SEGURANÇA JURÍDICA DO MÉDICO DIANTE DA ALTA A PEDIDO DO PACIENTE

18/04/2018 às 07:56

Resumo:


  • Os preceitos éticos da relação médico-paciente indicam que o médico assistente é responsável por determinar o momento e as condições para a alta hospitalar.

  • Em casos de solicitação de alta hospitalar feita pelo paciente, surge um dilema entre respeitar a autonomia do paciente e zelar pela saúde do mesmo.

  • Documentos assinados pelos pacientes informando sobre os riscos da interrupção do tratamento podem ser providenciados, mas não isentam o médico da responsabilidade caso haja consequências negativas.

Resumo criado por JUSTICIA, o assistente de inteligência artificial do Jus.

É do cotidiano dos médicos depararem-se com solicitação de alta hospitalar formulada pelo próprio paciente. E neste caso, qual deve ser a conduta adequada, considerando a segurança jurídica, para que sejam resguardados os direitos do médico?

Os preceitos éticos da relação médico-paciente nos induzem ao raciocínio lógico de que o paciente, quando internado em instituição hospitalar, está sob cuidados de um médico assistente e cabe a este último determinar o momento e as condições para a alta hospitalar.

Contudo, é do cotidiano dos médicos depararem-se com solicitação de alta hospitalar formulada pelo próprio paciente. E neste caso, qual deve ser a conduta adequada, considerando a segurança jurídica, para que sejam resguardados os direitos do médico?

O eixo principal deste dilema reside no aparente conflito entre respeitar a autonomia do paciente e providenciar a alta hospitalar ou recusar o pedido e manter o paciente internado; inserido neste contexto decisório está a saúde do paciente que poderá sofrer prejuízos, a indisponibilidade do direito à vida e o dever médico de zelar pela saúde do paciente.

Na busca de regular essa situação delicada alguns hospitais, ou mesmo os próprios médicos, providenciam documentos, escritos de à punho ou pré-formatados, assinados pelos pacientes, informando sobre os riscos de interromper o tratamento, com o fito de isentar o médico da responsabilidade advinda da alta a pedido.

Em que pese a intenção do referido documento, veremos que no mais das vezes aquele instrumento não tem o poder de isentar o médico e/ou o hospital da responsabilidade pelas consequências da alta a pedido, vejamos:

Primeiramente cabe esclarecer que a alta hospitalar é um ato médico, pois este último é o profissional com condições técnicas de decidir pelo tratamento do paciente.  Sendo assim, a autoridade do médico deve ser sempre considerada, ainda mais em casos de risco à vida do paciente, ocasião em que o médico sequer deve seguir a vontade do paciente, mas sim dar continuidade ao tratamento.

Mas quando não se está diante do risco à saude ou vida do paciente, os entendimentos divergem,  como se apresentará a seguir.

O Conselho Regional de Medicina do Estado de São Paulo – CREMESP, emitiu parecer de nº 20589/00 com a seguinte conclusão:

O paciente que, devidamente esclarecido e sem risco de vida iminente, assume o não cumprimento da determinação médica de permanecer sob tratamento intra hospitalar, desobrigando o profissional de dar continuidade ao tratamento, bem como de emitir receita.

Tal fato deve ficar expressamente documentado no prontuário médico.

O mesmo Conselho, em outro parecer anterior ao acima transcrito já havia entendido pela responsabilidade do médico:

Como conseqüência, a alta a pedido pode gerar danos à vida e à saúde do paciente, no instante em que ela interrompe o processo de tratamento. Dessa maneira, se após refletir sobre o estado de saúde do recém-nascido o profissional concluir que, efetivamente, a alta agravará a situação do mesmo, ele deverá recusá-la.

Vale dizer que, se a saúde do paciente agravar-se em conseqüência da alta a pedido, o profissional que a autorizou poderá ser responsabilizado pela prática de seu ato, no caso, por omissão de socorro, imprudência ou negligência. (Parecer CREMESP nº 26574/92)

Por fim, a respeito da assinatura do termo ou instrumento de pedido de alta,  ainda o Conselho de São Paulo, esclarece:

“Todavia nesses casos, é de boa praxe exigir que ele ou seu representante legal assine termo ou declaração de alta a pedido, a fim de isentar o médico e o hospital de qualquer responsabilidade.

Contudo, alerta JOSÉ D AMICO BAUAB que esse documento só produzirá o efeito a que se presta, se o médico cumprir o dever ético de informar ao paciente, da maneira mais completa possível, as vantagens e desvantagens da alta requerida. A seu turno GENIVAL VELOSO DE FRANÇA enfatiza que o termo de responsabilidade assinado pelo paciente na alta a pedido, só terá valor se ela não implicar em graves prejuízos à saúde e à vida do paciente. Nesse sentido, PAULO ANTONIO DE CARVALHO FORTES esclarece que as declarações, recibos ou documentos de alta a pedido têm valor ético e jurídico muito limitado, não suprindo a ocorrência de um ato ilícito, como a omissão de socorro, quando o usuário estiver em iminente perigo de vida.  (Consulta 16948/99 – CREMESP.)


A assinatura pelo paciente da alta a pedido também não exonera a responsabilidade do profissional de saúde, se a situação do paciente se agravar e for provado que houve ação imprudente ao deixá-lo partir.
Segundo esse mesmo autor, é a gravidade e a iminência de perigo à vida do paciente que deve condicionar a aceitação ou a recusa de uma alta a pedido.

Diante dessas considerações, temos que a conduta mais segura ao médico assistente é analisar, diante da alta a pedido, se há iminente risco à vida ou saúde do paciente, com o escopo de não incidir em negligência ou imprudência, protegendo-se das consequências civis, criminais e éticas.

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Sobre o autor
Marcelo Lavezo

Advogado especialista em Direito Empresarial - Tributário, pos-graduando em Direito Civil e Processo Civil, atuante também em Direito Médico e da Saúde.

Informações sobre o texto

Este texto foi publicado diretamente pelos autores. Sua divulgação não depende de prévia aprovação pelo conselho editorial do site. Quando selecionados, os textos são divulgados na Revista Jus Navigandi

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