4.TERRORISMO – GUERRA IRREGULAR
“É guerra que aparentemente não é guerra” (HEYDTE, 1990).[21]
A visão de conceito dada por Alessandro Visacro é a de que a guerra irregular é aquela que não possui regulamento, impossibilitando que seja encaixada em padrões sociais, ambientes políticos ou militares:
Para compreender a guerra irregular há que se partir da premissa de que, nesse tipo de beligerância, não existem regras. Sem regras, torna-se mais difícil a tarefa de delinear um conjunto rígido e definido de princípios teóricos que fundamentem a sua aplicação em circunstâncias muito diversificadas.[22]
A guerra irregular tem por tática ações supreendentemente rápidas, sendo bem pensadas, mas não delongando na execução. Ademais, não apresenta modelos de alvos predeterminados ou fáceis de serem identificados, o que praticamente impossibilita uma ação estatal preventiva.
O terrorismo, como um dos principais exemplos de guerra irregular e o mais atualmente em voga no Direito Penal internacional (outros são a subversão – ações essencialmente psicológicas; a guerra de guerrilhas – operações de combate; e a sabotagem – ação destinada a comprometer o funcionamento normal dos sistemas sociais), foi conceituado pelo Departamento de Estado dos Estados Unidos da América como sendo a “violência premeditada e politicamente motivada perpetrada contra alvos não combatentes por grupos subnacionais ou agentes clandestinos, normalmente com a intenção de influenciar um público alvo”[23].
Por definição ainda, tem-se que terrorismo “é o ato de provocar terror nas pessoas através do uso da violência física ou psicológica, com o intuito de intimidar uma sociedade e impingir ideologias fundamentalistas, sejam elas políticas, religiosas ou de outra natureza”[24].
As práticas terroristas podem ser resumidas em ações de intimidação psicológica, que têm como elementos constitutivos: agente perpetrador (organizações militantes ou criminosas), clandestinidade (ilegalidade do ato), violência real ou presumida, alvo primário (objeto imediato), publicidade, público-alvo e meta psicológica.
A publicidade é o elemento mais importante para a prática do terror, pois é através da mídia que o dano é conhecido e propagado, alastrando a meta psicológica para além do alvo primário e atingindo o maior número de público-alvo possível. Sem a divulgação almejada, o atentado não alcança o objetivo de se tornar conhecido e grandioso o bastante.
4.1 Classificação do terrorismo
O atentado é catalogado por Visacro (2017) da seguinte maneira:
A.quanto à amplitude:
a.1) internacional – os elementos constitutivos envolvem mais de uma nacionalidade;
a.2) nacional ou doméstico – os atentados são praticados por nacionais contra seus concidadãos.
B.quanto à motivação:
b.1) de Estado – o governo patrocina os atos de terror. “Em alguns casos, os Estados estabeleceram organizações terroristas ‘fantoches’, cuja missão é agir em nome do Estado patrocinador”[25];
b.2) político-ideológico – “dirigido contra o Estado, por meio de assassinatos seletivos e ataques ao patrimônio público e à propriedade privada”[26];
b.3) político-religioso – militantes usam a devoção religiosa como base institucional para as organizações;
b.4) narcoterrorismo – terrorismo financiado pelo tráfico de entorpecentes, intentando a manutenção ou expansão dos lucros desse comércio ilegal;
b.5) autotélico – “normalmente, está associado ao fenômeno do banditismo, a segregação racial e ao mero fanatismo de seitas radicais ou à disputa por poder local entre tribos e grupos étnicos distintos”[27].
C.quanto ao alvo ou à natureza do ataque
c.1) seletivo – os ataques tendem a serem melhor planejados, quanto aos seus alvos, restringindo as consequências (danos e vítimas), a fim de que a reprovação pública não seja tão grande;
c.2) indiscriminado – ao contrário do seletivo, não se preocupa com quem serão os alvos, tampouco com o quão mal a opinião pública será, a respeito da prática.
D.quanto ao contexto das organizações terroristas (variantes):
d.1) primeira – contexto de movimento revolucionário, normalmente praticada em conjunto com a subversão e a guerrilha;
d.2) segunda – atuação com radicalismo, o que afasta o apoio popular para as causas, ainda que “justas”;
d.3) terceira – operação realizada com orientações do próprio governo;
d.4) quarta – atua com expansão de sua organização terrorista, alcançando não somente território nacional, mas projetando alcançar outras regiões.
Muitos comentaristas procuram, em vão, respostas para o terrorismo no ato em si. O terrorismo é apenas uma arma. O uso que se faz dela compete àqueles que optam por empregá-la. Portanto, a moralidade, a motivação e os objetivos implícitos em um atentado não podem ser identificados e compreendidos pela análise exclusiva da ação.[28]
É necessário que a prevenção parta do conhecimento do fenômeno aqui estudado, só assim ela será efetiva.
5.CONSIDERAÇÕES FINAIS
O intuito deste artigo foi apresentar o terrorismo como principal forma de instigação aos avanços do Direito Penal do Inimigo.
No Brasil a tendência ao aumento de penas, bem como a tentativa de deixá-las mais “pesadas” para os criminosos, faz como que ocorra a inflação legislativa, com muita intervenção estatal e pouca efetividade. Não que se diga que a impunidade ou punições brandas sejam a solução, mas não se pode valer cada vez mais de normas que já não garantem a real imposição da segurança social.
O terrorismo, além de ser classificado como Direito Penal de terceira velocidade, pode ser encaixado como uma guerra de quarta geração, qual seja, aquela decidida em níveis operacional, estratégico, moral e mental, distanciando-se dos moldes tático e físico, comumente conhecidos.
Essa forma de guerra não se dá, única e exclusivamente, por meio do fundamentalismo religioso. A mídia, em especial, passou a pregar que a religião é o maior vilão no caso do terrorismo, o que nem sempre é verdade. As práticas terroristas podem ter inúmeras motivações, fazendo com que a restrição a um pensamento abra espaço para que os Estados deixem de se analisar todas as situações e sejam atacados mais facilmente.
A mídia, a opinião pública e os tomadores de decisões são os elementos básicos que levam os terroristas a se orientarem no planejamento de suas ações. Concordando com a opinião de Visacro (2017, p. 293), “somente quando a mídia, a opinião pública e a cúpula governamental adquirirem uma maior compreensão do fenômeno terrorismo, a sociedade tornar-se-á, de fato, menos vulnerável a esse tipo de ameaça”.
REFERÊNCIAS
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Notas
[1] MELIÁ, Manuel Cancio; JACKOBS, Günther. Direito Penal do inimigo: noções e críticas. Org. e trad. André Luís Callegari; Nereu José Giacomolli. 2 ed. Porto Alegre: Livraria do Advogado, 2007. p. 67
[2] SANTOS, Eric de Assis. Discutindo a terceira velocidade do direito penal. Disponível em: <https://jus.com.br/artigos/18603/discutindo-a-terceira-velocidade-do-direito-penal>. Acesso em: 17 de janeiro de 2018.
[3] RIBEIRO, Juciene Souza. Entendendo o tal “Direito Penal do Inimigo”. Disponível em: <https://jucienesouza.jusbrasil.com.br/artigos/130414898/entendendo-o-tal-direito-penal-do-inimigo>. Acesso em 17 de janeiro de 2018.
[4] MELIÁ, Manuel Cancio; JACKOBS, Günther. Direito Penal do inimigo: noções e críticas. Org. e trad. André Luís Callegari; Nereu José Giacomolli. 2 ed. Porto Alegre: Livraria do Advogado, 2007. p. 70 e 71
[5] apud JÚNIOR, Cícero José Franzen. Direito Penal do Inimigo. Disponível em: <http://monografias.brasilescola.uol.com.br/direito/direito-penal-inimigo.htm#capitulo_9>. Acesso em: 17 de janeiro de 2018.
[6] GRECO, Rogério. Direito Penal do Equilíbrio: uma visão minimalista do Direito Penal. 6 ed. Niterói: Impetus, 2011. p. 25
[7] MELIÁ, Manuel Cancio; JACKOBS, Günther. Direito Penal do inimigo: noções e críticas. Org. e trad. André Luís Callegari; Nereu José Giacomolli. 2 ed. Porto Alegre: Livraria do Advogado, 2007. p. 80
[8] apud GUIMARÃES, Caroline Carvalho. A incompatibilidade do direito penal do inimigo com o Estado Democrático de Direito. Disponível em: <http://repositorio.uniceub.br/bitstream/235/4115/1/Caroline%20Carvalho%20Guimar%C3%A3es%20RA%2020808764.pdf>. Acesso em 18 de janeiro de 2018.
[9] GRECO, Rogério. Direito Penal do Equilíbrio: uma visão minimalista do Direito Penal. 6 ed. Niterói: Impetus, 2011. p. 23
[10] GRECO, Rogério. Direito Penal do Equilíbrio: uma visão minimalista do Direito Penal. 6 ed. Niterói: Impetus, 2011. p. 12
[11] YOUNG, 2002 apud GRECO, Rogério. Direito Penal do Equilíbrio: uma visão minimalista do Direito Penal. 6 ed. Niterói: Impetus, 2011. p. 14 e 15
[12] GRECO, Rogério. Direito Penal do Equilíbrio: uma visão minimalista do Direito Penal. 6 ed. Niterói: Impetus, 2011. p. 15
[13] RUBIN, Daniel Sperb. Janelas quebradas, tolerância zero e criminalidade. Disponível em: <https://jus.com.br/artigos/3730/janelas-quebradas-tolerancia-zero-e-criminalidade>. Acesso em: 18 de janeiro de 2018.
[14] GRECO, Rogério. Direito Penal do Equilíbrio: uma visão minimalista do Direito Penal. 6 ed. Niterói: Impetus, 2011. p. 21
[15] JESUS, Damásio Evangelista de. Porque o Direito Penal do Inimigo é perigoso. Disponível em: <http://www.cartaforense.com.br/conteudo/colunas/porque-o-direito-penal-do-inimigo-e-perigoso/16820>. Acesso em 18 de janeiro de 2018.
[16] apud GUIMARÃES, Caroline Carvalho. A incompatibilidade do direito penal do inimigo com o Estado Democrático de Direito. Disponível em: <http://repositorio.uniceub.br/bitstream/235/4115/1/Caroline%20Carvalho%20Guimar%C3%A3es%20RA%2020808764.pdf>. Acesso em 18 de janeiro de 2018.
[17] apud GUIMARÃES, Caroline Carvalho. A incompatibilidade do direito penal do inimigo com o Estado Democrático de Direito. Disponível em: <http://repositorio.uniceub.br/bitstream/235/4115/1/Caroline%20Carvalho%20Guimar%C3%A3es%20RA%2020808764.pdf>. Acesso em 18 de janeiro de 2018.
[18] GRECO, Rogério. Direito Penal do Equilíbrio: uma visão minimalista do Direito Penal. 6 ed. Niterói: Impetus, 2011. p. 28
[19] JESUS, Damásio Evangelista de. Porque o Direito Penal do Inimigo é perigoso. Disponível em: <http://www.cartaforense.com.br/conteudo/colunas/porque-o-direito-penal-do-inimigo-e-perigoso/16820>. Acesso em 18 de janeiro de 2018.
[20] GRECO, Rogério. Direito Penal do Equilíbrio: uma visão minimalista do Direito Penal. 6 ed. Niterói: Impetus, 2011. p. 28 e 29
[21] apud VISACRO, Alessandro. Guerra irregular: terrorismo, guerrilha e movimentos de resistência ao longo da história. São Paulo: Contexto, 2017. p. 222
[22] VISACRO, Alessandro. Guerra irregular: terrorismo, guerrilha e movimentos de resistência ao longo da história. São Paulo: Contexto, 2017. p. 222
[23] apud WHITTAKER, David J. Terrorismo: um retrato. Rio de Janeiro: Bibliex, 2005. p. 18
[24] Significado do terrorismo. Disponível em: <https://www.significados.com.br/terrorismo/>. Acesso em: 21 de janeiro de 2018.
[25] WHITTAKER, David J. Terrorismo: um retrato. Rio de Janeiro: Bibliex, 2005. p. 72
[26] VISACRO, Alessandro. Guerra irregular: terrorismo, guerrilha e movimentos de resistência ao longo da história. São Paulo: Contexto, 2017. p. 288
[27] VISACRO, Alessandro. Guerra irregular: terrorismo, guerrilha e movimentos de resistência ao longo da história. São Paulo: Contexto, 2017. p. 290
[28] VISACRO, Alessandro. Guerra irregular: terrorismo, guerrilha e movimentos de resistência ao longo da história. São Paulo: Contexto, 2017. p. 291