Desistência no Mandado de Segurança e desnecessidade de oitiva do réu: uma revisão de conceitos.

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Este artigo enfrenta o tema da desistências no Mandado de Segurança e a necessidade de oitiva do réu. Ele foi inicialmente escrito em julho de 2007, mas devido ao advento da Nova Lei do MS e à citação dele no LI Concurso do MPMG, publico-o novamente.

Palavras-chave: Mandado de Segurança. Desistência. Necessidade de Oitiva do Réu.

Sumário: Introdução – 1 - O Mandado de Segurança como ação civil: algumas conseqüências - 2 – Do Mandado de Segurança como instrumento de garantia das partes à escolha entre o certo e o errado, entre o justo e o injusto, independentemente da origem do seu destinatário – 2 - Distinção entre autoridade coatora e réu no MS – 3 - Controle de legalidade como direito das partes – 4 - Posicionamento da jurisprudência: crítica – Conclusão – Bibliografia

Introdução

O Mandado de Segurança não é uma ação nova, pelo contrário, já conta com quase um século de existência, pois sua origem remonta aos primórdios da República brasileira. Sua nova lei regente, a de n° 12.016, de 7 de agosto de 2009, completará neste ano de 2012 três anos, substituiu a famosa lei de n° 1.533, de 31 de dezembro de 1951, que contava com mais de sessenta anos de existência, e as leis de nºs 4.166, de 4 de dezembro de 1962, 4.348, de 26 de junho de 1964, 5.021, de 9 de junho de 1966. Entretanto, muitos mitos e tabus ainda se apresentam quando estamos tratando de Mandado de Segurança.

Neste artigo, porém, buscaremos enfrentar um dos mitos teóricos que afligem este remédio de índole constitucional a que a Jurisprudência não dá atenção. Aqui estudaremos a homologação da desistência do mandado de segurança, buscando uma revisão no conceito de que ela pode se efetivar sem a anuência do réu após a sua citação, partindo do pressuposto teórico lançado na versão anterior, ampliando, porém, a esfera de estudo em que fica bem mais evidente o equívoco jurisprudencial.

A jurisprudência do STF já se manifestou no sentido de que a oitiva do réu é desnecessária. Todavia, ao se investigar os pilares do Mandado de Segurança, sobretudo, quanto ao julgamento da legalidade ou não-abusividade do ato administrativo objeto dessa ação mandamental, restará demonstrada a insubsistência da tese jurisprudencialmente firmada.

Assim, no transcorrer deste trabalho, serão abordadas a evolução histórica do Mandado de Segurança como ação civil, a ação de Mandado de Segurança como instrumento de garantia das partes à escolha entre o certo e o errado, entre o justo e o injusto, independentemente da origem do seu destinatário, a distinção entre autoridade coatora e réu nesta ação, o controle da legalidade como direito não só de uma das partes, mas de ambas, uma análise crítica da jurisprudência do STF, promovendo, assim, uma necessária revisão de conceitos sobre o Mandado de Segurança.

1 - O Mandado de Segurança como ação civil: algumas conseqüências

Sempre que estudamos o Mandado de Segurança ouvimos a doutrina afirmar que o mandamus é uma ação civil. Tal informação, quando confrontada com a Constituição de 1988, ganha relevância significativa, pois demonstra que o Mandado de Segurança não é uma ação penal e nem administrativa, já que a partir de 1988, no sistema brasileiro, ficaram bem distintos os processos de natureza civil, penal e administrativo.

Contudo, apesar do avanço que revela a natureza de ação civil, parece, ainda assim, hesitante a doutrina em definir os contornos do Mandado de Segurança como ação distinta da penal e da administrativa. Tal hesitação só aumenta quando, apesar de civil, ventilamos a aplicação do Código de Processo Civil ao Mandado de Segurança.

A sensação que se destaca, quanto à aplicação do CPC com seus avanços científicos e técnicos à ação de Mandado de Segurança é um verdadeiro e injustificado tabu.

Para os que têm formação jurídica pós 1988, a compreensão desse tabu é difícil porque simplesmente não viveram o processo de formação do Mandado de Segurança. Por isso, fazendo uso do método histórico, para que possamos chegar ao hoje e romper os grilhões do tabu atinente à aplicação do CPC ao Mandado de Segurança é preciso voltar ao passado e descobrir a origem do problema.

Como bem destaca CASTRO NUNES: “As origens do Mandado de Segurança estão naquele memorável esforço de adaptação realizado pela jurisprudência, sob a égide do Supremo Tribunal, em torno do habeas corpus, para não deixar sem remédio certas situações jurídicas que não encontravam no quadro das nossas ações a proteção adequada.”i Aqui se descobre o primeiro motivo por que a doutrina cansativamente afirma ser civil a natureza do Mandado de Segurança. Ele surge como solução para os casos em que o habeas corpus não servia, tinha e ainda tem ele, por conseguinte, a nobre natureza de ser uma ação contra atos do poder público, distintos do cerceamento da liberdade.

Mais adiante CASTRO NUNES informa que a ideia de um remédio distinto e paralelo ao habeas corpus surgiu no Congresso brasileiro em 1922, então presidido pelo ministro Muniz Barreto, mas acabou interrompida em 1926 pela Reforma Constitucionalii. Como sabemos, apesar de nessa época já se viver no Brasil o período da República, o processo civil brasileiro ainda era todo baseado nas ordenações filipinas. Por isso é que o Congresso brasileiro discutia as reformas das ações judiciais, pois estas exprimiriam a mais alta manifestação de proteção ao direito, assegurado pelo Estadoiii.

Assim, debatia o Congresso Nacional a criação dessa ação judicial de mesma envergadura que o habeas corpus, pois destinado a proteger a sociedade dos atos do poder público. Vários nomes foram inicialmente propostos. Alberto Tôrres propôs que fosse nominada tal ação de mandado de garantia, mas o deputado Alcântara Machado, então presidente da Comissão de Constituição e Justiça da Câmara dos Deputados, juntamente com João Mangabeira, Temístocles Cavalcanti, Carlos Maximiliano e Afrânio de Melo Franco debateram o tema, fazendo uso de evolução histórica, cujo ponto de partida foi a lei nº 221/1894 – instituidora de uma ação especial para a invalidação dos atos da administração lesivos a direitos individuais –, culminando no art. 113, nº 23, da CF/1934iv, propôs o nome de mandado de segurança.

Fato que salta aos olhos é o de que apesar de ser inaugurado o Mandado de Segurança como direito e garantia fundamental em 1934, no art. 113, nº 33, o Mandado de Segurança continuava umbilicalmente ligado ao habeas corpus, pois o texto constitucional indicava que ele seria processado da mesma forma que o habeas corpus, sendo ouvida a pessoa de direito público interessada.

Em 16 de janeiro de 1936, foi promulgada a lei nº 191 que regulava muito mais do que o processo do Mandado de Segurança. Porém, apesar do avanço que já representava, os tribunais pátrios hesitaram em aplicar a novidade. Já a Constituição de 1937, contrariamente à de 1934, silenciou quanto à garantia constitucional do Mandado de Segurança. Assim, o mandamus deixou de ser meio de defesa contra os atos do Presidente da República. Porém, o Código de Processo Civil de 1939 cuidou da ação de Mandado de Segurança a partir do art. 319v, em que expressamente afastava do campo de atuação do writ os atos do Presidente da República, dos Ministros de Estado, Governadores e Interventores. Graças à queda do Estado Novo e à nova Constituição de 1946, o Mandado de Segurança é novamente alçado à garantia constitucional, sendo vazada a sua aplicabilidade contra ato de qualquer autoridade no art. 141, § 24, da CF/1946vi. Posteriormente, em 31 de dezembro de 1951, a lei 1.533 é promulgada, revogando-se os artigos do Código de Processo Civil que cuidavam da matéria, inaugurando, assim, a grande discussão sobre a aplicabilidade ou não do CPC ao Mandado de Segurança.

Com o advento da lei 1.533/1951 a doutrina começou a tratar o Mandado de Segurança como uma ação, apesar de natureza civil, de forma completamente estanque e distante do processo civil, erro que esperamos não ser repetido agora com o advento da nova Lei do Mandado de Segurança. Todavia, apesar de a lei 1.533/1951 ter mantido vários artigos com conteúdos semelhantes ou até mesmo idênticos aos do Código de Processo Civil, o processamento do Mandado de Segurança se mostrava e ainda se mostra difícil e extremamente lacunoso, pois várias normas atinentes ao processamento da ação mandamental não se encontravam expressamente previstas na lei 1.533/1951 nem na lei n. 12.016/2009.

Isso ocorreu porque ao ser retirado do CPC o regramento do Mandado de Segurança, toda a estrutura normativa e procedimental da legislação processual civil deixou de ser aplicada ordinariamente ao processamento do Mandado de Segurança, sobretudo por causa dos arts. 19 e 20vii. O primeiro limitava a aplicação do CPC ao Mandado de Segurança exclusivamente quanto às normas relativas ao litisconsórcio; o outro, revogou as normas previstas no CPC atinentes ao Mandado de Segurança.

Assim, devido à necessidade de um regramento próprio, quanto a seu procedimento, foi introduzida no ordenamento pátrio a lei 4.348/64viii, cujo objetivo foi o de regular o procedimento do Mandado de Segurança. Posteriormente, veio a lei nº 5.021/66 a complementar o procedimento atinente ao mandamus.

Chegamos finalmente à Constituição de 1988, que prevê no art. 5º, LXIX e LXX, a possibilidade de se conceder Mandado de Segurança para proteger direito líquido e certo, não amparado por "habeas-corpus" ou "habeas-data", quando o responsável pela ilegalidade ou abuso de poder for autoridade pública ou agente de pessoa jurídica no exercício de atribuições do Poder Público; e também o Mandado de Segurança coletivo pode ser impetrado por partido político com representação no Congresso Nacional; ou organização sindical, entidade de classe ou associação legalmente constituída e em funcionamento há pelo menos um ano, em defesa dos interesses de seus membros ou associados.

A Nova Lei de Mandado de Segurança, por sua vez, trouxe os arts. 24 e 25 que prescrevem: aplicarem-se ao Mandado de Segurança os arts. 46 a 49 do Código de Processo Civil, e que não cabem, no processo de Mandado de Segurança, a interposição de embargos infringentes e a condenação ao pagamento dos honorários advocatícios, sem prejuízo da aplicação de sanções no caso de litigância de má-fé. Noutras palavras, o novo repetiu, com um pouco mais de adorno, os mesmos preceitos do passado.

Depois dessa evolução histórica, podemos observar que os dois problemas quanto à consequência de ser civil a ação de Mandado de Segurança ainda continuam presentes. Assim, relembrando quais seriam esses problemas, temos que um, é o da aplicação das normas atinentes ao Código de Processo Civil ao Mandado de Segurança quanto ao procedimento em si; o outro, é o do enquadramento do Mandado de Segurança como uma ação apartada e estanque da teoria geral do processo.

Logo, por que não se aplicar ao Mandado de Segurança as normas do processo civil de forma ordinária? Somente por causa dos arts. 19 e 20 da lei 1.533/51, que revogaram os dispositivos contidos no Código de Processo Civil de 1939, e agora por conta dos arts. 24 e 25 da Lei nº 12016/2009? Será que assim emprestaremos ao Mandado de Segurança a efetividade e densidade mandamental que lhe são caras como direito e garantia fundamental?

Não entendemos correta a resposta positiva às perguntas acima lançadas, pelo contrário. Conforme demonstraremos em tópico próprio, a ideia mesma de Mandado de Segurança como veiculador de proteção a direito exclusivo do administrado precisa ser superada. Os direitos fundamentais não são unilaterais, a própria Administração também deve ser amparada pelos direitos e garantias fundamentais, sobretudo porque ao se garantir tais direitos ao Estado, estamos também se resguardando o direito da própria sociedade e do próprio cidadão à segurança jurídica.

2 – Do Mandado de Segurança como instrumento de garantia das partes à escolha entre o certo e o errado, entre o justo e o injusto, independentemente da origem do seu destinatário

O processo, como sabemos, surge como uma forma de compor litígios. Ele nasce da necessidade de o Estado se substituir aos particulares, retirando-lhes o império da prevalência da força bruta e lhes impondo a consequência da lei. Importa destacar, porém, que não pretendemos discutir a origem histórica do processo, e, por uma questão didática, adotamos, como ponto de partida, o processo no Império Romano.

Porém, essa mudança não foi facilmente aplicada. Em verdade, ela resultou da grande transformação do jus privatum para o jus publicum. Antes mesmo da formação da ideia de Estado Romano, o direito vigente era os das famílias, cada pater familia tinha um ordenamento jurídico próprio e soberano1. Tal poder era tão absoluto que ninguém podia interferir nas decisões de cada família romana. Entretanto, as famílias começaram a formar cidades e, com isso, surgiram novas relações, que passaram a ser regradas pelas leis da cidade.

Essa, portanto, convivia com dois direitos totalmente distintos, o privatum e o publicum, este era de competência do Senado, uma assembleia composta pelas famílias romanas, ou seja, pelos patrícios. Assim, como bem destaca Cláudio de Cicco: “vemos, pois, que Roma tinha um governo monárquico, temperado pela influência do Senado, que elegia o novo rei quando o ocupante vinha a falecer.”2

Posteriormente, com a ampliação do império romano, surgiu a necessidade de se regular não só o direito das famílias e da cidade, mas também da plebe, surgindo as leis das doze tábuas, como bem esclarece o professor supracitado, in verbis:

Havia, então, como que duas cidades: a dos patrícios, com os cônsules e o Senado; e a dos plebeus, com o tribuno da plebe e o plebiscito. Depois disso, a plebe passou a exigir maior participação na cidade patrícia, pela igualdade civil, política e religiosa. A igualdade civil foi conseguida pela Lei das Doze Tábuas. Em 451 a.C., os patrícios entregaram a dez homens (decênviros) o encargo de fazer leis de equiparação entre os patrícios e os plebeus.3

Assim, como a lei das doze tábuas foram gravadas em lâminas de bronze e apostas no Fórum de Roma, concluímos que a principal função dessas leis era garantir a todos os que precisavam da decisão dos juízes e dos pretores a certeza de que seriam julgados não pela origem (patrícios ou plebeus), e sim pela determinação contida nas leis, nas duras leis, mas apenas nas leis.

Logo, a ideia de processo se liga à de garantia, sobretudo, na medida em que o Estado passa a monopolizar o poder de dizer o direito. Desta forma, submeter-se ao processo implica promover a igualdade entre os envolvidos no litígio, e essa igualdade se reflete também no suportamento do peso do tempo.

Vários princípios e valores incidem sobre a normatização e teorização do processo para assegurar que ele seja uma garantia. A ampla defesa, o contraditório, o devido processo legal, o duplo grau de jurisdição4 e, atualmente, também a duração razoável são princípios indispensáveis à construção desse processo-garantia.

Entretanto, mesmo sendo princípios de índole fundamental, eles não são absolutos e não podem ser suscitados a ponto de anularem-se uns aos outros. Precisamos que o processo seja o devido, que a defesa seja a ampla – mas não ilimitada –, que o contraditório seja o material, que as decisões judiciais possam ser revistas por um órgão distinto dos seus prolatores, mas é essencial que tudo isso aconteça dentro de um limite temporal razoável.

Neste panorama, portanto, devemos pensar o processo não apenas como um meio hábil para a satisfação de um direito material – mas como uma garantia –, como uma fundamental garantia de que, independentemente de qualquer origem, as pessoas serão submetidas a julgamentos pelo Estado num tempo equânime.

É por meio do processo que o Estado garante a todos a segurança de que a força admitida para dirimir um conflito é sua, e não a das partes em suas ipsiedades ou singularidades5.

Desta forma, a EC nº 45/04 apenas cristalizou6, no inciso LXXVIII, a ideia que já circundava o meio social quando se pensava em processo e, especial, em garantia. Prescrever que a todos, no âmbito judicial e administrativo, são assegurados a razoável duração do processo e os meios que garantam a celeridade de sua tramitação, é revestir de traje fundamental um princípio já conhecido de todos.

Assim, o nosso desafio diante da norma constitucional acima exposta é enorme. Vê-la como direito fundamental, por mais fundamental que já implicasse ser a sua ideia, significa revermos velhos paradigmas, pois como bem leciona Luís Roberto Barroso, em matéria de direitos constitucionais:

O discurso acerca do Estado atravessou, ao longo do século XX, três fases distintas: a pré-modernidade (ou estado liberal), a modernidade (ou estado social) e a pós-modernidade (ou estado neo-liberal). A constatação inevitável, desconcertante, é que o Brasil chega à pós-modernidade sem ter conseguido ser liberal nem moderno. Herdeiros de uma tradição autoritária e populista, elitizada e excludente, seletiva entre amigos e inimigos – e não entre certo e errado, justo ou injusto –, mansa com os ricos e dura com os pobres, chegamos ao terceiro milênio atrasados e com pressa.7

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Logo, a duração razoável do processo não pode ser sinônimo de pressa, pois assim como a justiça lenta é injusta, a célere demais também será. Necessitamos escolher entre o certo e errado, entre o justo e o injusto, independentemente da origem do seu destinatário, garantindo, assim, a todos um processo adequado, razoável, certo e justo em todos os seus aspectos.

E o Mandado de Segurança, como uma ação civil de natureza constitucional – voltada à defesa do administrado contra os atos administrativos praticados pelo Estado ou quem lhe faça as vezes – é uma garantia fundamental do administrado, portanto, submetida a essa mesma necessária situação de direitos constitucionais.

Não podemos esquecer que o Mandado de Segurança está inserido no título dos direitos e garantias fundamentais da ordem jurídica brasileira, de modo que ele é a um só tempo direito e garantia fundamental. Ele é direito, quando visto sob o prisma da sua ontologia, porque representa o direito ao instrumento hábil de defesa contra atos estatais; e, garantia porque ele serve à defesa de outros direitos – positivos ou negativos - contra esse mesmo Estado.

Todavia, o Mandado de Segurança deve ser compreendido não apenas como uma ação civil de natureza constitucional, voltada à defesa do administrado contra os atos administrativos praticados pelo Estado, mas como uma ação constitucional destinada a conferir a toda a sociedade a segurança de que a Administração Pública atue sempre de forma legal e não-abusiva (impessoal).

A compreender o Mandado de Segurança como um via de “mão dupla”, incluímos como destinatária dessa segurança a própria Administração Pública, pois, se é certo que o administrado tem direito de pedir ao Judiciário que impeça a violação ou ameaça a um direito líquido e certo seu; é igualmente certo que a Administração Pública também tem direito que o Judiciário se pronuncie sobre a legalidade ou não abusividade do ato praticado por agente seu, quando esse ato for impugnado judicialmente.

Com isso, promovemos a seleção entre o certo e o errado, entre o justo e o injusto, independentemente da origem do seu destinatário, garantindo, assim, a todos um processo adequado e razoável.

2 - Distinção entre autoridade coatora e réu no MS

A autoridade coatora não se confunde com o réu no Mandado de Segurança. A autoridade é o impetrado, o autor é impetrante, mas o réu não é o impetrado. É preciso distinguir entidade, órgão e autoridade. Nesse aspecto, revela-se de grande valia a definição legal contida na lei 9.784/99, pois prescreve ser autoridade o servidor público dotado de poder de decisão; órgão a unidade de atuação integrante da estrutura da Administração direta e indireta; e entidade a unidade de atuação dotada de personalidade jurídica.

Ora, como se sabe, para ser réu, portanto parte no processo, é preciso ser dotado de personalidade jurídica. Assim, como o impetrado é a autoridade coatora, isto é, o servidor público dotado de poder de decisão e como ele é agente público, integrante de um órgão público de uma entidade da Administração, parece claro que ele, em sua singularidade, não possui personalidade jurídica.

No Brasil adotou-se a teoria de Otto Gierke, que define o agente como órgão integrante da pessoa jurídica, não sendo nem representante e nem mandatário do Estado. Logo, a autoridade é órgão da pessoa jurídica a que pertence, de modo que ao praticar um ato administrativo, que o pratica não é, em verdade, a autoridade, mas a própria entidade.

Portanto, a autoridade coatora, apesar de ser uma pessoa física, dotada de personalidade jurídica, no Mandado de Segurança não passa de um órgão do réu. Noutras palavras, a autoridade coatora, impetrado, é chamada no Mandado de Segurança não para defender-se ou para defender o ato administrativo impugnado, mas para apresentar ao juiz os porquês de ter praticado aquele ato jurídico.

As informações da autoridade coatora, por lógico, devem limitar-se às matérias atinentes à competência, a legalidade, aos motivos, ao objeto, à finalidade e, sobretudo, ao não cometimento de abuso de poder.

Já a entidade a que pertence a autoridade coatora tem a faculdade de responder ao Mandado de Segurança, isto é, apresentar contestação, exceções, recursos, suspensão de segurança etc. Logo, não há se confundir impetrado e réu no Mandado de Segurança. Aquele é a autoridade coatora, servidor dotado de poder de decisão; este, a entidade a que pertence a autoridade coatora dotada de personalidade jurídica.

3 - Controle de legalidade como direito das partes

O Mandado de Segurança é uma ação civil de natureza constitucional, voltada à defesa do administrado contra os atos administrativos praticados pelo Estado. Essa, pelo menos, sempre foi a idéia elementar quando se trata de Mandado de Segurança. Digo sempre foi, porque aqui se proporá um importante questionamento a essa idéia.

O art. 1º da Lei 1.533/51 prescreve que se concederá Mandado de Segurança para proteger direito líquido e certo, não amparado por habeas corpus, sempre que, ilegalmente ou com abuso do poder, alguém sofrer violação ou houver justo receio de sofrê-la por parte de autoridade, seja de que categoria for e sejam quais forem as funções que exerça. Destaca-se aqui um ponto pouco observado pela jurisprudência: a ilegalidade ou o abuso do poder violadores dum direito líquido e certo do impetrante.

Não basta, portanto, que se tenha um direito líquido e certo, é preciso que haja violação ou receio justo de violação a esse direito através de ato administrativo ilegal ou abusivo. Aqui, se é obrigado a tratar da ilegalidade e do abuso de poder na prática do ato administrativo, remetendo-se o leitor à lei de ação popular, que prescreve o seguinte, in verbis:

Art. 2º São nulos os atos lesivos ao patrimônio das entidades mencionadas no artigo anterior, nos casos de:

a) incompetência;

b) vício de forma;

c) ilegalidade do objeto;

d) inexistência dos motivos;

e) desvio de finalidade.

Parágrafo único. Para a conceituação dos casos de nulidade observar-se-ão as seguintes normas:

a) a incompetência fica caracterizada quando o ato não se incluir nas atribuições legais do agente que o praticou;

b) o vício de forma consiste na omissão ou na observância incompleta ou irregular de formalidades indispensáveis à existência ou seriedade do ato;

c) a ilegalidade do objeto ocorre quando o resultado do ato importa em violação de lei, regulamento ou outro ato normativo;

d) a inexistência dos motivos se verifica quando a matéria de fato ou de direito, em que se fundamenta o ato, é materialmente inexistente ou juridicamente inadequada ao resultado obtido;

e) o desvio de finalidade se verifica quando o agente pratica o ato visando a fim diverso daquele previsto, explícita ou implicitamente, na regra de competência.

Logo, será ilegal o ato administrativo sempre que ele for contrário à Constituição, à lei, ao regulamento ou a outro ato normativo; e abusivo, quando praticado em desvio de finalidade, pois o agente pratica o ato visando a fim diverso daquele previsto, explícita ou implicitamente, na regra de competência.

Assim, voltando ao art. 1º da Lei 1.533/51, o ato administrativo que será combatido no Mandado de Segurança é aquele violador ou ameaçador de direito líquido e certo praticado por agente público de forma contrária à Constituição, à lei, ao regulamento ou a outro ato normativo; ou visando a fim diverso daquele previsto, explícita ou implicitamente, na regra de competência.

Portanto, o Mandado de Segurança deve ser compreendido não apenas como uma ação civil de natureza constitucional, voltada à defesa do administrado contra os atos administrativos praticados pelo Estado, mas como uma ação constitucional destinada a conferir a toda a sociedade a segurança de que a Administração atue sempre de forma legal e não-abusiva (impessoal).

A compreender o Mandado de Segurança como um via de “mão dupla”, inclui-se como destinatária dessa segurança a própria Administração Pública, pois, se é certo que o administrado tem direito de pedir ao Judiciário que impeça a violação ou ameaça a um direito líquido e certo seu; é igualmente certo que a Administração Pública também tem direito que o Judiciário se pronuncie sobre a legalidade e não-abusividade do seu ato administrativo.

Não se consegue compreender, sobretudo se visto o Mandado de Segurança como direito fundamental, como se excluir da sua proteção a própria Administração Pública. Logo, fazer uso do Mandado de Segurança é exigir que o Judiciário controle não só a ameaça ou a lesão a direito líquido e certo, mas também que decida se há ou não ilegalidade ou abuso de poder na prática do ato pela autoridade coatora.

Por essas razões, deve-se compreender o Mandado de Segurança como meio de controle de legalidade não só como direito do impetrante, mas fundamentalmente como direito das partes nele envolvidas, isto é, administrado e Administração Pública. Portanto, como é direito de ambas as partes tal controle, não se pode aceitar que o impetrante tenha poder de dispor, a seu bel-prazer, da ação mandamental.

Aqui, então, convida-se o leitor a refletir: se o mandamus se destina a proteger direito líquido e certo do impetrante contra ato ilegal ou abusivo da parte ré, e se é direito de ambas as partes que o Judiciário se manifeste sobre a legalidade ou não-abusividade do ato administrativo, como é que se pode admitir que o pedido de desistência do impetrante possa ser homologado sem a anuência do réu?

Como se sabe, ao Mandado de Segurança se aplica, subsidiariamente, o Código de Processo Civil, desde que as disposições não sejam incompatíveis. Assim, como não há nenhuma disposição legal atinente a Mandado de Segurança que confira ao impetrante o direito de desistir da ação, a remissão ao Código de Processo Civil, já que este cuida da matéria, é obrigatória.

Nesse aspecto, ao examinar o CPC, encontram-se basicamente dois artigos fundamentais sobre a desistência, os arts. 158 e 267ix. No primeiro, o legislador determina que os atos das partes produzam efeitos de imediato, mas ressalva, no parágrafo único, que a desistência só terá efeito depois de homologada; No segundo, prescreveu o legislador que se o autor desistir haverá a extinção do processo sem o exame do mérito, mas ressalvou no § 4º que o autor não poderá desistir se o réu já tiver sido citado sem que este consinta.

A razão para a vedação à desistência por parte do autor, depois de citado o réu é bastante clara: o réu tem direito à tutela jurisdicional tanto quanto o autor. Assim, se a extinção do processo é sem exame do mérito, em caso de desistência do autor, o mérito da demanda continuará sem pronunciamento, causando ao réu insegurança jurídica, pois o autor poderá renovar a ação sempre que queira e enquanto não sobrevier nenhum óbice legal a isso.

Portanto, para evitar que o réu se torne “refém” do autor, em demandas judiciais intermináveis, o legislador determinou que o autor só pode desistir, quando já citado o réu, se, e somente se, o réu aceitar. Ora, se na demanda processual civil em que se discutem, via de regra, direitos privados existe essa faculdade conferida ao réu, parece óbvio que no Mandado de Segurança tal direito também deve ser conferido à pessoa jurídica de direito público ré no mandamus.

Não admitir a aplicação de tal entendimento ao Mandado de Segurança viola a própria idéia de paridade de armas e de inafastabilidade da jurisdição. Repita-se, o mandamus se destina não só a proteger o administrado, mas à própria Administração Pública também. Tanto impetrante (autor) como réu (pessoa jurídica de direito público) têm direito à manifestação jurisdicional sobre o mérito da demanda.

Logo, se o impetrante, depois de citada a pessoa jurídica de direito público, nos termos do art. 3º da lei 4.348/64, pede desistência da ação, não poderá o juiz ou tribunal homologar a desistência sem a oitiva e concordância da parte ré, porque ela também possui, no mínimo, direito líquido e certo a que o Judiciário declare se o ato administrativo praticado pelo seu agente é ilegal ou abusivo.

4 - Posicionamento da jurisprudência: crítica

A jurisprudência, especialmente do STF, tem se posicionado no sentido de que é possível a desistência, por parte do impetrante, sem que para a sua homologação seja necessária a anuência do réu ou da autoridade coatora, consoante se extrai dos arestos abaixo, in verbis:

EMENTA: AGRAVO REGIMENTAL NO AGRAVO REGIMENTAL NO AGRAVO REGIMENTAL NO RECURSO EXTRAORDINÁRIO. MANDADO DE SEGURANÇA. DESISTÊNCIA. HOMOLOGAÇÃO. POSSIBILIDADE. Mandado de Segurança. Desistência. Possibilidade de sua ocorrência, a qualquer tempo, independentemente da anuência do impetrado. Precedente do Tribunal Pleno. Agravo regimental não provido. ( RE-AgR-AgR-AgR 228751 / RS - RIO GRANDE DO SUL AG.REG.NO AG.REG.NO AG.REG.NO RECURSO EXTRAORDINÁRIO Relator(a): Min. MAURÍCIO CORRÊA Julgamento: 18/02/2003 Órgão Julgador: Segunda Turma Publicação DJ 04-04-2003 PP-00052 EMENT VOL-02105-03 PP-00603 Parte(s) AGTE.(S) : UNIÃO FEDERAL ADVDO.(A/S : PFN - MARIA WALKIRIA RODRIGUES DE SOUSA E OUTRO (A/S) AGDO.(A/S) : METALÚRGICA FORMA LTDA ADVDO.(A/S) : RENATO ROMEU RENCK JÚNIOR E OUTROS)

EMENTA: EMBARGOS DE DECLARAÇÃO EM AGRAVO REGIMENTAL NO RECURSO EXTRAORDINÁRIO. MANDADO DE SEGURANÇA. DESISTÊNCIA. HOMOLOGAÇÃO. POSSIBILIDADE. Mandado de Segurança. Desistência. Possibilidade de sua ocorrência, a qualquer tempo, independentemente da anuência do impetrado. Precedente do Tribunal Pleno. Vícios no julgado. Inexistência. Embargos de declaração rejeitados. (RE-AgR-ED 232049 / RJ - RIO DE JANEIRO EMB.DECL.NO AG.REG.NO RECURSO EXTRAORDINÁRIO Relator(a): Min. MAURÍCIO CORRÊA Julgamento: 26/11/2002 Órgão Julgador: Segunda Turma Publicação DJ 14-02-2003 PP-00077 EMENT VOL-02098-02 PP-00398 Parte(s) EMBTE(S). : UNIÃO FEDERAL ADVDO(A/S).: PFN - MARIA WALKIRIA RODRIGUES DE SOUSA E OUTRO (A/S) EMBDO(A/S).: TEXPREV - TEXACO SOCIEDADE PREVIDENCIÁRIA ADVDO(A/S).: JOYCE MACHADO E MELO E OUTRO (A/S))

Consoante se pode extrair dos textos acima, percebe-se que o STF levou em consideração muito mais um aspecto pragmático do que técnico. Noutras palavras, a praticidade da decisão se sobrepôs à técnica e à precisão científica do instituto jurídico cuidado anteriormente.

Admitir a homologação da desistência sem a anuência do réu, com a devida vênia, é erro técnico injustificável e sem amparo legal. Por isso, não se o deve aceitar, mesmo vindo do pretório Excelso, sem crítica. É preciso respeitar as decisões judiciais, mas nem por isso se pode aceitá-las como verdades absolutas.

Conclusão

O Mandado de Segurança é uma ação civil e, por isso, ampara-se na construção científica da teoria geral do processo. Apesar de sua natureza constitucional, ele é meio e não fim em si mesmo. Através do Mandado de Segurança são defendidos direitos, resguarda-se o próprio interesse público. E conforme bem destaca o prof. Alexandre Pasqualini, in verbis:

“Mostra-se urgente elaborar uma Teoria Geral do Direito Administrativo, assimilando, até o fim, uma das mais benfazejas conseqüências do pensamento Kantiano. A utilitas publica (=interesse público) impõe-se, como telos imperativo e categórico, não só às relações jurídico-administrativas, mas a todas as relações que se queiram realmente jurídicas. Ou o Direito é sinônimo teleológico do interesse público, ou é a entronização irracional do arbítrio.”x

A defesa, portanto, do interesse público transcende ao interesse individual. Fazer uso do Mandado de Segurança é por sob controle do Judiciário não só o direito do impetrante, visto em sua particularidade, mas o próprio interesse público como finalidade imperativa e categórica das próprias relações jurídico-administrativas.

Disso se extrai que ter um ato administrativo controlado via Mandado de Segurança confere à Administração Pública o direito de obter do Judiciário uma resposta quanto à legalidade e não-abusividade do ato praticado. E nesse aspecto o interesse decorrente desse direito transborda a particularidade do interesse da Administração e ganha contornos de interesse público, pois o ato administrativo ao ser declarado ilegal deverá ser anulado de ofício pela Administração Pública, a fim de que ela, cumprindo o seu papel finalístico, confira a toda a sociedade a segurança jurídica que deve nortear as suas relações.

Logo, admitir a homologação da desistência da ação de Mandado de Segurança, quando já citado o réu, sem a sua anuência, significa impedir que a sociedade tenha atendido o seu legítimo interesse a uma atuação legal e não-abusiva por parte da Administração Pública. Numa frase, ao agir assim, o Judiciário nega a satisfação do que há de mais nobre nas relações entre a Administração Pública e seus administrados, a satisfação do interesse público.

Desta forma, resta claro que a tese jurisprudencialmente aceita pelo STF precisa ser revista, e junto com ela alguns dos conceitos mais importantes do Mandado de Segurança, a exemplo dos limites significativos do controle da legalidade do ato administrativo, pois o direito não pode perder o que há de mais palpável em sua finalidade, a pacificação social.

Bibliografia

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1CICCIO, Cláudio de. História do Pensamento Jurídico e da Filosofia do Direito, 3 ed, São Paulo: Saraiva , 2007.

2 CICCIO, Cláudio de. História do Pensamento Jurídico e da Filosofia do Direito, 3 ed, São Paulo: Saraiva , 2007, p. 24.

3 CICCIO, Cláudio de. História do Pensamento Jurídico e da Filosofia do Direito, 3 ed, São Paulo: Saraiva , 2007, p. 26.

4Sobre esse princípio, apesar de haver quem o negue, entendemos que pode e deve sofrer limitações, que alguns não aceitaram existir após a reforma processual de 2006 limitadora do uso do Agravo de Instrumento. O duplo grau de jurisdição, construído axiomático, extraído de um conjunto normativo estruturante do Judiciário, deve sofrer limitação para que garantamos ao processo um fim previsível. Essa limitação iluminadora do término assegurará, ao menos em condições abstratas e gerais, igualdade entre as partes num processo. Assim, nem toda a decisão judicial deverá ser revista por outro órgão julgador, porque é preciso limitar essa revisibilidade a fim de que o processo não se torne um fim em si mesmo. Não podemos esquecer que o processo é o caminho, e como tal é importante também, mas não ao ponto de impedir que ele tenha fim. Toda caminhada é destinada a se findar. Caso admitíssemos a revisão de todas as decisões formuladas no processo o caminho acabaria por não se concluir, ou não num tempo útil. Com o avanço do projeto constitucional no tempo, aflorou no ideário da sociedade ainda mais a necessidade duma duração razoável do processo como norma fundamental. Não nos bastava mais apenas a garantia de submetimento a um processo, era preciso fazê-lo durar apenas o tempo suficientemente necessário ao fazimento da justiça, assegurando às partes a construção dialética da conclusão do processo.

5Vale destacar que o ato do juiz, concernente a caso concretos, é calcado em premissas casuísticas firmadas pelas partes, exigindo que ele produza uma decisão, mesmo dentro duma racionalidade dialética, estritamente subjetiva, mas não por que decorrente de arbítrio seu, e sim por que consequente de direito subjetivo das partes. Exatamente por isso as consequências desse tipo de decisão são suportadas pelas partes em suas individualidades relacionais, o efeito é inter partis. A legitimidade do ato de julgar do Juiz, nessa situação jurisdicional, é conferida e extraída pelo e do caso concreto, este como realidade construída pelo discurso dialético processual das partes. Assim, ao se substituir às partes, o Estado-Juiz acaba por se vincular a elas, seja pelos efeitos de sua decisão seja pelos limites de construção do caso concreto a serem examinados. É este o ato próprio e distintivo do Judiciário frente aos demais Poderes. Desta forma, as notas capazes de estremar a jurisdicionalidade de um ato ou uma atividade realizada por um Juiz seriam a aplicação da lei ao caso concreto, como finalidade específica de seu agir, e a sua imparcialidade de terceiro, como consequente de ser um ser distinto das partes, mesmo substituindo-as em suas singularidades.

6Destacamos, porém, que a ideia de um processo célere e com duração razoável, mesmo só transformada em norma constitucional agora, já era um fim almejado pelos estudiosos do processo. Tanto isso é verdade que Buzaid, na exposição de motivos do Código de Processo Civil destacou as seguintes razões: “Na reforma das leis processuais, cujos projetos se encontram em vias de encaminhamento à consideração do Congresso Nacional, cuida-se, por isso, de modo todo especial, em conferir aos órgãos jurisdicionais os meios de que necessitam para que a prestação da justiça se efetue com a presteza indispensável à eficaz atuação do direito. Cogita-se, pois, de racionalizar o procedimento, assim na ordem civil como na penal, simplificando-lhe os termos de tal sorte que os trâmites processuais levem à prestação da sentença com a economia de tempo e despesas para os litigantes. Evitar-se-á, assim, o retardamento da decisão das causas ou na execução dos direitos reconhecidos em juízo. No tutelar-se por essa forma o interesse das partes e a dignidade da justiça, seguir-se-á, aliás, o caminho facultado pela Constituição vigente, quando no art. 112, parágrafo único, dispõe:para as causas ou litígios, que a lei definirá, poderão ser instituídos processos e julgamento de rito sumaríssimo, observados os critérios de descentralização, de economia e de comodidade das partes.”

7 BARROSO, Luís Roberto. Temas de Direito Constitucional. Tomo II, Renovar: Rio de Janeiro, 2003, p. 7.

i NUNES, Castro. Do Mandado de Segurança e de outros meios de defesa contra atos do poder público, 5 ed. Revista Forense: Rio de Janeiro, 1956, p. 19.

ii Ibidem, p. 20.

iii Idem.

iv Ibidem, p.23/29.

O texto final da Constituição de 1934 ganhou a seguinte redação:

Art 113 - A Constituição assegura a brasileiros e a estrangeiros residentes no País a inviolabilidade dos direitos concernentes à liberdade, à subsistência, à segurança individual e à propriedade, nos termos seguintes:

........................................................................................................................

33) Dar-se-á Mandado de Segurança para defesa do direito, certo e incontestável, ameaçado ou violado por ato manifestamente inconstitucional ou ilegal de qualquer autoridade. O processo será o mesmo do habeas corpus, devendo ser sempre ouvida a pessoa de direito público interessada. O mandado não prejudica as ações petitórias competentes.

v Art. 319. Dar-se-á Mandado de Segurança para defesa e direito certo e incontestável, ameaçado ou violado por ato manifestamente inconstitucional, ou ilegal de qualquer autoridade, salvo do Presidente da República, dos Ministros de Estado, Governadores e lnterventores.

§ 1º Quando o direito ameaçado ou violado couber a uma categoria de pessoas indeterminadas, qualquer delas poderá requerer Mandado de Segurança.

§ 2º Também se consideram atos de autoridade os de estabelecimentos públicos e das pessoas naturais ou jurídicas, no desempenho de serviços públicos, em virtude de delegação ou contrato exclusivo, ainda quando transgridam o contrato ou exorbitem da delegação.

§ 3º Caberá o Mandado de Segurança contra quem executar, mandar ou tentar executar o ato lesivo.

Art. 320. Não se dará Mandado de Segurança, quando se tratar :

I – de liberdade de locomoção, exclusivamente;

II – de ato de que caiba recurso administrativo com efeito suspensivo, independentemente de caução;

III – de ato disciplinar;

IV – de impostos ou taxas, salvo se a lei, para assegurar a cobrança, estabelecer providências restritivas da atividade profissional do contribuinte.

Art. 321. A petição inicial, em três (3) vias, preencherá os requisitos dos arts. 158 e 159, e conterá a indicação precisa, inclusive pelo nome, sempre que possível, da autoridade a quem se atribua o ato impugnado.

§ 1º A 2ª e a 3ª vias da petição inicial serão instruidas com cópias de todos os documentos, autenticadas pelo requerente e conferidas pelo escrivão ou pelo secretário do Tribunal. A 2ª via destinar-se-á à formação de autos suplementares (art 14).

§ 2º Si o requerente afirmar que documento necessário à prova de suas alegações se acha em repartição ou estabelecimento público, ou em poder de autoridade que lhe recuse certidão, o juiz requisitará, preliminarmente, por oficio, a exibição do documento, em original, ou em cópia autenticada, no prazo que fixar, de três (3) a oito (8) dias úteis; si a autoridade indicada pelo requerente fôr a coatora, a requisição se fará no próprio instrumento da notificação (art. 322, nº I). O escrivão extrairá cópias do documento para juntar, no primeiro caso, à 2ª e à 3ª vias da iniciai; no segundo caso, apenas à via.

Art. 322. Despachando a petição inicial, o juiz mandará:

I – notificar o coator, mediante oficio entregue por oficial de justiça e acompanhado da 3ª via da petição inicial, instruída com as cópias dos documentos, a fim de prestar informações no prazo de dez (10) dias;

II – citar o representante judicial, ou, à falta, o representante legal da pessoa jurídica de direito público interessada na ação.

§ 1º Quando a pessoa do coator se confundir com a do representante judicial, ou legal da pessoa jurídica de direito público interessada na causa, a notificação, feita na forma do n. I deste artigo, produzirá também os efeitos da citação.

§ 2º O prazo para a contestação será de dez (10) dias.

Art. 323. Nos casos do n. I e do § 1º do artigo anterior, feita a notificação, o escrivão ou o secretário do Tribunal juntará aos autos cópia autenticada do ofício e prova da entrega ao destinatário, ou da recusa deste em recebê-lo, ou dar recibo.

Art. 324. Findo o prazo para as informações e para a contestação, os autos serão conclusos ao juiz, que decidirá em cinco (5) dias.

§ 1º Si o juiz verificar que o ato foi ou vai ser praticado por ordem de autoridade não subordinada à sua jurisdição, mandará remeter o processo ao juiz ou Tribunal competente.

§ 2º – Quando se evidenciar a relevância do fundamento do pedido e puder do ato impugnado resultar lesão grave ou irreparável ao direito do requerente, o juiz mandará desde logo suspender o ato.

Art. 325. Julgando procedente o pedido, o juiz:

I – transmitirá, em ofício, por mão do oficial do juízo ou pelo correio, mediante registro, com recibo de volta, o inteiro teor da sentença ao representante legal da pessoa jurídica de direito público interessada e, no caso do art. 319, § 2º, também ao representante legal da pessoa que tiver praticado o ato impugnado;

II – mandará expedir, imediatamente, como título executório, o Mandado de Segurança, e determinará as providências, especificadas na sentença, contra a ameaça ou a violação.

Art. 326. Em caso de urgência, o pedido de Mandado de Segurança, as comunicações e quaisquer ordens do juiz ou Tribunal poderão transmitir-se por telegrama ou radiograma. Os originais, com as firmas reconhecidas serão apresentados à agência expedidora, devendo constar do despacho o cumprimento daquela exigência.

§ 1º – Requerido o Mandado de Segurança por telegrama ou radiograma, o escrivão, ou o secretário do Tribunal, extrairá cópias para os efeitos do art. 321, § 2º e do art. 322, nº I.

§ 2º Quando a decisão fôr comunicada por telegrama ou radiograma aos interessados, o juiz mandará confirmá-la na fórma do artigo 325, nº I.

Art. 327. Recebendo a cópia da sentença, o representante da pessoa jurídica de direito público, sob pena de responsabilidade, ou, no caso do art. 319, § 2º, o representante legal da pessoa que houver praticado o ato impugnado, providenciará imediatamente, sob pena de desobediência, para o cumprimento da decisão judicial.

Art. 328. A requerimento do representante da pessoa jurídica de direito público interessada e para evitar lesão grave à ordem, à saúde ou à segurança pública. poderá o presidente do Supremo Tribunal Federal ou do Tribunal de Apelação, conforme a competência, autorizar a execução do ato impugnado.

Art. 329. A decisão do Mandado de Segurança não impedirá que o requerente, por ação própria, pleiteie o seu direito e os respectivos efeitos patrimoniais.

Art. 330. Poderá renovar-se o pedido do mandado, quando a decisão denegatória não lhe houver apreciado o mérito.

Art. 331. O direito de requerer Mandado de Segurança extinguir-se-á depois de cento e vinte (120) dias contados da ciência do ato impugnado.

vi Art. 141 - A Constituição assegura aos brasileiros e aos estrangeiros residentes no País a inviolabilidade dos direitos concernentes à vida, à liberdade, a segurança individual e à propriedade, nos termos seguintes:

...............................................................................................

§ 24 - Para proteger direito líquido e certo não amparado por habeas corpus , conceder-se-á Mandado de Segurança, seja qual for a autoridade responsável pela ilegalidade ou abuso de poder.

vii Art. 19. - Aplicam-se ao processo do Mandado de Segurança os arts. 88 a 94 do Código do Processo Civil. (artigo com redação anterior à alteração realizada pela lei 6.071/74)

Art. 20 - Revogam-se os dispositivos do Código do Processo Civil sobre o assunto e mais disposições em contrario.

viii A lei 4.348/64 foi recentemente alterada pela lei 10.910/2004.

ix Art. 158. Os atos das partes, consistentes em declarações unilaterais ou bilaterais de vontade, produzem imediatamente a constituição, a modificação ou a extinção de direitos processuais.

Parágrafo único. A desistência da ação só produzirá efeito depois de homologada por sentença.

Art. 267. Extingue-se o processo, sem resolução de mérito:

.................................................................................................................

VIII - quando o autor desistir da ação;

.................................................................................................................

§ 4º Depois de decorrido o prazo para a resposta, o autor não poderá, sem o consentimento do réu, desistir da ação.

x Pasqualini, Alexandre. Hermenêutica e Sistema Jurídico – uma introdução à interpretação sistemática do Direito, Livraria e Editora do Advogado: Porto Alegre, 1999, p. 141.

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Sobre o autor
Alessandro Samartin de Gouveia

Promotor de Justiça do Estado do Amazonas. Possui graduação em Direito pelo Centro de Estudos Superiores de Maceió (2004). Pós-graduado em nível de Especialização em Direito Processual pela ESAMC/ESMAL(2006). Formação complementar em política e gestão da saúde público para o MP - 2016 - pela ENSP/FIOCRUZ. Pós-graduando em prevenção e repressão à corrupção: aspectos teóricos e práticos, em nível de especialização (2017/2018), pela ESTÁCIO/CERS. Mestre em direito constitucional pela Universidade de Fortaleza - UNIFOR. Tem experiência na área de Direito, com ênfase em Direito Público, atuando principalmente nos seguintes temas: súmula vinculante, separação dos poderes, mandado de segurança, controle de constitucionalidade e auto de infração de trânsito. http://orcid.org/0000-0003-2127-4935

Informações sobre o texto

Este texto foi publicado diretamente pelos autores. Sua divulgação não depende de prévia aprovação pelo conselho editorial do site. Quando selecionados, os textos são divulgados na Revista Jus Navigandi

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