Eleições e formação política do brasileiro

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A análise de que "não há em quem votar" ou de que "os candidatos são sempre os mesmos", para justificar a nossa tão desvirtuada e irresoluta democracia, não tem sustentação, beira a falta de bom senso. Não está nisso a causa dos nossos grandes males.

A verdade, nua e crua, é que o brasileiro não sabe votar por falta de boa 'formação política'. A análise de que "não há em quem votar' ou de que "os candidatos são sempre os mesmos", para justificar a nossa tão desvirtuada e irresoluta democracia, não tem sustentação, beira a falta de bom senso, visto que não está nisso a causa dos nossos grandes males. 

Nenhum interesse em provocar quem defende a equivocada análise, mas o que falta no eleitor brasileiro, em primeiro lugar, é 'formação política', que não se confunde, propriamente, com o grau de escolaridade. Um agricultor, um pequeno comerciante, um comerciário, um trabalhador braçal, um desempregado, um estudante, todos esses, podem ser politizados sem necessariamente possuir uma educação superior ou de segundo grau. O mesmo se diga do semianalfabeto, e até do analfabeto que esteja engajado num projeto sociopolítico de melhorias para a zona rural, por exemplo, desde que não seja refém de um único partido político, ou de um grupo fechado de pessoas, que lhe venha tolher a capacidade de entender o mundo, a realidade à sua volta. Os meios de comunicação do mundo moderno propiciam a qualquer pessoa a capacidade de conhecer, analisar e poder escolher o que é melhor para si e para a sua comunidade.

Ter formação política é ser engajado, socialmente, de modo a poder analisar situações do contexto social, da vida em sociedade, mas sendo capaz de contribuir, através de ideias e projetos, dentro da sua comunidade ou na sociedade global, para um mundo mais justo e equânime, para o bem comum. O indivíduo politizado não se confunde, evidentemente, com aquela pessoa que participa de um partido político, ou de um movimento social, visando unicamente obter lucros para si ou para o grupo que representa.

Mas toda a nossa formação sociopolítica é deficiente. Leiam os grandes estudiosos e sociólogos, aqueles que tiveram interesse em tratar do nosso ‘eu social’, histórico e profundo, que se ocuparam da formação do povo brasileiro, dentre eles, Euclides da Cunha (“Os Sertões”), Manuel Bonfim (“América Latina”), Oliveira Viana (“Populações Meridionais do Brasil”), Sérgio Buarque de Holanda (“Raízes do Brasil”), Florestan Fernandes (“A Revolução Burguesa no Brasil”), Paulo Prado (“Retrato do Brasil”), Gilberto Freyre (“Casa-Grande e Senzala”, “Sobrados &  Mucambos” e “Ordem e Progresso”), Caio Prado Júnior (“Formação do Brasil Contemporâneo”), Víctor Nunes Leal (“Coronelismo, Enxada e Voto”), Raimundo Faoro (“Os Donos do Poder”), Darcy Ribeiro (“O Povo Brasileiro”) e verão que há uma conclusão inarredável: o brasileiro foi mal produzido, mal formado. Para uma melhor compreensão do comportamento social do brasileiro, teríamos que estudar o seu ‘eu’ e o ‘me’, segundo a sociologia e a psicologia social de George Herbert Mead (1863-1931). Lamentavelmente, fomos educados para a corrupção, a leniência, a falta de responsabilidade social, daí a incapacidade para ações grandiosas, os projetos adiados, as leis que não pegam, os artifícios legais, os atos governamentais inconsequentes, os casuísmos requentados, a baixa estima. 

Não se enganem. Se tivéssemos boa 'formação política', com certeza não teríamos esse 'sistema eleitoral' viciado, pois ele é resultado da inação, quando menos de uma precária responsabilidade eleitoral do cidadão, fruto da falta de formação política do povo. Já dizia Joseph-Marie de Maistre (1753-1821) que “Toda Nação tem o governo que merece”, ou seja, o povo tem o governo que merece. No Brasil, a máxima do filósofo francês se ajusta como a mão à luva. 

Ora, é justamente o povo quem põe o governante e o parlamentar no poder. Se o povo, ao invés de votar em candidatos conhecidos como “políticos de carteirinha” ou não confiáveis, ou naquele(s) que dizemos ser "o menos pior"; se, ao invés de votar em palhaços, artistas e apresentadores  de TV, que não conhecem leis e não sabem como aplicá-las, os quais também não têm postura ética e confundem, com ares de bom moço, o eleitorado, fosse às urnas para votar em branco ou anular o voto, de uma maneira generalizada, num claro e inequívoco voto de protesto, tenham certeza de que todo esse 'sistema eleitoral' seria varrido e estaríamos contribuindo para mudar o país. 

Observo, a propósito, que, ao tratar da anulação do voto, não estou defendendo nenhuma conduta que se considere irregular na apuração dos sufrágios, como prevista nos artigos 221 e 222, do Código Eleitoral, desaguando na aplicação do art. 224 do CE. Isto, como é sabido, não mudaria o sistema eleitoral brasileiro, pois o caso estaria previsto na regra do art. 224. Não! O que defendo é que, todo cidadão, como voto de protesto, deve anular o voto, se não quiser votar em branco, sem dar causa a nenhuma irregularidade, obrigando o legislador a mudar o sistema vigente no país. 

Enquanto o brasileiro não entender que "o menos pior", ou aquele que "não conhecemos", ou o palhaço, ou o consagrado artista popular, ou o apresentador de TV, quaisquer desses, são tão enganosos quanto o “político de carreira”, nada mudaremos. O chamado “voto de protesto”, dado a um palhaço, a uma figura folclórica ou histriônica, fica aquém do bom senso, pois, na prática, se elege um candidato destituído de predicados políticos, incapaz de contribuir para o aperfeiçoamento da democracia. 

A crítica é importante. Não podemos dissociá-la de um projeto de mudança sociopolítica no Brasil. Quem não gosta da crítica (falam tão mal dos críticos nesse país!), não haverá de contribuir para melhorar o Estado brasileiro. E não poderá contribuir para sairmos do fundo do poço em que nos encontramos. Devemos ter o cuidado, porém, de fazer a 'crítica responsável', a crítica comprometida com o 'bem comum', a crítica para atingir um objetivo social que traga boas mudanças para todos. 

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Não tenho uma solução acabada para o nosso país. Digo, entretanto, que tudo deve começar nas urnas, pois será a partir delas que escolheremos o governo central, os governos estaduais e municipais; o parlamentar federal, estadual e municipal. Tudo depende da vontade do povo! Entendo que, se o eleitor não confia no candidato, por ser “político de carteirinha” ou por ser o "menos pior", ou porque "não o conhece", a solução é não votar nele. E, não encontrando nenhum candidato com perfil de seriedade, que seja confiável, a solução é votar em branco ou anular o voto. Esse voto mudará o país!

O eleitor brasileiro deve entender que, através do voto, instrumento legal posto à sua disposição para escolher governantes e parlamentares, tem a grata oportunidade de mudar o Brasil. De nada adianta dizer que o político A, B ou C é corrupto e enganou o povo, se continuar votando no “político de carteirinha”, no "menos pior", naquele que "não conhece", ou no palhaço, no apresentador de TV ou no artista popular, os quais não conhecem leis e não sabem aplicá-las, e que tampouco estarão devidamente assessorados para o pleno e correto exercício do mandato, cabendo esclarecer que o assessor não governa e não legisla e que o mandatário só terá bons assessores se ele próprio for um governante ou um parlamentar bem intencionado. 

Muitos acham que o gestor público precisa apresentar tão somente uma boa assessoria, não sabendo que, toda assessoria, reflete as qualidades intelectuais e morais do assessorado; que toda assessoria nunca estará muito acima (sobretudo em termos éticos) do seu chefe, ao qual lhe cumpre assessorar e obedecer. A visão de que o assessor pode ser muito bom e vai resolver tudo, contribuindo para uma boa administração, é inteira e lamentavelmente enganosa. Na verdade, o assessor, mesmo tendo apreciáveis conhecimentos específicos que o chefe não possui, em regra, se comporta como uma peça ordenada para fazer exatamente aquilo que consta da agenda do chefe, ao passo que este geralmente escolhe seus assessores, ainda que indicados por terceiros, segundo conveniências pessoais, íntimas até. Querem saber quem é o chefe, vejam como se comportam seus assessores.

Nicolau Maquiavel (1469-1527) já dizia que os ministros de um príncipe “são bons ou maus segundo a prudência” do príncipe que os escolheu (in “O Príncipe”, capítulo XXII). Com efeito, um candidato corrupto, ou sem luz própria, será incapaz de escolher bons assessores. Portanto, nenhum desses merece o voto, daí resultando que o melhor é votar em branco ou nulo, pondo assim o voto de protesto, a melhor forma de mudarmos, a médio prazo, o sistema eleitoral vigente no país.  

Além de corrigir a postura no momento de colocar o voto na urna, também devemos exigir que os parlamentares, escolhidos por nós, aprovem, urgentemente, o ‘voto facultativo’, pois ninguém deve ser obrigado a votar se não tem candidato. 

Os legisladores e governantes, que representam os interesses do povo, devem oferecer a sua parcela de contribuição à sociedade, apurando os ouvidos, sensíveis às mudanças necessárias que não podem mais tardar, ou serão tragados pela insatisfação da massa. Assim, dando ao povo a oportunidade de tomar uma decisão consentânea com o ‘livre arbítrio’ de cada eleitor, e não tratando o povo como se fora um menor abandonado, poderão contribuir para construir uma grande Nação.

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Sobre o autor
José Ribamar da Costa Assunção

Procurador de Justiça Aposentado.

Informações sobre o texto

Este texto foi publicado diretamente pelos autores. Sua divulgação não depende de prévia aprovação pelo conselho editorial do site. Quando selecionados, os textos são divulgados na Revista Jus Navigandi

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Cumpre ao eleitor brasileiro, através do voto, mudar o sistema eleitoral vigente. Está em suas mãos transformar o país. Essa é a reflexão que desejo seja feita por cada cidadão que tem a responsabilidade de escolher seus representantes no Governo e no Parlamento.

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