Responsabilidade civil decorrente do abandono afetivo inverso

30/05/2018 às 09:31
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O artigo em questão tem por objetivo demonstrar juridicamente, quais as consequências do abandono afetivo inverso para os familiares que abandonam os idosos. Além de demonstrar quais as obrigações dos filhos em relação aos seus pais idosos.

RESUMO

O artigo em questão tem por finalidade fazer uma análise sobre a responsabilidade civil decorrente do abando afetivo inverso. Destaca-se que a pesquisa tem por objetivo demonstrar juridicamente, quais as consequências do abandono afetivo inverso para os familiares que abandonam os idosos. Bem como, conscientizar seus filhos para se atentarem para algo muito mais importante do que uma prestação pecuniária, o afeto. Contudo é importante frisar que os idosos nessa fase da vida necessitam de um cuidado especial para terem uma vida de qualidade. Dessa maneira, mesmo que amar seja faculdade, cuidar é obrigação, no entanto, não é o que vem ocorrendo atualmente em nosso país, cada vez mais aumentam o número de idosos abandonados por seus familiares, esquecidos e desamparados por aqueles que teriam o dever, a obrigação de amparar e dar a assistência necessária para uma vida digna e humana.

Palavras- chave: Idoso. Afeto. Indenização. Dano moral.

ABSTRACT

The article in question aims to do an analysis on civil liability arising from abando inverse affective. Highlights that the research aims to demonstrate legally, what are the consequences of emotional abandonment inverse for family members who leave the elderly. As well as, to raise your children to be careful for something much more important than a financial allowance, the affection, however it is important to stress that the elderly in this phase of life require special care to have a quality life. That way, even if love is College, care is obligation, however is not what is happening now in our country, more and more increase the number of elderly people abandoned by their families, forgotten and forsaken by those who would have the duty to obligation to support and give the necessary assistance to a worthy life and human.

Keywords: Elderly. Affection. Indemnification. Moral damage.

1. INTRODUÇÃO

O objetivo desse artigo é disseminar e informar a sociedade, como um todo, a respeito do assunto, qual seja, abando afetivo inverso, que apesar de ser uma figura pouco conhecida, é uma realidade despercebida, é um problema social que afetam milhares de idosos. Contudo, o ato de abandonar alguém é ato ilícito, e é impossível conviver com tamanho ato de omissão até mesmo do poder judiciário.  

Na atualidade, a população idosa vem aumentando cada vez mais e com maior expectativa de vida. Ocorre que as maiorias dos idosos vivem em situações precárias, sem falar que muitos vivem em asilos, casa abrigo, ou até mesmo moram sozinhos e sobrevivem como podem, dependendo muitas vezes da caridade e solidariedade de estranhos que na maioria das vezes tendem a serem mais caridosos do que aqueles que teriam o dever legal de cuidar dessas pessoas.  Isso ocorre, pelo fato de serem abandonados pela sua própria prole, sendo que, os filhos e familiares e até mesmo a sociedade e o Estado tem o dever de proporcionar, cuidado, dar assistência e principalmente garantir a eles uma velhice com dignidade.

Para frisar o que foi dito acima, a luz dos artigos 229 e 230 da Constituição Federal de 1988, o filho maior têm o dever de ajudar e amparar os pais na velhice, carência ou enfermidade; além da família, a sociedade e o Estado também tem o dever de amparar as pessoas idosas, assegurando sua participação na comunidade, preservando sua dignidade, bem-estar e principalmente o direito à vida.

Observa-se que a legislação foi clara em dizer que cuidar dos idosos é um dever constitucional, portanto uma obrigação e não uma faculdade. Apesar da Constituição, a lei maior do ordenamento jurídico, determinar que os filhos sejam obrigados a cuidar de seus pais na velhice, na realidade acontece ao contrario, as pessoas esquecem-se do dever moral, ético, e até mesmo do cumprimento da lei, sendo que esse descumprimento gera o dever de indenizar o idoso por dano moral, decorrente do instituto da responsabilidade civil por abando afetivo inverso, caso que será objeto de estudo mais adiante.

Portanto, é importante alertar as pessoas, e quem sabe até mesmo incentivar os filhos a cuidarem de seus pais, pois os idosos fazem parte da sociedade brasileira e de alguma forma contribuíram para o crescimento dela. Ademais se faz necessário chamar a atenção do Judiciário para que possam punir os responsáveis pelo abandono afetivo inverso.

2. CONCEITO DE IDOSO

Com o proposito de definir quem seria idoso tem-se um conceito formal, no qual, idosa é toda pessoa com 60 (sessenta) anos de idade ou mais, no entanto o fator cronológico não seria o suficiente para determinar quem é idoso e quem não é.

Para dar ênfase, é importante trazer o conceito dado pelo Estatuto do Idoso, Lei nº 10.741, de 1º de outubro de 2003 (Brasil, 2003), que define: “Idoso é toda pessoa com idade igual ou superior a 60 (sessenta) anos”. Em controversa existe a definição, da Organização Mundial da Saúde OMS (2002) sendo que, idosa é aquela pessoa com 60 anos ou mais, em países em desenvolvimento, e com 65 anos ou mais em países desenvolvidos.

Vale ressaltar, que o Estatuto do idoso seguiu a definição da OMS, no entanto, seguir apenas o critério cronológico não seria o ideal, o correto seria distinguir a população idosa por um conjunto de critérios, sendo estes, o psicológico, o físico, social e também o cronológico, uma vez que, existem pessoas com 60 anos, isto é, dependendo da sua qualidade de vida, que goza de uma saúde física e mental perfeita, tendo capacidade suficiente de se manter sozinho e ser independente, sem necessitar de cuidados especiais.

Há de se falar também, que o envelhecimento é uma característica personalíssima, uma vez que, cada pessoa envelhece de uma maneira, cada uma no seu tempo, portanto, generalizar dizendo que toda pessoa com 60 anos é idoso, apesar de parecer injusto, é muito importante essa definição do grupo etário, para que o Estado e a sociedade possam tratar essas pessoas com igualdade na medida de suas necessidades, garantindo-lhes direitos, e assim preservando o princípio da isonomia.

Portanto para encerrar esse capítulo é importante citar uma frase das autoras Viegas e Barros (2016, p. 06) (...) “ninguém está excluído de “ser idoso”, o tempo é inevitável, o idoso é a porta do passado que leva ao futuro”. (Viegas e Barros, 2016).

Diante dessa citação, é importante que os familiares de idosos e a sociedade como um todo, reflitam, e entendam que todos um dia irão envelhecer, é um fator natural da vida, portanto é importante que todos se conscientizem e dediquem afeto, respeito e cuidado, á essas pessoas que um dia também foram jovens, e que merecem toda consideração, pois, envelhecer não é sinônimo de capacidade física, e sim uma questão de amadurecimento.

3. O CRESCIMENTO MUNDIAL DA POPULAÇÃO IDOSA

É evidente o crescimento mundial da população de terceira idade, tendo em vista, que os idosos estão vivendo muito mais, situação essa preocupante, tendo em vista, que a população jovem vem diminuindo cada vez mais em razão da queda de fecundidade, isso porque, a média de fecundidade é de apenas 1 (um) filho por mulher, contudo, o Brasil não tem estrutura nem mesmo políticas sociais públicas para atender as necessidades dos idosos, haja vista, que não apenas o Brasil, mas também o mundo todo não está preparado para ter mais idosos do que jovens trabalhando e movimentando a economia mundial.

Ocorre que em alguns países, há um investimento para aumentar a fecundidade, no entanto, a julgar que a população mundial já é um tanto quanto exagerada, o ideal seria que os governantes investissem mais em uma educação de qualidade, pois essa pequena população jovial no futuro serão responsáveis por manter o mundo com mais idosos.

Enfatizando o aumento mundial da população idosa, conforme dados da Organização das Nações Unidas (ONU), no ano de 1950 a população com mais de 60 anos era de 250 milhões no planeta, porém até o ano 2000 esse número praticamente triplicou, passando para 606 milhões de pessoas idosas.

Resta claro, que a expectativa de vida mundial aumentou gradativamente, sendo que, não vale de nada um aumento na expectativa de vida, se o poder público não tiver condições básicas de garantir uma vida digna, com acesso à saúde, alimentação, moradia, educação, lazer, enfim todos os direitos dos idosos.

Relevante se faz mencionar ainda, que o grande aumento da população mundial acarreta danos ao meio ambiente irreversível, através do grande aumento da produção de lixo pela humanidade, portanto, como poderia um idoso sobreviver com qualidade de vida em um ambiente poluído?

O professor de estudos populacionais de Stanford, Paul R. Ehrlich, disse em uma entrevista ao G1, que: "O envelhecimento é inevitável se quisermos ter sustentabilidade. A preocupação com a redução e envelhecimento da população não faz sentido, e as pessoas deveriam comemorar quando a população do mundo começar a diminuir”. (São Paulo, 2011).

Em contrapartida, apesar de o aumento da expectativa de vida do idoso ser algo negativo, e acarretar grandes problemas, o envelhecimento é algo irreversível e inevitável, portanto cabe aos familiares, à sociedade e principalmente ao Estado garantir uma vida digna desde o mais jovem até os idosos, pois não basta apensas envelhecer, tem que envelhecer com saúde, e cabe ao Estado investir em uma saúde de qualidade, investir no meio ambiente e na sustentabilidade, para que todos os idosos, sem distinção de classe social, bem como a população como um todo, possam envelhecer com qualidade de vida.

4. DIREITO DO IDOSO

No âmbito nacional é evidente que os idosos adquiriram muitos direitos no passar dos anos, foram considerados cidadãos pela Constituição Federal em 1988 em seu artigo 1°, inciso III, contemplados pelo principio da dignidade da pessoa humana, um marco importantíssimo na história do Brasil, pois é a partir do princípio da dignidade da pessoa humana que emanam todos os demais direitos fundamentais, ademais a dignidade humana é o valor maior á ser alcançado pelo ordenamento jurídico.

Vislumbra-se que a Constituição Federal em seu artigo 203, inciso V, garante ao idoso que não tem meios de se sustentar, independentemente de contribuição previdenciária a assistência social. Bem como em seus artigos 229 e 230, trouxe o dever de cuidado dos filhos para com os pais quando na velhice, e ainda o dever da sociedade e do Estado de amparar e garantir a participação dos idosos na comunidade, preservando, portanto seu bem estar e o direito á vida. Ainda a falar do artigo 230, §2° a Constituição garantiu ao idoso maior de 65 (sessenta e cinco) anos a gratuidade do transporte coletivo.

Como já demonstrado, de forma sucinta, o idoso é um cidadão, e como todo cidadão os idosos também tem direitos e deveres constitucionais, sendo que esses direitos devem ser respeitados por todos.

O Código Civil Brasileiro de 2002 (Lei n° 10.406, de 10 de janeiro de 2002) também traz alguns direitos do idoso, ou melhor, restringe direitos ao limitar a capacidade de gerir os atos da vida civil. O Artigo 11 do Código Civil diz o seguinte: “Com exceção dos casos previstos em lei, os direitos da personalidade são intransmissíveis e irrenunciáveis, não podendo o seu exercício sofrer limitação voluntária”. (Brasil, 2002).

Em contrapartida, o código civil acaba sendo contraditório quando em seu artigo 1641, inciso II, impõe de maneira grosseira e até mesmo preconceituosa a obrigatoriedade do regime da separação de bens no casamento do idoso maior de 70 (setenta) anos.

Haja vista, que uma pessoa não deixa de ser capaz somente por ter mais de 70 anos, portanto não há razão para a lei limitar os direitos dessas pessoas, sendo que os bens pertencem á eles e desses bens eles fazem o que bem entender, ou será que um idoso não goza de autonomia de vontade? Algo que deveria ser revisto no ordenamento jurídico brasileiro.

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Há de se falar também do Estatuto do Idoso (Lei nº 10.741, de 1º de outubro de 2003), que depois da Constituição Federal, é o instrumento mais importante de garantias do idoso. Uma vez que, tem o objetivo de regulamentar os direitos dos idosos assegurados pela Constituição Federal de 1988.

Para frisar, o Estatuto do Idoso foi criado com um objetivo, de acordo com o entendimento de Cielo e Vaz (2009):

Criado com o objetivo de garantir dignidade ao idoso, [...] o Estatuto do Idoso [...] veio em boa hora, com objetivo de dar continuidade ao movimento de universalização da cidadania, levando até o idoso a esperança de que seus anseios e necessidades estão de fato garantidos. (CIELO; VAZ, 2009, p. 42).

O Estatuto do idoso trouxe os direitos fundamentais garantidos pela Constituição, determinando ser dever da família, da sociedade e do Poder Público assegurar ao idoso esses direitos, quais sejam o direito à vida, à saúde, à alimentação, à educação, à cultura, ao esporte, ao lazer, ao trabalho, à cidadania, à liberdade, à dignidade, ao respeito e à convivência familiar e comunitária.

Bem como em seu artigo 9° o Estatuto trouxe a obrigação do Estado: “É obrigação do Estado garantir à pessoa idosa a proteção à vida e à saúde, mediante efetivação de políticas sociais públicas que permitam um envelhecimento saudável e em condições de dignidade”. (Brasil, 2003).

Evidencia-se que o Estatuto do Idoso, deixou claro quais são os direitos dos idosos, e quem são as pessoas responsáveis por garantir a preservação desses direitos, no entanto, apesar do Estatuto ser vasto em relação aos direitos, ele foi omisso em relação ao abandono familiar, não trazendo a possibilidade de indenização por dano moral decorrente do abandono afetivo inverso, além de não trazer programas educacionais específicos para os idosos, sem falar ainda, que foi falho em relação aos direitos previdenciários.

Necessário se faz mencionar de forma sucinta, a Política Nacional do Idoso (Lei nº 8.842, de 04 de janeiro de 1994) que foi criada para assegurar aos idosos os direitos sociais, proporcionando condições para motivar sua liberdade, independência, inclusão e participação na sociedade de forma efetiva.

Para encerrar, vale citar as autoras Viegas e Barros (2016):

A garantia de acesso dos idosos aos direitos que lhes são assegurados de forma expressa pela lei são nada mais nada menos que o reconhecimento de sua cidadania, e, como consequência, seus direitos e deveres devem ser oportunizados tanto na esfera governamental, quanto na sociedade civil, afinal, a capacidade não é condicionada indispensavelmente em função da idade. (Viegas e Barros, 2016, p.14).

Apesar de a legislação atribuir vários direitos aos idosos, ainda existe uma lacuna muito grande em relação ao abandono dessas pessoas por seus familiares, a falta de conhecimento da sociedade torna cada vez maior o numero de idosos abandonados, o Estado deveria proporcionar a todos uma educação social para que possam saber como acolher e cuidar dos idosos, porque muitas vezes a falta de conhecimento faz com que os filhos abandonem seus pais, pelo fato de não saberem como lidar com eles.

5. RESPONSABILIDADE CIVIL: BREVES CONSIDERAÇÕES

De forma sucinta, responsabilidade civil é a obrigação de reparar danos causados a outrem, sejam danos materiais ou morais. O Código Civil trouxe o instituto da responsabilidade civil em seu artigo 927, caput: “Aquele que, por ato ilícito (arts. 186 e 187), causar dano a outrem, fica obrigado a repará-lo”.

Vale frisar, que o instituto da responsabilidade civil é tão relevante, que até mesmo a Constituição Federal trouxe o direito de indenização pelo dano sofrido, no artigo 5°, incisos V e X, assegura de forma expressa o direito de indenização por dano material ou moral.

Entende-se que a responsabilidade civil se divide em objetiva e subjetiva. Sendo que a responsabilidade civil objetiva (não terá aplicação nesse artigo) é aquela que independe da culpa do agente nos casos específicos na lei, ou quando decorre do próprio risco da atividade desenvolvida pelo o agente, assim determina o parágrafo único do artigo 927 do Código Civil. Por outro lado, a responsabilidade civil subjetiva, exige-se alguns pressupostos a serem cumpridos, e um deles é provar a culpa do agente.

O Código Civil trouxe de forma clara quais são esses pressupostos para caracterizar a responsabilidade civil subjetiva. De acordo com o artigo 186 do CC: “Aquele que, por ação ou omissão voluntária, negligência ou imprudência, violar direito e causar dano a outrem, ainda que exclusivamente moral, comete ato ilícito”. (Brasil, 2002).

Observam-se no artigo supracitado, quatro pressupostos da responsabilidade civil subjetiva sendo eles: a) conduta do agente (por ação ou omissão); b) culpa do agente (se o agente agiu com negligência, imprudência ou imperícia); c) nexo causal (relação de causa e efeito entre a conduta do agente e o dano causado à vítima); d) e o dano (lesão a um bem juridicamente tutelado pelo ordenamento jurídico seja na esfera patrimonial ou extrapatrimonial).

Dessa forma, pode-se considerar que a responsabilidade civil subjetiva será de extrema relevância na apuração do dever de indenizar os idosos pelos danos causados que decorreu de um ato ilícito praticado por sua prole.

A respeito dos danos causados, é importante frisar, que o dano material, ou seja, aquele que atinge o patrimônio da vítima é possível medir a sua extensão, no entanto, o dano moral atinge intimamente a vítima, sendo impossível mensurar qual a extensão, cabendo ao juiz, de forma equitativa, quantificar o dano moral de acordo com as circunstâncias do caso.

Conclui-se, que não se pode medir a inação de afeto, pois não é possível mensurar a extensão de tamanha tristeza e solidão, todavia o dano moral ou material causado pelo abandono afetivo pode ser quantificado em níveis indenizatórios, com base nas circunstâncias de vida do próprio idoso, alcançando assim uma reparação civil necessária.

6. DEVER DE CUIDADO DOS FILHOS EM FACE DOS PAIS IDOSOS

Antes de explicar o conceito de abandono afetivo inverso, é relevante demonstrar quais as obrigações dos filhos em face dos seus pais idosos. Como já visto acima, o dever de cuidado dos filhos não está determinado apenas no Estatuto do Idoso, mas também no artigo 229 da Constituição Federal de 1988: “os pais têm o dever de assistir, criar e educar os filhos menores, e os filhos maiores têm o dever de ajudar e amparar os pais na velhice, carência ou enfermidade”. (BRASIL, 1988).

No entanto, o Estatuto do idoso, trouxe de forma mais ampla o dever de cuidado dos filhos em seu artigo 3°:

Art. 3º. É obrigação da família, da comunidade, da sociedade e do Poder Público assegurar ao idoso, com absoluta prioridade, a efetivação do direito à vida, à saúde, à alimentação, à educação, à cultura, ao esporte, ao lazer, ao trabalho, à cidadania, à liberdade, à dignidade, ao respeito e à convivência familiar e comunitária. (BRASIL, 2003).

Observa-se que ambos os dispositivos supracitados, primeiramente trouxeram o dever de cuidado da família, no entanto a Constituição não abrangeu o dever do Estado e da sociedade para com os idosos, contudo delimitou que o dever de cuidado cabe aos descendentes do idoso. Toda via o Estatuto do idoso de forma ampla definiu que o dever de cuidado cabe á família sem especificações, de forma inovadora especificou que a sociedade bem como o Estado também tem a obrigação de cuidar dos idosos.

6.1 O Abandono

Para melhor esclarecer o que é abandono de idosos, relevante se faz definir, primeiramente, o que é o abandono propriamente dito.

Na esfera jurídica, abandono é o ato pelo qual uma pessoa de forma negligente renuncia, ou seja, abre mão de um direito em relação a uma pessoa ou um bem, causando consequências jurídicas.

Contudo, o abandono de idosos pode ser de forma material ou imaterial. Sendo que o abandono material se dá quando o idoso deixa de ter acesso á itens básicos para sua sobrevivência, como, por exemplo, água, alimentação saudável e digna, vestimentas adequadas, bem como o acesso á saúde e tratamento adequado se for o caso e até mesmo a pensão alimentícia.

A Constituição Federal de 1988 em seu artigo 229° resguardou esse direito do idoso, bem como o Código Penal que tipificou a conduta do abandono material em seu artigo 224°:

Art. 244 - Deixar, sem justa causa, de prover a subsistência do cônjuge, ou de filho menor de 18 (dezoito) anos ou inapto para o trabalho, ou de ascendente inválido ou maior de 60 (sessenta) anos, não lhes proporcionando os recursos necessários ou faltando ao pagamento de pensão alimentícia judicialmente acordada, fixada ou majorada deixar, sem justa causa, de socorrer descendente ou ascendente, gravemente enfermo: (Alterado pela L-010. 741-2003). Pena - detenção, de 1 (um) a 4 (quatro) anos e multa, de uma a dez vezes o maior salário mínimo vigente no País (BRASIL, 1941).

Pode se observar que o Código penal determinou pena privativa de liberdade cumulada com multa, para aquele que deixar de cumprir o dever legal de prestar assistência material ao idoso, o que significa dizer que apesar do Código Penal tipificar a conduta como um crime de desamor, ainda assim, não há previsão legal de forma explicita no âmbito civil, á respeito da responsabilidade civil decorrente do abandono afetivo inverso.

Há de se falar também, na forma de abandono imaterial, este é o mais devastador, sendo caracterizado pela falta da convivência familiar e assistência moral ao idoso. O abandono imaterial é arguido pelo artigo 229 da CF/88, quando determina a reciprocidade do dever da relação entre pais e filhos. Bem como o artigo 4° do Estatuto do Idoso definiu:

Art. 4o Nenhum idoso será objeto de qualquer tipo de negligência, discriminação, violência, crueldade ou opressão, e todo atentado aos seus direitos, por ação ou omissão, será punido na forma da lei.

§ 1o É dever de todos prevenir a ameaça ou violação aos direitos do idoso.

§ 2o As obrigações previstas nesta Lei não excluem da prevenção outras decorrentes dos princípios por ela adotados. (BRASIL, 2003).

Vislumbra-se que o artigo citado acima, determinou ser dever de todos evitar que os direitos dos idosos sejam violados, e quem violar qualquer direito do idoso será punido na forma da lei. Bem como o Código penal que tipificou o abandono material, o Estatuto do Idoso tipificou a conduta do abandono imaterial, em seus artigos 98 e 99:

Art. 98. Abandonar o idoso em hospitais, casas de saúde, entidades de longa permanência, ou congêneres, ou não prover suas necessidades básicas, quando obrigado por lei ou mandado:

Pena – detenção de 6 (seis) meses a 3 (três) anos e multa.

Art. 99. Expor a perigo a integridade e a saúde, física ou psíquica, do idoso, submetendo-o a condições desumanas ou degradantes ou privando-o de alimentos e cuidados indispensáveis, quando obrigado a fazê-lo, ou sujeitando-o a trabalho excessivo ou inadequado:

Pena – detenção de 2 (dois) meses a 1 (um) ano e multa.

§ 1o Se do fato resulta lesão corporal de natureza grave:

Pena – reclusão de 1 (um) a 4 (quatro) anos.

§ 2o Se resulta a morte:

Pena – reclusão de 4 (quatro) a 12 (doze) anos. (BRASIL, 2003).

Apesar de penalizar a conduta com pena privativa de liberdade e multa, nota-se que nem mesmo o Estatuto do idoso, um dos dispositivos mais importantes de proteção dos direitos dos idosos, não abrangeu a possibilidade de indenização por dano moral decorrente do abandono afetivo inverso.

6.2 O Afeto

Diante de um conceito informal, afeto é um sentimento positivo ou negativo em relação a uma pessoa, sendo que o afeto é de extrema importância para o fortalecimento dos laços familiares.

Por outro lado, pode se dizer que existem dois tipos de afeto, objetivo e subjetivo. Sendo que o afeto objetivo são normas jurídicas que devem ser cumpridas em relação ao idoso, como por exemplo, o dever de cuidado. No entanto, o afeto subjetivo são os sentimentos, propriamente dito, ou seja, são as emoções sentidas pelo ser humano.

No campo jurídico, o princípio da afetividade não está de forma explicita no ordenamento jurídico. Todavia, no Direito de Família esse princípio é a base principal para constituir um núcleo familiar sólido, pois é através dele que se tem a capacidade de amar ao próximo, possibilitando dessa forma, a adoção, o reconhecimento da união estável, e a família homoafetiva.

O afeto em relação ao idoso é muito importante, uma vez, que a pessoa na velhice já é propícia a sofrer de depressão, pois com o passar do tempo eles tendem a se sentirem cada vez menos úteis, já que em um determinado momento alguns não conseguem mais trabalhar, e às vezes dependem da ajuda de outras pessoas para executar as atividades mais simples do dia a dia, como por exemplo, tomar banho.

Perante o que foi dito acima, o afeto em relação ao idoso não está voltado para a questão do amor, pois amar é faculdade que nasce em cada um de uma determinada maneira, porém, a questão aqui, é o dever de cuidado dos pais para com os filhos e destes para com os pais na velhice.

Ocorre que na vida do idoso, as coisas se tornam mais delicadas na velhice, portanto o apoio material, ou seja, os cuidados e a assistência são de relevante valor para facilitar a vida do idoso, há de se falar também que o amor, a demonstração de carinho, são as maneiras de apoio mais importantes, pois para o idoso que se sente amado, que se sente importante, enfrentar os problemas da vida se torna mais fácil quando se tem um apoio moral familiar.

Para finalizar, é importante citar o entendimento formidável de Charles Bicca (2015):

O abandono afetivo constitui uma das mais graves formas de violência que pode ser perpetrada contra o Ser Humano. A violência praticada é completamente diferente, sendo duradoura, covarde e, sobretudo, silenciosa. O abandono afetivo é a morte em vida. [...]. (BICCA, 2015, p.15).

Importante se faz mencionar, que é entristecedor, que algo que deveria ser natural e espontâneo do ser humano, seja necessário que o ordenamento jurídico imponha de forma obrigatória o dever de cuidado dos filhos para com os pais.

7. DANO MORAL DECORRENTE DO ABANDONO AFETIVO INVERSO

O dano moral decorrente do abandono afetivo inverso, em regra, se dá pela falta de afeto, ou melhor, pela falta de cuidado dos filhos para com os pais idosos. O dano moral, nesse aspecto é constituído, pela omissão voluntária dos filhos, tendo por objetivo a proteção do princípio constitucional da dignidade da pessoa humana.

A indenização por dano moral, não tem o objetivo de impor o amor, pois amar é faculdade e uma dádiva do ser humano, portanto não se compensa com dinheiro, todavia, o objetivo aqui é evitar ou pelo menos amenizar, os danos físicos, sociais e principalmente psicológicos causados pela falta de cuidado.

Para continuar, é importante explicar o termo “inverso”, segundo o entendimento das autoras Viegas e Barros (2016): “A palavra “inverso” inserida no contexto do abandono se relaciona com a equação às avessas do binômio da relação paterno-filial, ou seja, os filhos devem cuidar dos pais idosos, assim como, os pais devem cuidar dos filhos na infância”. (Viegas e Barros, 2016, p.21).

Diante do contexto supracitado, fica a dúvida se seria possível a indenização por dano moral decorrente do abandono afetivo inverso. Contudo ao analisar o instituto da responsabilidade civil, entende-se que sim, seria possível indenização por dano moral, pelo fato da omissão voluntária do dever de cuidado dos filhos em relação aos pais, pois a falta de cuidado com o tempo se transforma em um sofrimento psíquico além de agravar doenças, dessa forma seria possível uma compensação onerosa.

Importante frisar, que na ação de indenização por dano moral decorrente do abandono afetivo inverso, o ônus da prova pertence ao requerente, ou seja, ao idoso, exigindo como requisitos a prova da culpa do requerido, provar a conduta do agente que neste caso será por omissão voluntária, além disso, tem que provar o nexo de causalidade com o dano causado.

Observa se que não é fácil provar o dano moral, contudo não é impossível, ocorre que em relação ao abandono afetivo de pais para com os filhos existe uma ampla literatura jurídica, até mesmo entendimento jurisprudencial á favor da indenização por dano moral, porém o caminho invertido, ou seja, o abandono praticado pelos filhos em relação aos pais é pouco debatido, em uma pesquisa jurisprudencial, foi possível encontrar apenas um acórdão do Tribunal de Justiça do Estado de São Paulo, que negou provimento ao recurso de apelação, pois a parte autora não conseguiu provar o dano.

O fato de não existir uma legislação específica, que defina a indenização por dano moral decorrente do abandono afetivo inverso, não significa que os filhos estão livres do dever de cuidado, uma vez, que tal obrigação está expressa na nossa lei maior, portanto se até a Constituição Federal de 1988 deliberou sobre o dever de cuidado, o abando afetivo, no geral, representa um fato jurídico de relevante valor social que merece uma maior atenção e principalmente, necessita ser debatido com magnitude pelos operadores do direito.

Importante se faz mencionar que a figura do Abandono Afetivo Inverso não veio para quantificar o amor, nem mesmo para impor o afeto, mas sim para impor o cumprimento do dever de cuidado da família em relação ao idoso, pois a família aceitando ou não essa condição, eles estão obrigados a cumprir esse dever constitucional.

Para frisar o que foi dito cima, segundo o entendimento do desembargador Jones Figueiredo Alves (PE), diretor nacional do Instituto Brasileiro de Direito de Família (IBDFAM):

A inação de afeto ou, mais precisamente, a não permanência do cuidar, dos filhos para com os genitores, de regra idosos. Segundo o diretor, esta falta do cuidar serve de premissa de base para a indenização. O amor é uma celebração permanente de vida, e, como tal, realidade espontânea e vivenciada do espírito; todavia o abandono moral e material, como instrumento de desconstrução de vida pode ser mensurado em níveis de quantificação indenizatória. Os parâmetros são os circunstanciais de vida dos próprios atores envolvidos, sinalizando uma reparação civil adequada e necessária. (ABANDONO, 2013).

Portanto, para concluir se ocorrer à violação do dever de cuidado filial-paterno, surgirá o direito do idoso de ser indenizado por dano moral à luz do instituto da responsabilidade civil, mesmo que não exista nenhuma lei específica vigente no Brasil que regularmente o abandono afetivo inverso.

CONCLUSÃO

No cenário nacional, é nítido que no decorrer dos anos a população de terceira idade aumentou gradativamente, porém a sociedade, o Estado e os familiares não estão preparados para proporcionar aos idosos, uma vida com dignidade.

Contudo, o envelhecimento é algo natural da vida, e em regra, todos um dia irão envelhecer, todavia, não existem politicas públicas adequadas para proteger e garantir todos os direitos dos idosos.

A realidade atual é entristecedora, pois apesar das garantias constitucionais do dever de cuidado filial-paterno, o que vem ocorrendo é o aumento do abandono desses seres humanos tão frágeis por suas próprias famílias, além do mais o acesso à saúde é precário, sem falar ainda que existe uma grande falha educacional para facilitar a inclusão do idoso na sociedade. Outra realidade que cada vez, mais afetam os idosos de maneira agressiva, insensível e preconceituosa é a falta de oportunidades no mercado de trabalho em razão de um critério cronológico injusto.

Em relação ao dever de cuidado, que deveria ser algo automático do ser humano, em razão da moral e dos bons costumes, contudo necessitou que tal “dever” tivesse amparo constitucional para que pudesse preservar os direitos dos idosos. Portanto, se o dever de cuidado está inserido na Constituição Federal de 1988, esse cuidado de pai para filho, e o cuidado do filho para com o pai não é algo facultativo e sim obrigatório, pode se dizer então, que o descumprimento desse dever gera o dever da família, da sociedade e até mesmo do Estado de indenizar o idoso que tenha sido lesado em razão desse abandono afetivo.

Outro fator relevante é a falta de uma legislação específica sobre o abandono afetivo inverso, contudo existe um projeto de lei n°4294 de 2008, feito pelo Deputado Carlos Bezerra, que se aprovado acrescentará um parágrafo ao art. 1.632 do Código Civil (Lei nº 10.741, de 1ª de outubro de 2003), e também acrescentará o §2° ao art. 3° do Estatuto do Idoso (Lei nº 10.741, de 1ª de outubro de 2003), de modo a estabelecer a indenização por dano moral em razão do abandono afetivo.

Porém, ocorre que esse projeto de extrema relevância para o ordenamento jurídico brasileiro está aguardando julgamento pela Comissão de Constituição e Justiça e de Cidadania (CCJC), aliás, há vários anos, vale aproveitar o momento para fazer uma crítica pela ineficiência do legislativo, e clamar pelo seu despertar em relação a um problema grave que assolam cada vez mais os idosos desse país.

Dessa forma, nota se que mesmo que não seja possível impor o ato de amar a ninguém, existe o instituto da responsabilidade civil decorrente do abandono afetivo inverso, que possibilita tutelar acima de tudo o dever de cuidado violado pelas famílias, pela sociedade e principalmente pelo o Estado, pois é esse o ente responsável por garantir proteção aos direito dos idosos e punir aquele que desrespeitar qualquer um desses direitos.

Haja vista, que a indenização por dano moral tem também o objetivo de inibir o ato ilícito do abandono, ato esse que se torna cada vez mais frequente pelos próprios filhos, contudo esse problema tem solução, porém essa será uma caminhada longa, mas não impossível.

Há de se fala que não se pode esquecer-se daqueles, que acima de tudo, deram á vida aos seus filhos, que deram amparo, deram amor, dedicação, educação, e uma vida digna e humana quando eram crianças, quando eram considerados frágeis tinham o amparo de seus pais. Portanto, é injusto, que quando eles (idosos) precisam ser amados, que necessitam de amparo, cuidados de seus filhos, aqueles que teriam o dever legal de cuida-los estão mais preocupados com o mundo capitalista que vivem hoje, onde tudo gira em torno de trabalhar e ganhar mais e mais dinheiro, do que com a saúde e o bem-estar daquele, do qual lhes deram a vida.

Para concluir, é relevante um momento de reflexão, você que acha que seus pais porque envelheceram, vai te dar muito trabalho, vão atrapalhar sua vida, pense que um dia foi você quem deu muito trabalho à eles , e não se esqueça da lei do retorno “tudo o que você pratica hoje, voltará pra você no futuro. Pense nisso!

 

REFERÊNCIAS

BICCA, Charles. Abandono afetivo: o dever de cuidado e a responsabilidade civil por abandono afetivo de filhos – Brasília, Editora OWL, 2015.

BRASIL. Código Civil. Código Civil. Diário Oficial da União. Brasília, 11 jan. 2002. Disponível em: <http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/leis/2002/l10406.htm>. Acesso em 24 abr. 2018.

BRASIL. Código Penal. Diário Oficial da União. Brasília, 31 dez. 1940. Disponível em: <http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/decreto-lei/Del2848compilado.htm>. Acesso em: 13 mai. 2018.

BRASIL. Constituição da República Federativa do Brasil. Diário Oficial da União. Brasília, 05 out. 1988. Disponível em: <http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/constituicao/constituicaocompilado.htm>. Acesso em 17 abr. 2018. 

BRASIL. Lei nº 10.741, de 1º de outubro de 2003. Dispõe sobre o Estatuto do Idoso e dá outras providências. Diário Oficial da União, Brasília, 03 out. 2003. Disponível em: <http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/leis/2003/l10.741.htm>. Acesso em: 18 abr. 2018.  

BUARQUE, Daniel. G1. Envelhecimento da população mundial preocupa pesquisadores. 29 out. 2011. Disponível em: <http://g1.globo.com/mundo/noticia/2011/10/envelhecimento-da-populacao-mundial-preocupa-pesquisadores.html> Acesso em 19 abr. 2018.

CIELO, Patrícia Fortes Lopes Donizele; VAZ, Elizabete Ribeiro de Carvalho. A legislação brasileira e o idoso. Revista CEPPG, v. 2, n. 21, p. 42, 2009.

IBDFAM. Abandono afetivo inverso pode gerar indenização. 16 jul. 2013. Disponível em: <http://www.ibdfam.org.br/noticias/5086/+Abandono+afetivo+inverso+pode+gerar+indeniza %C3%A7%C3%A3o>. Acesso em: 15 mai. 2018. 

VIEGAS, Cláudia Mara de Almeida Rabelo; DE BARROS, Marília Ferreira. Abandono Afetivo Inverso: O Abandono do Idoso e a Violação do Dever de Cuidado por Parte da ProleCadernos do Programa de Pós-Graduação em Direito – PPGDir./UFRGS, Porto Alegre, v. 11, n. 3, p. 06-14-21, fev. 2017. ISSN 2317-8558. Disponível em: <http://seer.ufrgs.br/index.php/ppgdir/article/view/66610/40474>. Acesso em: 16 abr. 2018. doi: http://dx.doi.org/10.22456/2317-8558.66610.

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