"Possibilidade de uma licitante abandonar o procedimento licitatório ou deixar de assinar o respectivo contrato após adjudicação do objeto e eventuais consequências"

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Questiona-se sobre a possibilidade de uma licitante abandonar o procedimento licitatório ou mesmo deixar de pactuar o respectivo contrato público após a adjudicação do objeto e qual o efeito decorrente desse abandono.

"Possibilidade de uma licitante abandonar o procedimento licitatório ou deixar de assinar o respectivo contrato após adjudicação do objeto e eventuais consequências".

01. INDAGAÇÃO SOBRE O TEMA EM TESTILHA:

Questiona-se sobre a possibilidade de uma licitante abandonar o procedimento licitatório ou mesmo deixar de pactuar o respectivo contrato público após a adjudicação do objeto e qual o efeito decorrente desse abandono, ou seja, os riscos no caso da manutenção da desistência de uma proposta já apresentada. 

02. FUNDAMENTOS:

A Lei nº 8.666/93 (Lei Geral de Licitações) trata do tema no § 6º do art. 43[1], e aduz que após a fase de “habilitação”não cabe desistência de proposta pelo licitante [2], salvo por motivo justo decorrente de fato superveniente e aceito pela Comissão processante de certo e determinado procedimento licitatório.

A Lei nº 10.520/02 (Lei do Pregão Comum) trata do tema no art.  [3] e aduz que após a fase licitatória de “adjudicação”o licitante deverá manter a sua proposta, caso contrário, ficará impedido de licitar e contratar com a União, Estados, Distrito Federal e Municípios, e mais do que isso, será descredenciado nos sistemas de cadastramento de fornecedores, pelo prazo de até 05 (cinco) anos [4], podendo ainda ser sancionado.

O Decreto que trata da modalidade licitatória “Pregão Eletrônico”, qual seja, o Decreto nº 5.450/05 (legislação específica sobre o Pregão Eletrônico) traz uma sistemática distinta das apontadas nos parágrafos antecedentes, qual seja, o licitante tão somente poderá desistir da proposta até o momento da “abertura da sessão” [5], conforme § 4º do art. 21 [6], sendo a pior regra das assinaladas. 

Logo, dessume-se que, se uma empresa participar de um certame na modalidade “PregãoEletrônico”e, ao final do procedimento, tomar a decisão comercial no sentido de não maisformalizar o contrato por entendê-lo arriscado às finanças da empresa,deve estar atenta para o fato de que estará correndo o risco de ser sancionada de maneira drástica.

Isso porque, em regra, tal motivo – “desistir por desistir”– não estaria dentro das hipóteses de exceção, quais sejam, (i) motivo justo decorrente de fato superveniente e (ii) aceito pela Comissão processante.

03. JURISPRUDÊNCIA SOBRE O TEMA: 

“APELAÇÃO. MANDADO DE SEGURANÇA. LICITAÇÃO. PREGÃO. DESISTÊNCIA DA PROPOSTA. APLICAÇÃO DE PENALIDADE. CABIMENTO. 1. Hipótese em que a recorrente participou de processo licitatório, na modalidade pregão (...) porém, após o encerramento da fase de lances, a parte autora, tendo sido classificada, foi convocada para encaminhamento da proposta e documentos de habilitação, informou que "lançou valor errado", pelo que requereu sua desclassificação. 2. O princípio da vinculação ao edital é dirigido não somente à Administração, mas também aos licitantes, tendo em vista que estes não podem deixar de atender aos requisitos do instrumento convocatório, sob pena de serem considerados inabilitados ou desclassificados. Assim, seja qual for a modalidade de licitação, esta deve seguir o procedimento que se desenvolve mediante uma sucessão ordenada de atos vinculantes tanto pra a Administração Pública como para os licitantes. De modo que, estabelecidas e aceitas as regras da licitação, elas se tornam inalteráveis para aquele certame, até o final do procedimento. 3. Havendo previsão expressa no edital de que "a licitante responsabilizar-se-á por todas as transações que forem efetuadas que forem efetuadas em seu nome no sistema eletrônico, assumindo como firmes e verdadeiras suas propostas, assim como os lances inseridos durante a sessão pública" (item 1.3 do Edital 2/2015) e que, "nos termos do art.  da Lei nº 10.520/2002, ficará impedida de licitar e contratar com a União e será descredenciada do SICAF, ou dos sistemas de cadastramento de fornecedores a que se refere o inciso XIV do art. 4º da mesma Lei, pelo prazo de até cinco anos, sem prejuízo das multas previstas neste Edital e das demais penalidades previstas na Lei nº 8.666/93, a licitante que: (...) não mantiver a proposta" (item 18.1), a sanção imposta de 2 anos não vai de encontro aos princípios da razoabilidade e proporcionalidade, nem tampouco da ilegalidade, mormente por ter sido precedida de procedimento administrativo com ampla defesa. 4. Apelo desprovido.0128654-20.2015.4.02.5001 (TRF2 2015.50.01.128654-3).”

“AGRAVO DE INSTRUMENTO. ADMINISTRATIVO. LICITAÇÕES. RECUSA EM ASSINAR O CONTRATO. PENALIDADES. EMBASAMENTO LEGAL E EDITALÍCIO. INEXISTÊNCIA DE ELEMENTOS QUE EVIDENCIEM A PROBABILIDADE DO DIREITO. AGRAVO DE INSTRUMENTO DESPROVIDO. 1. (...) 3. As penalidades aplicadas à agravante, inclusive no que tange ao valor da multa e ao prazo de impedimento de licitar e contratar com a Administração, possuem embasamento legal e editalício, de forma que, conforme consignado pelo juízo a quo, inexistem, até o presente momento, elementos aptos a afastar a presunção de legitimidade e legalidade de que se reveste a decisão administrativa impugnada, não sendo possível, em cognição sumária, concluir pelo excesso, irrazoabilidade e desproporcionalidade das penas impostas pela agravada. 4. As alegações da agravante não podem ser confirmadas neste momento processual, sendo necessária dilação probatória para verificar se, de fato, havia justo motivo para a recusa da sociedade agravante em assinar o contrato, consubstanciada, conforme alega, na drástica e imprevisível alteração de sua situação econômica, e, ainda, a extensão do prejuízo suportado pela Administração em razão da desistência em comento. 5. Ao menos em análise perfunctória, deve ser afastada a alegação da parte agravante no sentido de que teria transcorrido o prazo de validade de sua proposta, eis que, ao contrário do que alega, o instrumento editalício previa que a proposta deveria ser válida por, no mínimo, sessenta dias contados da data de abertura do envelope nº 4 (da proposta de preços), e não da 1 data da entrega da proposta. 6. Inexistem, desta forma, ao menos até o presente momento, elementos que evidenciem a probabilidade do direito, nos termos do requerido pelo art. 300 do Código de Processo Civil, sendo de rigor, portanto, a manutenção da decisão recorrida. 7. Agravo de instrumento desprovido.0013560-21.2017.4.02.0000 (TRF2 2017.00.00.013560-7).”

04. CONCLUSÃO: 

Há de se concluir, então, que, para a segurança da própria empresa licitante que visa desistir de um procedimento licitatório ou mesmo de formalizar um contrato público, deve esta última sopesar certamente sobre a existência de um justo motivo decorrente de um fato superveniente – desconhecido, portanto, quando do termo inicial de sua participação no certame –, assim como pelo fato de que deverá tal fundamentação – sobre a desistência– ser aceita pela comissão processante, o que depende unicamente do juízo do Administrador Público, por se tratar tal decisão de um ato discricionário, ou seja, de uma faculdade da Administração Pública em anuir com tal pleito, sendo do exclusivo critério do Contratante a avaliação da solicitação e seu consequente deferimento.

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Felipe Furtado Morais é advogado especializado em Direito Administrativo do Escritório Morais & D’Ornellas Advogados Associados.

[1] “Art. 43. A licitação será processada e julgada com observância dos seguintes procedimentos:(...) § 6oApós a fase de habilitação, não cabe desistência de proposta, salvo por motivo justo decorrente de fato superveniente e aceito pela Comissão.”

[2] Ou seja, poderá ser feita até a conclusão da fase de habilitação, incluindo-se a fase recursal. 

[3] Art. 7º Quem, convocado dentro do prazo de validade da sua proposta, não celebrar o contrato, deixar de entregar ou apresentar documentação falsa exigida para o certame, ensejar o retardamento da execução de seu objeto, não mantiver a proposta, falhar ou fraudar na execução do contrato, comportar-se de modo inidôneo ou cometer fraude fiscal, ficará impedido de licitar e contratar com a União, Estados, Distrito Federal ou Municípios e, será descredenciado no Sicaf, ou nos sistemas de cadastramento de fornecedores a que se refere o inciso XIV do art. 4o desta Lei, pelo prazo de até 5 (cinco) anos, sem prejuízo das multas previstas em edital e no contrato e das demais cominações legais.”

[4] Nesta modalidade, adota-se o entendimento no sentido de que a desistência da proposta poderá ocorrer até que seja aberto o primeiro envelope de proposta.

[5]“Art. 21. Após a divulgação do edital no endereço eletrônico, os licitantes deverão encaminhar proposta com a descrição do objeto ofertado e o preço e, se for o caso, o respectivo anexo, até a data e hora marcadas para abertura da sessão, exclusivamente por meio do sistema eletrônico, quando, então, encerrar-se-á, automaticamente, a fase de recebimento de propostas (...) § 4oAté a abertura da sessão, os licitantes poderão retirar ou substituir a proposta anteriormente apresentada.”

[6] Para a modalidade eletrônica do Pregão, a desistência da proposta pode ser feita até o final do prazo para encaminhamento das propostas, ou seja, até o horário de início da sessão pública.

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Sobre os autores
Felipe Furtado Morais

– Bacharel em Direito pela Universidade Cândido Mendes – Centro; – Pós Graduado em Direito Público pela Universidade Gama Filho; – Pós-Graduado em MBA Executivo – Gestão de Negócios – IBMEC; – Idiomas: Inglês e Espanhol; – OAB/RJ nº 142.387 e Cédula Profissional de Advogado Português nº 54915P.

Vivian Valle D'Ornellas

– Bacharel em Direito pela Universidade do Estado do Rio de Janeiro – UERJ; – Pós Graduada em Direito Público pela Universidade Gama Filho; – Curso de Extensão – Contratos: Teoria e Prática – PUC-RIO; – Idioma: Inglês e Espanhol; – OAB/RJ nº 150.002.

Informações sobre o texto

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