INTRODUÇÃO
O § 8º do art. 98 da Lei n. 13.105/15, novo Código de Processo Civil, afirma que “havendo dúvida fundada quanto ao preenchimento atual dos pressupostos para a concessão de gratuidade, o notário ou registrador, após praticar o ato, pode requerer, ao juízo competente para decidir questões notariais ou registrais, a revogação total ou parcial do benefício ou a sua substituição pelo parcelamento”.
Será examinado o alcance do dispositivo frente ao Processo do Trabalho e sua repercussão na esfera processual trabalhista onde há um grande número de litigantes beneficiários da justiça gratuita. A possibilidade de incompatibilidade lógica de decisões haja vista que, em tese, dois juízes de primeiro grau podem decidir de maneira diversa sobre o mesmo tema. O alcance da decisão. A citação do beneficiário para contestar a demanda, e o prazo para defesa.
Antes de ingressarmos especificamente no tema acima será feito um exame nos institutos da assistência jurídica integral (art. 5º, LXXIV, CRFB), benefício da justiça gratuita (Leis n. 1.60/50 e art. 98/102 do CPC) e da assistência judiciária gratuita (Lei n. 5.584/70) exclusivamente nos processos individuais. Também serão conceituadas as despesas judiciais.
1- DA ASSISTÊNCIA JURÍDICA INTEGRAL (ART. 5º, LXXIV, CRFB), DO BENEFICIO DA JUSTIÇA GRATUITA (LEI N. 1.060/50, E ARTS. 98/102, CPC) E DA ASSISTÊNCIA JUDICIÁRIA GRATUITA (ART. 790 DA CLT E LEI N. 5.584/70)
Verifica-se em parte da doutrina e jurisprudência o uso indiscriminado dos termos assistência jurídica integral, justiça gratuita e assistência judiciária gratuita como constata Augusto Tavares Rosa Marcacini, afirmando:
"Os conceitos de justiça gratuita e de assistência judiciária são comumente utilizados como sinônimos, sem que, na verdade, o sejam. Como bem anota José Roberto de Castro, o equívoco tem origem nos próprios textos legislativos, que empregam as duas expressões indistintamente, como se tivessem o mesmo significado. A Lei n. 1.060/50 utiliza diversas vezes a expressão assistência judiciária ao referir-se, na verdade, à justiça gratuita.[i] "
Passa-se ao exame de cada um dos institutos jurídicos.
1-1 DA ASSISTÊNCIA JURÍDICA INTEGRAL (ART. 5º, LXXIV, CRFB)
Por expressa determinação Constitucional[ii], o Estado deve prestar assistência jurídica gratuita e integral aos que comprovarem insuficiência de recursos. O dispositivo ecoa a preocupação de favorecer o exercício amplo da cidadania ao viabilizar o acesso do hipossuficiente à justiça. Nas palavras de Ada Pellegrino Grinover “a Constituição não apenas se preocupou com a assistência judiciária aos que comprovarem insuficiência de recursos mas a estendeu à assistência jurídica pré-processual”[iii]. Reconheceu-se a necessidade da atuação positiva do Estado para assegurar o gozo de direitos sociais básicos, como, por exemplo, o acesso a justiça.
De acordo com Barbosa Moreira, "a grande novidade trazida pela Carta de 1988 consiste em que, para ambas as ordens de providências, o campo de atuação já não se delimita em função do atributo 'judiciário', mas passa a compreender tudo que seja 'jurídico'. A mudança do adjetivo qualificador da 'assistência', reforçada pelo acréscimo 'integral', importa notável ampliação do universo que se quer cobrir. Os necessitados fazem jus agora à dispensa de pagamentos e à prestação de serviços não apenas na esfera judicial, mas em todo o campo dos atos jurídicos. Incluem-se também na franquia: a instauração e movimentação de processos administrativos, perante quaisquer órgãos públicos, em todos os níveis; os atos notariais e quaisquer outros de natureza jurídica, praticados extrajudicialmente; a prestação de serviços de consultoria, ou seja, de informação e aconselhamento em assuntos jurídicos"[iv].
O próprio conceito de acesso a justiça sofre mudanças. Inicialmente incluía somente o acesso à proteção judicial como direito formal do indivíduo de propor e contestar a ação. A CRFB/88 procura assegurara também a efetivação dessa garantia formal, com a obrigação estatal de prestar assistência jurídica aos que comprovarem insuficiência de recurso.
O dever do Estado de garantir a “assistencia jurídica integral” não se limita a fase processual. É mais ampla com a obrigação de esclarecimento e orientação, pois muitos desprovidos de recursos desconhecem seus direitos e ignoram a possibilidade de reparação através dos instrumentos processuais. O direito dos carentes terem acesso a justiça manifesta-se como fundamental, sendo uma exigência da cidadania.
1.2 DO BENEFICIO DA JUSTIÇA GRATUITA (LEI N. 1.060/50, E ARTS. 98/102, CPC)
A Seção IV do Capítulo II do Título I do Livro III da parte Especial do novo Código de Processo Civil disciplina detidamente a gratuidade da justiça, revogando expressamente diversos dispositivos da Lei n. 1.060/50[v].
O artigo 98 “caput” do CPC garante a gratuidade da justiça à “pessoa natural ou jurídica[vi], brasileira ou estrangeira” desde que declarem “insuficiência de recursos para pagar as custas, as despesas processuais e os honorários advocatícios”.
O novo CPC, garantiu expressamente a possibilidade de pessoas jurídicas serem beneficiárias da gratuidade da justiça. Na Justiça do Trabalho a possibilidade da conceção do benefício já era verificada, porém com resistência por parte da jurisprudência[vii].
Para Antônio Pedro Albernaz Crespo a “conceituação de pobreza é algo extremamente complexo. Pode ser feita levando em conta algum “juízo de valor”, em termos relativos ou absolutos. Pode ser estudada apenas do ponto de vista econômico ou incorporando aspectos não-econômicos à análise, sendo contextualizada de forma dependente ou não da estrutura sócio-política da sociedade…[viii]”
Necessitados não são apenas os economicamente pobres, mas todos aqueles que necessitam de tutela jurídica diferenciada por incapacidade de fazer valer seus interesses de forma individual.
A gratuidade da justiça é postulada mediante simples afirmação[ix], na petição inicial ou outro momento[x], de que a parte não está em condições de pagar as custas do processo e os honorários de advogado[xi], sem prejuízo próprio ou de sua família[xii].
Conforme leciona PONTES DE MIRANDA[xiii] “assistência judiciária e benefício da justiça gratuita não são a mesma coisa. O benefício da justiça gratuita é direito à dispensa provisória de despesas, exercível em relação jurídica processual, perante o juiz que promove a prestação jurisdicional. É instituto de direito pré-processual. A assistência judiciária é a organização estatal, ou para estatal, que tem por fim, ao lado da dispensa provisória das despesas, a indicação de advogado”.
No mesmo sentido José Cretella Junior, desenvolve raciocínio em termos de ser a assistência jurídica gratuita de natureza administrativa, partindo assim de tal premissa para elaborar o seu conceito, que indica:
"Benefício da justiça gratuita é o direito à dispensa provisória de despesas, exercível em relação jurídica processual, perante o juiz que tem o poder-dever de entregar a prestação jurisdicional. Instituto de direito pré-processual, a assistência judiciária é a organização estatal, ou paraestatal, que tem por fim, ao lado da dispensa provisória das despesas, a indicação de advogado. O instituto é mais do direito administrativo do que do direito judiciário civil, ou penal.
Denomina-se assistência judiciária o auxílio que o Estado oferece – agora, obrigatoriamente – ao que se encontra em situação de miserabilidade, dispensando-o das despesas, e providenciando-lhe defensor, em juízo. A lei de organização judiciária determina qual o juiz competente para a assistência judiciária; para deferir ou indeferir o benefício da justiça gratuita competente ao próprio juiz da causa. A assistência judiciária abrange todos os atos que concorram, de qualquer modo, para o conhecimento da justiça – certidões de tabeliães, por exemplo –, ao passo que o benefício da justiça gratuita é circunscrito aos processos, incluída a preparação da prova e as cautelares.[xiv] "
A concessão do benefício da gratuidade não requer postulação em procedimento apartado sendo examinado de plano, sem depender de prévia manifestação da parte contrária (contraditório diferido).
A gratuidade não é necessariamente integral. Pode ser concedida em relação a específicos atos processuais ou, ainda, significar a redução percentual de despesas processuais que o beneficiário tiver de adiantar no curso do processo (art. 98, § 5º) ou, ainda, seu parcelamento (art. 98, § 6º).
A concessão da gratuidade, por outro lado, não afasta o dever de o beneficiário pagar, ao final, as multas processuais que lhe sejam impostas. É o § 4º do art. 98 evidenciando o que não está compreendido no caput do dispositivo
Caberá a parte contrária[xv], após o deferimento, oferecer impugnação[xvi], nos autos do próprio processo[xvii] e sem suspensão do seu curso.
Como ensina Daniel Amorim Assumpção Neves sendo “revogado o benefício, a parte arcará com as despesas processuais que deixou de adiantar em razão da gratuidade de justiça. E, havendo a comprovação de má-fé, além do pagamento das despesas, sofrerá como sanção a aplicação de uma multa de até o décuplo do valor de tais despesas, se nesse caso a Fazenda Pública Estadual ou Federal for a credora, que poderá inscrever o valor da multa em dívida ativa e, não havendo pagamento, ingressar com a devida execução fiscal”[xviii].
E prossegue o referido autor afirmando que:
“A revogação do benefício em primeiro grau não impede a parte de agravar de instrumento da decisão sem recolher o preparo e outras custas processuais referentes ao ato de recorrer, nos termos dos §§ 1.º e 2.º do art. 101 do Novo CPC[xix].
As consequências da revogação da gratuidade da justiça estão previstas no art. 100, parágrafo único[xx], do Novo CPC. O caput do art. 102 do Novo CPC[xxi] reafirma tais consequências diante do trânsito em julgado da decisão que revoga a gratuidade, o que não deixa de ser curioso, porque em tese elas já deveriam ser geradas independentemente do trânsito em julgado.
O parágrafo único[xxii] do dispositivo traz novidades porque prevê as consequências do não recolhimento das despesas de cujo adiantamento a parte foi dispensada. Haverá extinção terminativa do processo no caso de a omissão partir do autor, e no caso do réu, não será deferida a realização de nenhum ato ou diligência requerida antes de o depósito ser efetuado.[xxiii]”
Feito o exame da gratuidade da justica passa-se ao exame da assitência judiciária gratuita.
1.3 ASSISTÊNCIA JUDICIÁRIA GRATUITA (ART. 790 DA CLT E LEI N. 5.584/70)
A assistência judiciária gratuita no âmbito da Justiça do Trabalho é disciplinada pelo § 3º do artigo 790 da CLT[xxiv] e Lei n. 5.584/70, artigo 14 § 1º[xxv].
Como leciona Rodrigues Pinto “justiça gratuita[xxvi] é a concessão legal, à parte que não dispõe de recursos financeiros para prover as despesas obrigatórias do processo de litigar com dispensa do respectivo encargo. Assistência Judiciária Gratuita é a concessão legal à parte que não dispõe de recursos financeiros para suportar o pagamento de honorários advocatícios, de ser assistida por advogado sem ter que suportar o respectivo encargo”[xxvii].
Bezerra Leite afirma que “a assistência judiciária, nos domínios do processo do trabalho, continua sendo monopólio das entidades sindicais, pois a Lei n. 10.288/2001 apenas derrogou (revogação parcial) o art. 14 da Lei n. 5.584/70, mesmo porque o seu art. 18 prescreve que a “assistência judiciária, nos termos da presente lei, será prestada ao trabalhador ainda que não seja associado do respectivo sindicato”. Na assistência judiciária, portanto, temos o assistente (sindicato) e o assistido (trabalhador), cabendo ao primeiro oferecer serviços jurídicos em juízo ao segundo.”
E prossegue a “assistência judiciária gratuita abrange o benefício da justiça gratuita e talvez por isso a existência de confusão a respeito destes dois institutos. Com efeito, o benefício da justiça gratuita, que é regulado pelo art. 790, § 3º, da CLT, pode ser concedido, a requerimento da parte ou de ofício, por qualquer juiz de qualquer instância a qualquer trabalhador, independentemente de ser ele patrocinado por advogado ou sindicato, que litigue na Justiça do Trabalho, desde que perceba salário igual ou inferior ao dobro do mínimo legal ou que declare que não está em condições de pagar as custas do processo sem prejuízo do sustento próprio ou de sua família[xxviii]”
Em razão da alteração da competência da Justiça do Trabalho, estabelecida pela Emenda Constitucional n. 45/2004, em 2005 o TST editou a Instrução Normativa n. 27/2005[xxix], disciplinando o deferimento dos honorários advocatícios. De acordo com a citada Instrução Normativa nas demandas decorrentes da relação de trabalho não subordinado, a condenação ao pagamento de honorários advocatícios decorre de simples sucumbência.
A jurispurdência sumulada do TST[xxx] determina que no caso de demanda decorrente da relação de emprego, a condenação ao pagamento de honorários advocatícios não decorre pura e simplesmente da sucumbência, devendo a parte vencedora estar assistida por sindicato da categoria profissional e comprovar a percepção de salário inferior ao dobro do mínimo legal, ou que a sua situação econômica não lhe permita demandar sem prejuízo do próprio sustento ou da família. No mesmo sentido a Súmula 633 do Supremo Tribunal Federal[xxxi].
Digno de nota é o Incidente de Resolução de Recursos Repetitivos nº RR – 341-06.2013.5.04.0011[xxxii], que examinará a questão relativa ao direito aos honorários assistenciais em reclamações trabalhistas típicas, envolvendo trabalhadores e empregadores, consideradas as disciplinas das Leis 1.060/50 e 5.584/70, do art. 5º, LXXIV, da CF, e o teor das Súmulas 219 e 329 do TST. A questão tem fundamento do dissenso jurisprudêncial observado na Súmula 61 do TRT da 4ª Região[xxxiii] que defere os honorários de assistência judiciária àqueles que preencherem os requisitos da gratuidade da justiça previsto na Lei n. 1.060/50.
Já a jurisprudência dos demais Tribunais Regionais é conforme a Súmula 219 do TST[xxxiv].
Feita a distinção entre assistencia jurídica integral, justiça gratuita e assistência judiciária gratuita passa-se ao exame das despesas processuais.
1.4- DAS DESPESAS JUDICIAIS
Inicialmente deve-se considerar que o exercício da atividade jurisdicional, como toda e qualquer atividade do Estado, apresenta um custo. Os prédios, instalações, equipamentos, material e funcionários do Poder Judiciário, tudo demanda gasto financeiro. Esses gastos são distribuídos entre o Estado e as parte. Para Elpidio Donizetti Nunes “é prudente e recomendável que as partes sejam compelidas a contribuir com o custeio do processo, como forma de se evitar o demandismo em massa”[xxxv].
As despesas judiciais são todos os gastos que se fazem em juízo, durante o processo, para PONTES DE MIRANDA, compreendem custas, honorários advocatícios, multas impostas às partes, custos da perícia, condução e indenização as testemunhas, os pareceres de jurisconsultos, etc[xxxvi].
Ensina André Puccinelli Júnior que os “gastos com o processo dividem-se em despesas processuais e honorários advocatícios. Despesas processuais englobam todos os gastos devidos aos agentes estatais (Poder Judiciário e auxiliares da justiça). Tais despesas envolvem a taxa judiciária (tributo), emolumentos devidos a eventuais cartórios não oficializados, custo de diligências e remuneração dos auxiliares da justiça eventuais (peritos etc.)”[xxxvii].
Despesas processuais têm sentido mais amplo do que custas. As custas são remunerações previstas nos regimentos federal e estaduais, enquanto as despesas, além de abrangê-las, envolvem também todas as outras exigidas no desenrolar do processo.
Como leciona Bezerra Leite “as custas, à luz do art. 145, II, da CF e do art. 77 do CTN[xxxviii], têm natureza jurídica de taxa[xxxix] (melhor seria empregar o termo “taxa judiciária”), espécie do gênero tributo, pois são valores pagos pela parte ao Estado em decorrência da prestação de um serviço público específico: a prestação jurisdicional. Nessa perspectiva, os jurisdicionados são os usuários dos serviços (públicos) jurisdicionais prestados pelo Estado”[xl].
E prossegue o doutrinador agora conceituando emolumentos como “ressarcimentos das despesas efetuadas pelos órgãos da Justiça do Trabalho pelo fornecimento de traslados, certidões, cartas etc. ao usuário (parte interessada). Os emolumentos também podem ser enquadrados na categoria de taxa, pois não deixam de ser um valor pago pelo usuário como contraprestação do serviço público jurisdicional federal a ele prestado por um órgão (Justiça do Trabalho) que integra o Poder Judiciário da União.[xli]”
Com as alterações introduzidas no art. 789 da CLT pela Lei n. 10.537[xlii], as custas relativas ao processo trabalhista de conhecimento, nos dissídios individuais ou em quaisquer outras ações (ou procedimentos) de competência da Justiça do Trabalho incidirão na base de 2% (dois por cento), observado o mínimo de R$ 10,64 (dez reais e sessenta e quatro centavos).
O Tribunal Superior Eleitoral editou as Súmulas 25[xliii], 36[xliv], 53[xlv], 86[xlvi], 170[xlvii] e as Orientações Jurisprudenciais 33[xlviii], 104 (CANCELADA), 140[xlix], 158[l], 186 (CANCELADA) da SDI 1. e a OJ. 148 da SDI 2[li] e 27 da SDC[lii] sobre a matéria.
2- DA AÇÃO DO NOTÁRIO OU REGISTRADOR CONTRA O DEFERIMENTO DA GRATUIDADE DA JUSTIÇA
A gratuidade da justiça compreende tudo aquilo que está enumerado nos incisos do art. 98, § 1° inc IX[liii], incluindo os emolumentos devidos a notários e registradores em decorrência da prática de atos de registro ou averbação, bem como atos notariais necessários para a efetivação de decisão judicial ou à continuidade do processo judicial no qual o benefício tenha sido concedido[liv]. Mas ao notário ou registrador é dado postular a revogação do benefício, se houver dúvida sobre o preenchimento dos requisito, na forma do §8º, do art. 98 do CPC.
Cumpre destacar que a Lei Processual exige que o notário ou registrador pratique os atos notariais necessários para a efetivação de decisão judicial ou à continuidade do processo judicial no qual o benefício tenha sido concedido antes de ingressar com ação judicial impugnando a concessão do benefício.
O § 7º do artigo 98 do CPC[lv] prevê a aplicação dos §§ 3º a 5º do art. 95 também do CPC[lvi].
O beneficiário da gratuidade será citado e terá prazo de 15 (quinze) para contestar o pedido de revogação total ou parcial do benefício ou a sua substituição pelo parcelamento das despesas.
Conforme a literalidade da Lei é do juízo competente para decidir questões notariais ou registrais (Vara Especializada em Registros Públicos), e não do juízo do processo no qual a gratuidade foi concedida. Dessa forma, pode haver juízo do mesmo grau jurisdicional em conflito haja vista que a concessão da gratuidade, alcança muito mais do que o pagamento dos emolumentos cartorários. Três soluções são possíveis:
O juízo da Vara de Registros Públicos decidir que não pode revogar a concessão do benefício deferido no processo originário. Tal solução faria letra morta o § 8º do art. 98 do CPC. Solução que não parece adequada.
O juízo da Vara de Registros Públicos revoga o benefício ocasionando o que Norberto Bobbio conceitua como antinomia “aquela situação que se verifica entre duas normas incompatíveis, pertencentes ao mesmo ordenamento e tendo o mesmo âmbito de validade.[lvii]” Essa solução levaria a uma contradição lógica de decisões judiciais de mesmo grau de jurisdição, também não sendo adequada.
Por fim, a solução aparentemente mais adequada é aquela em que a decisão de revogação da gratuidade deferida seria eficaz apenas com relação aos emolumentos devidos ao notário ou registrador, para as demais despesas a gratuidade continuaria vigendo. Aqui ainda se verifica contradição lógica, contudo não há contradição pratica de decisões. Como leciona Carlos Maximiliano a “incompatibilidade implícita entre duas expressões de direito não se presume; na dúvida, se considerará uma norma conciliável com a outra.[lviii]”
CONCLUSÃO
A assistência jurídica integral e a gratuidade da justiça tem intima relação com democracia e sua indissociabilidade em relação ao processo como instrumento de realização da Justiça. Acesso à Justiça é “acesso à ordem jurídica justa”; é reflexo das conquistas democráticas e da busca de igualdade entre os homens; em última instância, a garantia depende de um processo democrático e só ocorre, em seus termos completos, quando há paridade de armas e oportunidades processuais.
Para Canotilho o princípio da máxima efetividade da norma constitucional possui a seguinte formulação: “a uma norma constitucional deve ser atribuído o sentido que maior eficácia lhe dê[lix]” Gilmar Mendes ao comentar o princípio adverte que, “embora se trate de um princípio aplicável a toda norma constitucional, tem espaço de maior realce no campo das normas constitucionais programáticas e no domínio dos direitos fundamentais. A eficácia da norma deve ser compreendida como a sua aptidão para produzir os efeitos que lhes são próprios. Esse princípio, na realidade, vem sancionado, entre nós, no § 1º do art. 5º da Constituição, que proclama a aplicação imediata das normas definidoras de direitos e garantias fundamentais.[lx]”
E prossegue o Ministro ao afirmar que “não se deve pressupor que o legislador haja querido dispor em sentido contrário à Constituição; ao contrário, as normas infraconstitucionais surgem com a presunção de constitucionalidade. Daí que, se uma norma infraconstitucional, pelas peculiaridades da sua textura semântica, admite mais de um significado, sendo um deles coerente com a Constituição e os demais com ela incompatíveis, deve-se entender que aquele é o sentido próprio da regra em exame leitura também ordenada pelo princípio da economia legislativa (ou da conservação das normas). A interpretação conforme a Constituição possui, evidentemente, limites. Não pode forçar o significado aceitável das palavras dispostas no texto nem pode desnaturar o sentido objetivo que inequivocamente o legislador quis adota”[lxi].
A interpretação dada ao § 8º do Art. 98 do CPC, ao restringir o alcance da revogação dos benefícios da gratuidade da justiça apenas aos emolumentos devidos ao notário/registrador é a que melhor se moldura aos preceitos constitucionais vigentes.
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