A espistemologia brasileira

08/02/2018 às 16:29
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O presente artigo tem como escopo indagar a respeito da epistemologia brasileira. Far-se-á uma reflexão no que tange a dominação epistemológica no paiís, expondo o modo que isso afeta o direito pátrio.

O presente texto tem como escopo discorrer brevemente a respeito do conhecimento adotado no país, e, por conseguinte, indagar sobre uma possível ou necessária transformação, contudo, não pretendendo responder tal indagamento no curto espaço aqui cordialmente cedido. Para tanto, iniciar-se-á com a seguinte questão – O que é epistemologia?

Em uma rápida busca na internet encontra-se que é um “ramo da filosofia que se ocupa dos problemas relacionados com o conhecimento humano, refletindo sobre sua natureza e validade”.[1] Em outras palavras, é um campo preocupado com o modo e produção de conhecimento, estudando sua própria validade, possuindo origem em Platão. Compreendida a resumida ideia, necessário indagar-se acerca da epistemologia brasileira, ainda, se é considerada válida e eficaz.

No atual estágio da sociedade é possível compreender o forte impacto proporcionado pela globalização, fazendo com que continue a dominação de determinada parte do mundo em relação ao outro. Como exemplifica SANTOS[2], o globo terrestre divide-se entre os que estão “do lado de cá da linha” e aqueles “do lado de lá da linha”.

Fazendo com que continue pois a citada dominação iniciou-se há séculos, em 1492, ao nascer o colonialismo. A partir disso, restou notório o extermínio de habitantes, imposição de crenças religiosas e exploração econômica dos nativos que habitavam terras ainda desconhecidas pelos europeus. Mais tarde, o movimento intensificou-se, em razão do imperialismo.

O famoso escambo evoluiu, não limitando-se tão somente em trocas de espelhos, mas também de conhecimentos, filosofia, sociologia, isto é, forma de pensar e construir o mundo. Foi insuficiente arrancar ligações políticas, sendo necessário impor relações culturais, modos de educação, pensamentos e desejos. Nesse sentido, Fornet-Betancourt acentua:

No olvidemos que com la conquista y la colonización – que es también una empresa de colonización espiritual – se impone, em efecto, la cultura europea com su sistema universitario y sus métodos de investigación. Y la filosofia, en tanto que es parte de esa cultura, reproduce em América Latina el modelo cultural que se trae de Europa.[3]

Deste modo, restou perfectibilizada a dominação epistemológica do povo latino-americano, caráter que perdura até os dias atuais e que é cada vez mais intensificado por intermédio da globalização. A influência é sentida com veemência no mundo jurídico, com diversas importações em diferentes ramos do Direito brasileiro. No mais perigoso deles, isto é, o Penal, a dominação alemã é cristalina.

É comum o povo brasileiro realizar uma comparação com as potências mundiais – leia-se Europa e Estados Unidos da América – em qualquer campo, mas com especial atenção no jurídico. Fácil apontar “erros” no Código Penal, afirmando ser o Brasil o país da impunidade, quando na verdade possui a terceira maior população carcerária do planeta.[4]

Realmente, talvez seja o local da impunidade para a cifra negra da criminalidade, com uma deficiente e selecionada criminalização primária e secundária, conforme denuncia a criminologia crítica. Contudo, não é debater tal matéria a finalidade deste artigo.

Indubitável é a ineficácia do sistema penal, bem como as inúmeras catástrofes sociais advindas com aquele. O Código Penal de raízes alemãs é falho em terrae brasilis e acentua a violência estrutural, dessa forma, colaborando com a ausência de suprimento de direitos fundamentais por parte do Estado.

Porém, essa intensificação nas relações sociais mundias, dificultam a criação de normas arraigadas em necessidades e realidades próprias, pois como bem acentua Boaventura de Sousa Santos “estamos perante um fenómeno multifacetado com dimensões económicas, sociais, políticas, culturais, religiosas e jurídicas interligadas de modo complexo”.[5]

Ante a situação atual, aparenta estar distante a valorização do conhecimento próprio, completamente dominado e isolado desde o colonialismo. Contudo, faz-se mister indagar a respeito da possibilidade de lhe trazer à baila em tempos escuros. Termino o breve relato com os seguintes questionamentos – É viável continuar a importação e valorização de conhecimentos estranhos a realidade brasileira? Não seria o momento de uma libertação epistemológica?


[1] Dísponivel em: https://dicionariodoaurelio.com/epistemologia. Acesso em 22/01/2018.

[2] SANTOS, Boaventura de Sousa, MENESES, Maria Paula, Epistemologia do Sul, Cortez, São Paulo, 2010, p. 32.

[3] Tradução Livre: Não esqueçamos que com a conquista e a colonização, que também é uma empresa de colonização espiritual, são impostas a cultura européia com um sistema universitário e seus métodos de investigação. E a filosofia como parte desta cultura reproduz na América Latina o modelo cultural que é trazido da Europa. FORNET-BETANCOURT, Raúl, La filosofía intercultural desde uma perspectiva latinoamericana, Solar, n. 3, ano 3, Lima 2007, pp. 23/40.

[4] Dísponivel em: < http://www1.folha.uol.com.br/cotidiano/2017/12/1941685-brasil-ultrapassa-russia-e-agora-tem-3-maior-populacao-carceraria-do-mundo.shtml> . Acesso em 24/01/2018.

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[5] SANTOS, Boaventura de Sousa, A Globalização e as Ciências Sociais, Cortez, 4ªed,  São Paulo, 2011, p. 32.

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Sobre o autor
Victor Bambinetti Gonçalves

Estudante de Direito da Universidade da Região de Joinville - UNIVILLE e da Faculdade de Direito da Universidade do Porto - FDUP. Com pesquisas no Direito Civil, mais especificamente Direito Civil Constitucional e Direito Digital.

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