CONDUÇÃO COERCITIVA

03/12/2017 às 14:56
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A prévia notificação daquele que deva comparecer é requisito indispensável previsto pelo Código de Processo Penal em todos os dispositivos que regulam o instituto.

CONDUÇÃO COERCITIVA

COERCITIVE DRIVING

CONDUCCIÓN COERCITIVA                                                 

             

                                                                                                                NOVO, Benigno Núñez¹

RESUMO

O presente artigo tem como objetivo a discussão da condução coercitiva. A prévia notificação daquele que deva comparecer é requisito indispensável previsto pelo Código de Processo Penal em todos os dispositivos que regulam o instituto. Garante-se, assim, que a pessoa que deva cooperar com a elucidação dos fatos não será surpreendida, resguardando-a de ofensa à sua imagem ou exposição pública desnecessária. A condução coercitiva constitui medida constitucional e também legal cujo objetivo consiste a assegurar a eficácia do sistema probatório e de cautelares na persecução criminal, evitando uma restrição mais extrema no âmbito da esfera de liberdade do indivíduo, e mesmo ante a existência de posições favoráveis, e também desfavoráveis, à sua utilização na fase inquisitorial policial, é necessário uma sucinta análise do caso concreto, em plena obediência aos princípios da razoabilidade e proporcionalidade.

Palavras-chave: Condução coercitiva; prévia notificação; razoabilidade; proporcionalidade.

ABSTRACT

The present article aims at the discussion of coercive driving. The prior notification of the one who must attend is an indispensable requirement provided by the Code of Criminal Procedure in all the provisions that regulate the institute. It is thus guaranteed that the person who is to cooperate with the elucidation of the facts will not be surprised, guarding it from offense to its image or unnecessary public exposure. Coercive conduct is a constitutional and also a legal measure whose purpose is to ensure the effectiveness of the probative system and the precautionary system in criminal prosecution, avoiding a more extreme restriction within the sphere of freedom of the individual, and even in the presence of favorable positions, and also unfavorable to their use in the police inquisitorial phase, a brief analysis of the concrete case is required, in full compliance with the principles of reasonableness and proportionality.

Keywords: Coercive driving, prior notification, reasonableness, proportionality.

RESUMEN

El presente artículo tiene como objetivo la discusión de la conducción coercitiva. La previa notificación de aquél que deba comparecer es requisito indispensable previsto por el Código de Proceso Penal en todos los dispositivos que regulan el instituto. Se garantiza, así, que la persona que deba cooperar con la elucidación de los hechos no será sorprendida, resguardándola de ofensa a su imagen o exposición pública innecesaria. La conducción coercitiva constituye una medida constitucional y también legal cuyo objetivo consiste en asegurar la eficacia del sistema probatorio y de cautelares en la persecución criminal, evitando una restricción más extrema en el ámbito de la esfera de libertad del individuo, e incluso ante la existencia de posiciones favorables, y también desfavorables, a su utilización en la fase inquisitorial policial, es necesario un sucinta análisis del caso concreto, en plena obediencia a los principios de la razonabilidad y proporcionalidad.

Palabras clave: Conducción coercitiva, previa notificación, razonabilidad, proporcionalidad.

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¹Advogado, doutor em direito internacional pela Universidad Autónoma de Asunción. E-mail: [email protected]

1 INTRODUÇÃO

            Condução coercitiva é uma forma impositiva de levar sujeitos do processo, ofendidos, testemunhas, acusados ou peritos, independentemente de suas vontades, à presença de autoridades policiais ou judiciárias.

            Prevista no Código de Processo Penal Brasileiro (CPP), a condução coercitiva é considerada, de acordo com alguns juristas, uma espécie de “prisão cautelar” de curta duração.

            Tal expressão é utilizada pois o indivíduo sob condução coercitiva é obrigado a acompanhar os policiais ao departamento de polícia para prestar esclarecimentos sobre determinado assunto, com o objetivo de produzir provas sobre a investigação.

            Conforme prevê o artigo 218 do Código de Processo Penal Brasileiro, a condução coercitiva só é legitima quando é precedida de uma intimação prévia. Quando este método é aplicado sem a intimação, configura-se como uma violação do direito de liberdade da testemunha ou do indiciado.

            Porém, caso o indivíduo receba a intimação, mas não compareça ou justifique a sua ausência, a condução coercitiva está livre para ser utilizada. As autoridades policiais podem algemar e conduzir o intimado em viatura policial a força, caso seja necessário.

            Existe um grande debate sobre a validação da condução coercitiva. Segundo alguns juristas, este é considerado um método inconstitucional, pois discorda com a redação do artigo 5º, inciso LXI, da Constituição Federal de 1988.

            “LXI - ninguém será preso senão em flagrante delito ou por ordem escrita e fundamentada de autoridade judiciária competente, salvo nos casos de transgressão militar ou crime propriamente militar, definidos em lei;”

            No entanto, a condução coercitiva é tida como legal pelo ponto de vista de ser um mecanismo para a produção de evidências úteis no exercício de uma investigação criminal.

2 DESENVOLVIMENTO

         Da inteligência do artigo 260 do CPP, se o acusado ou investigado "não atender à intimação para o interrogatório, reconhecimento ou qualquer outro ato que, sem ele, não possa ser realizado, a autoridade poderá mandar conduzi-lo à sua presença".

         Trata-se o presente instituto da possibilidade de o delegado de polícia ou juiz de direito, se fazer valer da força necessária e não abusiva para que o investigado seja conduzido a presença da autoridade, a fim de suprir seu eventual descaso com o Estado na busca pela efetiva persecutio criminis, para realização de um ato relevante, seja durante as investigações em sede de inquérito policial, seja no decurso do processo penal.

         Considerada por alguns autores como um tipo de prisão cautelar, a condução coercitiva viola o direito de liberdade de locomoção sendo um dos direitos fundamentais previstos na Constituição Federal, além dos princípios como a presunção de inocência, igualdade processual, ampla defesa, verdade real, devido processo legal e a proporcionalidade.

         Assim, busca-se demonstrar a impossibilidade da condução coercitiva do acusado ou investigado, bem como o não cabimento de qualquer das hipóteses de condução sem a notificação prévia. Para tanto, estudam-se os seus fundamentos, destacando a vedação à utilização do poder geral de cautela no processo penal.

         O Código de Processo Penal foi promulgado no ano de 1941, período em que o país passava por um período ditatorial, possuindo caráter inquisitivo. Porém, logo após a promulgação da Constituição de 1988, que adotou o modelo acusatório e proclamou os direitos e garantias fundamentais do cidadão, houve a necessidade de se adequarem as suas normas às da Carta Magna.

         Nenhuma lei pode atentar contra a Constituição Federal. Por essa razão, desde a promulgação da Carta Magna, o Processo Penal passou a seguir as suas mesmas linhas, sendo seus princípios pautados, em sua maioria, nos princípios constitucionais.

         Há um cabedal normativo no CPP que autoriza a condução coercitiva nas fases investigatória e processual.

         Para mencionar algumas disposições, há possibilidade de o ofendido ser conduzido perante a autoridade policial para prestar declarações:

         “Art. 201.  Sempre que possível, o ofendido será qualificado e perguntado sobre as circunstâncias da infração, quem seja ou presuma ser o seu autor, as provas que possa indicar, tomando-se por termo as suas declarações. (Redação dada pela Lei nº 11.690, de 2008)

         § 1º Se, intimado para esse fim, deixar de comparecer sem motivo justo, o ofendido poderá ser conduzido à presença da autoridade. (Incluído pela Lei nº 11.690, de 2008)”

         Na fase judicial, também a testemunha pode ser conduzida com força policial:

“Art. 218.  Se, regularmente intimada, a testemunha deixar de comparecer sem motivo justificado, o juiz poderá requisitar à autoridade policial a sua apresentação ou determinar seja conduzida por oficial de justiça, que poderá solicitar o auxílio da força pública.”

         Do mesmo modo, o acusado pode ser conduzido à presença do seu próprio interrogatório judicial:

         “Art. 260.  Se o acusado não atender à intimação para o interrogatório, reconhecimento ou qualquer outro ato que, sem ele, não possa ser realizado, a autoridade poderá mandar conduzi-lo à sua presença.

         Parágrafo único.  O mandado conterá, além da ordem de condução, os requisitos mencionados no art. 352, no que Ihe for aplicável.”

         Até mesmo o perito pode ser chamado, sob vara, à presença do juízo:

         “Art. 278.  No caso de não-comparecimento do perito, sem justa causa, a autoridade poderá determinar a sua condução.”

         Mesmo durante a fase preliminar de investigações, a Autoridade Policial pode, com esteio no art. 6º e incisos, do CPP, conduzir, sob força, um investigado para prestar esclarecimentos perante a polícia judiciária.

         O requisito essencial para a expedição da condução coercitiva é o acusado ou a testemunha não atender à intimação, ou seja, pressupõe uma intimação, pois esse requisito assegura a todo o cidadão investigado ou testemunha de ato ilícito o direito a intimidade, a presunção de inocência, a privacidade, a dignidade da pessoa humana, dentre outros.

         Uma das discussões mais interessantes sobre o assunto surge em relação ao mandado de condução coercitiva do investigado e o direito de não produzir provas contra si mesmo, previsto constitucionalmente. Conforme visto, certo é que a legislação permite a condução coercitiva do investigado, contudo, não se pode perder de vista que a Constituição Federal assegura em seu artigo 5º, LXII, dentre outros, o direito ao silêncio. Aliás, a Convenção Americana de Direitos Humanos (art. 8, 2, “g”) no mesmo sentido, dispõe que toda pessoa acusada de um delito tem o direito de não ser obrigada a depor contra si mesma, nem a confessar-se culpada. Deste modo, compreende-se que, inobstante a condução se mostre obrigatória, a prestação de esclarecimentos se faz facultativa, isto é, o sujeito não pode se furtar à obrigação de comparecer perante a autoridade, entretanto, lhe é constitucionalmente autorizado não responder as perguntas que lhe são direcionadas.

         É imprescindível lembrar que o Estado Democrático de Direito pressupõe um sistema de garantias fundamentais de cunho processual com intuito de frear os excessos do Estado. Este papel contra majoritário é exercido pelo Poder Judiciário por meio da jurisdição constitucional. Não se admite, em pleno século XXI, o desrespeito a direitos fundamentais diante do incomensurável poder estatal. Aliás, o próprio Hobbes, no século XVIII, já afirmava a necessidade de garantias diante do poder do Leviatã.

         Cumpre salientar que a prática da condução coercitiva viola garantias constitucionalmente conquistadas pelo cidadão, esta prática constitui verdadeira pressão psicológica com o objetivo de obter informações de maneira forçosa. Portanto, a condução coercitiva afronta violentamente os direitos e garantias do investigado e, por que não dizer, do processo penal democrático, indispensável para um Estado Democrático de Direito. Neste viés, a condução forçada mostra-se inconcebível, pois constitui verdadeiro instrumento de intimidação e arbitrariedade. Aliás, apesar de opiniões diversas, fica claro que a condução coercitiva se mostra um meio cerceador de liberdade, ainda que de caráter temporário.

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         O Processo Penal deve seguir as normas constitucionais de garantias e direitos fundamentais do cidadão. Considerada uma condição de direitos subjetivos para defesa do indivíduo, feita pelo Estado, a aplicação principiológica no Direto Processual Penal ocorre como forma de prevenir as agressões de seus cidadãos.

         Princípio da Presunção de Inocência

         O Princípio da Presunção de Inocência ou “Princípio da não-culpabilidade” traz a regra da liberdade. A autoria de uma infração penal será conhecida apenas com a sentença condenatória transitada em julgado. O encarceramento do acusado só ocorrerá em casos excepcionais. É o que dispõe o artigo 5°, inciso LVII da CRFB/88:

         Art. 5º Todos são iguais perante a lei, sem distinção de qualquer natureza, garantindo-se aos brasileiros e aos estrangeiros residentes no País a inviolabilidade do direito à vida, à liberdade, à igualdade, à segurança e à propriedade, nos termos seguintes:

         LVII - ninguém será considerado culpado até o trânsito em julgado de sentença penal condenatória. (BRASIL, 1988)

         Desse princípio derivam duas regras, a regra probatória e a regra de tratamento. A regra probatória, ou de juízo, dispõe que a parte acusadora possui o ônus de provar a culpabilidade do acusado, não sendo necessário que este prove a sua inocência.

         Já a regra do tratamento vem dizer que ninguém será considerado culpado até a sentença com transito em julgado, impedindo a antecipação de condenação ou de culpabilidade.

         Princípio da Igualdade Processual

         O Princípio da Igualdade Processual ou “Princípio da Paridade de Armas” é aquele que dispõe sobre o tratamento isonômico entre as partes no decurso do processo. Decorre ele do artigo 5°, caput, da CRFB/88.

         Apesar de sua regra tratar da igualdade entre as partes, deve haver uma preponderância com relação aos interesses do acusado.

         Princípio da Ampla Defesa

         O Princípio da Ampla Defesa vem disposto no artigo 5°, inciso LV da CRFB/88:

         Art. 5º Todos são iguais perante a lei, sem distinção de qualquer natureza, garantindo-se aos brasileiros e aos estrangeiros residentes no País a inviolabilidade do direito à vida, à liberdade, à igualdade, à segurança e à propriedade, nos termos seguintes:

         LV - aos litigantes, em processo judicial ou administrativo, e aos acusados em geral são assegurados o contraditório e ampla defesa, com os meios e recursos a ela inerentes; (BRASIL, 1988)

         Por ele, assegura-se a possibilidade que a assistência jurídica deve ser prestada pelo Estado, de forma gratuita para as pessoas carentes.

         A defesa pode ser subdividida em duas, a defesa técnica e a autodefesa. A defesa técnica é feita por um profissional habilitado, sendo obrigatória. A Súmula n° 523 do STF vem consagrá-la.

         A autodefesa é feita pelo próprio acusado, tratando-se de uma forma de conveniência do réu, que poderá ficar inerte.

         Princípio da Verdade Real

         O Princípio da Verdade Real busca a exatidão, a conformidade com o real. O fato investigado deve corresponder a realidade. O Código de Processo Penal adota o termo verdade “substancial”, em seu artigo 566, in verbis: “Art. 566. Não será declarada a nulidade de ato processual que não houver influído na apuração da verdade substancial ou na decisão da causa.” (BRASIL, 1941).

         Princípio do Devido Processo Legal

         O Princípio do Devido Processo Legal encontra respaldo no artigo 5°, inciso LIV, da CRFB/88.

         Art. 5º Todos são iguais perante a lei, sem distinção de qualquer natureza, garantindo-se aos brasileiros e aos estrangeiros residentes no País a inviolabilidade do direito à vida, à liberdade, à igualdade, à segurança e à propriedade, nos termos seguintes:

         LIV - ninguém será privado da liberdade ou de seus bens sem o devido processo legal; (BRASIL, 1988)

         Esse princípio traça todo o meio como deve agir o Processo Penal, assim como a atividade do legislador. Pode ser analisado sobre duas perspectivas. A primeira, de caráter processual, assegura a tutela dos bens jurídicos por meio do procedimento correto. A segunda, de caráter material, atua de forma substancial definindo a atuação adequada. O processo é o seu instrumento, garantindo a limitação da atividade estatal e tornando-se uma ferramenta de implantação da Constituição Federal.

         Princípio da Proporcionalidade

         O Princípio da Proporcionalidade é um importante instrumento de aplicação do Direito Processual Penal. A sua função é limitar o poder estatal, como forma de atender ao interesse público.

         O Princípio da Proporcionalidade, ainda que possua grande importância no Processo Penal, encontra maior atuação na CRFB/88, mas de forma implícita, como explica Raimundo Amorin de Castro:

         É bem verdade que o princípio da proporcionalidade ainda não é um cânone expresso no texto constitucional, mas está claramente implícito quando o legislador constituinte de 1988 adotou a cláusula do devido processo legal (art. 5º, inc. LIV); o sistema misto do controle jurisdicional da constitucionalidade (art. 102 e incs.); o sistema difuso em que a inconstitucionalidade de uma lei pode ser declarada por um juiz a quo, somente gerando efeitos entre as partes; e o sistema concentrado em que a inconstitucionalidade de uma lei é declarada por um Tribunal Superior, gerando efeitos vinculados erga omnes. (CASTRO, 2009, p. 109-110)

         Partindo-se da compreensão do instituto da condução coercitiva, e da base do denominado “Poder Geral de Cautela” no processo civil, questiona-se: é possível a condução coercitiva do investigado ou acusado no processo criminal?

         O Supremo Tribunal Federal entende que é possível a condução coercitiva do suspeito ou investigado, tendo assim decidido no HC 107644/SP, relatado pelo Min. Ricardo Lewandowski:

         HABEAS CORPUS. CONSTITUCIONAL E PROCESSUAL PENAL. CONDUÇÃO DO INVESTIGADO À AUTORIDADE POLICIAL PARA ESCLARECIMENTOS. POSSIBILIDADE. INTELIGÊNCIA DO ART. 144, § 4º, DA CONSTITUIÇÃO FEDERAL E DO ART. 6º DO CPP. DESNECESSIDADE DE MANDADO DE PRISÃO OU DE ESTADO DE FLAGRÂNCIA. DESNECESSIDADE DE INVOCAÇÃO DA TEORIA OU DOUTRINA DOS PODERES IMPLÍCITOS. PRISÃO CAUTELAR DECRETADA POR DECISÃO JUDICIAL, APÓS A CONFISSÃO INFORMAL E O INTERROGATÓRIO DO INDICIADO. LEGITIMIDADE. OBSERVÂNCIA DA CLÁUSULA CONSTITUCIONAL DA RESERVA DE JURISDIÇÃO. USO DE ALGEMAS DEVIDAMENTE JUSTIFICADO. CONDENAÇÃO BASEADA EM PROVAS IDÔNEAS E SUFICIENTES. NULIDADE PROCESSUAIS NÃO VERIFICADAS. LEGITIMIDADE DOS FUNDAMENTOS DA PRISÃO PREVENTIVA. GARANTIA DA ORDEM PÚBLICA E CONVENIÊNCIA DA INSTRUÇÃO CRIMINAL. ORDEM DENEGADA. I – A própria Constituição Federal assegura, em seu art. 144, § 4º, às polícias civis, dirigidas por delegados de polícia de carreira, as funções de polícia judiciária e a apuração de infrações penais. II – O art. 6º do Código de Processo Penal, por sua vez, estabelece as providências que devem ser tomadas pela autoridade policial quando tiver conhecimento da ocorrência de um delito, todas dispostas nos incisos II a VI. III – Legitimidade dos agentes policiais, sob o comando da autoridade policial competente (art. 4º do CPP), para tomar todas as providências necessárias à elucidação de um delito, incluindo-se aí a condução de pessoas para prestar esclarecimentos, resguardadas as garantias legais e constitucionais dos conduzidos. IV – Desnecessidade de invocação da chamada teoria ou doutrina dos poderes implícitos, construída pela Suprema Corte norte-americana e e incorporada ao nosso ordenamento jurídico, uma vez que há previsão expressa, na Constituição e no Código de Processo Penal, que dá poderes à polícia civil para investigar a prática de eventuais infrações penais, bem como para exercer as funções de polícia judiciária. V – A custódia do paciente ocorreu por decisão judicial fundamentada, depois de ele confessar o crime e de ser interrogado pela autoridade policial, não havendo, assim, qualquer ofensa à clausula constitucional da reserva de jurisdição que deve estar presente nas hipóteses dos incisos LXI e LXII do art. 5º da Constituição Federal. VI – O uso de algemas foi devidamente justificado pelas circunstâncias que envolveram o caso, diante da possibilidade de o paciente atentar contra a própria integridade física ou de terceiros. […]. (STF, HC 107644/SP, relator min. Ricardo Lewandowski, Primeira Turma, julgado em 06/09/2011, publicado em 18-10-2011).

         O poder de condução do investigado, que intimado, negou-se a comparecer espontaneamente, perante a autoridade policial, mesmo sem mandado judicial, consiste em faculdade inerente às atribuições conferidas àquela autoridade, mediante seus próprios poderes investigatórios.

         Controvérsia relevante, diz respeito à discordância nos segmentos jurídicos desta atribuição, posto entendimento pelo qual a autoridade policial não poderia expedir mandado de condução coercitiva, na modalidade de prisão mesmo cautelarmente, fundado na dicção do inciso XL, do artigo 5º da Constituição Federal, e que se torna inócua, em princípio, já que a condução coercitiva não consiste no aprisionamento do investigado, deixando sujeita à orfandade a consideração engendrada no âmbito da esfera constitucional.

         A finalidade precípua da condução coercitiva é determinar que os a ela submetidos colaborem com a polícia judiciária, na condução das investigações, inclusive para que possa o próprio investigado produzir elementos que lhe retiram indícios de autoria e materialidade, podendo-se afirmar que, do ponto de vista defensivo, trata-se de uma quase defesa prévia, já que o investigado tem essa oportunidade, ainda que o suspeito valha-se de sua prerrogativa constitucional de manter-se em silêncio; frise-se ainda que sua excepcionalidade reveste-se de requisitos diferentes daqueles atribuídos à prisão preventiva ou cautelar.

         O direito constitucional de não produzir prova contra si mesmo, não influi da condução coercitiva, devendo o suspeito alegá-lo na presença da autoridade coercitiva, após o atendimento da intimação policial, manifestando-se sobre sua prerrogativa constitucional.

         A condução coercitiva somente pode servir aos seus propósitos, caso o suspeito/investigado recuse-se a comparecer perante a autoridade para a prestação de depoimento, após sua regular intimação para fazê-lo, não se podendo falar em condução coercitiva como ato imediato, eivando o instituto de nulidade, e, até mesmo, de abuso de autoridade. Assim, temos que são requisitos essenciais para a condução coercitiva: a) intimação/comunicação regular e válida para comparecimento ao ato; b) recusa injustificada de quem foi intimado e não compareceu ao ato.

         Observe-se que, em uma investigação policial em curso, a condução coercitiva é uma medida vital não apenas para interrogatório do suspeito que, intimado, recusou-se a comparecer, mas ainda para suprir diligências contidas em uma operação policial externa, servindo ainda para evitar a ocultação e/ou destruição de provas materiais, durante busca e apreensão domiciliar, realização de interrogatórios simultâneos – mantendo-se incólume o direito constitucional ao silêncio – e impedir que diferentes investigados possam combinar versões atenuantes; vale ainda e não menos, viabilizar prova de reconhecimento pessoal materializando a identificação criminal (Lei nº. 12.037/2009).

         Pode-se afirmar também que decorre do poder geral de cautela do juiz – caso em que decorra de ordem judicial – conforme estabelecido pelo artigo 798 do Código de Processo civil, ou artigo 297 do Novo Código de Processo civil, consolidado pela jurisprudência das Cortes Superiores e ainda pela doutrina, meio substitutivo de menos gravosidade ante uma restrição de liberdade em menor grau. A admissão desse mecanismo, quando do advento da Lei nº. 11.719/2008, acrescentou o parágrafo único do artigo 387 do Código de Processo Penal, determinando que o Juiz decida fundamentadamente pela imposição de prisão preventiva ou outra medida cautelar.

         No esteio desse raciocínio, comprova-se que a realização da condução coercitiva pelo delegado de polícia não se eiva de inconsistências, já que a própria Corte Suprema afirmou expressamente, que toda a restrição a direito fundamental depende de prévia autorização judicial, implicaria em uma verdadeira paralisação da atuação policial e administrativa, extraindo-lhe, de vez, seu poder de polícia do Estado (Medida Cautelar interposta em sede de Habeas Corpus nº. 124.332).

         A condução coercitiva decretada a partir das hipóteses legais jamais poderá ser efetivada sem notificação prévia. Por lógico que, consoante já exposto, não é possível a condução coercitiva do acusado ou investigado, quanto mais sem ser previamente intimado. Refere-se, portanto, aos envolvidos no processo penal a quem a lei possibilita a adoção da medida: o perito, a testemunha, o ofendido, e quem, por qualquer motivo, deva ser fazer presente.

         A Constituição da República Federativa do Brasil prevê, em seu artigo 5°, inciso LVII, que “ninguém será culpado até o trânsito em julgado de sentença penal condenatória”. (BRASIL, 1988). Trata-se do princípio da presunção de inocência, pelo qual o acusado de cometer determinada infração penal deve ser protegido contra qualquer antecipação da sanção sem o devido processo legal e a ampla defesa. A inocência, nesse caso, é presumida, cabendo à acusação provar o contrário. O que não se pode conceber é a antecipação do juízo da culpa.

3 CONSIDERAÇÕES FINAIS

             A condução coercitiva é medida prevista no Código de Processo Penal como forma de obrigar o ofendido, a testemunha, o perito, ou qualquer outra pessoa que deva comparecer ao ato para o qual foi intimada, e assim não o faz, injustificadamente.

            A prévia notificação daquele que deva comparecer é requisito indispensável previsto pelo Código de Processo Penal em todos os dispositivos que regulam o instituto. Garante-se, assim, que a pessoa que deva cooperar com a elucidação dos fatos não será surpreendida, resguardando-a de ofensa à sua imagem ou exposição pública desnecessária.

            A condução coercitiva constitui medida constitucional e também legal cujo objetivo consiste a assegurar a eficácia do sistema probatório e de cautelares na persecução criminal, evitando uma restrição mais extrema no âmbito da esfera de liberdade do indivíduo, e mesmo ante a existência de posições favoráveis, e também desfavoráveis, à sua utilização na fase inquisitorial policial, é necessário uma sucinta análise do caso concreto, em plena obediência aos princípios da razoabilidade e proporcionalidade.

        

REFERÊNCIAS

ARAS, Vladimir. Debaixo de vara: a condução coercitiva como cautelar pessoal autônoma. Publicado em 16/07/2013. Disponível em: https://blogdovladimir.wordpress.com/2013/07/16/a-conducao-coercitiva-como-cautelar-pessoal-autonoma/ (acesso em 02 de dezembro de 2017).

CASTRO, Raimundo Amorim de. Provas ilícitas e o sigilo das comunicações telefônicas. Curitiba: Juruá, 2007, p. 109-110.

BRASIL. Constituição (1988). Constituição da República Federativa do Brasil. Brasília, DF: Senado Federal. Disponível em: http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/constituicao/constituicaocompilado.htm (acesso em 02 de dezembro de 2017).

LOPES JR., Aury. Direito Processual Penal e sua Conformidade Constitucional. Vol. I. Rio de Janeiro: Lumen Juris, 2007.

MACHADO, Antonio Alberto. Teoria geral do processo penal. São Paulo: Atlas, 2009.

NUCCI, Guilherme de Souza. Código de Processo Penal Comentado. RT. São Paulo. 2012. 11ª Ed.

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Sobre o autor
Benigno Núñez Novo

Pós-doutor em direitos humanos, sociais e difusos pela Universidad de Salamanca, Espanha, doutor em direito internacional pela Universidad Autónoma de Asunción, com o título de doutorado reconhecido pela Universidade de Marília (SP), mestre em ciências da educação pela Universidad Autónoma de Asunción, especialista em educação: área de concentração: ensino pela Faculdade Piauiense, especialista em direitos humanos pelo EDUCAMUNDO, especialista em tutoria em educação à distância pelo EDUCAMUNDO, especialista em auditoria governamental pelo EDUCAMUNDO, especialista em controle da administração pública pelo EDUCAMUNDO, especialista em gestão e auditoria em saúde pelo Instituto de Pesquisa e Determinação Social da Saúde e bacharel em direito pela Universidade Estadual da Paraíba. Assessor de gabinete de conselheiro no Tribunal de Contas do Estado do Piauí.

Informações sobre o texto

Este texto foi publicado diretamente pelos autores. Sua divulgação não depende de prévia aprovação pelo conselho editorial do site. Quando selecionados, os textos são divulgados na Revista Jus Navigandi

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