O estudo prévio de impacto ambiental e o relatório de impacto ambiental como instrumentos de eficácia dos princípios da precaução e da prevenção na proteção do meio ambiente ecologicamente equilibrado

14/02/2018 às 13:18
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A preservação do meio ambiente e a reparação dos danos ambientais eventualmente ocorridos são objeto do EIA-RIMA de modo a antecipar o conhecimento dos efeitos que determinado empreendimento irá apresentar ao meio ambiente, de modo a protegê-lo.

Introdução. 1.A defesa do meio ambiente segundo a Constituição Federal. 2.Princípios norteadores do direito ambiental. 2.1 Precaução. 2.2 Prevenção 2.3 Poluidor-pagador e do usuário-pagador. 2.4 Vedação ao retrocesso ecológico. 2.5 Princípio da Responsabilidade 2.6 Desenvolvimento Sustentável 3. O licenciamentp ambiental como consequencia do EPIA-RIMA e instrumento de eficácia dos princípios da precaução e da prevenção. Conclusão. Referências Bibliográficas.

INTRODUÇÃO

Legalmente conceituado como o “conjunto de condições, leis, influências e interações de ordem física, química e biológica, que permite, abriga e rege a vida em todas as suas formas” (art. 3º da Lei 6.938/81), a preservação figura como condição sine qua non para a vida no planeta, pelo que sua preservação é objetivo do Estado de todos os cidadãos.

Nesse sentido é que diversas formas e instrumento de proteção são previstos por nossa Constituição Federal e devem ser respeitados e postos em prática visando o bem estar da coletividade.

Uma das formas de proteção constitucionalmente prevista e regulamentada é necessidade da elaboração de Estudo Prévio de Impactos Ambientais, que dá ensejo ao Relatório de Impactos Ambientais (EPIA-RIMA), a fim de prever e delatar os riscos de qualquer ação que cause risco de dano ao meio ambiente, o que, de forma simples e objetiva, se passará a dispor no presente trabalho.

Para tanto, dividiu-se o trabalho em três capítulos: 1) O direito fundamental ao direito ambiental ecologicamente sustentável no Direito Internacional; 2) Princípios norteadores do Direito Ambiental; 3) O licenciamentp ambiental como consequencia do EPIA-RIMA e instrumento de eficácia dos princípios da precaução e da prevenção.

No primeiro capítulo, pois, discorremos sobre pontos basilares para o Direito Ambiental e proteção do meio ambiente, ressaltando a importância internacional dos mecanismos de proteção ambiental, haja vista sua proteção constitucional.

O segundo capítulo é voltado para a conceituação e importância de alguns dos principais princípios que norteiam a aplicação do direito ambiental nas relações com o meio ambiente: precaução, prevenção, poluidor-pagador/usuário-pagador e vedação ao retrocesso ecológico, responsabilidade social, proibição do confisco e desenvolvimento sustentável.

Já o terceiro capítulo expõe a necessidade de observância a preceitos basilares do direito ambiental e à correta elaboração do EPIA-RIMA a fim de conferir eficácia aos princípios do Direito Ambiental, mormente ao da precaução e da prevenção, dois dos principais e mais importantes à integral proteção do meio ambiente ecologicamente equilibrado.

Desse modo, buscaremos de forma concisa fomentar novos estudos e expor a importância da efetiva aplicação das normas em vigor para integral proteção do meio ambiente.

1.         A DEFESA DO MEIO AMBIENTE SEGUNDO A CONSTITUIÇÃO FEDERAL

Historicamente, a Constituição Federal de 1988 foi a primeira a dedicar um capítulo à proteção do meio ambiente, rompendo com a máxima que antes imperava de que questões ambientais deveriam ser tratadas isoladamente, geralmente como forma de promover a saúde pública.

Nesse sentido, influenciada por diversos tratados, convenções e estudos internacionais, a atual Constituição passou a tratar o meio ambiente com a importância devida em virtude de sua influência em todas as áreas, seja do setor público ou privado, passando ao status de assunto de interesse nacional, altamente protegido.

O Capítulo VI, do Título VIII, da Constituição Federal (CF/88), trata especificamente do meio ambiente, sendo o artigo 225 da Carta Maior dispositivo de garantia que institui a obrigação de zelo do meio ambiente pela coletividade, in verbis:

Art. 225. Todos têm direito ao meio ambiente ecologicamente equilibrado, bem de uso comum do povo e essencial à sadia qualidade de vida, impondo-se ao Poder Público e à coletividade o dever de defende-lo e preservá-lo para as presente e futuras gerações.

Notemos que o constituinte originário reservou espaço exclusivo no texto constitucional para deliberar apenas sobre o meio ambiente, dispondo ser este um direito de todos, seguido pela obrigação de defesa e preservação, inerentes a todos os mecanismos de controle e proteção ambiental que vieram a surgir após a promulgação da CF/88.

O §1º do mesmo dispositivo constitucional dispõe sobre os diversos meios dos quais deve o Poder Público lançar mão para a preservação e garantir a efetividade do que disposto no caput do dispositivo.

Além desse meio de atuação do Poder Público, a CF/88 dispõe sobre medias preservacionistas a quantos possam gerar danos ao meio ambiente, seja de forma direta ou indireta. Desse modo, aquele que explorar recursos minerais ficará obrigado a promover a recuperação do meio ambiente que degradou, na forma e condições impostas pelo Poder Público.

Nesse sentido, importante destacar que a CF/88, ao passo que enfatiza medidas preventivas, não deixa, também, de elencar reponsabilidades e assinalar medidas repressivas de modo a imputar responsabilidades e obrigações a todos aqueles que apresentarem condutas lesivas ao bem comum ambiental, impondo sanções administrativas e penais, sem prejuízo da obrigação de reparar os danos causados. É o que dispõe o §3º, do art. 225, da CF/88:

§3.º As condutas e atividades consideradas lesivas ao meio ambiente sujeitarão os infratores, pessoas físicas e jurídicas, a sanções penais e administrativas, independentemente da obrigação de reparar os danos causados.

Assim, com a promulgação da Carta Magna de 1988, passou o meio ambiente a ser tratado como um garantidor do direito fundamental maior, o direito à vida. Passou ele a ser tratado como valor preponderante, e que, em proporção, é de elevada importância em relação a outros direitos fundamentais, como o direito à propriedade, bem como ao desenvolvimento econômico, vez que discute a tutela da qualidade do ambiente em que todos estão inseridos, sendo através dessa tutela que se protege um valor ainda maior: a qualidade da vida humana.

2.         PRÍNCÍPIOS NORTEADORES DO DIREITO AMBIENTAL

Entende-se por princípios os mandamentos ou enunciados formadores do núcleo de determinada ciência. O Direito, pois, por ciência, possui diversos princípios formadores da base de todas as normas jurídicas, podendo ser escritos ou não.

Nesse sentido, para que uma disciplina jurídica seja considerada autônoma em relação às demais, necessário que possua princípios próprios que a diferenciem. Nesse sentido, o Direito Ambiental apenas fora reconhecido autonomamente em meados da década de 90.

Desse modo, a fim de melhor entender o Direito Ambiental e todas as suas nuances, bem como as consequências jurídicas aos infratores das leis ambientais, necessário discorrer brevemente sobre alguns dos principais princípios que regem esta disciplina

2.1      PRINCÍPIO DA PRECAUÇÃO

Reconhecido como Princípio do Direito Ambiental Internacional, a Precaução, em síntese, fomenta a ideia de que as atividades que venham a causar algum tipo de agressão ao meio ambiente tenham, de modo internalizado nas organizações, todos os custos necessários para viabilizar medidas antecipatórias a fim de evitar o dano ambiental ou reduzir ao máximo suas consequências.

Na era moderna, o Princípio da Precaução fora primeiramente disposto nos anos 70, na Alemanha, onde ficou conhecido como Vorsorge Prinzip. Em pouco tempo, então, tal princípio passou a integrar a política de meio ambiente em praticamente todos os países europeus voltado a todos os setores da economia que pudessem, de alguma forma, causar efeitos adversos ao meio ambiente e à saúde humana.

Em 1990, a Bergen Conference realizada nos Estados Unidos ofereceu uma interpretação simples porém adequada à análise do princípio: "É melhor ser grosseiramente certo no tempo devido, tendo em mente as consequências de estar sendo errado do que ser completamente errado muito tarde"

O Princípio 15 da Declaração do Rio/92 sobre o Meio Ambiente e Desenvolvimento, originado na conhecida ECO/92, assim dispõe:

Princípio 15: De modo a proteger o meio ambiente, o princípio da precaução deve ser amplamente observado pelos Estados, de acordo com suas capacidades. Quando houver ameaça de danos sério ou irreversíveis, a ausência absoluta de certeza não deve ser utilizada como razão para postergar medidas eficazes e economicamente viáveis para prevenir a degradação ambiental.

Também o Princípio 17 da mesma declaração dispõe sobre a realização de estudo prévio de impactos ambientais como meio de viabilizar a Precaução:

Princípio 17: a avaliação do impacto ambiental, como instrumento internacional, deve ser empreendida para as atividades planejadas que possam vir a ter impacto negativo considerável sobre o meio ambiente, e que dependam de uma decisão de autoridade nacional competente.

Nesse sentido, podemos afirmar que o Princípio da Precaução implica uma ação antecipatória à ocorrência do dano ambiental, garantindo, assim, maior eficácia à medidas ambientais selecionadas.

Na mesma linha de raciocínio, Machado leciona:

A precaução age no presente para não se ter que chorar e lastimar o futuro. A precaução não só deve estar presente para impedir o prejuízo ambiental, mesmo incerto, que possa resultar das ações ou omissões humanas, como deve atuar para a prevenção oportuna desse prejuízo. Evita-se o dano ambiental através da prevenção no tempo certo.[1]

Algumas características podemos destacar do Princípio da Precaução: i) Incerteza do Dano e Nexo Ambiental; ii) Inversão do Ônus da Prova, e iii) Custos da Medidas de Precaução.

Com o Princípio da Precaução, uma nova concepção fora desenvolvida sobre a obrigatoriedade de comprovação cientifica dos danos ambientais, na medida em que uma atividade ameaçadora do meio ambiente é obrigada a agir precaucionariamente independentemente do grau de certeza dos impactos que causará.

Em termos, passou-se a não mais se preocupar com o tamanho do abalo ambientar a ser enfrentado em virtude das atividades de uma organização, mas o quanto esta mesma organização será capaz de deixar de poluir o meio ambiente.

Com efeito, a certeza científica do dano, quando possível de ser demonstrada, acarreta a aplicação imediata das medidas ambientais. Mas se deixássemos de aplicá-las quando houvesse incerteza científica, estaríamos incorrendo num grave erro, que é o da inércia diante dos problemas ambientais, pois os efeitos do possível dano, provavelmente, seriam irreversíveis.

Assim, é pacífico entre os doutrinadores e demais estudiosos da questão ambiental que, quando houver incerteza científica do dano ou também risco de sua irreversibilidade, o dano deve ser prevenido e, indiscutivelmente, se houver certeza científica do mesmo.

O princípio da precaução consiste em dizer que não somente somo responsáveis sobre o que nós sabemos, sobre o que nós deveríamos ter sabido, mas, também, sobre o que nós deveríamos duvidar.[2]

Também o Princípio da Precaução traz consigo a inversão do ônus da prova como característica fundamental, pela qual deve a organização comprovar que suas atividades não ofenderão o meio ambiente de modo a prejudicar a saúde pública, bem como que aplicará todos os recursos necessários à utilização de meios precaucionários disponíveis.

No sistema jurídico brasileiro impera a regra que o ônus da prova cabe ao autor, que deverá comprovar suas alegações. No entanto, conforme entendimento pacificado pelo Egrégio Superior Tribunal de Justiça – STJ, em casos de ofensas ao meio ambiente, impera o instituto da inversão do ônus da prova, pelo que se imputa à organização poluidora a obrigação de provar que suas atividades possuem os riscos são cientificamente previstos.

Tal foi o entendimento adotado pela Ministra Eliane Calmon, relatora do REsp 972.902/RS (inteiro teor em anexo), e até a presente data seguido pela Corte Superior.

Ainda, os custos a serem despendidos para a tomada de todas as medidas de precaução devem ser compatíveis com a capacidade econômica de cada país, de modo que todos possam, de forma efetiva, minorar os danos ambientais causados por seu desenvolvimento ao máximo, ao passo que os custos para tal fim sejam os menores.

Nesse sentido, afirma Ayala:

[...] é verdade que se utilize da incapacidade econômica para que se postergue ou mesmo não se lance mão de medidas orientadas à prevenção da ameaça de agressividade ao patrimônio ambiental. É no custo ambiental da medida que será sim, indispensável, a vinculação à capacidade econômica estatal que será obrigatoriamente discriminada e diferenciada em atenção a maior ou menor possibilidade de emprego da tecnologia adequada.[3]

Desse modo, apesar do elevado custo das ações precaucionarias e também do uso de “tecnologias mais limpas", não podemos procrastinar a implementação de políticas e ações ambientais em virtude de certezas ou probabilidades, vez que os danos ao meio ambiente são, na maioria das vezes, irreparáveis e trazem graves consequências para todo o planeta. Nesse sentido, o dever de agir de forma antecipada é premissa fundamental para garantir a aplicação do princípio da precaução, garantindo-lhe a eficácia suficiente capaz de conferir qualidade de vida à sociedade.

2.2      PRINCÍPIO DA PREVENÇÃO

Muitas vezes confundido com o princípio da precaução, a prevenção diferencia-se no sentido de que indica que a organização poluidora aja para evitar os danos que já sabe que ocasionará.

Segundo Alexandre Kiss:

A diferença entre o princípio da prevenção e o princípio da precaução esta na avaliação do risco que ameaça o meio ambiente. A precaução é considerada quando o risco é elevado – tão elevado que a total certeza científica não deve ser exigida antes de se adotar uma ação corretiva, devendo ser aplicado naqueles casos em que qualquer atividade possa resultar em danos duradouros ou irreversíveis ao meio ambiente, assim com naqueles casos em que o benefício derivado da atividade é completamente desproporcional ao impacto negativo que essa atividade pode causar ao meio ambiente.[4]

Constata-se, portanto, que a noção de prevenção diz respeito ao conhecimento antecipado dos sérios danos que podem ser causados ao bem ambiental em determinada situação e a realização de providências para evitá-los. Já se verifica um nexo de causalidade cientificamente demonstrável entre uma ação e a concretização de prejuízos ao meio ambiente.

2.3      PRINCÍPIO DO POLUIDOR-PAGADOR E DO USUÁRIO-PAGADOR

Traduz-se na obrigação do empreendedor de internalizar custos de modo a efetivar o Princípio da Prevenção, Tal princípio se mostra importante pois com sua aplicação fica o gerador dos abalos ambientais responsabilizados por custear as ações de precaução, prevenção e reparação dos danos, não recaindo sobre o Estado e, consequentemente, na sociedade, a obrigação de desembolsar por atividades empresariais.

Tal princípio está expresso pelo Princípio 16 da Declaração do Rio/92:

Princípio 16: As autoridades nacionais devem procurar promover a internacionalização dos custos ambientais e o uso de instrumentos econômicos, tendo em vista a abordagem segundo a qual o poluidor deve, em princípio, arcar com o custo da poluição, com a devida atenção ao interesse público e sem provocar distorções no comércio e nos investimentos internacionais.

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No entanto, não se pode conferir ao Poluidor-pagador a faculdade de poluir ilimitadamente, já que é responsável pela internalização dos custos reparatórios necessários. Ao contrário, busca-se evitar que o dano ocorra.

Intimamente ligado a este instituto, é o do Usuário-pagador, que se refere àqueles que se utilizam de determinado recurso natural, ainda que como consumidor final, e que deverá arcar com todos os custos necessários para tornar possível tal uso.

Em verdade, o uso gratuito dos recursos naturais representa um enriquecimento ilícito do usuário, pois a comunidade, mesmo não utilizando esses recursos, acaba também onerada, e é tal procedimento que se pretende diluir com a aplicação do Princípio do Usuário-pagador.

2.4      PRINCÍPIO DA VEDAÇÃO AO RETROCESSO ECOLÓGICO

Em síntese, por esse princípio, qualquer política que venha a ser adotada, seja pautada em legislações ou em atos de governo, deve, obrigatoriamente, observar o que já fora disposto sobre a proteção do meio ambiente, não podendo retroceder no sentido de diminuir ou abolir os meios de proteção já existentes.

Nesse sentido, temos que a CF/88 elevou o meio ambiente sustentável a direito/dever de toda a sociedade, devendo o Estado e os cidadãos primarem por sua especial proteção. Assim foi que o constituinte originário, com seu poder ilimitado, dispôs.

Logo, a legislação infraconstitucional, que deve sempre se encontrar em estrita consonância com os termos da Carta Maior, não pode recuar para diminuir, revogar ou modificar o que antes tido por prioridade. Da mesma maneira, as leis que se sobreporem temporalmente a outras em matéria ambiental não podem diminuir o que antes adquirido como meios de proteção ao meio ambiente.

2.5      PRINCÍPIO DA RESPONSABILIDADE

           

            Por esse princípio há responsabilidade daqueles que aqueles que expões o meio ambiente a perigo, degradando-o, a arcar com todos os custos envolvidos para a reparação de eventuais danos, compensando-o sempre que possível.

            Tal responsabilidade é observada nos âmbitos administrativo e penal, independentemente da obrigação de reparar o dano causado, sendo imposta a pessoa física ou jurídica, nos termos do artigo 225, §3º da Constituição Federal, o que também pode ser observado na primeira parte do inciso VII, do artigo 4º, da Lei 6.938/81, bem como no inciso IX, do artigo 9º desse mesmo diploma legal.

            Também a Declaração do Rio de Janeiro sobre Meio Ambiente e Desenvolvimento, em seu Princípio 13, estatuiu que:

Os Estados irão desenvolver legislação nacional relativa à responsabilidade e à indenização das vítimas de poluição e de outros danos ambientais. Os Estados irão também cooperar, de maneira expedita e mais determinada, no desenvolvimento do direito internacional no que se refere à responsabilidade e à indenização por efeitos adversos dos danos ambientais causados, em áreas fora de sua jurisdição, por atividades dentro de sua jurisdição ou sob seu controle.

            Por fim, cabe frisar a possibilidade de responsabilização da pessoa jurídica pelos danos ambientais causados em virtude da atividade econômica que desenvolva.

2.6      PRINCÍPIO DO DESENVOLVIMENTO SUSTENTÁVEL

            Por muitos considerado como condensador dos princípios do usuário e poluidor pagador, reparação, acesso equitativo aos recursos naturais, precaução e prevenção, o Princípio do Desenvolvimento Sustentável, nos moldes do que dispõe o relatório intitulado “Nosso futuro comum” (Relatório Brundtland), publicado pela chamada Comissão Mundial sobre o Meio Ambiente e Desenvolvimento, presidida pela médica Gro Harlem Brundtland:

O desenvolvimento sustentável é o desenvolvimento que encontra as necessidades atuais sem comprometer a habilidade das futuras gerações de atender suas próprias necessidades.

(...)

            Em outras palavras, pelo desenvolvimento sustentável deve-se entender a necessidade de que a exploração dos recursos naturais, o desenvolvimento tecnológico e as diretrizes institucionais, sejam públicas ou privadas, se mostrem aptas a garantir a perpetuação da vida e saúde da população presente e das vidas futuras, o que deve ser encarado como processo de mudança de culturas e paradigmas pela qual todos temos que passar.

           

3.         O LICENCIAMENTO AMBIENTAL COMO CONSEQUÊNCIA DO EPIA-RIMA E INSTRUMENTO DE EFICÁCIA DOS PRINCÍPIOS DA PRECAUÇÃO E DA PREVENÇÃO.

No Brasil, diversos são os instrumento de proteção ao meio ambiente, seja por disposições legais ou por políticas públicas implementadas pelo Estado. É nesse contexto, pois, que o EPIA-RIMA surge de modo a assegurar a observância aos princípios norteadores da proteção ambiental, mormente os da precaução e da prevenção.

Mais conhecidos por suas siglas EIA-RIMA, neste trabalho acrescentamos a inicial “P” (EPIA-RIMA) para indicar a necessidade de que o estudo seja PRÉVIO, o que, na atual conjuntura das instituições, merece especial relevo.

De início, cabe mencionar que o EPIA-RIMA já fora dispostos na Declaração do Rio/92, em seu Princípio 17:

Princípio 17: A avaliação do impacto ambiental, como instrumento nacional, será efetuada para as atividades planejadas que possam vir a ter um impacto adverso significativo sobre o meio ambiente e estejam sujeitas à decisão de uma autoridade nacional competente.

Também o texto constitucional traz a previsão/necessidade de se realizar estudo prévio para avaliação dos riscos decorrentes do início de determinada atividade agressora ao meio ambiente:

Art. 225. Todos têm direito ao meio ambiente ecologicamente equilibrado, bem de uso comum do povo e essencial à sadia qualidade de vida, impondo-se ao Poder Público e à coletividade o dever de defendê-lo e preservá- lo para as presentes e futuras gerações.

§ 1º - Para assegurar a efetividade desse direito, incumbe ao Poder Público:

(...)

IV - exigir, na forma da lei, para instalação de obra ou atividade potencialmente causadora de significativa degradação do meio ambiente, estudo prévio de impacto ambiental, a que se dará publicidade;

Intrinsecamente relacionado, pois, ao Princípio da Precaução, com o Estudo Prévio de Impacto Ambiental pretende-se conhecer antecipadamente os riscos, ponderando-se os meios para evitar ao máximo os prejuízos ambientais.

Os EPIA’s produzem informações sobre os efeitos ambientais a serem causados por empreendimentos e atividades econômicas, antes de serem implantados. Devem os estudos: i) descrever o empreendimentos e a situação do meio ambiente na área que estará sob sua influência; ii) apontar as consequências negativas e positivas, seus custos e quem será atingido/beneficiados por elas, e iii) Devem dar uma opinião clara sobre a gravidade daqueles efeitos ambientais, dizer se o empreendimento pode ser implantado ou não e, em caso positivo, quais as medidas que o Poder Público deve exigir ao empreendedor para controlar os impactos previstos, distribuir custos e benefícios.

Os relatórios de impacto sobre meio ambiente – RIMA, por sua vez, devem sintetizar os resultados dos estudos feitos nos EIA (sempre longos, escritos em linguagem técnica), em linguagem clara e acessível aos que não são especialistas. Não só a linguagem deverá ser adequada, mas também os documentos deverão estar acessíveis à consulta pelos Interessados. Se o público pedir, também tem o direito de acesso aos EIA.[5]

Conforme exposto por Paulo Affonso Leme Machado[6], temos que o EPIA compreende o levantamento da literatura científica e legal pertinente, trabalhos de campo, análises de laboratórios e a própria confecção do relatório. O RIMA, por sua vez, "refletirá as conclusões do Estudo de Impacto Ambiental" (art. 9º da Resolução 001/86 do Conama). O EIA é realizado previamente ao RIMA, sendo a base para elaboração do relatório.

Paulo Affonso, releva, ainda, que o Relatório de Impactos Ambientais "transmite - por escrito - as atividades totais do estudo de impacto ambiental, importando acentuar que não se pode criar uma parte transparente das atividades (o RIMA) e uma parte não transparente das atividades (o EIA). Dissociado do EIA, o RIMA perde validade"[7].

Os EIA-RIMA são os primeiros instrumentos criados no Brasil para informar com antecedência ao Poder Público e à própria sociedade quais os custos e benefícios ambientais de atividades econômicas e obras, e sobre quem eles vão recair. Portanto, eles tornam possível a discussão e obras pela sociedade antes que elas se tornem um fato consumado. São documentos obrigatórios para muitos empreendimentos, exemplificados na lista da resolução n° 001/86 do CONAMA (Conselho Nacional do Meio Ambiente). Mas, a rigor, o Poder Público pode pedir um EPIA-RIMA para todo e qualquer empreendimento não listado.

Importa destacar que, ainda que financiado com dinheiro do empreendedor, o EPIA-RIMA não é um documento de sua propriedade, mas sim um documento público, uma peça fundamental para o licenciamento ambiental. Tem que ser feito com rigor técnico e científico, isenção em relação aos interesses particulares, compromisso integral com o interesse público. Ele é o documento técnico que fundamenta da decisão do Poder Público sobre o licenciamento, e determina os custos ambientais que serão pagos pelo empreendedor.

Tratam-se de análises feitas por equipes de especialistas sobre obras e atividades que podem modificar o meio ambiente. Tais estudos são peças obrigatórias para o licenciamento das obras, pois, a falta de um laudo positivo, o empreendedor não ganha a licença ambiental, que é condição necessária para implantar sua obra ou atividade[8].

Na prática, todas as obras e atividades econômicas capazes de interferir no ambiente devem se licenciar junto ao órgão de controle ambiental de cada Estado, para poder se implantar. Este licenciamento ambiental é composto por três licenças: licença prévia, licença de construção e licença de operação.

Nos termos da Resolução 237 do CONAMA, pois, em seu artigo 1º, Licenciamento Ambiental é o

procedimento administrativo pelo qual o órgão ambiental competente licencia a localização, instalação, ampliação e a operação de empreendimentos e atividades utilizadoras de recursos ambientais , consideradas efetiva ou potencialmente poluidoras ou daquelas que, sob qualquer forma, possam causar degradação ambiental, considerando as disposições legais e regulamentares e as normas técnicas aplicáveis ao caso.

O artigo 3º da mesma resolução dispõe sobre a necessidade de prévio estudo ambiental para que efetivado o licenciamento:

A licença ambiental para empreendimentos e atividades consideradas efetiva ou potencialmente causadoras de significativa degradação do meio dependerá de prévio estudo de impacto ambiental e respectivo relatório de impacto sobre o meio ambiente (EIA/RIMA), ao qual dar-se-á publicidade, garantida a realização de audiências públicas, quando couber, de acordo com a regulamentação.

Parágrafo único. O órgão ambiental competente, verificando que a atividade ou empreendimento não é potencialmente causador de significativa degradação do meio ambiente, definirá os estudos ambientais pertinentes ao respectivo processo de licenciamento.

O mesmo do que previsto no artigo 10, da Lei 6.938/81, que estabelece a Política Nacional do Meio Ambiente:

Art. 10.  A construção, instalação, ampliação e funcionamento de estabelecimentos e atividades utilizadores de recursos ambientais, efetiva ou potencialmente poluidores ou capazes, sob qualquer forma, de causar degradação ambiental dependerão de prévio licenciamento ambiental.

Nesse contexto, desde logo percebemos a intrínseca relação existente entre o EPIA-RIMA e o licenciamento ambiental, sendo aquele requisito para que este possa ser analisado, o que não quer dizer liberado, autorizado, posto que para que o empreendimento conquiste as licenças necessárias para que inicie sua operação outra série de pressupostos devem ser cumpridos.

Iniciemos, pois, a expor quais licenças são necessárias à operação de determinado empreendimento.

A primeira delas é a Licença Prévia (LP). Para que seja concedida é necessária a aprovação do local do empreendimento e sua concepção, bem como atestada a viabilidade ambiental, bem como sejam estabelecidos requisitos básicos e condicionantes que devem ser atendidos para as próximas fases.

Importa salientar, porém, que mesmo para a concessão da licença prévia condicionantes podem ser fixadas, de modo que, não cumpridas, obstam o prosseguimento do processo de licenciamento.

Tal procedimento pode ser vivenciado no mundo jurídico com o Acórdão referente ao julgamento da Apelação nº 0025999-75.2010.4.01.3900 / PA, do Tribunal Federal da 1ª Região, de relatoria do D. Desembargador Souza Prudente, que vale ser transcrito parcialmente, ao analisar o procedimento para licenciamento da Usina hidrelétrica de Belo Monte, no estado do Pará[9]:

CONSTITUCIONAL, ADMINISTRATIVO E AMBIENTAL. AÇÃO CIVIL PÚBLICA. EXPLORAÇÃO DE RECURSOS ENERGÉTICOS. UHE BELO MONTE. COMPROMETIMENTO DO DIAGNÓSTICO DE VIABILIDADE AMBIENTAL. DESCONSIDERAÇÃO DAS CONCLUSÕES DA PARTICIPAÇÃO POPULAR (AUDIÊNCIAS PÚBLICAS). POSTERGAÇÃO INDEVIDA DO PROGNÓSTICO DA QUALIDADE DA ÁGUA. AUSÊNCIA DE AVALIAÇÃO INDIVIDUALIZADA DA EFICIÊNCIA DAS MEDIDAS MITIGADORAS DE IMPACTOS NEGATIVOS. INVALIDADE DA DECLARAÇÃO DE RESERVA DE DISPONIBILIDADE HÍDRICA - DRDH. NULIDADE DA LICENÇA PRÉVIA N° 342/2010. AGRESSÃO AOS PRINCÍPIOS DE ORDEM PÚBLICA DA PRECAUÇÃO, DA PREVENÇÃO, DA PROIBIÇÃO DO RETROCESSO ECOLÓGICO E DO DESENVOLVIMENTO SUSTENTÁVEL (CF, ARTS. 170, INCISOS I E VI, E 225, CAPUT).  I - Na visão hermenêutica do Supremo Tribunal Federal, "a suspensão de liminar é medida gravíssima, de profunda invasividade, na medida em que dispensa ampla cognição, bem como contraditório completo. Ademais, as contracautelas extraordinárias estão disponíveis apenas ao poder público, que não as pode utilizar como sucedâneo recursal nem como imunização à observância de decisões judiciais proferidas segundo o devido processo judicial regular." (SL 712/MG - DJ-e de 28/8/2013). 

(...)

VI - A tutela constitucional, que impõe ao Poder Público e a toda coletividade o dever de defender e preservar, para as presentes e futuras gerações, o meio ambiente ecologicamente equilibrado, essencial à sadia qualidade de vida, como direito difuso e fundamental, feito bem de uso comum do povo (CF, art. 225, caput), já instrumentaliza, em seus comandos normativos, o princípio da precaução (quando houver dúvida sobre o potencial deletério de uma determinada ação sobre o ambiente, toma-se a decisão mais conservadora, evitando-se a ação) e a conseqüente prevenção (pois uma vez que se possa prever que uma certa atividade possa ser danosa, ela deve ser evitada). No caso concreto, impõe-se com maior rigor a observância desses princípios, por se tratar de tutela jurisdicional em que se busca, também, salvaguardar a proteção da posse e do uso de terras indígenas, com suas crenças e tradições culturais, aos quais o Texto Constitucional confere especial proteção (CF, art. 231, §§ 1º a 7º), na linha determinante de que os Estados devem reconhecer e apoiar de forma apropriada a identidade, cultura e interesses das populações e comunidades indígenas, bem como habilitá-las a participar da promoção do desenvolvimento sustentável (Princípio 22 da ECO-92, reafirmado na Rio + 20).  VII - Nesse contexto, a Comissão Interamericana de Direitos Humanos, com base no Parecer técnico 21/2009 da FUNAI, outorgou a Medida Cautelar 382/10, revisada em 29 de julho de 2011, determinando ao Estado brasileiro que adote urgentes providências para "1) proteger a vida, a saúde e integridade pessoal dos membros das comunidades indígenas em situação de isolamento voluntário da bacia do Xingu, e da integridade cultural das mencionadas comunidades, que incluam ações efetivas de implementação e execução das medidas jurídico-formais já existentes, assim como o desenho e implementação de medidas especificas de mitigação dos efeitos que terá a construção da represa Belo Monte sobre o território e a vida destas comunidades em isolamento; 2) adote medidas para proteger a saúde dos membros das comunidades indígenas da bacia do Xingu afetadas pelo projeto Belo Monte, que incluam (a) a finalização e implementação aceleradas do Programa Integrado de Saúde Indígena para a região da UHE Belo Monte, e (b) o desenho e implementação efetivos dos planos e programas especificamente requeridos pela FUNAI no Parecer Técnico 21/09, recém enunciados; e 3) garanta a rápida finalização dos processos de regularização das terras ancestrais dos povos indígenas na bacia do Xingu que estão pendentes, e adote medidas efetivas para a proteção dos mencionados territórios ancestrais ante a apropriação ilegítima e ocupação por não-indígenas, e frente a exploração ou o deterioramento de seus recursos naturais".  VIII - No caso concreto, subsistindo sérias dúvidas acerca da viabilidade ambiental do empreendimento hidrelétrico em questão, mormente em face do conjunto fático-probatório carreado para os autos, impõe-se a realização de estudos complementares, antes da sua implementação, sob pena de violação aos princípios da precaução, da prevenção, da proibição do retrocesso ecológico e do desenvolvimento sustentável (CF, arts. 170, incisos I e VI, e 225 caput). 

(...)

XII - Nos termos do art. 2º da Resolução CONAMA nº 1/1986, o licenciamento ambiental de empreendimento hidrelétrico dependerá de prévio Estudo de Impacto Ambiental e de Relatório de Impacto Ambiental (EIA/RIMA), devendo constar, no primeiro, necessariamente, além de outros requisitos, a "definição das medidas mitigadoras dos impactos negativos, entre elas os equipamentos de controle e sistemas de tratamento de despejos, avaliando a eficiência de cada uma delas" (art. 6º, inciso III), hipótese não ocorrida, na espécie dos autos.  XIII - Em face do que dispõe o art. 8º, inciso I, da Resolução CONAMA nº 237/1997, a emissão da Licença Prévia atesta a viabilidade ambiental do empreendimento, razão por que, em se tratando de aproveitamento de recursos hídricos, como na espécie, deve ser precedida, dentre outras medidas, de competente prognóstico da qualidade da água, como suporte do exame da viabilidade ambiental, não se admitindo a sua inclusão como condicionante da Licença Prévia, conforme assim o fez o órgão ambiental na hipótese em comento.  XIV - Dispõe o art. 7º, caput, da Lei nº 9.984/2000, que "para licitar a concessão ou autorizar o uso de potencial de energia hidráulica em corpo de água de domínio da União, a Agência Nacional de Energia Elétrica - ANEEL deverá promover, junto à ANA, a prévia obtenção de declaração de reserva de disponibilidade hídrica", sendo que a referida declaração será automaticamente transformada, pelo poder outorgante, em outorga de direito de uso de recursos hídricos ao empreendedor (§ 2º). No caso em exame, uma vez emitida a Declaração de Reserva de Disponibilidade Hídrica - DRDH, por intermédio da Resolução ANA nº 240/2009, sobrevindo a alteração dos pressupostos fáticos que fundamentaram a sua emissão - no caso, a alteração do Hidrograma de Consenso que lhe serviu de base - impõe-se a emissão de nova Declaração, pelo órgão administrativo competente (Agência Nacional de Águas - ANA) ante a manifesta invalidade daquela anteriormente expedida.  XV - Há de se destacar, na espécie, a inteligência revelada pelo colendo Tribunal de Contas da União, firme no entendimento de que o órgão ambiental não poderá admitir a postergação de estudos de diagnóstico próprios da fase prévia para as fases posteriores sob a forma de condicionantes do licenciamento (Acórdão 1.869/2006-Plenário-TCU, item 2.2.2).  XVI - "O Direito Ambiental contém uma substância estreitamente vinculada ao mais intangível dos direitos humanos: o direito à vida, compreendido como um direito de sobrevivência em face das ameaças que pesam sobre o Planeta, pelas degradações múltiplas do meio onde estão os seres vivos. Essa substância, entretanto, é um conjunto completo, cujos elementos são interdependentes. Daí, uma regressão local, mesmo que limitada, pode ensejar outros efeitos, noutros setores do ambiente. Tocar numa das pedras do edifício pode levar ao seu desabamento. É por isso que os juízes que terão o trabalho de mensurar até onde se poderá regredir sem que isso implique condenar o edifício, deverão ir além da jurisprudência antiga, relativa à intangibilidade dos direitos tradicionais, imaginando uma nova escala de valores, para melhor garantir a sobrevivência do frágil equilíbrio homem-natureza, considerando a globalização do ambiente" (Michel Prieur, in "o Princípio da Proibição do Retrocesso Ambiental" - Ed. Do Senado Federal - 2011, pags. 19/20 e 48).  "Também os juízes devem ter em mente que os instrumentos do Direito Ambiental não corroem, nem ameaçam a vitalidade produtiva do Brasil e a velocidade de sua inclusão entre as grandes economias do Planeta; tampouco pesam na capacidade financeira do Estado ou se apresentam como contrabando legislativo, devaneio imotivado de um legislador desavisado ou irresponsável. Ao contrário, se inserem no âmbito da função social e da função ecológica da propriedade, previstas na Constituição de 1988 (arts. 5º XXIII, e 186, II, respectivamente).  Conseqüentemente, reduzir, inviabilizar ou revogar leis, dispositivos legais e políticas de implementação de proteção da natureza nada mais significa, na esteira da violação ao princípio da proibição do retrocesso ambiental, que conceder colossal incentivo econômico a quem não podia explorar (e desmatar) partes de sua propriedade e, em seguida, com a regressão, passar a podê-lo. Tudo às custas do esvaziamento da densificação do mínimo ecológico constitucional.  Retroceder agora, quando mal acordamos do pesadelo da destruição ensandecida dos processos ecológicos essenciais nos últimos 500 anos, haverá de ser visto, por juízes, como privatização de inestimável externalidade positiva (= os serviços ecológicos do patrimônio natural intergeracional), que se agrega à também incalculável externalidade negativa (= a destruição de biomas inteiros), que acaba socializada com toda a coletividade e seus descendentes" (Herman Benjamin, in "o Princípio da Proibição do Retrocesso Ambiental" - Ed. Do Senado Federal - 2011, pags. 70/72).  XVII - Apelação parcialmente provida. Sentença reformada, em parte, para julgar parcialmente procedentes os pedidos e declarar: (a) a nulidade da Licença Prévia nº 342/2010, outorgada pelo Instituto Brasileiro do Meio Ambiente e dos Recursos Naturais Renováveis - IBAMA, em favor da UHE Belo Monte, devendo a referida autarquia se abster de emitir nova licença enquanto não integralmente sanadas as irregularidades apontadas; (b) a invalidade da Declaração de Reserva de Disponibilidade Hídrica - DRDH, a que se reporta a Resolução/ANA n.° 740/2009, devendo a emissão de outra declaração ser precedida de análise, pela Agência Nacional de Águas - ANA, da nova situação surgida com a alteração do hidrograma apresentado no EIA/RIMA; e (c) a inviabilidade ambiental do projeto UHE Belo Monte e do Hidrograma proposto pelo órgão licenciador do Trecho da Vazão Reduzida - TVR, no contexto aqui exposto.  XVIII - Diante do estágio atual em que se encontram as obras do empreendimento hidrelétrico descrito nos autos e com vistas na eficácia plena do julgado, em face do seu caráter mandamental-inibitório, determina-se, nos termos do art. 11 da Lei nº 7.347/85 e do art. 461, § 5º, do CPC, que sejam sanadas as irregularidades aqui apontadas, no prazo de 90 (noventa) dias, devendo as promovidas, no raio de suas respectivas competências institucionais, iniciar as medidas necessárias ao efetivo cumprimento desta ordem mandamental, no prazo de 10 (dez) dias, a contar da intimação deste julgado, sob pena de multa pecuniária, no valor de R$ 500.000,00 (quinhentos mil reais), por dia de atraso (CPC, art. 461, § 5º), que deverá ser revertida ao fundo a que alude o art. 13 da Lei nº. 7.347/85, sem prejuízo das sanções criminais, cabíveis na espécie (CPC, art. 14, inciso V e respectivo parágrafo único) e imediata suspensão das aludidas obras da UHE Belo Monte. (AC 0025999-75.2010.4.01.3900 / PA, Rel. DESEMBARGADOR FEDERAL SOUZA PRUDENTE, QUINTA TURMA, e-DJF1 p.360 de 22/04/2014) – grifamos.

A decisão acima transcrita nada mais que revela, de forma exemplar, técnica e em atenção à efetiva proteção do meio ambiente, que a primeira fase do licenciamento ambiental não se trata de mera formalidade, mas, ao contrário, merece especial atenção por traduzir os anseios daquele que causará prejuízo ao meio ambiente e, por consequência, à toda coletividade.

A segunda licença a ser buscada pelo interessado é a Licença de Instalação, pela qual é autorizada a “instalação do empreendimento ou atividade de acordo com as especificações constantes dos planos, programas e projetos aprovados, incluindo as medidas de controle ambiental e demais condicionantes, da qual constituem motivo determinante” (Artigo 8º, Inciso II, Resolução CONAMA 237).

Nessa fase do procedimento licenciatório, o empreendedor deve se comprometer a manter a compatibilidade entre o projeto final e as condições estabelecidas quando deferido o licenciamento na fase anterior, conforme bem esclarecido por Taden Farias ao afirmar que “qualquer alteração na planta ou nos sistemas instalados deve ser formalmente enviada ao órgão licenciador, para que ele possa expressar a sua concordância”[10].

Com o deferimento, pois, da licença de operação, fica o empreendedor autorizado a realizar as obras necessárias ao inícios da operações, mas não iniciar a produção em si, que apenas será autorizada após superada a próxima fase do licenciamento, com a concessão da Licença de Operação.

A Licença de Operação, nos moldes do que dispõe o artigo 8º, inciso III, da Resolução 237/CONAMA, visa autorizar a

a operação da atividade ou empreendimento, após a verificação do efetivo cumprimento do que consta das licenças anteriores, com as medidas de controle ambiental e condicionantes determinados para a operação.

Após minucioso controle e verificação pelo órgão licenciador e verificado que o empreendimento cumpre todas as condicionantes impostas para a concessão das licenças anteriores, em especial as condições ambientais, conforme bem esclarecido por Talden Farias[11]:

Trata-se de ato administrativo conclusivo pelo qual o órgão licenciador autoriza o início das atividades, depois da verificação da verificação do efetivo cumprimento do que consta nas licenças anteriormente concedidas, por meio da avaliação dos sistemas de controle e monitoramento ambiental propostos e considerando as disposições legais e regulamentares aplicáveis ao caso específico.

Nesse sentido, pois, nítida a intrínseca relação destes instrumentos com os princípios norteadores da Precaução e da Prevenção, como meio viabilizador da aplicação destes de modo a garantir segurança ao meio ambiente ecologicamente equilibrado.

Ora, se a precaução revela-se nos atos que de preservação sempre que houver dúvida sobre o potencial danoso de uma determinada ação sobre o ambiente, tomando-se a decisão mais conservadora de modo a evitar a ação, tal é o conceito e finalidade do EIA-RIMA, que embasará, posteriormente, os requisitos para o licenciamento ambiental.

CONCLUSÃO

Neste trabalho fora feita uma singela abordagem sobre a relação existente entre o EIA-RIMA e os princípios da precaução e da prevenção, de modo a indicar aquele como meio viabilizador para conferir eficácia a estes, com o fim de proteção ao meio ambiente ecologicamente equilibrado.

Para que se possa melhor entender sobre o bem tutelado pelo direito ambiental, é necessário melhor compreender sobre os princípios norteadores do Direito Ambiental, quais sejam: Princípio da precaução, Princípio da prevenção, Princípio do Poluidor-Pagador e Usuário-Pagador, Princípio da vedação ao retrocesso, da Responsabilidade e do Desenvolvimento Sustentável.

Por toda exposição, percebe-se que todo e qualquer empreendimento deverá ser antecedido por estudo técnico especializado e minucioso que indique quais serão os efeitos sobre o meio ambiente a fim de conferir eficácia ao princípio da precaução, no sentido de que, conhecidos previamente os impactos ambientais, desde logo o empreendedor internalize todos os custos e ações necessárias à atenuação dos efeitos de tais impactos.

Ainda, já prescritos os impactos possíveis, antecipado o conhecimento das medidas necessárias caso os impactos ambientais causados gerem dano ao meio ambiente, de modo a conferir plena eficácia às ações de prevenção, ou seja, de reparação.

Desse modo, forçoso concluir que a correta aplicação e confecção do Estudo Prévio de Impactos Ambientas e do Relatório de Impactos Ambientais viabiliza o que necessário à preservação e, ao mesmo tempo, da reparação do meio ambiente em razão dos impactos ambientas causados por qualquer tipo de empreendimento. E isso, nada mais é do que conferir eficácia aos princípios norteadores e basilares do meio ambiente ecologicamente equilibrado – Princípio da Precaução (preservação) e Princípio da Prevenção (reparação).

REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS

______. Resolução CONAMA nº 001, de 23 de janeiro de 1986. Disponível em: <http://www.mma.gov.br/port/conama/res/res86/res0186.html. Acesso em: 25. mai. 2017.

______. Resolução CONAMA nº 237, de 19 de dezembro de 1997 Disponível em: <http://www.mma.gov.br/port/conama/res/res97/res23797.html. Acesso em: 25. mai. 2017.

______. Lei   6.938, de 31 de agosto de 1981. Dispõe sobre a Política Nacional do Meio Ambiente, seus fins e mecanismos de formulação e aplicação, e dá outras providências. Disponível em: <http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/leis/L6938.htm. Acesso em: 25. mai. 2017.

BRASIL. Constituição (1988). Constituição da República Federativa do Brasil. Disponível em:  <http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/constituicao/constituicao .htm> . Acesso em: 29. out. 2014.

FARIAS, Talden. Introdução ao Direito Ambiental. Belo Horizonte: Del Rey, 2009.

GRANZIERA, Maria Luiza Machado. Direito ambiental. São Paulo: Atlas, 2009.

KISS, Alexandre. Os direitos e interesses da gerações futuras e o princípio da precaução, In: CUREAU, Sandra. Direito Ambiental. Rio de Janeiro: Alsevier, 2013.

MACHADO, Paulo Affonso Leme. Direito Ambiental Brasileiro. São Paulo: Malheiros, 2005.

MACHADO, Paulo Affonso Leme. Direito Ambiental Brasileiro. São Paulo: Malheiros, 2001.

NEVES, Estela & TOSTES, André. Meio Ambiente: a lei em suas mãos, Rio de Janeiro: CEPIP/VOZES, 1992.

TOLEDO, Francisco de Assis. Princípios básicos de direito penal. 5 ed. São Paulo: Saraiva, 1994.


[1] MACHADO, Paulo Affonso Leme. Direito Ambiental Brasileiro. São Paulo: Malheiros, 2001. Pg. 57.

[2] apud MACHADO, 1, p. 58.

[3] AYALA, Patrick Araújo, in: LEITE, Rubens Moraes (Org.). Inovações em Direito Ambiental. Florianópolis: Fundação Borteux, 2000, p. 73.

[4] KISS, Alexandre. Os direitos e interesses da gerações futuras e o princípio da precaução, In: CUREAU, Sandra. Direito Ambiental. Rio de Janeiro: Alsevier, 2013 p. 53.

[5] FORNASARI FILHO, N. & BITAR, O.Y. O meio físico em estudos de impacto ambiental-EIAs. In: BITAR, O.Y. (Coord.). Curso de geologia aplicada ao meio ambiente. São Paulo: Associação Brasileira de Geologia de Engenharia (ABGE) e Instituto de Pesquisas Tecnológicas (IPT), 1995. cap. 4.1, p.151-163.

[6] MACHADO, P.A.L. Direito ambiental brasileiro. 5ª ed. São Paulo: Malheiros Editores, 1995. 696p.

[7] MACHADO, P.A.L. Direito ambiental brasileiro. 5ª ed. São Paulo: Malheiros Editores, 1995. 696p.

[8] NEVES, Estela & TOSTES, André. Meio Ambiente: a lei em suas mãos, Rio de Janeiro: CEPIP/VOZES, 1992, p. 39-57.

[9] AC 0025999-75.2010.4.01.3900 / PA, Rel. DESEMBARGADOR FEDERAL SOUZA PRUDENTE, QUINTA TURMA, e-DJF1 p.360 de 22/04/2014

[10] FARIAS, Talden. Introdução ao Direito Ambiental. Belo Horizonte: Del Rey, 2009, p. 117.

[11] FARIAS, Talden. Introdução ao Direito Ambiental. Belo Horizonte: Del Rey, 2009, p. 118.

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Sobre o autor
Filipe Lima Guedes

Advogado. Professor. Consultor UNESCO.

Informações sobre o texto

Este texto foi publicado diretamente pelos autores. Sua divulgação não depende de prévia aprovação pelo conselho editorial do site. Quando selecionados, os textos são divulgados na Revista Jus Navigandi

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