ELEIÇÕES 2018: TODA IMPROBIDADE GERA INELEGIBILIDADE?

17/06/2018 às 17:31
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Não é qualquer condenação por improbidade administrativa que gera necessariamente a inelegibilidade, devendo cada caso ser analisado detalhadamente.

Elegibilidade é, em síntese, é a capacidade/possibilidade do cidadão ser eleito a um mandato de cargo político no Legislativo ou no Executivo, desde que reúna as condições iniciais para deferimento de seu registro de candidatura pela Justiça Eleitoral e, logicamente, receba posteriormente quantidade suficiente de votos. Já a inelegibilidade, por outro lado, é a perda desta capacidade eleitoral, em geral, temporária, decorrente de uma série de circunstâncias, algumas por expressa previsão constitucional, outras por determinação de lei complementar. 

A elegibilidade é a regra, porque constitui direito fundamental de participação na vida política do Estado. A inelegibilidade é exceção.

A Constituição da República estabelece em seu art. 14, por exemplo, que são inelegíveis os analfabetos e os inalistáveis como eleitores, como é caso dos estrangeiros. No parágrafo 9º do referido art. 14 a Constituição define que outros casos de inelegibilidade sejam criados por lei complementar, o que foi atendido com a edição da Lei Complementar nº 64/90, conhecida como Lei das Inelegibilidades. Esta LC 64/90 foi alterada pela Lei da Ficha Limpa (LC nº 135/10).

No art. 1º, inc. I, alínea “l”, da LC 64/90, incluído pela LC 135/10, encontra-se definido que fica inelegível para qualquer cargo os que forem condenados à suspensão dos direitos  políticos, por  decisão transitada em julgado ou proferida por órgão judicial colegiado, por ato doloso de improbidade administrativa que importe lesão ao patrimônio público e enriquecimento ilícito, desde a condenação ou o trânsito em julgado até o transcurso do prazo de oito anos após o cumprimento da pena.

O tema inelegibilidade ganha destaque nos meses que antecedem às eleições, quando costumam surgir questionamentos sobre a inelegibilidade deste ou daquele pré-candidato que eventualmente tenha sido julgado por improbidade administrativa.

Mas o que é isso mais precisamente? Toda improbidade gera inelegibilidade?

Vamos por partes!

Primeiramente, é oportuno esclarecer que nem toda condenação por ato de improbidade administrativa resulta em inelegibilidade.

O que a LC nº 64/90 exige para a incidência de inelegibilidade é que a decisão judicial:

  1. Condene o agente público à suspensão de seus direitos políticos. A jurisprudência do Tribunal Superior Eleitoral exige que esta condenação venha expressa na parte dispositiva da decisão, ou seja, na sua parte conclusiva[1];
  2. Tenha transitado em julgado, ou seja, que não tenha mais possibilidade de recurso, ou ainda, que tenha sido prolatada por órgão colegiado judicial, como é o caso dos tribunais de justiça dos estados ou tribunais regionais federais. Neste último caso, não há necessidade da decisão haver transitado em julgado, estando inelegível o condenado, mesmo que tenha interposto recurso contra a referida decisão do órgão colegiado judicial;
  3. Reconheça que houve ato doloso de improbidade administrativa, o que significa dizer que o juiz deve decidir que o agente que cometeu o ato de improbidade agiu com intenção, com conhecimento da ilegalidade, isto é, que não agiu com mera culpa;
  4. Declare que o ato doloso de improbidade representou enriquecimento ilícito e, cumulativamente, dano ao erário.

É importante destacar que o enriquecimento precisa ser ilícito, ou seja, fora dos parâmetros legais, mas não necessita ser enriquecimento do próprio agente, mas pode ser também de terceiros, geralmente conhecidos por “laranjas”.  

É a Lei de Improbidade Administrativa (Lei nº 8.429/92) que define em seu art. 9º o que é enriquecimento ilícito, tido como auferir qualquer tipo de vantagem patrimonial indevida em razão do exercício de cargo, mandato, função, emprego ou atividade nos órgãos públicos em geral. O referido artigo dá várias hipóteses que caracterizam improbidade de que resulta enriquecimento ilícito.

É relevante salientar, ainda, que a Justiça Eleitoral não exige que o enriquecimento ilícito conste expressamente da decisão da Justiça Comum, pois ela reconhece sua própria competência para extrair essa conclusão a partir do que conste da condenação por improbidade[2], até mesmo da parte da fundamentação da decisão da Justiça Comum[3].

É também a Lei de Improbidade Administrativa que estabelece claramente em seu artigo 10 o que é considerado dano ao patrimônio público (erário), enumerando uma grande variedade de condutas que o caracterizam.

Portanto, os agentes públicos precisam estar muito atentos a cada ato que praticam durante o exercício de suas funções, porque, se de um lado não é competência da Justiça Eleitoral condená-los à cassação de seus direitos políticos por ato de improbidade administrativa, por outro lado é plenamente possível que a Justiça Eleitoral analise o teor da condenação da Justiça Comum (a parte de fundamentação e a parte dispositiva – a parte conclusiva da decisão) para aferir se houve ou não enriquecimento ilícito, o qual, cumulado com dano ao patrimônio público poderá ter sérias consequências à sua vida política.

A eventual inelegibilidade incidirá por oito anos após o cumprimento da pena de suspensão dos direitos políticos (impedimento de votar e de ser votado, especialmente), que poderá ser de cinco a oito anos, se a violação for ao que estabelece o art. 10 da Lei de Improbidade; e de oito a dez anos, se houver inobservância ao que determina o art. 9º da mencionada lei.

Por consequência, o político pode ficar afastado das eleições por treze anos (5 + 8), ou mais tempo ainda, a depender do caso concreto.

Cabe, por fim, destacar mais uma vez: não é qualquer condenação por improbidade administrativa que gera necessariamente a inelegibilidade, devendo cada caso ser analisado detalhadamente, conforme demonstrado.

   Gisele Nascimento é Advogada em Mato Grosso.


[1] RESPE - Recurso Especial Eleitoral nº 11227, Acórdão de 15/12/2016, Relator(a) Min. Antonio Herman De Vasconcellos E Benjamin.

[2] 2. Nesse contexto, forçoso reconhecer a incidência da causa de inelegibilidade prevista no art. 1º, I, l, da LC nº 64/90, na linha da jurisprudência fixada pelo Tribunal Superior Eleitoral, especialmente no que concerne à possibilidade de a Justiça Eleitoral "examinar o acórdão da Justiça Comum - em que proclamada a improbidade - em seu conjunto" (REspe nº 50-39/PE, Redator para o acórdão o Ministro Tarcisio Vieira de Carvalho Neto, PSESS de 13.12.2016), o que afasta a necessidade de o enriquecimento ilícito estar expressamente consignado no dispositivo do acórdão da ação de improbidade administrativa. (RESPE - Recurso Especial Eleitoral nº 36966/MG, Acórdão de 14/09/2017, Relator(a) Min. Tarcisio Vieira De Carvalho Neto)

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[3] 7. A análise da configuração in concrecto da prática de enriquecimento ilícito pode ser realizada pela Justiça Eleitoral, a partir do exame da fundamentação do decisum condenatório, ainda que tal reconhecimento não tenha constado expressamente do dispositivo daquele pronunciamento judicial. (RESPE - Recurso Especial Eleitoral nº 23184/GO, Acórdão de 01/02/2018, Relator(a) Min. Luiz Fux)

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Sobre a autora
Gisele Nascimento

Advogada em Mato Grosso, Especialista em Direito Civil e Processo Civil, pela Cândido Mendes, pós-graduada em Direito do Consumidor, pela Verbo Jurídico e pós-graduanda em Direito Previdenciário, pela EBRADI e MBA Marketing Digital Para Negócios pela PUC.

Informações sobre o texto

Este texto foi publicado diretamente pelos autores. Sua divulgação não depende de prévia aprovação pelo conselho editorial do site. Quando selecionados, os textos são divulgados na Revista Jus Navigandi

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