Breves considerações sobre os controles interno, externo e social na Constituição Federal

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A necessidade do Controle Interno e Externo dos atos decorrentes das competências institucionais dos Poderes de Estado se relaciona às características do próprio Estado: forma de Estado, ordenamento jurídico, Governo, finalidades e Administração.

Os órgãos de controle e o poder fiscalizatório social estão expressamente contemplados na Constituição da República. São órgãos constituídos e direitos públicos subjetivos assegurados aos cidadãos, respectivamente. 

 Com relação ao Brasil, estamos diante de um Estado de Direito, Federativo, Democrático e Republicano. Esses adjetivos do Estado brasileiro se relacionam à própria evolução da nossa sociedade que se inspirou em doutrinas e leis dos mais diversos países, europeus e americanos, para a construção dos instrumentos de controle interno e externo moldados à nossa realidade.

 Originariamente, os Tribunais de Contas tinham o controle prévio de contas centrado principalmente no Poder Executivo. Hoje, é um controle pulverizado, dirigido a todos os Poderes. A razão da ingerência maior no Poder Executivo dos Tribunais de Contas tem aspecto histórico e normativo, tendo em vista que é de competência do Poder Executivo as leis e planos orçamentários.

Quanto à integração entre os Sistemas de Controles, é indispensável a complementariedade dos controles internos dos Poderes de Estado com o controle externo, tendo em vista que a independência de instâncias processuais pode refletir nas responsabilizações.

A comunicação assegura a punição, bem como evita a ocorrência do denominado bis in idem, que é o termo utilizado quando o mesmo fato está sendo punido por mais de uma vez por processos de mesma natureza. Além disso, a integração fortalece a Democracia e a República, como princípios fundamentais do Estado. Sem as vias de controle, não se pode falar em Estado de Direito. A corrupção assolaria o Estado de forma desgovernada.

A Constituição se refere ao Controle Externo como uma das funções preponderantes do Poder Legislativo, que será auxiliado pelos Tribunais ou Conselhos de Contas. Faz, ainda, referência, com base na autotutela, à necessidade dos Poderes de Estado possuírem internamente órgãos de controle.

O Tribunal de Contas da União tem jurisdição administrativa sobre todos os Poderes da República, em observância às suas atribuições institucionais asseguradas constitucionalmente. Portanto, o único órgão efetivo que é reconhecido pela Constituição fora do Poder Legislativo como de Controle Externo, por estar alheio a todos os Poderes, é os Tribunal de Contas, considerado em sentido amplo, incluindo o Tribunal de Contas da União, os Tribunais de Contas dos Estados e os Conselhos de Contas Municipais, quando existentes.

A condição de auxiliar do Poder Legislativo não significa que os Tribunais de Contas a ele seja vinculado, mas tão somente que o Poder Legislativo nele se apoiará principalmente nas questões técnicas, tendo em vista que uma de suas prerrogativas constitucionais típicas é o Controle Externo. Não olvidamos que o Poder Legislativo é o Poder de maior representatividade democrática, por isso a ele é atribuída a função fiscalizatória.

Apregoa o art. 74 da Constituição Federal que os Poderes Legislativo, Executivo e Judiciário manterão, de forma integrada, sistema de controle interno com a finalidade de avaliar o cumprimento das metas previstas no plano plurianual, a execução dos programas de governo e dos orçamentos da União;  comprovar a legalidade e avaliar os resultados, quanto à eficácia e eficiência, da gestão orçamentária, financeira e patrimonial nos órgãos e entidades da administração federal, bem como da aplicação de recursos públicos por entidades de direito privado;  exercer o controle das operações de crédito, avais e garantias, bem como dos direitos e haveres da União; apoiar o controle externo no exercício de sua missão institucional.

Apotegma da responsabilidade no exercício do controle interno dispõe o § 1º do art. 74 da Constituição Federal que os responsáveis pelo controle interno, ao tomarem conhecimento de qualquer irregularidade ou ilegalidade, dela darão ciência ao Tribunal de Contas da União, sob pena de responsabilidade solidária.

A Constituição adentra na seara da responsabilidade para estabelecer a necessidade de integração, bem como da própria indisponibilidade das competências. Assim, a omissão da cientificação ao TCU de ilegalidade ou irregularidade terá por efeito a responsabilização solidária do agente público competente. Frise-se que as a responsabilização das condutas omissivas segue a denominada responsabilidade subjetiva, e, no caso somente poderá ocorrer nas vias administrativas ou cíveis. Dessa feita, somente se houver comprovadamente dolo ou culpa do agente competente, este poderá ser responsabilizado solidariamente. Tal responsabilidade é de cunho administrativo-civil, como referido, não se podendo olvidar a independência de instâncias.

Por fim, qualquer cidadão, partido político, associação ou sindicato é parte legítima para, na forma da lei, denunciar irregularidades ou ilegalidades perante o Tribunal de Contas da União. Estende-se aos Tribunais de Contas estaduais e aos Conselhos de Contas.

A representação também é um instrumento que se pulveriza nos órgãos de controle interno dos Poderes, pois inerente ao Estado e ao exercício de atividades administrativas, onde há hierarquia, cujos fins legais devem ser cumpridos sem vícios, morosidade e ilicitudes.

No âmbito do Poder Judiciário existe o denominado Conselho Nacional de Justiça (CNJ), órgão integrante que não possui o poder jurisdicional, mas é o responsável pela fiscalização e pelo controle restrito ao respectivo Poder. Trata-se, ao nosso entender, de órgão de controle interno, tendo em vista que não se aplica a qualquer outro. Seu raio de competência se limita ao Poder Judiciário.

O Conselho Nacional de Justiça tem sede na Capital Federal (inciso I-A do art.92 da Constituição) e será presidido pelo Presidente do Supremo Tribunal Federal.

A Constituição Federal delineia a atribuição de controle, fiscalizatória e correicional do CNJ.  Nesses termos, compete ao Conselho o controle da atuação administrativa e financeira do Poder Judiciário e do cumprimento dos deveres funcionais dos juízes.

A Constituição ainda atribui ao CNJ as seguintes competências (além de outras que poderão lhe ser atribuídas pelo Estatuto da Magistratura):

 I - zelar pela autonomia do Poder Judiciário e pelo cumprimento do Estatuto da Magistratura, podendo expedir atos regulamentares, no âmbito de sua competência, ou recomendar providências; - no sentido de evitar a ingerência dos demais poderes em suas atribuições preponderantes; exercer o poder de legislar internamente para os serviços e competências que lhe são inerentes..

 II - zelar pela observância do art. 37 e apreciar, de ofício ou mediante provocação, a legalidade dos atos administrativos praticados por membros ou órgãos do Poder Judiciário, podendo desconstituí-los, revê-los ou fixar prazo para que se adotem as providências necessárias ao exato cumprimento da lei, sem prejuízo da competência do Tribunal de Contas da União – aqui se aplicando os princípios fundamentais da Administração, perfeitamente extensíveis aos atos administrativos praticados no âmbito desse Poder, que também necessita dessa autonomia para fazer funcionar instrumentalmente suas atividades finalísticas.

III receber e conhecer das reclamações contra membros ou órgãos do Poder Judiciário, inclusive contra seus serviços auxiliares, serventias e órgãos prestadores de serviços notariais e de registro que atuem por delegação do poder público ou oficializados, sem prejuízo da competência disciplinar e correicional dos tribunais, podendo avocar processos disciplinares em curso e determinar a remoção, a disponibilidade ou a aposentadoria com subsídios ou proventos proporcionais ao tempo de serviço e aplicar outras sanções administrativas, assegurada ampla defesa – atividade correicional, e de apuração de fatos que podem estar tipificados como condutas ilícitas ou imorais.

 IV representar ao Ministério Público, no caso de crime contra a administração pública ou de abuso de autoridade – pendendo para a seara penal, cuja competência para a propositura das ações penais é do Ministério Público, indispensável que, tomando conhecimento de crime no curso dos processos administrativos ou mesmo de pronto, remeta os autos ao Ministério Público para que proceda à propositura da ação ou solicitação de investigação por parte da Polícia Judiciária.

V rever, de ofício ou mediante provocação, os processos disciplinares de juízes e membros de tribunais julgados há menos de um ano – atividade correicional derivada da hierarquia administrativa, onde se avoca ou delega competências ou atos.

VI elaborar semestralmente relatório estatístico sobre processos e sentenças prolatadas, por unidade da Federação, nos diferentes órgãos do Poder Judiciário;

VII elaborar relatório anual, propondo as providências que julgar necessárias, sobre a situação do Poder Judiciário no País e as atividades do Conselho, o qual deve integrar mensagem do Presidente do Supremo Tribunal Federal a ser remetida ao Congresso Nacional, por ocasião da abertura da sessão legislativa.

Verificamos que o CNJ é um órgão definitivamente de controle interno, referindo-se à Governança, ao Controle Interno de Gestão, e ao próprio Gerenciamento de Riscos nas atividades desenvolvidas pelos seus jurisdicionados, dentro de uma hierarquia administrativa e não jurisdicional.

Apenas para exemplificar a atividade correicional do CNJ, a este é atribuída a competência de remover, disponibilizar e aposentar magistrados com base no interesse público. Todavia, tais questões serão decididas por voto da maioria absoluta do Conselho.

Não se pode olvidar que todo processo que vise sancionar agente público, incluindo agentes administrativos, agentes políticos, deve assegurar o direito público subjetivo à ampla defesa. Corroborando, o Presidente de Tribunal que, por ato comissivo ou omissivo, retardar ou tentar frustrar a liquidação regular de precatórios incorrerá em crime de responsabilidade e responderá, também, perante o Conselho Nacional de Justiça.

Nos termos do § 7º do art. 103-B da Constituição, dispõe que a União, inclusive no Distrito Federal e nos Territórios, criará ouvidorias de justiça, competentes para receber reclamações e denúncias de qualquer interessado contra membros ou órgãos do Poder Judiciário, ou contra seus serviços auxiliares, representando diretamente ao Conselho Nacional de Justiça.

Aplica-se ao Ministério Público, todavia por órgão específico denominado Conselho Nacional do Ministério Público as mesmas prerrogativas, competências fiscalizatórias e correicionais do Conselho Nacional de Justiça.

No âmbito do Poder Legislativo teceremos pormenores sobre os órgãos que no âmbito deste Poder exercem as funções de controle interno.

Importante frisarmos que no âmbito da Administração Pública Federal além de um Ministério específico, denominado Ministério da Transparência, Fiscalização e Controladoria Geral da União, a Administração Direta e Indireta, desconcentram poderes fiscalizatórios. Órgãos como as Ouvidorias, Corregedorias, de Controle Interno de Gestão, etc., reforçam a ideia de controle, pois são filtros das condutas praticadas pelos agentes públicos no curso de suas competências.  Tais filtros são demasiadamente importantes para a gestão de riscos, e para o Controle Externo, oportunidade dos Poderes de mitigar a ocorrência de condutas ilícitas ou ímprobas.

Alhures, tecemos consideração breve sobre a qualificação do estado brasileiro: Estado de Democrático de Direito, República e Federação. A base principiológica dos órgãos de controle são essas características do Estado. Em resumo, o controle somente existe em um Estado cujos órgãos constituídos obedeçam às leis, estejam imbuídos de ética e moralidade, ante a gnose de que a coisa pública não pertence ao agente público, mas ao povo. O Sistema de Controle Social é fixado nessa premissa: soberania popular.

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A base principiológica do Controle Social é a soberania popular. Todavia, como pressuposto do direito público subjetivo ao controle dos atos e procedimentos do Estado, a legitimação deriva da denominada cidadania.

Nos termos do inciso II do art. 1º da Constituição Federal, a cidadania é um dos fundamentos da República Federativa do Brasil. Corroborando com a ideia de cidadania, o parágrafo único do artigo apregoa o princípio da soberania popular ao estabelecer que todo o poder emana do povo, ainda que este seja representado.

No âmbito da Constituição Federal de 1988, o exercício do direito ao controle social, primeiramente terá por base o inciso XXXIIII do art.5º, que dispõe que todos têm direito a receber dos órgãos públicos informações de seu interesse particular, ou de interesse coletivo ou geral, que serão prestadas no prazo da lei, sob pena de responsabilidade, ressalvadas aquelas cujo sigilo seja imprescindível à segurança da sociedade e do Estado. Outro inciso do art. 5º que viabiliza o controle social consta no inciso XXXIV, que assegura a todos, independentemente do pagamento de taxas: a) o direito de petição aos Poderes Públicos em defesa de direitos ou contra ilegalidade ou abuso de poder; b) a obtenção de certidões em repartições públicas, para defesa de direitos e esclarecimento de situações de interesse pessoal. Ainda, no âmbito do art. 5º podemos fazer referência a inviabilidade de a lei afastar a ingerência do Poder Judiciários, quando requerido, nos casos de lesão ou ameaça a direito. Pode-se fazer referência, ainda, em observância ao devido processo legal, aos incisos LIV e LV, que dispõem respectivamente: “LIV - ninguém será privado da liberdade ou de seus bens sem o devido processo legal; LV - aos litigantes, em processo judicial ou administrativo, e aos acusados em geral são assegurados o contraditório e ampla defesa, com os meios e recursos a ela inerentes (...)”. Por fim, no seio deste artigo, o controle social poderá incidir sobre a morosidade dos procedimentos. O inciso LXXVIII determina que a todos, no âmbito judicial e administrativo, são assegurados a razoável duração do processo e os meios que garantam a celeridade de sua tramitação.

Sob o aspecto administrativo, o controle social é feito com a análise pelos interessados da observância pelos Poderes, no exercício de competência administrativa, dos princípios fundamentais da Administração Pública constantes no caput do art. 37 da Constituição (legalidade, impessoalidade, moralidade, publicidade e eficiência).

Não se pode olvidar que o Controle Social também abrange a fiscalização da atividade financeira dos órgãos e entidades públicas pelos cidadãos e demais interessados, incluindo, associações e outros segmentos sociais que visam a fiscalização dos atos governamentais.

Por fim, repisando, o controle externo é exercido pelo Congresso Nacional com o auxílio do Tribunal de Contas. O controle interno, todavia, será mantido pelos Poderes de Estado no âmbito de suas estruturas orgânicas. O controle social é realizado pelos cidadãos e demais interessados. Os controles se interagem e são classificados em três sistemas: interno, externo e social. Dessa forma, nossa Constituição adota o controle sistêmico, que indica a necessidade de interação e harmonia entre os Sistemas de Controle.

Sobre o autor
David Augusto Souza Lopes Frota

DAVID AUGUSTO SOUZA LOPES FROTA Advogado. Servidor Público Federal. Pós-graduado em Direito Tributário. Pós-graduado em Direito Processual. Especialista em Direito Administrativo. Especialista em Licitações Públicas. Especialista em Servidores Públicos. Foi analista da Diretoria de Reconhecimento Inicial de Direitos – INSS – Direito Previdenciário. Foi analista da Corregedoria Geral do INSS – assessoria jurídica e elaboração de pareceres em Processos Administrativos Disciplinares - PAD. Foi Analista da Diretoria de Recursos Humanos do INSS - Assessor Jurídico da Coordenação de Recursos Humanos do Ministério da Previdência Social – Lei nº 8.112/90. Chefe do Setor de Fraudes Previdenciárias – Inteligência previdenciária em parceria com o Departamento de Polícia Federal. Ex-membro do ENCCLA - Estratégia Nacional de Combate a Corrupção e à Lavagem de Dinheiro do Ministério da Justiça. Convidado para ser Conselheiro do Conselho de Recursos da Previdência Social - CRPS. Convidados para atuação junto ao Grupo Responsável pela Consolidação dos Decretos Federais da Presidência da República. Assessor da Coordenação Geral de Recursos Logísticos e Serviços Gerais do MPS - COGRL. Elaboração de Minutas de Contratos Administrativos. Elaboração de Termos de Referência. Pregoeiro. Equipe de Apoio. Análise das demandas de controle interno e externo do MPS. Análise das demandas de Controle Interno e Externo do Ministério da Fazenda - SPOA. Assessor da Coordenação Geral do Logística do Ministério da Fazenda - CGLOG – SPOA. Assessor da Superintendência do Ministério da Fazenda no Distrito Federal - SMF-DF. Membro Titular de Conselho na Secretaria de Direitos Humanos para julgamento de Processos. SEDH. Curso de Inteligência na Agência Brasileira de Inteligência - ABIN. Consultoria e Advocacia para prefeitos e demais agentes políticos. Colaborador das Revistas Zênite, Governet, Síntese Jurídica, Plenus. Coautor de 3 livros intitulados "O DEVIDO PROCESSO LICITATÓRIO" tecido em 3 volumes pela editora Lumen Juris.

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