Ineficácia da desincompatibilização do cargo público.

Reflexões sobre o uso indevido do nome na propaganda eleitoral nos cargos legislativos

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26/07/2018 às 11:42
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5 DA APLICAÇÃO DOS PRINCÍPIOS NO DIREITO ELEITORAL

Diferentemente das normas, que devem ser seguidas de acordo com as suas determinações específicas, os princípios devem ser satisfeitos dentro da medida do que é possível no caso concreto, dessa forma doutrina Robert Alexi (2008.p. 90-91): "são normas que ordenam que algo seja realizado na maior medida possível dentro das possibilidades jurídicas e fáticas existentes”.

As regras trazem consigo a noção de determinação que deve ser seguida ipsis litteris, os princípios, todavia, além de servirem para garantir o exercício de determinado direito, estes são aplicados através da ponderação.

Nessa perspectiva, os princípios merecem o devido destaque na área do Direito Eleitoral, haja vista que, estes servem para assegurar o exercício do voto e a competição entre candidatos de forma igualitária e legal. Nesse sentido, são aplicadas de forma ponderada de acordo com o caso concreto, a fim de assegurar principalmente a máxima igualdade, são alguns deles: igualdade e equilíbrio no pleito eleitoral, potencialidade da conduta lesiva, paridade de armas entre candidatos, impessoalidade, os quais serão dados o devido destaque.


6 DOS PRINCÍPIOS DA IGUALDADE E EQUILÍBRIO NO PLEITO ELEITORAL

O Pleito Eleitoral deve ser primar pela lisura e obedecer aos princípios democráticos, portando o princípio da igualdade e do equilíbrio devem nortear tudo que envolve a disputa. Os referidos princípios visam a nivelar os candidatos, diminuindo suas diferenças, coibindo, assim, abusos econômicos e políticos. Desse modo, se pode garantir uma disputa limpa e justa.

O que dá essência à democracia é o fato de o poder residir no povo. Toda democracia, para ser tal, repousa na vontade popular no que tange à fonte e exercício do poder, em oposição aos regimes autocráticos em que o poder emana do chefe, do caudilho, do ditador (SILVA, 2005, p.133)

O problema encontra-se quando a vontade do povo é tomada por vícios, a escolha que é alvo de toda eleição, acaba sendo feita, mas por critérios que fazem os cidadãos pensarem que aquela é a melhor escolha.

A propaganda eleitoral é um dos meios que mais influenciam a escolha do eleitor, fazendo uso de tecnologias e recursos diversos, tendo, sendo muitas vezes, o fator decisivo nos resultados do pleito.

Por conseguinte, tomando como base o princípio da igualdade, abarcado também pelo direito eleitoral, é garantido a todos os candidatos na persecução do cargo público o tratamento isonômico. Logo não serão toleradas disparidades entre concorrentes, advindas de aplicações de recursos financeiros ou abusos de poder na ordem política. Evita-se assim que a escolha pelos eleitores seja deturpada em virtude de gastos excessivos com campanhas ou favorecimento políticos por parte de candidato. (FOPPA, 2016, p.1)

É importante frisar que, ao usar o nome do cargo público, o candidato está se autofavorecendo e consequentemente deturpando a escolha dos eleitores, pois estes acreditam que certos projetos e políticas públicas implantadas pelo governo, continuarão vigorando com a eleição de um candidato, ligado a determinado programa, ainda que indiretamente.

No que se refere ao equilíbrio, este é considerando uma perfeita correspondência entre os elementos que compõem o pleito eleitoral, seriam eles os candidatos ao cargo eletivo.

O equilíbrio material entre os contendores em uma eleição é necessidade imposta pelo regime democrático. A eleição é um mecanismo institucional de regulação dos conflitos existentes na sociedade e, por esse motivo, os inúmeros agentes sociais interessados em usar ou direcionar o poder em jogo na disputa tendem a favorecer, com recursos de toda ordem, os candidatos que, a seu juízo, melhor atenderão a seus interesses. A quantidade de recursos utilizados pelos candidatos para a obtenção de votos afeta a decisão do eleitor, podendo-se afirmar que há uma tendência de correlação positiva entre volume de recursos disponíveis e resultado eleitoral.(DIAS, 2015, p.152)

 Quando um candidato possui mais chances do que outro, em se falando de oportunidades, o equilíbrio entre os elementos é desestabilizado, provocando uma espécie de oportunismo, todavia, a conduta que quebra esse equilíbrio tem a conhecida potencialidade lesiva, o que não quer dizer que, simplesmente, pelo fato de não ter influenciado na eleição, não deve ser levado em conta ou punido.

Assim, quando o candidato a cargo eletivo utiliza o nome hierárquico que faz ligação com o órgão público, acaba diminuindo as chances de outros candidatos, não apenas por questões da quantidade de votos, mas pelo fator visibilidade e atenção que ele chama, principalmente provinda das massas, que de uma maneira maior volta sua atenção para aquele candidato mais bem visto.

 O objetivo do aparato normativo - lei, resoluções e jurisprudência dos tribunais eleitorais - é proteger e zelar pela igualdade entre os candidatos que irão disputar o pleito eleitoral, objetivando garantir o regime democrático. No entanto, ao contrário de alguns, a conduta que fere o pleito eleitoral não necessita provocar lesão.


7 DA POTENCIALIDADE DA CONDUDA LESIVA AO PLEITO

No Direito Penal, a aplicação do princípio da potencialidade da conduta lesiva ou da lesividade, tem sido aplicado quanto ao uso de arma de fogo, no sentido de que, para configurar qualificadora do crime de roupa a arma deverá ostentar uma capacidade de provocar lesão, característica essa que não possui uma arma de brinquedo ou uma arma sem munição, nestes casos, é apenas elementar do tipo simples de roupo. É sabido que o Direito não é uma ciência exata, ou seja, a aplicação de um princípio em uma área pode ser interpretado de forma diferente em outra, referido princípio é aplicado de forma impar no Direito Eleitoral.

O princípio da potencialidade visa a conferir certo grau de força às atitudes de abuso cometidas por candidatos. Por meio desse princípio, pode-se mensurar a capacidade de influenciar na lisura do pleito eleitoral. A atitude de coibir existe para preservar a democracia.

Atos abusivos desnivelam os candidatos nas fases de pré-eleição e pós-eleição, não fazendo diferença se o ato influencia ou não nas eleições, o abuso de poder acaba por se configurar.

Não é preciso que o abuso influa no processo eleitoral por inteiro ou somente em parte dele, como na votação, basta haver a prática do comportamento tipificado para configurar dano à lisura e à regularidade do pleito.

O que não deve haver é a vinculação da ocorrência do abuso ao do resultado do pleito, uma vez que os dois acontecimentos são distintos. Nesse sentido, a ideia do princípio da potencialidade não está relacionada diretamente com o resultado do pleito eleitoral. O número de votos obtidos por certo candidato em campanha não se configura caracterizador de prejuízo à campanha.

Marcos Ramayana (2008), tratando novamente sobre a questão de o candidato em observação ter saído vitorioso ou não do pleito, afirma que esse fato não interfere na apreciação da potencialidade da conduta:

Como se nota, o conceito é o de conduta potencialmente lesiva para desequilibrar as eleições. A conduta não precisa ter desequilibrado com a constatação do aumento de número de votos em determinadas urnas, ou seja, ter atingido seu objetivo. [...]. Se o candidato favorecido não foi eleito é um fator sem importância. Não se exige o resultado material do abuso. Não necessário comprovar que o candidato tenha aumentado os votos em determinado estado, município ou região. Basta a prática onipotente da conduta. (2008, p.138)

Isto posto, verifica-se que um candidato que usa o nome do cargo na administração pública ou até mesmo o de um cargo hierárquico, comete ato considerado abusivo, mas que, em certas situações, não possui potencialidade para modificar o resultado do pleito eleitoral. Ainda assim, o uso é considerado como uma conduta abusiva. Desse modo, devem ser aplicadas as penalidades previstas na lei para casos de conduta potencialmente lesiva, não se fazendo necessária a comprovação do número de votos obtidos.

Deve ser explicado, ainda, que, em algumas situações é possível não encontrar nenhuma ilegalidade. Todavia, ao se verificar as atitudes daqueles, seria possível auferir a potencialidade das ações em influir no pleito eleitoral.

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Vislumbra-se ainda que, para caracterizar abuso de poder, é necessário haver potencialidade do ato em prejudicar o pleito eleitoral, não se fazendo necessário que o candidato saia vencedor do mesmo, para perceber a potencialidade do ato. O conjunto de atos cometidos sejam potencialmente prejudiciais ao processo eleitoral.


8 DA PARIDADE DE ARMAS ENTRE CANDIDATOS

A paridade de armas ou igualdade de armas é de fundamental importância para um bom combate, de forma sucinta, o referido princípio afirma que as oportunidades, condições e possibilidades entre os litigantes, devem ser iguais, do início ao fim do processo, afim de que o resultado de todo o processo seja justo.

O poder judiciário vem tentando desvincular o caráter de “armas”, que remete a combate e brigas. Todavia, acredita-se que, quando se fala em disputas eleitorais, não há como se desvincular uma ideia da outra, pois até mesmo o debate entre candidatos, ainda que coordenado, é uma jogo de palavras para obter noção de quem responde melhor a grande quantidade de indagações de um candidato a outro e ver quem sai vitorioso do mesmo.

É válido lembrar que a paridade de armas ecoa para fora do Direito Processual Civil, enveredando por novos caminhos, como o processo eleitoral, orientando dessa maneira: regras, conduta entre candidatos, ética, o correto cumprimento do mandato eletivo.

No campo do direito eleitoral, quando há desrespeito à paridade de armas, pode configurar também abuso de poder político o que é algo grave e muito nocivo ao processo democrático defendido pela carta magna, promovendo a fiel representação dos eleitores nas casas legislativas.


9 DA RESPONSABILIDADE DA REPRESENTAÇÃO

Quando se conhece o conceito de representação, se tem a noção de que esta é fundamental para o exercício da democracia, a própria Constituição Federal em seu artigo 1º, legitima que o poder emana do povo que o pode ser exercido indiretamente através dos seus representantes legais, é o que afirma o filósofo Ernst-Wolfgang Böckenförde:

A tarefa consiste antes em admitir a existência desse poder de direção e desses representantes, em conferir-lhes estabilidade no possível, mas, ao mesmo tempo, em submetê-los à legitimação democrática em um processo aberto de formação da vontade democrática, assim como em vinculá-los à responsabilidade e aos controles democráticos, para que sua ação possa valer como uma ação autorizada pelo povo e em nome do povo, e inclusive simplesmente para que essa ação possa dar-se

Deve-se considerar que o parlamentar ao ser eleito representa uma parte da população, na qual ele firmou suas bases eleitorais, devendo sempre pautar seu discurso naquilo que defendia em campanha, embora o conceito de representação seja algo singelo em teoria, na prática é algo tão frágil que um simples ato pode viola-lo.

Desde a campanha eleitoral, através de suas promessas, o candidato firma sua base política representando uma parcela da sociedade. Em campanha, essa pré-representação é violada através uso do nome do cargo publico (posto, graduação no caso de órgãos militares) que ocupam aqueles que praticam tal conduta, acabam violando a democracia fazendo com que as chances de outros candidatos venham a reduzir, afetando de forma indireta essa representação.

Muitos não conseguem ver mencionada conduta como algo sério, mas quando se fala de representação de fato, esta é violadora direta da democracia, posto que muitos utilizam do nome do cargo público, para autopromoção, acoplada a promessas que vão em tese beneficiar parcela da eleitores que ora votariam e outro candidato. Isto posto, a campanha eleitoral se torna uma fase determinante não só para o processo eleitoral, mas para o efetivo exercício da democracia indireta, estabelecido na Carta Constitucional.

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Sobre o autor
Daniel Melo Lima

Advogado, Pós-Graduado em Direito Constitucional , Pós-Graduado em Direito Eleitoral.

Informações sobre o texto

Este texto foi publicado diretamente pelos autores. Sua divulgação não depende de prévia aprovação pelo conselho editorial do site. Quando selecionados, os textos são divulgados na Revista Jus Navigandi

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