A adjudicação compulsória frente à obrigação de registro do contrato de promessa de compra e venda de bem imóvel.

A discordância entre o artigo 1.418 do Código Civil de 2002 e o Enunciado 239 da súmula do STJ

07/06/2018 às 18:27
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Uma análise da divergência entre normas, advinda da edição do Código Civil de 2002, em contrariedade ao disposto no Enunciado 239 do STJ.

Resumo: presente artigo expõe a divergência de normas advindo da edição do Código Civil de 2002 em contrariedade ao disposto no Enunciado 239 do Superior Tribunal de Justiça. O novo código ressurgiu um desusado entendimento do Supremo Tribunal Federal, enquanto guardião da legislação infraconstitucional, referente à obrigação de registro do compromisso de compra e venda ao reconhecimento do direito à adjudicação compulsória. O entendimento fora mudado pelo Superior Tribunal de Justiça, encontrando-se editado o Enunciado 239, que determina no direito de adjudicação compulsória que não se condiciona ao registro imobiliário da promessa de compra e venda. Entretanto, o Código Civil de 2002, seguinte ao referido enunciado jurisprudencial, em seus artigos 1.417 e 1.418, condiciona o direito à adjudicação compulsória ao registro da promessa de compra e venda em cartório, o que, especificamente, gerou insegurança jurídica quanto à aplicação do instituto jurídico em questão. Entretanto, o embaraço jurídico assentado foi elucidado com a edição do Enunciado 95 da I Jornada de Direito Civil, o qual ratificou, após a edição do Código Civil de 2002, o entendimento de que o direito de adjudicação compulsória, quando interpretado em face do promitente vendedor, não se condiciona ao registro da promessa de compra e venda no cartório de registro imobiliário.

Palavras-chave: Direito, adjudicação compulsória, Código Civil, registro.


1  - INTRODUÇÃO

 O presente artigo tem por objetivo o estudo do conflito entre o artigo 1.418 do Código Civil Brasileiro de 2002 e o Enunciado 239 da Súmula do Superior Tribunal de Justiça, ambos alusivos à execução específica do contrato de promessa de compra e venda intitulada adjudicação compulsória. O problema identificado na esfera das aludidas normas se expõe a partir do instante em que o artigo 1.418 do Código Civil condiciona o reconhecimento ao direito de adjudicação compulsória à realidade antecedente de um direito real de aquisição criado, o qual se concretiza com o adimplemento de vários quesitos, tais como, o registro do compromisso de compra e venda junto à matrícula do imóvel prometido, já que o Enunciado 239 do STJ libera o referido registro imobiliário à adjudicação compulsória.

Entretanto, a suposição de verificação desta pesquisa é a isenção do registro prévio do compromisso de compra e venda no cartório imobiliário para o ajuizamento da ação de adjudicação compulsória, por zelar de instituto jurídico de natureza eminentemente pessoal, sendo necessário o registro apenas para se garantir direito de sequela, oponível a terceiros. Para isso, se utilizará de argumentos doutrinários, fundamentos normativos e entendimentos jurisprudenciais consoantes à hipótese cuja verificação é pretendida. Entretanto, no primeiro capítulo discorrer-se-á sobre os direitos reais e pessoais, seguindo a idéia principal de que existem conceitos e institutos jurídicos diversos referentes a cada uma destas classes; a denominação da evolução normativa do contrato de promessa de compra e venda, entretanto, como de sua execução específica; a consciência de que o direito real de aquisição é um direito real limitado, não possui o condão de substituir, por si só, a propriedade do imóvel destinado ao promitente comprador. Após, o segundo capítulo trata a diferenciar o conceito, a natureza jurídica e o efeito da promessa de compra quando registrada e quando destituída de registro, resvalando ao direito de adjudicação compulsória. Também, apresentaremos o referido conflito entre normas, assim como o respectivo pensamento doutrinário e a relevância de se esclarecer de forma clara as normas no ordenamento jurídico Brasileiro.

Outrossim, o terceiro capítulo tem como objetivo apresentar a jurisprudência relacionada, conferenciar  no que entende a doutrina civilista brasileira. Assim, terá como objetivo de estudo a jurisprudência do Supremo Tribunal Federal, como guardião da legislação infraconstitucional, e do Superior Tribunal de Justiça, após a promulgação da Constituição Federal de 1988.


1 Direitos Patrimoniais Subjetivos

 Direitos Pessoais e Direitos Reais.

Entretanto, é relevante, no presente artigo, ressaltar alguns tópicos doutrinários a respeito dos direitos reais e pessoais, já que o estudo de tais institutos é permanente para traçar toda a linha de raciocínio envolvida nesta pesquisa.

É relevante ressaltar que, à época do direito romano, os direitos reais e pessoais não sofriam distinção, pontuando como objeto do direito apenas “o poder do homem” a respeito algo ou alguém, indicando como parte unificadora do direito. A crítica às teorias monistas lançam pela demonstração da disparidade essencial entre os direitos reais e os direitos pessoais. Assim, passa pela comprovação da existência de um dualismo essencial no seio dos direitos patrimoniais que impliquem coisas.  A visão de direitos reais deve ser determinada a partir de uma base teórica dualista, em que os direitos reais (absolutos) e os direitos obrigacionais (relativos) são considerados sob o aspecto de um âmbito de dicotomias, como institutos jurídicos basicamente diferenciados e autônomos.

 As teorias fundamentais empregadas pela doutrina a respeito a realista, ou clássica, e a personalista.

Na corrente realista, estão presentes três elementos na relação jurídica de direito real: sujeito ativo titular do direito real, o direito súbito do homem sobre a coisa, entretanto, é capaz de ter a relação jurídica entre o homem e a coisa, isso que difere os direitos reais dos obrigacionais.

Referente às relações jurídicas de direitos pessoais estarem dispostas entre duas ou mais pessoas, não há o que se falar de ligação de coisa e pessoa, assim a relação obrigacional refere-se à vivência de uma obrigação de uma parcela em a uma responsabilidade de contraprestação, assim as partes podem operar o direito em oposição relativo à insolvência da parte oposta. Presume-se que a obrigação de uma parcela pressupõe a um bem, não se pode dizer em domínio imediato a respeito deste bem, mas uma influência indireta em relação a coisa, assim, a totalidade da transação precisa do líbito do possuidor do bem, assim se distingue as relações.

Na associação dos direitos pessoais estão expostos os elementos: sujeito passivo, sujeito ativo e a prestação corpórea ou incorpórea, como instrumento do vínculo. Os personalistas distinguem que nos direitos reais o sujeito passivo  exterioriza na pessoa de entidade, existindo um compromisso passivo genérico. Assim, incide a humanidade a obrigação de acatar a premissa jurídica do possuidor do direito real, dever este de renúncia em relação à coisa,  assim, não pode incomodar o detentor do direito por ação de outrem sobre a coisa.

Assim, comprova a o conceito de alguns juristas, vez que não pressupõe a incidência de direitos reais a menos que haja uma ligação lícita entre o titular do direito sobre a coisa e os demais cidadãos, assim, resguardados os termos legais, o uso dos direitos sobre a coisa por parte de seu possuidor deve ser garantido e protegido perante terceiros. No contexto da diferenciação entre direitos patrimoniais, é notório que os direitos reais requerem dos outros membros da sociedade cumprimento ao direito que o titular desempenha sobre a coisa, já nos direitos pessoais o sujeito passivo do vínculo não deve apenas conhecer o direito de crédito como cumpri-lo, cessando a prestação.

 Assim, a compreensão sintetiza-se no senso de que existe uma “condição jurídica” para o sujeito efetivo de direito real “passível de gerar relações jurídicas” entre o detentor do direito real e quem por ventura descumprir a obrigação genérica de cumprimento imposto à sociedade, passando de terceiro a sujeito passivo, sendo certo que, neste caso, mantém absoluto o poder imediato que o titular exerce sobre a coisa”, o qual é exercido perante os indivíduos e da sociedade.

 A eficácia absoluta dos direitos reais referem-se propriamente com efeito erga omnes dos direitos reais. Significa dizer que os direitos reais são oponíveis em face de qualquer pessoa que os descumpre.

Assim, os direitos obrigacionais são providos de eficácia relativa, o que aponta a dependência de certa parte em relação à autonomia da vontade, cometida pela outra parte por meio do cumprimento de sua obrigação, sendo certo que ambas as partes estão subordinadas de forma recíproca.

O caráter absoluto dos direitos reais, nas relações de direito real, a determinação do sujeito passivo e o aparecimento da relação jurídica se dá no momento da violação ao direito que o sujeito ativo pratica sobre a coisa, então, nas relações de direito pessoal à determinação do sujeito passivo se dá ao momento em que nasce o direito de crédito.

 Assim, os direitos relativos têm eficácia entre partes, vínculo entre credor e devedor, quando os direitos absolutos têm eficácia erga omnes, dever de abstenção da sociedade.

Já no princípio da Inerência a aderência do direito real à coisa, que o direito real conserva-se em sua essência, ou seja, por mais que, por exemplo, terceiros passem a ser detentores de determinada coisa, a titularidade do direito de propriedade não sofre mutação, estabelece-se uma relação de senhorio entre o titular a coisa.

Como exemplo, é que ocorre nos contratos de locação de imóveis, pois decorre da eficácia erga omnes. Discorre Ascensão quando a coisa continua a ser objeto do direito real, mesmo que passe por mil mãos.

O Direito de sequela é o elemento que traduz a imposição do direito real, pela inerência e pelo caráter absoluto, em relação a terceiros. Dessa forma, tem efeito quando a coisa, objeto de direito real, passa para esfera jurídica de terceiro. Neste caso tem-se que o titular de direito real tem a prerrogativa de exercê-lo, perseguindo o bem, em face de qualquer detentor ou possuidor.

Esse caso não ocorre em relação aos direitos pessoais, vez que esse tipo de fortuito conflito entre os obrigados geraria apenas o dever de indenizar.

 Entretanto nos Princípios da Tipicidade e da Taxatividade que tem como objetivo informar que os direitos reais existentes e possíveis de serem alegados, são apenas aqueles elencados pelo legislador no código civil ou na legislação.

O caráter restritivo referente aos direitos reais existentes, não está presente no âmbito dos direitos pessoais, de modo que há possibilidade das partes estabelecerem relações atípicas como a celebração de contratos.

É relevante esclarecer que tal restrição baseia-se nos efeitos gerados pelos direitos reais, vez que particulares não têm o poder de vincular a sociedade a deveres de abstenção diversos dos pré-existentes.

Quanto ao princípio da publicidade tem que ser ressaltado que parte do pressuposto de que há o conhecimento da titularidade do direito real por todos os indivíduos para a garantia e aplicabilidade da eficácia plena desses direitos.

Na esfera dos direitos pessoais, denota de que todas as informações relativas à relação jurídica são apenas entre as partes envolvidas, sem a necessidade de exteriorizar para toda a sociedade tais informações.

 Assim, no direito civil brasileiro, a difusão aparece na aquisição “inter vivos” de direito real sobre bens imóveis mediante registro, o mesmo não ocorre nos casos de bens móveis, já que o mesmo se na tradição, conforme pode ser visto no (artigo 1.226 do código civil brasileiro).

 Quando se fala de aquisição prescritiva de direitos reais, é quando extingue os direitos, resultante em decorrência da passagem do tempo, resultando diferentes efeitos quando se fala de direitos reais e direitos pessoais.

 Já nos direitos reais, tem-se a intitulada obtenção por usucapião, quando ocorre a revogação do direito de um em detrimento a aquisição de direito do outro, sobre o mesmo objeto jurídico.

Os direitos pessoais não podem ser obtidos por usucapião, havendo tão somente a prescrição do direito do autor, o que ocorre a revogação da obrigação e do direito de ação equivalente, ficando por conta do devedor apenas uma obrigação natural em vantagem para credor, já que o devido direito não declinou.

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Assim, as diferenças à natureza de cada uma das espécies de direito, seja real ou pessoal, retratam como causa determinante na descrição da natureza jurídica da ação de adjudicação compulsória.

Fundamenta este aspecto a constatação legal de que o registro do contrato de promessa de compra e venda de bem imóvel confere ao promitente comprador o direito real de aquisição, previsto no artigo 1.22529 e baseado no artigo 1.41730 do Código Civil Brasileiro de 2002.

Nos Art. 1.227 do CC. Os direitos reais sobre imóveis constituídos, ou transmitidos por atos entre vivos, só se adquirem com o registro no Cartório de Registro de Imóveis dos referidos títulos (arts. 1.245 a 1.247), salvo os casos expressos neste Código no Art. 1.226. Os direitos reais sobre coisas móveis, quando estabelecidos, ou difundidos por atos entre vivos, só se concretizam na tradição.

 De acordo com Art. 1.225 do CC. São direitos reais: (...) VII - o direito do promitente comprador do imóvel; (...) e Art. 1.417. Mediante promessa de compra e venda em que se não pactuou arrependimento, celebrada por instrumento público ou particular, e registrada no Cartório de Registro de Imóveis, adquire o promitente comprador direito real à aquisição do imóvel. (grifou-se).

Enquanto artigo 1.4183 da referida legislação, adiantando que a visão adotada remeter-se-á à sua natureza pessoal cumulada com a correlata eficácia real do direito do promitente comprador, em face da recusa do promitente vendedor em outorgar a escritura definitiva de compra e venda perante o cartório de notas, títulos e documentos.

 Sobre a promessa de Compra e Venda Registrada Como Direito Real Limitado de acordo com o direito civil brasileiro, os direitos reais repartem em limitados e ilimitados plenos.

A respeito dessa última classe possui o direito de propriedade, o que prevê, racionalmente, poderes de usar, gozar, dispor e reaver a coisa de quem quer que indevidamente a possua ou detenha, conforme prevê o artigo 1.228 do Código Civil de 2002, que assim dispõe: “O proprietário tem a faculdade de usar, gozar e dispor da coisa, e o direito de reavê-la do poder de quem quer que injustamente a possua ou detenha. Assim, estando o titular do direito real de propriedade investido de todos estes poderes conclui-se que ele possui a denominada propriedade plena”.

 Entretanto, o exposto direito de propriedade será restrito quando algumas das atribuições relacionadas se desprendem do proprietário e se integram ao patrimônio de outra pessoa.

Como exemplo podemos citar o usufruto, assim os poderes de usar e gozar da coisa recai ao usufrutuário, e ao proprietário permanecem os poderes de dispor e reivindicar a coisa, restando o usufrutuário titular de direito real sobre coisa alheia, oponível erga omnes.

De acordo com os direitos reais no código civil de 2002, conforme o princípio da taxatividade, no artigo 1.225 os direitos reais sujeitos de aquisição no ordenamento jurídico vigente expõe a propriedade, visto que os demais decorrem da desintegração dos efeitos inerentes ao domínio, ou seja, os direitos reais, neste caso, os limitados, direitos reais sobre coisa alheia, decorrem do parcelamento do único direito real pleno ilimitado, a propriedade, direito real sobre coisa própria, que incide ao dono da coisa investido de todos os poderes inerentes ao domínio.

A competência é passível de se fracionar em tantos direitos como são as formas por que se manifesta a atividade do homem sobre as coisas, e cada um dos direitos de elementares do domínio constitui em si um direito real: tais são o direito de usufruto, o de uso, o de servidão.

Os direitos reais, desmembrados do domínio e transferidos a terceiros, denominam-se direitos reais na coisa alheia (jus in re aliena)”, podem ser  classificados os direitos reais de superfície, servidões, usufruto, uso, habitação, e o direito do promitente comprador do imóvel como direitos reais de gozo ou fruição, ao que classifica o penhor, a hipoteca e a anticrese como direitos reais de garantia. Além destes, enumera como direitos reais de gozo ou fruição a concessão de uso especial para fins de moradia e a concessão de direito real de uso, todos presumidos e compreendidos no rol dos direitos reais pela Lei 11.481/2007.

  O contrato, em si, não possibilita a obtenção de direitos reais, mas apenas obrigações, de acordo com o artigo 481 do código civil de 2002: “pelo contrato de compra e venda um dos contratantes se obriga a transferir o domínio de certa coisa, e o outro, a pagar-lhe certo preço em dinheiro”.

 Não se pode dizer que a transferência de domínio exclusivamente pela celebração do contrato de compra e venda, necessitando assim, existindo o registro da escritura de compra e venda que funciona como título aquisitivo a ser registrado.

Perante os artigos 1.226 do código civil de 2002 (“os direitos reais sobre coisas móveis, quando constituídos, ou transmitidos por atos entre vivos, só se adquirem com a tradição”) e 1.227 do mesmo diploma legal, os direitos reais sobre imóveis constituídos, ou transmitidos por atos entre vivos, só se adquirem com o registro no Cartório de Registro de Imóveis dos referidos títulos (artigos. 1.245 a 1.247) salvo os casos expressos neste Código.

Assim, um contrato que disponha uma servidão ou uma hipoteca, enquanto não for registrado, causará somente o reconhecimento de um vínculo obrigacional, resultando o referido direito real somente após o registro do título.

Diante do exposto, tal ordenação se aplica corretamente ao direito real de aquisição, referente à promessa de compra e venda, que encontra-se previsão no inciso IX do artigo 1.225 do código civil de 2002, estabelecendo, entretanto, direito real previsto em lei, sujeito de aplicação de toda a sistemática incidente sobre os demais direitos reais, no que couber.

Assim, apenas o registro da promessa de compra e venda terá o promitente comprador direito real sobre o imóvel prometido. Entretanto, em que move o registro constituir elemento indispensável à constituição e transmissão de direitos reais entre vivos, esse requisito não é exigido em vias da chamada transmissão causa mortis, já que, aberta a sucessão, opera-se neste mesmo momento a transmissão do domínio e da posse, conforme reza o artigo 1.784 do código civil de 2002 (“Aberta a sucessão, a herança transmite-se, desde logo, aos herdeiros legítimos e testamentários”).

 De acordo com o princípio da inerência, no instante do registro se procede ao surgimento do ônus que se liga à coisa, a afetação da coisa, juntando a ela, assim como a acompanhando independente das mudanças que venham incidir sobre a titularidade dominial. Apenas se extingue havendo a ocorrência de uma causa legal, ou seja, ocorrendo situação previamente prescrita em lei.

Entretanto, mesmo que os imóveis gravados sejam alienados, os direitos reais limitados continuarão incidindo sobre os respectivos bens, resultando os adquirentes titulares da propriedade sobre a qual recai um direito real pertencente a outrem.

Assim, conclui-se que a finalidade maior do requisito quanto a formalidade do registro aos bens imóveis, assim como da tradição aos móveis, foi a publicidade da transferência dos direitos reais, os quais são oponíveis erga omnes, dada a latente necessidade social aferida pelo legislador ordinário.

Desta forma, conclui-se que, mediante da previsão dos artigos 1.225, 1.227, 1.228, 481 e 1.417 (“Mediante promessa de compra e venda em que se não pactuou arrependimento, celebrada por instrumento público ou particular, e registrada no Cartório de Registro de Imóveis, adquire o promitente comprador direito real à aquisição do imóvel.”), todos do código civil de 2002, tem-se que a promessa de compra e venda de bem imóvel, ato jurídico inter vivos, quando levada a registro, constitui direito real, dotado de todas as prerrogativas e atributos fundamentais de tal esfera de direitos subjetivos, diante de que constitui espécie de direito real limitado, incidente sobre coisa alheia,  devido a  ausência da reunião de todos os poderes inerentes ao domínio.

Já a promessa de Compra e Venda é que, de somente contrato preliminar a contrato autônomo, organismo da promessa de compra e venda, era considerado somente contrato preliminar tanto na origem quanto ao longo das alterações normativas no âmbito do direito civil brasileiro.

Entretanto, após a edição da Lei 6.766/79 e do Código Civil de 2002, a promessa de compra e venda registrada passou a ser vista como título aquisitivo de direito real, perfazendo as características de um contrato pronto e acabado. É relevante destacar que a diferença entre um contrato preliminar e um contrato definitivo será determinante para a análise do problema em tela: a natureza pessoal do direito de adjudicação compulsória e a natureza real do direito do promitente comprador frente à necessidade de registro do contrato de promessa de compra e venda estabelecida pelo Código Civil de 2002.

Assim, é relevante esclarecer as características próprias do contrato preliminar e do contrato definitivo, destacando à análise dos elementos da promessa de compra e venda de bem imóvel diante de sua evolução regimental, para se aferir em qual das modalidades contratuais o exposto instituto se encaixa.

No que se refere ao instituto do contrato preliminar, destaca-se que este figura como instrumento eminentemente preparatório, consiste dizer que é o instrumento contratual destinado a ajustar a realização futura de um contrato definitivo, definindo desde então as condições de pagamento, execução entre outras avenças correlatas.

Os requisitos básicos de constituição salientam que a celebração somente será possível quando: for às partes civilmente capazes, o objeto lícito e possível, bem como a manifestação de vontade emanar do consentimento, do acordo de vontades, ou seja, os requisitos de constituição dos contratos em geral.

 Destaca-se que a forma de celebração do contrato preliminar pode ser tanto pública como privada, já que a discussão doutrinária existente foi superada. Antemão, pode o contrato preliminar ser unilateral ou bilateral, classificação que figura como critério de incidência da obrigação relativa ao cumprimento do contrato definitivo. A saber, a unilateralidade aponta a situação em que a obrigação cabe apenas a um dos contratantes enquanto a bilateralidade revela o dever de concretização do contrato principal por ambos os contratantes.

Assim, o contrato definitivo se remete do contrato preliminar, ao passo que o primeiro tem por objeto uma obrigação de dar cumprimento aos termos do próprio contrato ao momento de celebração do negócio, não depende da celebração de novo ato jurídico e tem a intenção de postergar os efeitos do contrato definitivo, enquanto o segundo tem por objeto uma obrigação de fazer, reclama a execução futura do contrato definitivo e visa produzir seus efeitos ao momento da celebração do contrato.

Desta forma, diferencia as duas modalidades contratuais pelo tempo de execução das prestações avençadas, bem como seus efeitos e função, uma vez que o contrato preliminar visa à segurança das partes em exigir no futuro seus direitos correspondentes.

A principal diferença entre o contrato preliminar e o contrato de promessa de compra e venda, de acordo com a legislação atual, é de acordo com obrigação gerada a partir do vínculo jurídico instalado entre as partes. Entretanto, a premissa do contrato preliminar resulta em uma obrigação de fazer, enquanto o contrato de promessa de compra e venda, ao momento de sua celebração, institui uma obrigação de dar, no caso a coisa.

 A diferença entre contrato preliminar próprio e impróprio, de modo que o primeiro configura modalidade contratual essencialmente retratável, tendo por objeto a celebração de um contrato definitivo como forma de expressar que não exerceram o direito de arrependimento, e o outro tem caráter eminentemente irrevogável, de conteúdo exauriente, assim, não impõe a celebração de um novo contrato, mas a realização de um “ato devido” referente a um dever de ratificação da vontade, anteriormente a fim de conferir eficácia ao contrato preliminar, neste caso impróprio.

 Não estabelece conformidade entre a doutrina admitir que a promessa irretratável de compra e venda pode ser considerada como um contrato pronto e finalizado. Diante a perspectiva da evolução normativa do instituto no ordenamento jurídico nacional, a origem do contrato preliminar se dá na vigência do Código Civil de 1916.

 Embora não esteja previsto expressamente, a doutrina passou a reconhecer a possibilidade de pactuar a denominada “promessa de contratar”, tendo como objeto inicial o contrato de compra e venda. O instituto surge sob um contexto de aumento acentuado na realização de negócios jurídicos imobiliários revelados na existência de uma verdadeira “indústria dos loteamentos”, a qual se define, pelo argumento e o aproveitamento dos vendedores, provocados pela valorização acentuada de terrenos próximos aos centros urbanos, o que tornou necessária a regulamentação de tais contratos.

Assim, nascia o direito do promitente comprador, no qual se disciplinava a aplicação e os efeitos da resolução contratual por inadimplemento relativa ao contrato de compra e venda. Neste contexto, os efeitos incidentes sobre a promessa de compra e venda revelavam a possibilidade jurídica de quaisquer das partes manifestarem arrependimento antes de configurados os requisitos do contrato definitivo, sendo a incidência de perdas e danos, frente ao desfazimento do negócio, o único ponto a ser decidido pelo juiz.

Com a seguinte edição do Decreto-Lei nº 58 de 1937, que dispõe sobre a venda de terrenos não loteados, a promessa de compra e venda passou a ser vista como ônus real, constituindo gravame oponível erga omnes. Diante disso, pago o preço ou quitadas as prestações, sem pacto de arrependimento e registrado o instrumento negocial, tem o promitente comprador o direito de intimar o promitente vendedor resistente na obrigação de outorgar a escritura definitiva para fazê-lo.

Havendo persistência no ato de recusa, cabe ao juiz promover a adjudicação do imóvel ao promitente comprador. É o que dispõe o seu artigo 22 e alterações: “Art. 22. As escrituras de compromisso de compra e venda de imóveis não loteados, cujo preço deva pagar-se a prazo, em uma ou mais prestações, serão averbadas à margem das respectivas transcrições aquisitivas, para os efeitos desta lei. (Redação original) Art. 22. Os contratos, sem cláusula de arrependimento, de compromisso de compra e venda de imóveis não loteados, cujo preço tenha sido pago no ato da sua constituição ou deva sê-lo em uma ou mais prestações desde que inscritos em qualquer tempo, atribuem ao compromissário direito real oponível a terceiros e lhes confere o direito de adjudicação compulsória, nos termos dos artigos 16 desta lei e 346 do Código do Processo Civil. (Redação dada pela Lei nº 649, de 1949). Art. 22. Os contratos, sem cláusula de arrependimento, de compromisso de compra e venda e cessão de direitos de imóveis não loteados, cujo preço tenha sido pago no ato de sua constituição ou deva sê-lo em uma, ou mais prestações, desde que, inscritos a qualquer tempo, atribuem aos compromissos direito reais oponíveis a terceiros, e lhes conferem o direito de adjudicação compulsória nos termos dos artigos 16 desta lei, 640 e 641 do Código de Processo Civil. (Redação dada pela Lei nº 6.014, de 1973).

 Diante disso, a promessa de compra e venda ainda era tratada como contrato preliminar, entretanto, mesmo se já estivessem sendo traçados alguns aspectos hoje relevantes para configurá-la como contrato autônomo, quais sejam: requisitos e efeitos distintos do contrato preliminar original e a mutação da obrigação de fazer em obrigação de dar – mero cumprimento ao contrato inicialmente pactuado, dispensando novo contrato.

 Assim, o referido decreto, em seus artigos 15 e 16, §2º, este último com redação dada pela Lei nº 6.014, de 27 de dezembro 1973, preza que a sentença de adjudicação compulsória transitada em julgado equivale ao título aquisitivo para a transcrição.

Vejamos: “Art. 15. Os compromissários têm o direito de, antecipando ou ultimando o pagamento integral do preço, e estando quites com os impostos e taxas, exigir a outorga da escritura de compra e venda. (Redação original e atual) Art. 16. Recusando-se os compromitentes a passar a escritura definitiva no caso do art. 15, serão intimados, por despacho judicial e a requerimento do compromissário, a dá-la nos 10 dias seguintes à intimação, correndo o prazo em cartório. (Redação original) § 1º Se nada alegarem dentro desse prazo, o juiz, por sentença, adjudicará os lotes aos compradores, mandando: (Redação original) a) tomar por têrmo a adjudicação, dela constando, além de outras especificações, as cláusulas do compromisso, que devessem figurar no contrato de compra e venda, e o depósito do restante do preço, se ainda não integralmente pago; (Redação original) b) expedir, pagos os impostos devidos, o de transmissão inclusive, em favor dos compradores, como título de propriedade, a carta de adjudicação; (Redação original) c) cancelar a inscrição hipotecária tão somente a respeito dos lotes adjudicados nos têrmos da escritura aludida no § 3º, do art. 1º. (Redação original)

Na mesma medida, o revogado Código de Processo Civil Brasileiro de 1939, em seu artigo 1.006 (artigos 461 e 466-B do atual CPC) estabeleceu que, verificando a incidência dos requisitos da compra e venda na relação jurídica, teria o comprador direito à tutela jurisdicional, na qual o juiz supriria a declaração de vontade do vendedor por meio de sentença impositiva de elaboração do título aquisitivo de propriedade a ser transcrito no registro imobiliário.

Assim, compreendeu a doutrina à época, que a promessa teria sempre validade, independente de estarem configurados ou não os seus requisitos do contrato definitivo. Com isso, seriam os seus efeitos passíveis de mudança: se não restassem preenchidos os requisitos do contrato definitivo, a promessa resolver-se-ia em perdas e danos – relação obrigacional; se os preenchesse, a sentença supriria a declaração de vontade da parte recalcitrante – relação jurídica de direito real.

 A Lei nº 649, de 11 de março de 1949, que deu nova redação ao artigo 22, do Decreto-lei nº 58, de 10 de dezembro de 1937, foi a norma efetivada ao direito real, relativo à promessa de compra e venda . Assim, o artigo primeiro da Lei 649/49 mencionava que os contratos de promessa de compra e venda de bens imóveis não loteados, sem cláusula de arrependimento, inscritos no registro imobiliário e com preço determinado, quitado ou acordado quanto ao pagamento, conferiam ao compromissário direito real oponível a terceiros e direito de adjudicação compulsória.

No que tange à previsão do Código De Processo Civil de 1973, o atual CPC, seus artigos 466-A e 466-B, ao disciplinarem os requisitos e efeitos das sentenças proferidas pelo poder judiciário brasileiro, regularam o suprimento da vontade do compromissário no seguinte sentido: Art. 466-A. Condenado o devedor a emitir declaração de vontade, a sentença, uma vez transitada em julgado, produzirá todos os efeitos da declaração não emitida. Art. 466-B. Se aquele que se comprometeu a concluir um contrato não cumprir a obrigação, a outra parte, sendo isso possível e não excluído pelo título, poderá obter uma sentença que produza o mesmo efeito do contrato a ser firmado.

Já a Lei 6.766 de 1979, que dispõe sobre o parcelamento do solo urbano, tratou da matéria em seus artigos 25, 26, §6º, 27 e 41, de modo que a simples promessa de compra e venda do imóvel quitada valesse, concomitantemente, como título aquisitivo para transcrição e modo de aquisição de propriedade, dispensando-se a interpelação judicial.

Aqui, a promessa de compra passa a figurar, mesmo que especificamente, como contrato pronto e acabado, uma vez que seu registro produz efeitos translativos de propriedade, independente de outorga do promitente vendedor, conforme se verifica a seguir:  “Art. 25. São irretratáveis os compromissos de compra e venda, cessões e promessas de cessão, os que atribuam direito a adjudicação compulsória e, estando registrados, confiram direito real oponível a terceiros.

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