Como é sabido, o Novo Código de Processo Civil, em seu arcabouço normativo, promoveu grande reformulação no instituto da produção antecipada de prova, desvinculando-o do requisito da urgência e retirando-lhe a acessoriedade a uma necessária demanda judicial principal, balizas que regiam a antecipação da prova na vigência do CPC/73.
A partir dessas alterações, pode-se afirmar que foi consagrado com o novo diploma processual um direito autônomo à prova, do qual a parte pode se valer até mesmo para evitar um litígio. Ou seja, a ação de produção antecipada da prova “se esgota na produção da prova - tão somente”[1], já que não objetiva que o magistrado reconheça os fatos provados, nem que este certifique situações jurídicas em decorrência dos fatos provados.
Porém, como instituto relativamente novo, pelo menos nos atuais moldes, surgem alguns pontos controversos a respeito de sua correta compreensão. Dentro de tais pontos, surge a questão da competência para a ação de produção antecipada da prova e suas peculiaridades.
O Código de Processo Civil, ao tratar do procedimento de produção antecipada da prova, assim dispôs:
Art. 381. A produção antecipada da prova será admitida nos casos em que:
I - haja fundado receio de que venha a tornar-se impossível ou muito difícil a verificação de certos fatos na pendência da ação;
II - a prova a ser produzida seja suscetível de viabilizar a autocomposição ou outro meio adequado de solução de conflito;
III - o prévio conhecimento dos fatos possa justificar ou evitar o ajuizamento de ação.
(...)
§2º. A produção antecipada da prova é da competência do juízo do foro onde esta deva ser produzida ou do foro de domicílio do réu.
§3º. A produção antecipada da prova não previne a competência do juízo para a ação que venha a ser proposta.
§4º. O juízo estadual tem competência para a produção antecipada de prova requerida em face da União, de entidade autárquica ou de empresa pública federal se, na localidade, não houver vara federal.
Quanto à não prevenção da competência do juízo para a ação que eventualmente venha a ser proposta, não se verifica muita controvérsia, à medida que a regra vazada no §3º do dispositivo acima colacionado trata-se de positivação do entendimento jurisprudencial consagrado na Súmula 263 do extinto Tribunal Federal de Recursos.
Concernentemente ao foro competente para o ajuizamento da ação, da análise dos trechos destacados do dispositivo colacionado, infere-se que a competência para o processamento da produção antecipada da prova incumbe ao juízo do foro onde deva ser produzida ou do foro de domicílio do réu.
De fato, o diploma processual não traz qualquer regra explícita sobre subsidiariedade entre os foros nos quais é possível o ajuizamento da ação de produção antecipada da prova. Com efeito, embora da análise da sistemática adotada pelo Código de Processo Civil retire-se que a competência territorial é relativa, constituindo exemplo clássico desta modalidade de competência, há exceções a tal regra, conforme, por exemplo, o próprio art. 47, §§ 1º e 2º, do CPC, dispositivos que atribuem competência territorial absoluta ao foro de situação da coisa para ações sobre direito real imobiliário que versem sobre propriedade, vizinhança, servidão, divisão e demarcação de terras, nunciação de obra nova e possessórias sobre imóveis
Considerando, ainda, que o procedimento de produção antecipada da prova não previne a competência do juízo para futura ação a ser proposta, a competência incumbida ao foro onde deva ser produzida a prova, pelo menos para as provas em que se faz necessário o exame in loco, assume a natureza de competência absoluta, justamente por ser a intenção do legislador processual, ao que parece, promover a economia processual, de modo que sejam evitados atos dispendiosos ao processar-se a demanda em local distinto daquele em que, obrigatoriamente, tenha que ser produzida a prova, dando-se, assim, ênfase ao postulado da eficiência.
Ademais, como indício de que o foro do local onde deva ser produzida a prova possui, senão natureza absoluta, pelo menos prevalência sobre o foro de domicílio do réu é o disposto no § 4º do art. 381 do Código de Processo Civil, o qual determina que é ao juízo estadual a quem compete a produção antecipada de prova, mesmo que postulada em face da União, de entidade autárquica ou empresa pública federal, nas localidades em que não haja Vara Federal.
Inobstante exista o direito de escolha do foro, tal escolha deve ser realizada na estrita observância dos princípios de competência, eficiência e da boa-fé processual, não havendo sentido em se propor, por exemplo, ação de produção antecipada de prova pericial sobre imóvel em foro distinto daquele do local em que se situa o bem (onde a prova será produzida); Depreende-se, portanto, que o foro de domicílio do réu deve ser tido como foro excepcional, subsidiário ao do local em que se situa o imóvel nas ações de produção antecipada da prova que visam à realização de prova pericial imobiliária[2].
[1] DIDIER JR., Fredie; BRAGA, Paula Sarno; OLIVEIRA, Rafael Alexandria, Curso de Direito Processual Civil: teoria da prova, direito probatório, ações probatórias, decisão, precedente, coisa julgada e antecipação dos efeitos da tutela. 11 - ed. - Salvador: Ed. Jus Podivm, 2016, p. 141.
[2] Nesse sentido, posicionam-se DIDIER JR., Fredie; BRAGA, Paula Sarno; OLIVEIRA, Rafael Alexandria, Curso de Direito Processual Civil: teoria da prova, direito probatório, ações probatórias, decisão, precedente, coisa julgada e antecipação dos efeitos da tutela. 11 - ed. - Salvador: Ed. Jus Podivm, 2016, pp. 146-147.