Debates paradoxais têm tomado conta das pautas do agro envolvendo a defesa de ideologias de todos os tipos e sob as mais diversas óticas possíveis, de proteção ao meio ambiente, aos animais, à atividade rural, enfim.
E onde se coloca o direito nestes debates? Qual a real finalidade da legislação, que dá tantas margens à interpretação judicial?
A legislação é baseada na experiência das relações humanas, que servem para ligar os acontecimentos ao direito, para garantir paz social, mostrando a quem deve ser atribuída a legitimidade ou razão, desfazendo equívocos, ou abuso de poder, falsidade, ou um crime.
O contrário é a desordem social, o caos na sociedade e na economia.
No caso do Brasil, baseado em um sistema de regulamentação por herança romana, temos a lei como única fonte de direito, diferente dos estados americanos que admitem precedentes em igualdade de condições à lei.
Segundo as mais estudadas teorias, o direito se presta a resolver conflitos sociais, mas não criá-los, atendendo sempre à paz social e a humanização das normas para atender à sociedade.
E o que vem acontecendo com o direito na pecuária? O inverso.
Recentes teorias têm tomado conta de mudar o comportamento humano perante os animais, um perigoso biocentrismo em detrimento de direitos constitucionais basilares às questões alimentares e sociais, passando por questões ambientais e agrárias.
A visão constitucional de meio ambiente, incluindo a fauna vem dando espaço à interpretação da função ecológica da fauna como bem ambiental com posições extremistas sobre liberdades e interpretações sobre bem-estar animal.
Fato é que, também advém da Constituição Federal as liberdades individuais, o abastecimento alimentar e o fomento à produção agropecuária (art. 23, VIII), o que demanda o uso racional do bem ambiental, recursos naturais, fauna e flora, cabendo aos órgãos regulamentadores as demais definições de sustentabilidade, bem-estar, etc..
Isto significa dizer que não compete aos discursos ideológicos ou interpretações judiciais transversas apresentar oposições ao abastecimento alimentar, impedir o consumo de produtos agropecuários, a exportação de animais, dentre outras questões que contrariam a explicada função da legislação e do direito enquanto pacificadores das relações sociais.
A agropecuária brasileira, não obstante, teve papel predominante na evolução da sociedade, na evolução do país e por isso o direito na pecuária deve ser interpretado com cautela e limitações.
A proteção à fauna silvestre é lei, as atividades agropecuárias não se prestam ao cultivo de animais silvestres para o abastecimento alimentar, muito pelo contrário, é a criação de animais domésticos, que não vivem em liberdade.
Segundo o entendimento do colega gaúcho, Valente Selistre, em nossa obra comemorativa do Direito Agrário nos 30 anos da Constituição Federal (Editora Thoth 2018, leitura recomendada), ao abordar o mesmo assunto com maestria “Infelizmente, no Brasil, o cidadão urbano tem uma percepção equivocada do homem do campo [...] necessária uma modificação de raciocínio de toda a sociedade brasileira, valorizando o homem do campo, desde os legisladores aos operadores do Direito [...]”.