6. PROVA ILÍCITA
Segundo o Código de Processo Civil, determinada a inspeção, o juiz deverá designar dia, hora e local da inspeção, intimando as partes para que possam, se quiserem acompanhá-la. Para parte da doutrina, as partes tem sempre direito a assistir à inspeção, prestando esclarecimento e fazendo observações que reputem de interesse para a causa. Concluída a diligência, o juiz mandará lavrar auto circunstanciado, mencionando nele tudo quanto for útil ao julgamento da causa, podendo o auto ser acompanhado de desenho, gráfico ou fotografia.
Prova ilícita, é aquela que na sua essência infringe a norma protecionista processual ou material. Antes de uma prova ser considerada ilícita, é necessário observar se houve alguma inobservância da norma. O princípio da legalidade é primordial para análise da prova, pois segundo este preceito de origem constitucional, ninguém tem a obrigação de fazer ou deixar de fazer alguma coisa que antes não seja assegurado por uma lei. Portanto, a prova ilícita é principalmente constituída se houver desconformidade com a norma. A prova ilícita torna-se inutilizável e não pode ser considerada no processo.
O art. 5º, LVI, da Constituição Federal instituiu o princípio e vedou o uso de provas obtidas por meios ilícitos. Na literalidade da norma, dispõe-se o seguinte: “LVI – são inadmissíveis, no processo, as provas obtidas por meios ilícitos”. Portanto, no processo, as provas de caráter ilícito não podem ser admitidas.
Na doutrina, a prova ilícita pode ser dividida em duas vertentes: Prova ilícita e ilegítima. Segundo Daniel Amorim Assunção Neves (2015, p.509):Prova ilegítima, quando violar norma de direito processual, verificável no momento da produção da prova no processo; Prova ilícita, quando violar norma de direito substancial, verificável no momento da colheita da prova.
Por conseguinte, prova ilegítima é aquela que infringe norma processual. É a prova que possui violações no momento de produção probatória em juízo. Por exemplo, obtenção de depoimento de advogado que possui a proteção de não depor consequentemente pelo sigilo profissional amparado por lei. Prova ilícita é aquela que fere norma de direito material. Embora o direito material e processual estejam ligados, possuem diferenças, pois um é o complemento do outro. Sendo assim, a maior diferença de provas ilícitas e ilegítimas é que enquanto um fere norma de direito material, outra fere norma processual. Enquanto a primeira é retirada do processo, a segunda é anulada e pode ser solicitada a sua realização pela segunda vez. É o caso da perícia feita por um perito que não tem capacidade científica e técnica ou não foi nomeado para realizar tais procedimentos. Este tipo de prova possui vícios no que diz respeito a sua feitura, sendo assim, a essência da prova torna-se de caráter duvidoso. Neste caso, o que resta ao magistrado é anular a prova e solicitar segunda perícia com o perito habilitado para tanto. No entanto, ambas são vedadas pelo ordenamento jurídico. Daniel Amorim Neves, (2015, p.509) sobre prova ilegítima explica:
A ilegitimidade, assim, diz respeito ao modo pelo qual a prova foi obtida, em situação na qual o meio de prova em si é jurídico e permitido pela lei, mas a forma de produção de prova é viciada, como a colheita de prova testemunhal mediante ameaça de morte ou qualquer outra espécie de coação, bem como a assinatura de contrato sob tortura. A ilicitude se daria quando o próprio meio de produção da prova é injurídico ou imoral, como as gravações clandestinas de conversas telefônicas ou filmagens também clandestinas sem a devida autorização judicial.
Portanto, a ilegitimidade da prova tem relação com a forma em que a prova foi produzida. Qualquer forma de coação é proibida por lei. O magistrado no momento da audiência não pode forçar a testemunha ou a parte a confessar ou dizer algo que ela não queira. Durante a audiência de instrução, o juiz formula perguntas às testemunhas e às partes. Esse procedimento é uma fonte de colheita de provas. Porém, os advogados devem estar atentos com o tipo de pergunta formulada pelo juiz. Perguntas podem ser feitas de forma tendenciosa ou com intuito apenas de fazer uma pressão psicológica. É normal que o empregado ou testemunhas estejam em audiência nervosos, pois não é fácil enfrentar o judiciário, estar frente a frente a um juiz e lidar com algo que não estão acostumados e com poder decisório sobre sua vida ou vida de alguém. Portanto, o juiz pode passar da linha da legalidade e empregar coação nas testemunhas. O momento de compromissá-la não pode ser o momento que deixem as testemunhas desconfortáveis e com sentimento de ameaça. A testemunha deve, portanto, saber e entender a seriedade e consequências de mentir em um depoimento, porém não deve se sentir constrangido a falar algo que não manifeste a sua vontade. Se for observado este tipo de conduta pelo magistrado, tal prova é ilegítima e não pode ser admitida no processo. O entendimento jurisprudencial é o do subsequente modo:
PROVA ILEGÍTIMA E PROVA ILÍCITA. Doutrina autorizada distingue prova ilegítima de ilícita. A primeira, contraria norma processual e se apura no momento da produção da prova no processo; a segunda, fere o direito material e se apura no momento da colheita da prova (fase extraprocessual). Num e noutro caso, as regras de produção dos elementos da lide se aportam na obtenção deles através da eticidade e do direito material, atingindo todo e qualquer meio de prova. Processo não pode ser dicotomizado de modo a dar trato diferenciado à prova na sua gênese e, posteriormente, na sua função de instrumento revelador da verdade. Essa garantia não se alheia à conduta ilícita da parte para influir na atividade judicante. A invalidade da prova ilicitamente obtida vai à sanção antes do fato processual, por transgredir princípio de direito material. Documento assinado sob tortura, sob pressão, sob coação, ainda que suportando uma verdade, não poderia ser usado em processo sem que se convalide a própria tortura, apondo obstáculo elementar e repúdio à própria ilicitude.
(TRT-3 - RO: 2450508 00473-2008-134-03-00-1, Relator: Emilia Facchini, Nona Turma, Data de Publicação: 17/12/2008,DJMG . Página 19. Boletim: Não.)
RECURSO ORDINÁRIO. PROVA ILEGÍTIMA E PROVA ILÍCITA. SIGILO BANCÁRIO. LEI COMPLEMENTAR N.º 105/2001. . Doutrina autorizada distingue prova ilícita de ilegítima. Enquanto a primeira viola regra de direito material, a segunda ofende regra de direito processual. Outro fator distintivo atine ao momento da ilegalidade. A prova ilícita está atrelada ao momento da obtenção (que antecede a fase processual); já a prova ilegítima acontece no momento da produção da prova (dentro do processo), ou seja, a prova ilícita é extra-processual, ao passo que a ilegítima é intra-processual. Outra diferença que não pode deixar de ser sublinhada: a prova ilícita é inadmissível (não pode sequer ser juntada aos autos; se juntada deve ser desentranhada, não podendo ser renovada); a prova ilegítima, a seu turno, é nula (assim é declarada pelo juiz e deve ser refeita). Se no afã de comprovar o exercício de atividades alheias à lotação nominal para fins pecuniários, a parte carreia aos autos documentos cujo sigilo ...
(TRT-17 - RO: 00355008420095170141, Relator: DESEMBARGADORA ANA PAULA TAUCEDA BRANCO, Data de Publicação: 25/09/2012)
De acordo com a jurisprudência, a prova ilícita é totalmente desentranhada do processo. Possui efeito de total inexistência. Ela torna-se invalida na sua totalidade. É como se nunca estivesse existido no processo. Diferentemente da prova ilegítima que é considerada nula e pode ser refeita conforme as normas legais.
VIOLAÇÃO DO ARTIGO 896 DA CLT - PRELIMINAR DE NULIDADE DO ACÓRDÃO REGIONAL POR NEGATIVA DE PRESTAÇÃO JURISDICIONAL E HORAS EXTRAS - PROVA NULA - CONDENAÇÃO BASEADA EM DEPOIMENTO DE TESTEMUNHA QUE SE DIZ REVOLTADA COM O RECLAMADO. A condenação ao pagamento de horas extras deu-se em virtude da prova documental apresentada pelo reclamado (cartões de pontos com registros de horários quase invariáveis) e em virtude do depoimento do preposto da empresa que admitiu a prestação de serviços além do horário contratual, não havendo, pois, nenhuma omissão do Regional na análise da prova testemunhal apresentada pelo autor. Intactos os arts. 832 da CLT, 131, 405, § 3º, inciso IV, e 458 do CPC e 93, inciso IX, da Constituição Federal e, consequentemente, o art. 896 da CLT, uma vez que a revista não merecia conhecimento nestes temas. Embargos não conhecidos.
(TST – E-ED-RR: 7371904520015175555737190-45-2001.5.17.5555, Relator: Vantuil Abdala, Data de Julgamento: 02/04/2009. Subseção: 1 Especializada em Dissídios Individuais. Data de Publicação 17/04/2009)
Para Nelson Nery (1999, p.155) ao conceituar provas ilícitas, entende que há uma imprecisão sobre a diferenciação das provas ilegítimas e ilegais:
Conceituar prova obtida ilicitamente é tarefa da doutrina. Há alguma confusão reinando na doutrina a respeito do tema, quando se verifica o tratamento impreciso que se dá aos termos prova ilegítima, prova ilícita e prova ilegitimamente admitida, prova obtida ilegalmente. Utilizando, entretanto, a terminologia de prova vedada, sugerida por Nuvolone, tem-se que há a prova vedada em sentido absoluto (quando o sistema jurídico proíbe sua produção em qualquer hipótese) e em sentido relativo (há autorização do ordenamento, que prescreve, entretanto, alguns requisitos para a validade da prova). Resumindo a classificação de Nuvolone, verifica- se que a prova de natureza material, ou meramente processual. Ao contrário, será ilícita a prova quando sua proibição for de natureza material, vale dizer, quando for obtida ilicitamente.
A respeito dos meios que podem gerar uma prova que seja ilícita, Mauro Shiavi (2016, p.715) escreveu:
No âmbito da relação de trabalho, são muitas as hipóteses em que a prova para demonstração do dano moral pode ser obstruída por meio ilícito – por exemplo, câmeras colocadas no interior dos vestuários ou locais de privacidade dos trabalhadores, gravações telefônicas sem consentimento do outro interlocutor, documentos obtidos por furto do empregado, monitoração indevida de e-mails, entre outras hipóteses.
Portanto, quando se obtém provas sem a autorização do magistrado, ferindo normas de caráter material, conforme demonstrado acima, tem-se uma prova ilícita. Tanto a parte, como um terceiro pode invadir a intimidade da pessoa e conseguir provas forçadamente. A constituição não admite tal conduta. No entendimento de Alexandre de Moraes, as provas ilícitas diferenciam-se de provas ilegais e provas ilegítimas. (2004, p.126):
As provas ilícitas não se confundem com as provas ilegais e as ilegítimas. Enquanto, conforme já analisado, as provas ilícitas são aquelas obtidas com infringência ao direito material, as provas ilegítimas são as obtidas com desrespeito ao direito processual. Por sua vez, as provas ilegais seriam o gênero do qual as espécies são as provas ilícitas e as ilegítimas, pois, configuram-se pela obtenção com violação de natureza material ou processual ao ordenamento jurídico.
6.1. A prova ilícita no processo do trabalho
Na CLT não há previsão normativa das provas ilícitas. Porém, o processo do trabalho é subsidiário ao processo comum. Sendo assim, o Código de Processo Civil é utilizado como parâmetro para regular a admissibilidade ou inadmissibilidade das provas ilícitas no processo trabalhista.
É impreterível destacar, que o processo não pode ser anulado caso contenha provas ilícitas. Estas devem apenas ser retiradas do processo, considerando então, as provas lícitas e também provas que não tenham sido contaminas pela ilicitude probatória, conforme escreveu Renato Saraiva e Aryanna Manfredini (2015, p.353):
Cabe destacar que a simples presença de prova ilícita nos autos não invalida o processo. Portanto, retiradas as provas obtidas por meios ilícitos, caso ainda restem provas autônomas, independentes, não contaminadas por aquelas (provas ilícitas), deverá o magistrado dar prosseguimento ao processo. Em outras palavras, identificadas as “provas ilícitas” serão elas desentranhadas dos autos, continuando a correr o processo, desde que existam outras provas lícitas autônomas.
Sylvio Motta (2013, p.218) explica:
Em prosseguimento, deve-se observar que a Constituição não admite no processo provas obtidas por meios ilícitos, o que não significa que os processos que existam provas desta natureza tenham que ser anulados. Em outros termos: o fato, por si só, de haver prova viciada em um processo não é motivo para sua anulação. O que se invalida é a prova ilegal, bem como as demais a partir delas obtidas, determinando-se sua retirada dos autos. O processo, em si mesmo, não é atingido, permanecendo válidos os atos nele praticados, inclusive todas as provas produzidas regularmente que não decorram da prova ilícita.
A jurisprudência em relação às provas ilícitas no processo do trabalho, já se manifestou nos seguintes termos:
AGRAVO DE INSTRUMENTO. SALÁRIO POR FORA. PROVA ILÍCITA. VIOLAÇÃO DOS ARTIGOS 5º, X, XII E LVI, DA CONSTITUIÇÃO FEDERAL E 332 DO CPC. NÃO CONFIGURAÇÃO. DIVERGÊNCIA JURISPRUDENCIAL INESPECÍFICA. NÃO PROVIMENTO. 1. O egrégio Colegiado Regional, a partir da apreciação do conjunto fático-probatório existente nos autos, decidiu manter a sentença originária que condenou a reclamada a pagar as diferenças salariais relativas aos valores pagos -por fora-. 2. Não há como reconhecer a alegada divergência jurisprudencial, tampouco violação dos artigos 5 o , X, XII e LVI, da Constituição Federal e 332 do CPC, porquanto a egrégia Corte Regional não fundamentou sua decisão única e exclusivamente na gravação obtida de forma ilícita, mas sim nas várias provas existentes nos autos, e inclusive consignou que - Apesar de sustentar que aprova obtida pela Reclamante o foi por meios ilícitos o que é vedado, esta não foi a base da condenação do salário pago -por fora-3. Agravo de instrumento a que se nega provimento.
(TST - AIRR: 8747200552003502 8747200-55.2003.5.02.0900, Relator: Guilherme Augusto Caputo Bastos, Data de Julgamento: 06/05/2009, 7ª Turma,, Data de Publicação: 08/05/2009)
Na apreciação das provas, o juiz deve fazer a análise cuidando para que outros direitos fundamentais não sejam violados, como o direito a intimidade, a vida privada e entre outros. Segundo Mauro Shiavi, sobre o assunto, escreveu o seguinte (2016, p. 715):
A Constituição Federal, além de proibir a prova obtida por meio ilícito, tutela, no art. 5º, a inviolabilidade da intimidade, da vida privada, (inciso X), do domicílio (inciso XI) e da correspondência (inciso XII), como direitos de igual magnitude. Desse modo, deve o Juiz do Trabalho, ao apreciar a prova obtida por meio ilícito, ter bastante cautela, pois, ao admitir essa prova por uma das partes, pode estar violando um direito fundamental da parte contrária e até causar danos de ordem moral a esta última.
Deste modo, Mauro Shiavi, (2016, p. 716) estabeleceu alguns critérios de prudência no que diz respeito à análise das provas:
Por isso, acreditamos que o Juiz do Trabalho, ao analisar a pertinência ou não produção da prova obtida por meio ilícito como apta a demonstrar os danos de ordem moral, deve tomar as seguintes cautelas: Verificar se a prova do fato poderá ser obtida por outro meio lícito ou moralmente legítimo de prova, sem precisar recorrer à prova ilícita; Sopesar a lealdade e boa-fé da parte que pretende a produção da prova ilícita; Observar a seriedade e verossimilhança da alegação; Avaliar o custo-benefício na produção da prova; Aplicar o princípio da proporcionalidade, prestigiando o direito que merece maior proteção; Observar a efetiva proteção à dignidade da pessoa humana; Valorar não só o interesse da parte, mas também o interesse público;
Sendo assim, o magistrado trabalhista ao se deparar com um caso em que há provas ilícitas, deve examinar cada ponto, para verificar se realmente existe a necessidade delas serem consideradas e recebidas no processo.
6.2. Prova ilícita por derivação
A prova ilícita por derivação originária do Processo Penal Americano, teve sua origem nos Estados Unidos, com a criação da Teoria do Fruto da Árvore Envenenada. Quando a prova é obtida por meio de outra prova considerada ilícita, denomina-se prova ilícita por derivação.
A Teoria do Fruto da Árvore envenenada transmite o significado de que a árvore que está contaminada tem por consequência gerar frutos contaminados. Esta teoria aplica-se não somente no processo penal, como também no processo do trabalho. Se uma prova ilícita ao ser produzida ou após a sua produção gerar uma outra prova, ela se torna uma prova ilícita por derivação. Eugênio Pacelli (2008, p.301) sobre a teoria, escreveu:
A teoria dos fruits of the poisonous tree, ou teoria dos frutos da árvore envenenada, cuja origem é atribuída à jurisprudência norte-americana, nada mais é que simples consequência lógica da aplicação do princípio da inadmissibilidade das provas ilícitas. Se os agentes produtores da prova ilícita pudessem dela se valer para a obtenção de novas provas, a cuja inexistência somente se teria chegado a partir daquela (ilícita), a ilicitude da conduta seria facilmente contornável. Bastaria a observância da forma prevista em lei, na segunda operação, isto é, na busca das provas obtidas por meio das informações extraídas pela via da ilicitude, para que se legalizasse a ilicitude da primeira (operação). Assim, a teoria da ilicitude por derivação é uma imposição da aplicação do princípio da inadmissibilidade das provas obtidas ilicitamente.
Portanto, a prova ilícita por derivação, existe apenas porque há a vedação de provas ilícitas no ordenamento jurídico. é necessário que a prova obtida através de uma prova ilícita, não possa ser produzida através de nenhum outro meio legal. Segundo Daniel Amorim (2015, p. 509), por mais que a prova lícita, o fato dela ter sido conquistada por meios ilícitos, a torna inadmissível no processo:
Advém dessa corrente a teoria dos frutos podres da árvore envenenada (fruits of the poisonous tree), não se admitindo provas sem nenhuma ilicitude que tenham sido produzidas como desdobramentos de uma prova obtida de forma ilícita. Os adeptos dessa teses defendem, por exemplo, que eventual testemunho de sujeito que tenha sido mencionado em fita gravada clandestinamente deverá ser desconsiderado, ainda que a prova seja lícita em seu meio e na forma de sua obtenção, já que derivada da prova obtida ilicitamente.
A teoria embora seja americana, foi recepcionada pelo STF e é aplicado nos processos brasileiros. É importante ressaltar que a prova ilícita por derivação não anula o processo, apenas são desentranhadas tais provas consideradas ilícitas, porém as lícitas podem fundamentar a decisão do magistrado, conforme explicou Sylvio Motta (2013, p.221):
É a conhecida teoria dos “frutos da árvore envenenada” (The fruit of the poisonous tree), cunhada pela Suprema Corte americana, segundo a qual o vício da planta se transmite a todos os seus frutos. O STF já acolheu esta tese, tendo, contudo, em decisão recente, mantido a condenação de um réu, embora parte do acervo probatório contra ele produzido estivesse contaminado pela ilicitude. Entendeu o Pretório Excelso que a prova que restou hígida era mais do que o suficiente para preencher as lacunas da materialidade e dos veementes indícios de autoria. A cautela aqui é imprescindível: e o que dele derivou, depois, num segundo passo, se houver prova suficiente para a condenação, ótimo. Se não, estaremos rasgando a Constituição caso seja mantida a condenação.
A jurisprudência brasileira se manifestou do referente modo:
CAPTAÇÃO ILÍCITA DE SUFRÁGIO - PROVA ILÍCITA - GRAVAÇÃO AMBIENTAL. AUSÊNCIA DE AUTORIZAÇÃO JUDICIAL. CONTAMINAÇÃO DA PROVA DERIVADA. EFEITOS DA NULIDADE. INICIAL. INDEFERIMENTO. RECURSO PROVIDO. 1. No âmbito da Justiça Eleitoral, o poder de polícia pertence exclusivamente ao Juiz Eleitoral. Razões históricas que remontam a própria edição do Código Eleitoral de 1932 bem demonstram a razão de assim ser. 2. São nulas as atividades exercidas pelos agentes da Polícia Federal que deveriam ter comunicado à autoridade judiciária, ou ao menos ao Ministério Público Eleitoral, desde a primeira notícia, ainda que sob a forma de suspeita, do cometimento de ilícitos eleitorais, para que as providências investigatórias - sob o comando do juiz eleitoral - pudessem ser adotadas, se necessárias. 3. O inquérito policial eleitoral somente será instaurado mediante requisição do Ministério Público ou da Justiça Eleitoral, salvo a hipótese de prisão em flagrante, quando o inquérito será instaurado independentemente de requisição (Res.-TSE nº 23.222, de 2010, art. 8º). 4. A licitude da interceptação ou gravação ambiental depende de prévia autorização judicial. Ilicitude das provas obtidas reconhecida. 5. Inicial e peça de ingresso de litisconsorte ativo que fazem referência apenas às provas obtidas de forma ilícita. Não sendo aproveitáveis quaisquer referências aos eventos apurados de forma irregular, as peças inaugurais se tornam inábeis ao início da ação, sendo o caso de indeferimento (LC 64, art. 22, I, c). 6. Considerar como nula a prova obtida por gravação não autorizada e permitir que os agentes que a realizaram deponham sobre o seu conteúdo seria, nas palavras de José Carlos Barbosa Moreira, permitir que "a prova ilícita, expulsa pela porta, voltaria a entrar pela janela". 7. Preliminar de ilicitude da prova acolhida, por maioria. Prejudicadas as demais questões. Recurso provido para julgar a representação improcedente.
(TSE - RO: 190461 RR, Relator: Min. ARNALDO VERSIANI LEITE SOARES, Data de Julgamento: 07/08/2012, Data de Publicação: DJE - Diário de justiça eletrônico, Tomo 160, Data 21/8/2012, Página 39/40)