Direito constitucional em escolas de ensino fundamental e médio

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Discorre-se sobre os eventuais benefícios com a possível implementação da disciplina de Direito Constitucional nas escolas de nível fundamental e médio, bem como análise da situação política do país.

RESUMO: É um fato histórico brasileiro a repressão de movimentos estudantis para com a política nacional vigente. É exemplo disso os diversos movimentos estudantis que reivindicavam melhorias nas ações governamentais, principalmente no período da Ditadura Militar. Contudo, com o passar do tempo, as gerações púberes foram ganhando desgosto com a política e muitos afirmam que o motivo disso seja a corrupção e a má intenção dos políticos vigentes.  A principal causa disso é a má escolha feita durante o período eletivo, em que a maioria do eleitorado nem sequer pesquisou algo em relação ao candidato em que irá votar. Com isso, a implementação do Direito Constitucional em escolas de ensino fundamental e médio seria uma jogada fundamental para o retorno do gosto político dos jovens. Com o conhecimento dele, o jovem terá visão não apenas do ramo político, que possui um capítulo específico na Carta de 1988 (Capítulo IV – artigos 14 a 16), mas também, noções de outros ramos da Administração Pública, como o Direito Tributário, Administrativo, Penal, além de saber evitar as arbitrariedades vindas de autoridades superiores ou de qualquer outra pessoa, seja de natureza física ou jurídica. Tais conhecimentos são imprescindíveis para o desenvolvimento do jovem, tanto como pessoal, como cidadão passivo e ativo e, como consequência disso, o desenvolvimento do País como um todo.

PALAVRAS-CHAVE: Política; jovens; conhecimento.


1. INTRODUÇÃO

Desde que o Brasil foi conquistado pelos portugueses, existiu uma relação de abuso entre aqueles que exerciam o poder politico e os que obedecem (não cabe falar de titular do poder, pois o regime democrático só foi implantado séculos depois da conquista da América portuguesa).

Com o passar do tempo, as relações de poder foram diminuindo paulatinamente, embora ainda muito autoritárias, como Poder Moderador e as Ditaduras Vargas e Militar que nossa nação teve que suportar.

Hodiernamente, o que temos é uma falsa impressão de um país em que as pessoas imaginam que estão participando da vida política simplesmente exercendo seu direito-dever de voto. Uma infeliz consequência de todo o processo político que o Brasil passou é que, hoje, os nossos representantes estão sob a constante impressão de serem corruptos – e com razão – e permanecem com a desconfiança do povo.

Não raro, encontra-se um jovem aspirando à carreira política e, instantaneamente, o perguntam se ele quer virar ladrão. Esse fato faz com que nossos jovens, o futuro do Brasil, percam integralmente o interesse na vida política do país.

O tamanho desinteresse da nova geração é que me inspirou a elaborar este Projeto de Pesquisa para, ao menos, dar uma ideia do que seria uma nova forma de fazer com que nossos púberes reencontrem a vontade de engajarem-se na vida pública e melhorar nosso país, visto que vivemos sob a maior incerteza de como será o futuro canarinho.


2. CONTEXTO HISTÓRICO E SOCIAL

O desinteresse político dos jovens e, principalmente, dos adolescentes – aqueles que, em tese, teriam que ser os mais ativos politicamente – fez com que eu me destinasse a pesquisar tal assunto.

 Em um país que, na teoria, seria um Estado Democrático de Direito e, não somente isso, mas também adota o constitucionalismo, tamanho desinteresse político dos jovens reflete o impasse político, econômico e social que vivemos. Tal relaxamento não existiu (ou não existiu integralmente) nem mesmo na década de 60-70, quando vivenciamos uma Ditadura Militar.

Naquele tempo, o movimento estudantil universitário brasileiro se transformou em um importante foco de mobilização social. Sua força adveio da capacidade de mobilizar expressivos contingentes de estudantes para participarem da vida política do país.

Destarte, fica o questionamento: por que nossa juventude demonstra tamanho desinteresse político e quais são as formas de reatar a vontade deles para com o bem-comum?

O Direito Constitucional fará com que os jovens possam ter um maior senso do certo e do errado, nos aspectos políticos, e, dessa forma, fará com que o direito do voto seja exercido corretamente, justamente para evitar que os mandatos políticos sejam exercidos indevidamente.


3. DOS FATOS E PROPOSTAS

Hodiernamente, é somente considerado um cidadão, no Brasil, aqueles que exercem o seu direito-dever do voto para eleger os representantes da União, estados e municípios. Contudo, tem-se que, muitas vezes (a maioria, diga-se de passagem), os votos são delegados a candidatos inaptos a seguir tais cargos – estes que, por sua vez, são repletos de privilégios atribuídos à função – de tal forma que mostra tremendo analfabetismo político da população.

Contudo, anos passam seguindo em conformidade com esse desconhecimento político, ao invés de aumentar o senso crítico dos cidadãos e diminuir o número de representantes inaptos.

A má escolha para os representantes reflete em uma má administração e corrupção para com o bem público. Este processo vem se repetindo há décadas, no Brasil, e consequentemente criando uma má impressão dos nossos políticos. Fato que, infelizmente, vem criando uma tendência de desconfiança e má impressão para os nossos políticos.

Fiz uma pesquisa de campo na Escola Estadual Luizinha Nascimento, localizada no centro de Manaus, com cerca de 20 alunos. Pude perceber que a juventude tende a ser cada vez mais desacreditada e afastada da vida política do nosso país. E as causas dessa tendência, de acordo com os alunos, foram: a mídia, a falta de conhecimento dos políticos, os gastos excessivos, os desvios de verbas e a má-administrações.

Além de que, para eles, a falta de influência e de interesse político é resultado de um processo que veio se formando durante séculos no país. Isso, contudo, gera um “ciclo de revolta” que faz com que os jovens evitem entrar no âmbito político.

Desta forma, tenda em vista que tudo começa quando o direito do voto é mal delegado, como pode se resolver esse impasse?

A importância de uma Constituição em uma sociedade é muito evidente. Para muitos estudiosos, a primeira foi a Marga Carta de 1215, em que, pela primeira vez na história, equiparou um soberano ao povo. As constituições modernas trazem isso e mais um pouco: elas são um limite para o poder estatal.

A nossa Constituição abrange todo complexo de direitos fundamentais, organização do Estado e organização dos poderes. É sabido que, uma sociedade que conheça seus direitos e deveres minimiza as arbitrariedades do Estado, garantindo direitos que são positivados.

Visto que o Brasil é um Estado Democrático de Direito, as condutas que permeiam o dia-a-dia das pessoas são reguladas por leis. Desta forma, o não conhecimento das leis faz com que tenhamos um acesso incompleto ao nosso próprio país.

O conhecimento das nossas normas é imprescindível, como se alega nos artigos 5º, II e XXXIX, em que ninguém será obrigado a fazer ou deixar de fazer alguma coisa senão em virtude de lei; e não há crime sem lei anterior que o defina, nem pena sem prévia cominação legal.

Ademais, os princípios fundamentais da Constituição Federal servem como alicerce para todas as outras leis existentes no país. Com isso, mostra-se a importância de, no mínimo, o domínio dos nossos princípios fundamentais e direitos e garantias fundamentais.

Portanto, mostra-se qual é o primeiro benefício do Direito Constitucional para nossos jovens: o conhecimento das leis.

O seguinte princípio, por sua vez, não está no texto constitucional, mas o serve: é o artigo 3º da Lei de Introdução às Normas do Direito Brasileiro, que nos garante a eficácia de nosso ordenamento jurídico ao estipular a presunção de conhecimento da lei. O referido artigo diz que “ninguém se escusa de cumprir a lei, alegando que não a conhece”, ou seja, não é porque você não conhece a lei que você irá cometer um ato inadequado e querer sair sem ser sancionado.

Além disso, todos os cidadãos são repletos de direitos mas nem sabem. A emissão de documentos do primeiro imóvel de uma pessoa, por exemplo, deve ter um desconto de 50% no cartório. Contudo, o próprio cartório dificilmente vai avisar o seu cliente sobre esse direito e, muitas vezes, o cliente acaba pagando integralmente.

A parte concernente aos direitos e garantias fundamentais na CF é repleta de incisos em que o indivíduo pode ganhar indenizações. O inciso V, por exemplo, assegura o direito de resposta, proporcional ao agravo, além da indenização por dano material, moral ou à imagem. Contudo, por conta de não ter conhecimento de seus direitos, o indivíduo acaba por não ganhá-los.

Assim, tem-se um segundo benefício: ninguém perderá direitos por conta de não conhecê-los.

Um exemplo típico da ignorância do povo, é quando um candidato Senador da República, durante as eleições, baseia sua candidatura fazendo promessas de que, se for eleito, fará de tudo para reivindicar os direitos do eleitorado. Contudo, como se diz no artigo 46 da Constituição Federal, o Senador é representante do Estado como ente autônomo, e não dos direitos da população.

Para que se exerça o direito-dever de votar, sem que isso comprometa o Estado Democrático de Direito, é necessário ter conhecimentos mínimos de Direito Constitucional, por ser este modelo caracterizado pela participação consciente do povo no poder do Estado.


4. DOS BENEFÍCIOS

É certo que todo e qualquer conhecimento possui seus benefícios específicos. Cabe a este artigo, portanto, mostrar quais são os reais benefícios no Direito Constitucional e, ainda, qual o efeito surtirá caso seja implementado em escolas do ensino fundamental e médio.

O primeiro benefício do conhecimento do Direito Constitucional é que, por ser ele a base de todas as leis ou atos normativos vigentes no Brasil, é, por conseguinte, a base de conhecimento dos próprios direitos dos cidadãos, abrangendo, assim, todas as áreas de conhecimento a respeito do Direito, quais sejam:

Administração Pública (art. 37, caput), ao dispor que A administração pública direta e indireta de qualquer dos Poderes da União, dos Estados, do Distrito Federal e dos Municípios obedecerá aos princípios de legalidade, impessoalidade, moralidade, publicidade e eficiência [...].

Direito Penal (principio da legalidade, art. 5º, II; princípio da reserva legal, art. 5º, XXXIX), ao dispor que ninguém será obrigado a fazer ou deixar de fazer alguma coisa senão em virtude de lei; e não há crime sem lei anterior que o defina, nem pena sem prévia cominação legal. Entre outros diversos princípios e subprincípios de matéria penal na Carta Política.

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O princípio da legalidade é base do ordenamento do nosso Direito Penal. É vislumbrado como um verdadeiro amparo às liberdades individuais. A lei penal deve ser clara, exata e precisa, deve poder-se interpretá-la desde um executivo em São Paulo à um morador dos ribeirinhos do Amazonas, não podendo ser influenciada por diferenças sociais ou cultura\is, só existindo crime se houver um fato lesivo a um bem jurídico.

A propósito, o mestre Nelson Hungria9 depreende a seguinte lição:

"O princípio da legalidade no direito penal é a premissa da teoria dogmático-jurídica da tipicidade, de Ernest Beling: antes de ser anti-jurídica e imputável a título de culpa ‘sensu lato’, uma ação reconhecível como punível deve ser típica, isto é, corresponder a um dos ‘esquemas’ ou ‘delitos-tipos’ objetivamente descritos pela lei penal".

O princípio da legalidade, segundo a doutrina mais contemporânea, se desdobra em três postulados. Um quanto as fontes das normas penais incriminadoras. Outro concernente a enunciação dessas normas. E um terceiro relativo a validade das disposições penais no tempo. O primeiro dos postulados é o da reserva legal. O segundo é o da determinação taxativa. E o último é o da irretroatividade.

Noções de Direito Tributário (no mesmo artigo 5º, XXXIX), nenhum tributo poderá ser cobrado no mesmo exercício financeiro em que haja sido publicada a lei que instituiu ou aumentou, levando em consideração o princípio constitucional pelo qual “não há crime sem lei anterior que defina, em cena sem prévia cominaçãopenal”.

Parte do Direito do Trabalho, disposto no artigo 7º da Carta Magna, como, por exemplo, em seu inciso I, ao estabelecer que relação de emprego protegida contra despedida arbitrária ou sem justa causa, nos termos de lei complementar, que preverá indenização compensatória, dentre outros direitos.

Entre outras matérias relevantes ao aspecto jurídico que abrange toda a sociedade e deve ser de conhecimento geral do povo brasileiro, tais como o Direito Civil, Administrativo, Político.

Um segundo benefício é o pronto-entendimento do próprio país, com a leitura dos artigos 1, 2, 3 e 4, que estabelecem os princípios fundamentais do país. Esses princípios são de leitura importantíssima. Muitas pessoas nem mesmo leram estes artigos, mas toda sua vida é regulamentada por eles. Este é um exemplo típico da importância do ensino de Direito Constitucional em escolas: entender o próprio país.

O terceiro benefício do conhecimento do Direito Constitucional é saber quais são as garantias fundamentais dos cidadãos. segunda parte da constituição trata os “Direitos e Garantias Fundamentais” e começa no artigo 5º. Este artigo é um dos mais importantes de toda a legislação brasileira. É nele que os direitos e deveres dos brasileiros são tratados. É por causa dele que as pessoas têm direito à saúde e educação, por exemplo, e conhecer seu texto é fundamental.

Por fim, o quarto e último benefício baseia-se na proposição de que quem conhece a lei, não perde direitos. A Constituição Federal possui mais de 250 artigos e mais uma centena de adições posteriores. Todas elas são fundamentais para o funcionamento do país e de um bom convívio social, o que – por si só – já justificaria o ensino de Direito Constitucional em escolas.

Mas há algo mais importante do que simplesmente conhecer as leis fundamentais da nação. Como uma pessoa vai prevenir que outra abuse ou negue seus direitos e garantias se ela não souber quais são seus direitos e garantias?

Ensinar o Direito Constitucional em escolas é a forma de garantir que os cidadãos possam garantir sua própria cidadania de forma plena, evitando que pessoas aproveitem-se de seu desconhecimento em relação às leis mais fundamentais de seu próprio país.


CONCLUSÃO

Baseado nos fatos apresentados, conclui-se que a sociedade perdeu consideravelmente o gosto político ao longo dos anos. No período eleitoral, votam em qualquer político sem saber quais são suas reais intenções.

Com isso, a proposta deste artigo foi mostrar os reais benefícios do Direito Constitucional e como ele poderá influenciar na hora de escolher os representantes do povo. Como os jovens saberão se um determinado plano político é correto, se está de acordo com as normas constitucionais ou até se é objeto dos princípios fundamentais do nosso país, disposto nos primeiros quatro artigos da Constituição Federal. Poderão, ainda, fugir das arbitrariedades do Estado, bem como de qualquer outra pessoa, seja física ou jurídica.

Portanto, o pronto conhecimento de matéria constitucional é mister na vida de todo cidadão brasileiro, visto que possui inúmeros benefícios para todas as áreas da sociedade e para com a própria pessoa, visto que conhecimento é e sempre foi a maior conquista que o homem obteve e o que o diferencia das outras espécies animais.


REFERÊNCIAS

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BONAVIDES, Paulo. Ciência Política. 10. ed. São Paulo: Malheiros, 2000.

DAVICO, Luana Vaz. Os princípios penais constitucionais - análise descomplicada. Disponível em: <https://luanadavico.jusbrasil.com.br/artigos/111822119/os-principios-penais-constitucionais-analise-descomplicada> Acesso em: 30 Nov, 2017.

DIREITOS BRASIL. Ensino de Direito Constitucional em escolas públicas: quais os benefícios?. Disponível em: <http://direitosbrasil.com/ensino-de-direito-constitucional-em-escolas-publicas-quais-os-beneficios/> Acesso em: 26 Nov, 2017.

DIREITONET. O princípio da legalidade na Constituição Federal: análise comparada dos princípios da reserva legal, legalidade ampla e legalidade estrita. Disponível em: https://www.direitonet.com.br/artigos/exibir/7125/O-principio-da-legalidade-na-Constituicao-Federal-analise-comparada-dos-principios-da-reserva-legal-legalidade-ampla-e-legalidade-estrita Acesso em 26 Nov, 2017.

NEGÓCIOS. Jovem advogado cria projeto para ensinar Constituição em escolas públicas. Disponível em:http://epocanegocios.globo.com/Carreira/noticia/2017/02/jovem-advogado-cria-projeto-para-ensinar-constituicao-em-escolas-publicas.htmlAcesso em: 26 Nov, 2017, 1h24min.

ROMÁRIO. Senado aprova ensino da Constituição nas escolas. Disponível em: https://romario.org/noticias/senado-aprova-ensino-da-constituicao-nas-escolas/ Acesso em: 26 Nov, 2017.

SILVA, José Afonso. Curso de Direito Constitucional Positivo. 28. ed. São Paulo: Malheiros, 2000.

TORRES, Ricardo Lobo. Teoria dos direitos fundamentais. 2. ed. Rio de Janeiro: Renovar. 2001.

JUSBRASIL. Art. 7 da Constituição Federal de 88. Disponível em: https://www.jusbrasil.com.br/topicos/10641213/artigo-7-da-constituicao-federal-de-1988 Acesso em: 2 Dez, 2017.

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Sobre os autores
Lucas Monteiro Botero

Estudante de Direito da Universidade Estadual do Amazonas.

Informações sobre o texto

Este texto foi publicado diretamente pelos autores. Sua divulgação não depende de prévia aprovação pelo conselho editorial do site. Quando selecionados, os textos são divulgados na Revista Jus Navigandi

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