Luta por um direito inumano: a aposta da indeterminação do homem e da mulher.

Sobre a impronunciabilidade dos valores morais

Exibindo página 3 de 3
07/07/2018 às 10:50
Leia nesta página:

14. FÁBRICA DE PRECARIEDADES OU DE SUJEITOS DE DESEJOS.

Com efeito, não importa se “do Desejo” ou se “do Direito”, o Sujeito, penso como Slavoj Žižek, “representa o ponto vazio que precede a ideologia e a partir do qual a ideologia se articula” (“Glossário”, in, ŽIŽEK, 2017, p. 395), e de onde todas as suas aporias se derivam e se integram. Que é então este duplo Sujeito? Poderíamos ainda perguntar como Primo Levi: “Isto é um homem?” Então, como livrar-se das ilusões? Mesmo porque, o Sujeito é ponto vazio que ao precedê-la “a ideologia se articula” como um satélite e não o preenche, mas ocupa sua órbita e o orbita de forma elíptica, performativa, instrumental, provisória, precária, e, as vezes, até aparentemente duradoura, mas deixando-lhe, como sintoma, as crises das comoções de sentirem-se um Eu a que devem realizar, consolidando a cisão e desequilibrando a balança entre o “Eu” (mero ardil de sobrevivência) e o “Nós” (acordo fundamental que forma algo como um “Povo”)... Algo mais (geralmente sombrio) sempre acontece por ser ai, por estar ai, vagando, simultaneamente entre Ser-Tempo-Nada. O “Eu”, portanto, geralmente é uma fábrica de precariedades! É a ideologia individualizada de toda violência, de todo crime, de toda transgressão social, quando uma busca egoísta do gozo, do prazer, da saciedade, da riqueza etc., portanto, um mero atendente das solicitações dos ressentimentos provocados por dependências, fracassos e frustrações... E que por acaso, necessidade, fantasia, morte são fontes de conflitos, crimes e transgressões latentes até que assumam em simulacro a forma de um “Nós” contra “Eles”, e torna-se “Conflito”, “Violência”, “Guerra” etc. Por Interesses tantas vezes intangíveis... Sempre um paradoxo! Ai! Ai!


15. CRMES PREMEDITADOS E VONTADE DE PODER.

Levanta-se então uma questão genealógica: desde quando os crimes, os conflitos e as transgressões deixaram de ser passionais e tornaram-se premeditados? Seria isso o que modernamente foi convencionado chamar-se de Revolução: o crime como meio que justifica os fins? A Revolução como realização de uma “vontade de poder” (Nietzsche)?... Pois bem! O que anseio, segundo uma observação de Slavoj Žižek, “é não perder a calma”, abandonar a sabedoria, ou seja, lançar-me irresponsavelmente à aventura intelectual, isto é, “abandonar precocemente as velhas coordenadas conceituais”, os conhecimentos instrumentais e os projetos utópicos do quefazer político. Não que me atenha incondicionalmente a elas e a eles, mas porque não me seduz a percepção hiperbólica de que “tudo que é sólido se dissolve no ar” (Marx-Engels), nem as aventuras radicais pelo “vício de adrenalina”; nem a radicalização cultural do corpo da vida em nome de uma sexualidade polimorfa e do gozo sem eira nem beira; nem a consolidação de um sentido louco para viver a vida ou perdê-la por viver loucamente... E tal como observa Žižek:

“Contra essa tentação, deve-se seguir o inultrapassável modelo de Pascal e colocar esta difícil questão: como permaneceremos fiéis ao Velho sob novas condições? Apenas dessa maneira podemos gerar algo efetivamente Novo”... (ŽIŽEK, 2015, p. 95)

Ora, permanecer fiel ao Velho sob novas condições não define ser reacionário, nem ser conservador, senão, como exploraríamos territórios desconhecidos? Como observou o professor Marcelo Gleiser com muita pertinência:

“Para avançar além do conhecido, tanto Newton quanto Einstein assumiram riscos intelectuais, baseando-se em suposições inspiradas na intuição e preconceitos” (GLEISER, 2014, p. 35).


16. IMPOSTURAS E DELINQUÊNCIAS INTELECTUAIS.

Com efeito, “estranheza” e “indignação” me impulsionaram fortemente, (ao observar o conteúdo e a forma suspeita e as imposturas de todos os engajamentos “políticos” e “jurídicos”, todos os movimentos “sociais” e “antissociais” da atualidade), à buscar uma resposta ainda não realizada (o que não deixa de intrigar e ser enigmático mesmo enquanto descrição sintomática) para o entendimento da questão: “O que está acontecendo?” E o que é mais desesperador, (porque desequilibra emocionalmente, cria insegurança, promove a permissividade social, estimula as transgressões criminosas etc.), sendo mais particular, é a perplexidade escandalizada que me orienta: “o que está acontecendo no Mundo Jurídico? ” Esta pergunta é problemática! Não porque, por exemplo, no Brasil, a atual composição do STF (com Gilmar Mendes, Ricardo Lewandowski, Dias Toffoli, Marco Aurélio, Rosa Weber, Alexandre de Moraes) seja uma monstruosidade abjeta, um horror jurídico quando canalhas de toga cheios de má-fé (Sartre) decidem em nome da Lei corrompendo-a jurisprudencialmente sob o signo do STF (promovendo a impunidade nos crimes que eles próprios estão atolados até o pescoço na lama pútrida da corrupção), mas porque é uma indicação traumática da negatividade que nos esconde ou escamoteia não só o que permanece sólido, (como a semente que se planta e se reproduz nos frutos da árvore que é sua descodificação-recodificação), apesar de toda corrupção material e subjetiva, como também coloca na clandestinidade a verdade e o saber por onde começar, pois que a própria inteligentzia (dita de “direita” ou de esquerda”) torna-se delinquente e mercenária, sedenta por dinheiro, poder, notoriedade e impunidade em nome da “do social”, dos “direitos humanos” ou da “revolução” etc.


17. POR ONDE COMEÇAR UM COMBATE?

Sim, a grande questão pascaliana, segundo Lucien Febvre, sempre será: “começar por onde? ” A sua resposta:

“Pelas definições, ao mesmo tempo engenhosas e bem estudadas? É o velho método francês que, para melhor honrá-lo foi batizado como cartesiano. “O que é a arte”?”, pergunta-se Paul Valery no inicio de um volume da Enciclopédia francesas consagrado às Letras. E do mesmo modo, no início do volume dedicado à Matemática: “o que é o número?”, interroga-se Hadamard. Quando soubermos as respostas, tudo ficará mais fácil: teremos apenas que deduzir corretamente” (FEBVRE, 1998, p. 27-28).

No mesmo diapasão e outros contextos: “O que é a vida?”, pergunta-se A. I. Oparin. “O que é a felicidade?”, pergunta-se Victor Hugo. “O que é o Direito?”, perguntam-se todos os juristas. “O que é a Lei?”, pergunta-se Michel Foucault. E aqui vamos nós com uma estranha e irreconhecível pergunta depois de todas as respostas comporem uma enciclopédia, por mais questionável que seja a definição de alguns verbetes: e agora, o que Acontece ?...


18. UM BANHO DE SANGUE ANUNCIADO.

Como disse alguém, “a revolução é o amor, ou não é nada”. Gosto de pensar assim! Mas o que é o amor ? O amor, disse Christopher Clawdell, “é o elemento emocional das relações sociais”... Então, neste sentido, para uma resposta bem contextualizada, bem situada na ideologia imperial capitalista e ultraliberal de hoje, talvez até devêssemos começar por uma crítica esclarecedora sobre os Direitos Humanos , pois para ele deveriam convergir a prática política de todos as definições existencialistas (Sartre), respondendo simplesmente a questão perdida: o que são Direitos Humanos? Trago aqui algumas observações sobre o caminho para uma “resposta de verdade”, completa, consistente, inequívoca, radical, e assim, por um lado, recorro a um “olhar de madeira”, (Ginsberg), um olhar de “longa duração”, (Blaudel), que fite distante, longa e pacientemente o desenvolvimento deste famigerado “instante”, “momento”, “atualidade”, “presente”, “evento”, “contingência”, “realidade”, seja lá o que se diga que seja este amplo e nosso Dasain , (Heidegger), com atenção redobrada para os termos dos prováveis processos de metamorfoses do animal que se tornou sujeito e objeto de Direitos Humanos, na busca de entender como se constituiu no espaço e no tempo a Mente doente e, por Direito (Direito?), a garantia ou à vontade de sua Liberdade (Liberdade?) no processo histórico filogenético e ontológico que vai do macaco antropomorfo ao homo sapiens sapiens , ou seja, a maneira mais provável possível de entender como se formou fenomenologicamente “este sistema complexo de faculdades cognitivas e emocionais implementadas no cérebro” desta criatura que, -- como reconhece o neurocientista Steven Pinker, professor do Departamento de Psicologia em Harward --, deve sua imanência, ou seja, “sua estruturação básica aos processos da evolução” (PINKER, 2013, p. 22), e, por outro lado, diante do que se apresenta hoje aos nossos olhos e ouvidos como realidade, teorias, protestos, lamentos, movimentos e práticas “antirracistas”, “antipatriarcais”, “feministas”, “gays” etc. e “jurisprudenciais”, a indagar como ela, (a mente humana), pirou?, ou seja, sobre o resultado de sua “História Cultural” agora, no início do século XXI, com quase duas décadas já transcorridas, fundamentado na tese defendida por Pinker de experimentar pensando “a ideia de que o progresso moral é compatível com uma interpretação biológica da mente humana e um reconhecimento do lado obscuro de sua natureza” (PINKER, 2013, pp. 26), e buscar saber apontando experimentalmente para certos e determinados atores da cena social: “É isto um homem? ”, mas também, “É isto uma mulher? ” Em outras palavras: “De que compatibilidade se trata ?” Questão intrigante!... O rompimento da ideia de compatibilidade entre “o progresso moral” e “uma interpretação biológica da mente humana” pode significar que um dia teremos que enfrentar novamente (sem Leis e sem Pecados) o mais selvagem, o mais feroz, o mais sanguinário dos animais, o “homo sapiens sapiens”?


19. ANIMAIS INSIGNIFICANTES NO PODER.

Viveremos mais uma gloriosa “época de vítimas” e de forma nova “a consagração de genocídios”? Anuncia-se uma inédita e mais cruel barbárie? A barbárie da “boa vontade” kantiana? A barbárie da bondade como “transparência do Mal” (Baudrillard)? A barbárie de uma globalização do fascismo? Ora, não estamos testemunhando o Mal, transfigurado em algoz ou em vítima aproveitando-se do pretenso movimento histórico de dissolução geral de todos os Valores para, enfim, dissolver no social sua monstruosa liquidez política, superar pela igualdade (que igualdade?) sua insignificância, perder o pudor em nome da liberdade (que liberdade?), abandonar pela “revolução” (que revolução?) suas máscaras e fantasias e se tornar-se o ressentimento da vítimas o signo real da história? Ora a superação ou a negação da insignificância do algoz ou da vítima não reivindicou uma “Microfísica do poder” (e foi atendido por Foucault)? Uma “Gramatologia” (por Derrida)? Um “Anti-édipo” (por Deleuze)? etc. No que se transmutou a ideia da “revolução proletária”? A realidade do inelutável “protagonista” da “revolução”? É o que veremos! Há o que não se temer? Difícil dizer que não! Principalmente se considerarmos uma observação feita por Yuval Noah Harari, professor de História da Universidade Hebraica de Jerusalém, em seu livro best-seller, “Sapiens – Uma breve história da humanidade”, que:

“A coisa mais importante a saber cerca dos humanos pré-históricos é que eles eram animais insignificantes, cujo impacto sobre o ambiente não era maior que o de gorilas, vaga-lumes ou águas-vivas”. (HARARI, 2017, PP. 12).


20. UMA ERA DO PSICOPATA E DA SEXOPATIA?

Que aconteceu, então? A que se deveu a sua súbita proeminência? Qual a sua significância? Ou ironicamente, por que o homo sapiens tornou-se “um órfão destituído de família, carentes de primos ou irmãos e, o que é mais importante, sem pai nem mãe” (HARARI, 2017, PP. 13). O homo sapiens tornar-se-á (talvez até novamente) algo como um “homo psicopata” ou, mutatis mutandis, um “homo sexopata”? Tal qual anunciam os personagens de “A história do olho” de George Bataille? Que processo histórico pode levá-lo [em sua diferença (Deleuze) ou mesmo diferência (Derrida)] a isto? É o nosso objetivo oferecer a melhor resposta, livre de qualquer consideração política privilegiada, (e, talvez por isso mais verdadeira), e passar para uma análise, (antes que seja tarde), da formulação específica do que identifico como pensamento insano, (que corrompe e manipula tudo do judaísmo, do Islã, do cristianismo, do budismo, do liberalismo, do marxismo etc., em duas palavras, da História), e do que visualizo como sua práxis demente , tendo como ponto de partida as indagações: “’É isto a diferença sexual? ”, “É isto a sexualidade? ”, ”É isto a isto que nos leva a questão dos gêneros? ”, “É isto o sexo? ” “É isto o amor? ” Que pode estender-se: “É isto o racismo? ” “É isto a revolução?” E isto o proletariado? ” ou “É isto o Direito das Famílias? ” etc. E por que não: é isto o Estado sionista ? Tentaremos ver as Palavras (em sua ferocidade, devoção e cinismo igualitário agora escritura) e a Coisa (em sua monstruosidade e horror agora liberdade e igualdade), que como resultado do pensamento insano , acumula-se a gordura ideológica anarquista do capitalismo francês nas cabeças dos universiotários “teólogos” da “esquerda” brasileira e alhures. Um verdadeiro horror político!

Assine a nossa newsletter! Seja o primeiro a receber nossas novidades exclusivas e recentes diretamente em sua caixa de entrada.
Publique seus artigos

21. CONCLUSÃO.

As simplificações interpretativas são estarrecedoras e, de tão imbecis, paradoxalmente complexas e eivadas de sutilezas genealógicas “desconstrucionistas”: por conveniência, por analogia, por simulação, por simpatia !... Não será fácil esclarecê-las; a tarefa é muito espinhosa! Tudo seduz. Os discursos são engenhosos e bem construídos... Não gostaria de realizá-la agora,mas (pela imposição de não ser um eunuco ou, gerador de ventos, segundo Kierkegaard, como “as virgens de Israel”), que fazer? Faço-a, portanto, apenas de forma preliminar, a título de SOS, com atendimento de urgência, portanto, um pouco imperfeita, inacabada, mas honesta e competente... O que objetivo é mostrar o invisionavel (neologismo usado por Dufour significando o que remete “ao que não deve ser visto”) e o que denominamos subjetividades, que, infelizmente, tornou-se necessário mostrar, e o farei preliminarmente de forma implacável e cruel, mas sem precipitações e/ou injustiças irreparáveis, pois o que desejo não é a negação do gozo, mas que haja um pouco de pudor, o suficiente para estabelecermos um limite para não alcançarmos um ponto sem volta que torne impossível qualquer reconstrução, restauração ou renascimento do Mundo da Vida, ou, em outras palavras, para não fiquemos desprovidos da possibilidade e da oportunidade de erigirmos uma Ética do Real que seja os Princípios Gerais do Direito...


REFERÊNCIAS

BUTLER, Judith, “Quadros de guerra: Quando a vida é passível de luto”, tradução Sérgio Tadeu de Niemeyer Lamarão e Arnaldo Marques da Cunha, revisão de tradução Marina Vargas; reviso técnica Carla Rodrigues, 3ª ed., Rio de Janeiro: Civilização Brasileira, 2017.

DERRIDA, Jacques, “Gramatologia”, tradução Miriam Chnnaiderman e Renato Janine Ribeiro, Sã Paulo: Perspectiva, 2017, (Estudos; 16).

FEBVRE, Lucien, “Honra e Pátria”, tradução Eliana Aguiar; [fixação do texto, apresentação e notas por Thérèse Charmasson e Brigitte Mazon; prefácio de Charles Morazé], Rio de Janeiro: Civilização Brasileira, 1988.

FICHTE, Johann Gottlieb, “Da capacidade linguística e da origem da linguagem”,organização, tradução, notas e posfácio Ricardo Rocha, São Paulo: Paulus, 2017, Coleção Textos Filosóficos.

GLEISER, Marcelo, “A ilha do conhecimento: os limites da ciência e a busca por sentido”, 2ª ed., Rio de Janeiro: Record, 2014.

HARARI, Yuval Noah, “Sapiens – Uma breve história da humanidade”, tradução Janaína Marcoantonio, 24.ed., Porto Alegre, RS: L&PM, 2017.

KONDER, Leando, “Sobre o amor”, São Paulo: Boitempo, 2007.

LOVELOCK, James, “Gaia: Alerta Final”, tradução Vera de Paula Assis, Jesus de Paula Assis, Rio de Janeiro: Intrínseca, 2010.

PINKER, Steven, “Guia de escrita: como conceber um texto com clareza, precisão e elegância”, tradução Rodolfo Ilari, São Paulo: Contexto, 2016.

PINKER, Steven, “Os anjos bons de nossa natureza: Por que a violência diminuiu”, tradução Bernardo Joffily e Laura Teixeira Motta, 2ª ed., São Paulo: Companhia das Letras, 2013.

TOSEL, André, “Barbárie do capitalismo globalizado? (sobre o uso das categorias antitéticas assimétricas)”, in, “TERROR”, editores, Denis L. Rosenfield e Jean-François Mattéi, Rio de Janeiro: Jorge Zahar Ed., 2002.

ŽIŽEK, Slavoj, “Interrogando o Real”, organização Rex Butler, Scott Stephens, tradução Rogério Bettoni, 1º ed., Belo Horizonte: Autêntica Editora, 2017 (Filô/Margens).

ŽIŽEK, Slavoj, “O amor impiedoso (ou: Sobre a crença)”, tradução Lucas Mello Carvalho Ribeiro, 2ª ed.. 1º reimp., Belo Horizonte: Autêntica Editora, 2015 (FILÔ/Margens, 2).

Sobre a autora
Walter Aguiar Valadão

Professor universitário. Bacharel em História (UFES). Pós-Graduado "lato sensu" em Direito Público (UFES). Mestre em Direito Internacional pela UDE (Montevidéu, Uruguai). Editor dos Cadernos de Direito Processual do PPGD/UFES.

Informações sobre o texto

Este texto foi publicado diretamente pelos autores. Sua divulgação não depende de prévia aprovação pelo conselho editorial do site. Quando selecionados, os textos são divulgados na Revista Jus Navigandi

Publique seus artigos Compartilhe conhecimento e ganhe reconhecimento. É fácil e rápido!
Publique seus artigos