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Do Imposto de Renda retido pela fonte pagadora de prêmios em dinheiro

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01/03/2005 às 00:00
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IV – Da Retenção do Imposto de Renda pela Fonte Pagadora de Prêmios em Dinheiro no Exercício de Atividades Ilícitas

A incidência da norma de retenção do imposto de renda sobre prêmios em dinheiro distribuídos no exercício de atividades ilícitas toma importância principalmente pela atual situação de penumbra legal existente no caso dos bingos permanentes, criada pelas sucessivas alterações da Lei Federal n. 9.615/1998, pela Lei Federal n. 9.981/2000, pela Medida Provisória n. 2.051/2001, e, por final, pela proibição da atividade de exploração de bingo permanente externada na Medida Provisória n. 168/2003, que restou rejeitada pelo Congresso Nacional. Assim, podemos afirmar a existência de uma zona cinzenta, que ainda está sendo definida pelo Poder Judiciário. Todavia, por não ser este o tema objeto específico de nosso trabalho, não emitiremos opinião a respeito.

Outro fato a ser colocado é a natureza da norma de retenção e repasse, que pode assumir a natureza material e a instrumental, nos moldes do art. 113, do CTN. Isso porque se refere diretamente ao pagamento e extinção do crédito tributário do contribuinte (material), bem como se refere às prestações de interesse da arrecadação (instrumental) que não o mero pagamento do tributo, como antecipação, informações e garantia. Com essa natureza, no mínimo, híbrida, não se pode escusar, pela falta de autorização legal da atividade, do dever de retenção e repasse do imposto de renda sobre os prêmios pagos pela fonte pagadora. Isso em decorrência do disposto no art. 118, do CTN, ao qual é interessante citar:

Art. 118. A definição legal do fato gerador é interpretada abstraindo-se:

I - da validade jurídica dos atos efetivamente praticados pelos contribuintes, responsáveis, ou terceiros, bem como da natureza do seu objeto ou dos seus efeitos;

II - dos efeitos dos fatos efetivamente ocorridos.

Tal dispositivo indica que, indiferentemente da licitude do ato ou da atividade econômica, caso o evento se encaixe no que está previsto na norma de incidência tributária, o tributo deverá ser exigido dos contribuintes ou responsáveis. Ressalta-se a remição expressa ao responsável.

Contudo, por cremos na invalidade do IRRF-exclusivo, como explanado acima, somente poderia ser cobrado da fonte pagadora os valores que não foram recolhidos pelo beneficiário em ajuste anual do Imposto de Renda e os oriundos da mora e sanção por descumprimento de mandamento legal, sob pena de causar a bi-tributação do mesmo evento e locupletamento do Estado.

Nos moldes atuais, essa matéria é pouco estudada por toda doutrina e jurisprudência. Somente encontramos um acórdão do Conselho de Contribuintes que determinava a exigência da retenção e repasse do imposto sobre a renda provinda de prêmios em dinheiro pagos por uma casa de bingo não autorizada pela respectiva entidade desportiva, corroborando parcialmente com o posicionamento acima exposto. [10]


Comentários Finais

Longe de exaurimos o tema, acreditamos ter aventado os principais pontos do imposto de renda sobre prêmios pagos em dinheiro retido e recolhido exclusivamente pela fonte. Ainda, poderíamos discorrer sobre outros pontos como a dispensa de retenção e repasse do IR sobre de prêmios inferiores à R$ 11,30 (art. 676, §1º, do RIR/99), e a sua base de cálculo, mas as questões escapariam da análise comparativa do disposto em regulamento e a autorização constitucional.

Dessa forma, esperamos ter contribuído para o avanço jurídico, colocando de lado a posturas maniqueístas e aceitando o confronto de idéias.


Principais Referências Bibliográficas

ATALIBA, Geraldo. Hipótese de Incidência Tributária. 6ª ed., São Paulo : Malheiros, 2000.

BARRETO, Paulo Ayres. Imposto Sobre a Renda e Preços de Transferência. Dialética, 2001.

CARRAZZA, Roque Antônio. Curso de Direito Constitucional Tributário. 17 ed., São Paulo : Malheiros, 2002.

CARVALHO, Fábio Junqueira e MURGEL, Maria Inês. IRPJ – Teoria e Prática Jurídica. 2ª. ed., São Paulo : Dialética, 2001.

CARVALHO, Paulo de Barros. Saraiva : Curso de Direito Tributário. 13ª. ed., São Paulo : Saraiva, 2000.

GONÇALVES, José Artur Lima. Imposto sobre a Renda: Pressupostos Constitucionais. Malheiros.

MOSQUERA, Roberto Quiroga. Renda e Proventos de Qualquer Natureza. Dialética, 2001.

PAULSEN, Leandro. Direito Tributário: Constituição e Código Tributário à Luz da Doutrina e da Jurisprudência. 3ª. ed., Porto Alegre :Livraria do Advogado, 2001.

OLIVEIRA, Ricardo Mariz de. A sujeição passiva da fonte pagadora de rendimento, quanto ao imposto de renda devido na fonte. In Revista Dialética de Direito Tributário, n. 49.

SOUZA, Hamilton Dias de. Competência Tributária e seu Exercício: Racionalidade com Limitação ao Poder de Tributar. In: Imposto de Renda: Conceito, Princípios e Comentários (Org. MARTINS, Ives Gandra da Silva), São Paulo : Atlas, 1996.


Notas

1 Quanto ao critério temporal, não há regras constitucionais que limitem objetivamente o legislador a determinar o intervalo temporal para a determinação da renda. Apenas podemos indicar que, conforme o próprio conceito-base constitucional de renda, dever-se-á ser definido um período razoável para a efetiva aferição da renda com o cotejamento das entradas e saídas econômicas. Como já vem observando Hamilton Dias de Souza (p. 216-227), o legislador do imposto de renda deve ser razoável na determinação de tal intervalo, para que seja possível a caracterização da renda, ou efetivo acréscimo patrimonial.

2 Acórdão n. 104-19114, do Primeiro Conselho de Contribuintes, de 04.12.2002. Este acórdão é citado em vários outros do Conselho de Contribuintes.

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3 Recurso Especial n. 637.636-SC, Primeira Turma do STJ, Rel. Min. José Delgado, DJU 20.09.2004, e Recurso Especial n. 424.225-SC, Primeira Turma do STJ, Rel. Min. Teori Albino Zavascki, DJU 19.12.2003.

4 O posicionamento mais corrente no STJ é no sentido de que, em qualquer caso de IRRF, há uma substituição completa do contribuinte pelo responsável, sendo somente este passível de ser cobrado pelo imposto não retido e não recolhido. Recurso Especial n. 309.913-SC, Rel. Min. Paulo Medina, 2ª Turma, DJU de 01.07.2002.

5 Apelação Cível n. 2001.71.0001848-3 – RS, Segunda Turma do TRF da 4ª Região, Rel. Juiz Vilson Darós, DJU 27.11.2002.

6 Quanto à adoção do posicionamento de ser a fonte pagadora exclusiva responsável pelo pagamento do IR incidente sobre o prêmio em dinheiro, caso não haja a retenção do valor devido, a autoridade fiscal tenderá a considerar um aumento considerável da base de cálculo. Ou seja, ela, provavelmente, entenderá que a não retenção terá aumentado o valor do prêmio e, conseqüentemente, o valor da renda auferida pelo jogador. Assim, lançará o tributo devido sobre o valor total do prêmio somando-se ao valor que deveria ter sido retido e recolhido no momento do pagamento pela fonte.(Instruções Normativas da SRF n. 25/1996 e 15/2001)

7 Art. 4º Na hipótese de a administração do jogo de bingo ser entregue a empresa comercial, é de exclusiva responsabilidade desta o pagamento de todos os tributos e encargos da seguridade social incidentes sobre as respectivas receitas obtidas com essa atividade.

8 Por aceitação da constitucionalidade das Emenda Constitucional n. 03/1990, que incluiu o §7º, do art. 150, da CF/1988, conforme a interpretação do Supremo Tribunal Federal.

9 O indicado autor esclarece que o entendimento quanto o aumento da base de cálculo é oriundo de construção da jurisprudência do Conselho de Contribuintes, porém não há indicação de qual é o fundamento legal. Também, não pode ser considerado como unânime. Ex.: Acórdãos n. CSRF/01-02257, de 15.09.1997, n. 01-1146, de 28.06.1991, n. 104-19114, de 04.12.2002, n. 102-45463 (esses dois últimos específicos da questão de jogos de bingo).

10EXPLORAÇÃO DE JOGOS DE BINGO SEM AUTORIZAÇÃO DE ENTIDADE DESPORTIVA. SUJEITO PASSIVO DA OBRIGAÇÃO TRIBUTÁRIA. A empresa que explora a atividade de sorteios em jogos de "Bingo" sem autorização de entidade desportiva é a responsável pelas obrigações tributárias inerentes a essa atividade.

DISTRIBUIÇÀO DE PRÊMIOS. JOGOS DE BINGO. Os prêmios pagos em bens e dinheiro, mediante realização de "Bingo", sofrem tributação exclusiva na fonte; no caso de dinheiro, cabe o reajustamento da base de cálculo quando a fonte pagadora assume o ônus do imposto devido pelo beneficiário.

MULTA DE OFÍCIO - É devida a multa de ofício de 75%, quando a fonte pagadora, sujeito passivo da obrigação tributária de recolher o imposto devido exclusivamente na fonte, deixar de recolhê-lo aos cofres públicos.

JUROS MORATÓRIOS - TAXA SELIC - O crédito não integralmente pago no vencimento é acrescido de juros de mora, seja qual for o motivo determinante da falta. O percentual de juros a ser aplicado no cálculo do montante devido é o fixado no diploma legal, vigente à época do pagamento. Recurso parcialmente provido. (Acórdão n. 106-12729, do Primeiro Conselho de Contribuintes, de 10.06.2002.)

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Sobre o autor
Gustavo Vettorato

advogado militante em Porto Alegre e Cuiabá, pós-graduando em Direito Tributário pelo Instituto Brasileiro de Estudos Tributários (IBET) e em Economia Agroindustrial pela Universidade Federal do Mato Grosso

Como citar este texto (NBR 6023:2018 ABNT)

VETTORATO, Gustavo. Do Imposto de Renda retido pela fonte pagadora de prêmios em dinheiro. Revista Jus Navigandi, ISSN 1518-4862, Teresina, ano 10, n. 601, 1 mar. 2005. Disponível em: https://jus.com.br/artigos/6335. Acesso em: 16 abr. 2024.

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