Despesas com pessoal na Administração Pública Municipal e a Lei de Responsabilidade Fiscal

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Os limites de despesas com pessoal previstos na Lei de Responsabilidade Fiscal estão entre um dos mecanismos mais relevantes de fiscalização, transparência e controle das contas públicas.

Entre as despesas geradas pelos entes federativos, os gastos com pagamento de servidores públicos estão entre as mais vultuosas. Nesse sentido, a Constituição Federal, com o intuito de evitar aos entes federativos gastos excessivos sem ter as receitas necessárias para cobri-los, estabeleceu em seu art. 169 que as despesas com pessoal não poderão exceder limites estabelecidos em lei complementar. Colaciono:

Art. 169. A despesa com pessoal ativo e inativo da União, dos Estados, do Distrito Federal e dos Municípios não poderá exceder os limites estabelecidos em lei complementar.

§ 1º A concessão de qualquer vantagem ou aumento de remuneração, a criação de cargos, empregos e funções ou alteração de estrutura de carreiras, bem como a admissão ou contratação de pessoal, a qualquer título, pelos órgãos e entidades da administração direta ou indireta, inclusive fundações instituídas e mantidas pelo poder público, só poderão ser feitas:

I - se houver prévia dotação orçamentária suficiente para atender às projeções de despesa de pessoal e aos acréscimos dela decorrentes;

II - se houver autorização específica na lei de diretrizes orçamentárias, ressalvadas as empresas públicas e as sociedades de economia mista.

O desdobramento do disposto no art. 169 da Constituição Federal resultou na regulamentação da Lei Complementar nº 101/2000, conhecida como Lei de Responsabilidade Fiscal.

A Lei de Responsabilidade Fiscal visa impor o controle de gastos da União, dos estados, Distrito Federal e municípios, condicionando-os à capacidade de arrecadação de tributos desses entes da Federação. Trata-se de um mecanismo de fiscalização, transparência e controle das contas públicas, para que o governo não contraia empréstimos ou dívidas de forma injustificada.

A Lei de Responsabilidade Fiscal estabelece em seus artigos 19 e 20, os limites de despesa com pessoal na esfera municipal:

Art. 19. Para os fins do disposto no caput do art. 169 da Constituição, a despesa total com pessoal, em cada período de apuração e em cada ente da Federação, não poderá exceder os percentuais da receita corrente líquida, a seguir descriminados:

I – União: 50% (cinquenta por cento);

II – Estados: 60% (sessenta por cento);

III – Municípios: 60% (sessenta por cento).

[...]

Art. 20. A repartição dos limites globais do art. 19 não poderá exceder os seguintes percentuais:

[...]

III - na esfera municipal:

a) 6% (seis por cento) para o Legislativo, incluído o Tribunal de Contas do Município, quando houver;

b) 54% (cinquenta e quatro por cento) para o Executivo.

Nos termos da lei, a despesa total com pessoal na esfera municipal não poderá exceder 60% da receita corrente líquida, sendo 54% deste percentual para o Poder Executivo e 6% para o Legislativo, incluindo-se o Tribunal de Contas do Município, quando houver.

Considera-se despesa com pessoal o somatório dos gastos do ente da Federação com os ativos, os inativos e os pensionistas, relativos a mandatos eletivos, cargos, funções ou empregos, civis, militares e de membros de Poder, com quaisquer espécies remuneratórias e vantagens pessoais de qualquer natureza.

Ademais, as despesas com servidores, independentemente do regime de trabalho a que estejam submetidos, integram a despesa total com pessoal e compõem o cálculo do limite de gasto com pessoal. Consideram-se incluídos tanto servidores efetivos, como cargos em comissão, celetistas, empregados públicos e agentes políticos.

Cumpro esclarecer que quando ultrapassados os limites legais de despesa com pessoal, a Carta da República define que o ente federativo deve tomar algumas medidas para se adequar aos parâmetros definidos em lei. Inicialmente, deve haver redução de pelo menos vinte por cento das despesas com cargos em comissão e funções de confiança. Após, caso não solucionado o problema, serão exonerados servidores públicos não estáveis. Por fim, caso as medidas anteriores não tenham sido efetivas, serão exonerados os servidores estáveis, sendo respeitadas as normas definidas na Lei nº 9.801/99.

Deve-se destaque o fato que ultrapassar o limite de despesa total com pessoal em cada período de apuração se trata de infração político-administrativa do Prefeito Municipal, sujeita ao julgamento pela Câmara dos Vereadores e sancionadas com a cassação do mandato, conforme previsão expressa do inciso VII, do art. 4º do Decreto-Lei nº 201/1967. Outros atos, como o de provocar o aumento de despesas em desacordo com a legislação ou deixar de adotar medidas em caso de aumento podem gerar ainda a reclusão da autoridade de 1 (um) a até 4 (quatro) anos.

Muito embora o limite de despesa com pessoal estabelecido para o Executivo da esfera municipal na Lei de Responsabilidade Fiscal seja de 54%, também deve ser observado o limite prudencial estabelecido no parágrafo único do art. 22 da supracitada Lei, tendo em vista as vedações que podem ser estabelecidas em caso de excesso:

Art. 22. A verificação do cumprimento dos limites estabelecidos nos arts. 19 e 20 será realizada ao final de cada quadrimestre.

 Parágrafo único. Se a despesa total com pessoal exceder a 95% (noventa e cinco por cento) do limite, são vedados ao Poder ou órgão referido no art. 20 que houver incorrido no excesso:

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I - concessão de vantagem, aumento, reajuste ou adequação de remuneração a qualquer título, salvo os derivados de sentença judicial ou de determinação legal ou contratual, ressalvada a revisão prevista no inciso X do art. 37 da Constituição;

II - criação de cargo, emprego ou função;

III - alteração de estrutura de carreira que implique aumento de despesa;

IV - provimento de cargo público, admissão ou contratação de pessoal a qualquer título, ressalvada a reposição decorrente de aposentadoria ou falecimento de servidores das áreas de educação, saúde e segurança;

V - contratação de hora extra, salvo no caso do disposto no inciso II do § 6o do art. 57 da Constituição e as situações previstas na lei de diretrizes orçamentárias.

Portanto, o Poder que atingir 51,3% de Despesas com Pessoal (95% de 54%) está proibido de fazer os atos constantes nos incisos do parágrafo supramencionado. Sem prejuízo destas medidas, caso a despesa total com pessoal do Poder ou órgão se aproximar dos limites legais, o ente federativo deve realizar a extinção de cargos e funções públicas ou a redução temporária da jornada de trabalho com adequação dos vencimentos à nova carga horária.

Conforme o § 1º, inciso II, do artigo 59 da Lei de Responsabilidade Fiscal, o Poder Legislativo, diretamente ou com auxílio dos Tribunais de Contas, e o sistema de controle interno de cada Poder e do Ministério Público, fiscalizarão o cumprimento das normas da Lei Complementar, com ênfase no que se refere ao montante da despesa total com pessoal que ultrapassar 90% do limite. Interpretado como limite de alerta aos entes, não cabe penalização, servindo apenas para chamar a atenção dos gestores públicos de que o limite prudencial e máximo estão próximos de serem ultrapassados.

Muito embora a legislação seja clara quanto as sanções e vedações que podem ser desencadeadas em caso de descumprimento da Lei de Responsabilidade Fiscal, é comum que os municípios ultrapassem o limite prudencial, e muitas vezes extrapolem os limites de despesas com gastos de pessoal.

REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS

ALEXANDRINO, Marcelo, Paulo, Vicente. Direito Administrativo Descomplicado. São Paulo. Ed. Método. 18ª Edição. 2010.

BRASIL, Constituição, 1988. Constituição da República Federativa do Brasil; Senado Federal, 1988.

_______. Lei de Responsabilidade Fiscal. Lei Complementar nº 101 de 04 de maio de 2000.

_______. Decreto Lei nº 201, de 27 de fevereiro de 1967.

CARVALHO, Matheus. Manual de Direito Administrativo. 4ª Edição. Salvador: Juspodivm, 2017.

MELLO, Celso Antônio Bandeira de. Curso de Direito Administrativo. São Paulo: Malheiros, 2004.

Sobre o autor
Alberto Lúcio de Souza Simonetti Filho

Advogado. Pós-graduado em Direito Público pela Universidade do Estado do Amazonas. Pós-graduando em Direito Processual pela Pontifícia Universidade Católica de Minas Gerais.

Informações sobre o texto

Este texto foi publicado diretamente pelos autores. Sua divulgação não depende de prévia aprovação pelo conselho editorial do site. Quando selecionados, os textos são divulgados na Revista Jus Navigandi

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