Por esses motivos, os consumidores adquirentes de imóveis na planta ingressavam/ingressam na justiça para pleitear devolução dos valores, entendendo abusivas as cobranças referentes à comissão de corretagem e taxa SATI.
No entanto, diante dos inúmeros casos existentes no Judiciário acerca do tema, a Corte Especial do Colendo Superior Tribunal de Justiça, ao julgar o Recurso Especial nº 1.599.511/SP, submetido ao regime de Recurso Repetitivo, fixou o entendimento no sentido de que é válida a cláusula que transfere ao consumidor o pagamento da comissão de corretagem. Contudo, entendeu abusiva a cobrança da taxa SATI.
Isto porque os Ministros que julgaram a questão entenderam que o serviço de corretagem é efetivamente prestado e que a cláusula que trata de referida verba é válida. Ainda concluíram que, as construtoras/incorporadoras terceirizam o trabalho do corretor.
Confira-se, a propósito, e ementa do julgado:
“RECURSO ESPECIAL REPETITIVO. DIREITO CIVIL E DO CONSUMIDOR. INCORPORAÇÃO IMOBILIÁRIA. VENDA DE UNIDADES AUTÔNOMAS EM ESTANDE DE VENDAS. CORRETAGEM. CLÁUSULA DE TRANSFERÊNCIA DA OBRIGAÇÃO AO CONSUMIDOR. VALIDADE. PREÇO TOTAL. DEVER DE INFORMAÇÃO. SERVIÇO DE ASSESSORIA TÉCNICO-IMOBILIÁRIA (SATI). ABUSIVIDADE DA COBRANÇA.I – TESE PARA FINS DO ART. 1.040 DO CPC/2015:
1.1. Validade da cláusula contratual que transfere ao promitente-comprador a obrigação de pagar a comissão de corretagem nos contratos de promessa de compra e venda de unidade autônoma em regime de incorporação imobiliária, desde que previamente informado o preço total da aquisição da unidade autônoma, com o destaque do valor da comissão de corretagem.
1.2. Abusividade da cobrança pelo promitente-vendedor do serviço de assessoria técnico-imobiliária (SATI), ou atividade congênere, vinculado à celebração de promessa de compra e venda de imóvel.
II – CASO CONCRETO
2.1.Improcedência do pedido de restituição da comissão de corretagem, tendo em vista a validade da cláusula prevista no contrato acerca da transferência desse encargo ao consumidor. Aplicação da tese 1.1.
2.2. Abusividade da cobrança por serviço de assessoria imobiliária, mantendo-se a procedência do pedido de restituição. Aplicação da tese 1.2.
III – RECURSO ESPECIAL PARCIALMENTE PROVIDO.” (REsp nº 1.599.511/SP (2016/0129715-8) autuado em 06/05/2016 – Julgamento em 24/08/2016 – Publicado DJe 06/09/2016 – Ministro PAULO DE TARSO SANSEVERINO)
Porém, o pagamento da comissão de corretagem por parte do comprador só é válida desde que os contratos sejam transparentes e claros, com o custo previamente informado, especificando o valor total da aquisição da unidade autônoma, com destaque para o valor da comissão de corretagem.
Outrossim, em referido julgamento, entendeu-se que não há relação contratual direta entre o comprador e o corretor e, por este motivo, em regra, quem deve arcar com a remuneração do corretor é a parte a quem ele se vinculou, ou seja, o vendedor do bem (construtora/incorporadora).
No entanto, a obrigação de pagar a comissão de corretagem pode ser transferida à outra parte interessada no negócio jurídico, mediante cláusula contratual expressa no contrato principal, ou seja, desde que ajustado entre as partes.
Portanto, as construtoras/incorporadoras podem transferir a obrigação de pagamento da comissão de corretagem aos compradores dos imóveis, desde que esteja previamente informado no contrato principal e detalhado, de forma clara, o valor total do imóvel e o valor da comissão de corretagem.
Ressalta-se que, caso o valor da comissão de corretagem não tenha sido previamente informado, é cabível sua restituição, com prazo prescricional de 3 (três) anos, a contar da data do pagamento, conforme previsto no artigo 206, § 3º, inciso IV, do Código Civil.
Por fim, em relação à taxa SATI, o Superior Tribunal de Justiça manteve o posicionamento até então prevalecente nas instâncias ordinárias, no sentido de que não se trata de um serviço autônomo, motivo pelo qual é abusivo repassar o valor correspondente para o consumidor.
A título de esclarecimento, a taxa SATI é cobrada sob o argumento de uma suposta assessoria prestada aos consumidores para esclarecimentos acerca de questões contratuais, realizada por técnicos vinculados às construtoras/incorporadoras.
No entanto, referida assessoria é mera prestação de serviço inerente à celebração do contrato, não devendo ser cobrada, já que prestar todas as informações de forma clara é um dever do vendedor.
Desta forma, em relação ao pagamento da comissão de corretagem em imóveis adquiridos na planta, o STJ divergiu da posição até então adotada pelos Tribunais, decidindo por ser válida a cláusula que transfere ao consumidor o pagamento da comissão de corretagem. Já em relação à taxa SATI, a Corte Superior manteve o posicionamento dos Tribunais e decidiu que determinada taxa é ilegal e abusiva.
Na prática, o que ocorre é que as construtoras são amparadas juridicamente e preparam suas operações e instrumentos de acordo com o atual julgado, de maneira que não restam muitas opções aos consumidores, pois se desejam adquirir o imóvel devem pagar também a taxa de corretagem, sendo certo que na maioria das vezes o preço do bem já é repassado com referida taxa.
Portanto, o consumidor acaba por aceitar o pagamento, já que lhe é informado o preço final do imóvel e assim muitas vezes só toma conhecimento da taxa quando assina o contrato ou quando já realiza os pagamentos, os quais são desmembrados.
Quanto à taxa SATI, na maioria das vezes o valor da taxa, comparado com o valor do bem, chega a ser diminuto e muitas vezes o trabalho que o consumidor tem para ser ressarcido, acaba não compensando, fazendo com que ele não pleiteie em juízo.