Duas observações importantes sobre a pericia criminal no processo penal

08/09/2018 às 18:04
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Trata-se de aspectos importantes que devem ser observados pelo operador do direito no tocante à perícia criminal no processo penal.

Na esteira de angariar provas para sustentar uma acusação criminal, o exame de corpo de delito surge como ferramenta principal de constatação da materialidade do delito. Então, resta saber o que é o exame de corpo de delito.

O exame de corpo de delito é uma perícia técnica que visa comprovar a materialidade (existência) de um delito que deixa vestígio. Aquelas infrações que deixam vestígios também são chamadas de não transeuntes. É o que se extrai do artigo 158, do CPP.

“Art. 158. Quando a infração deixar vestígios, será indispensável o exame de corpo de delito, direto ou indireto, não podendo supri-lo a confissão do acusado”.

Observando o artigo acima podemos perceber que temos duas espécies de corpo de delito, direto e indireto.


ESPÉCIES DIRETO E INDIRETO

O exame de corpo de delito será direto quando realizado, pelo perito, diretamente sobre os vestígios deixados. Por exemplo, imagine o crime de homicídio, quando o perito analisar diretamente sobre o cadáver será um exame direto.

 E será indireto, quando o perito realizar o exame sobre informações “verossímeis” fornecidas a ele. O objeto sobre o qual recaiu o crime não está disponível ao perito. Acima, usamos o exemplo de um crime de homicídio, no mesmo exemplo, o exame indireto será feito levando em consideração as informações testemunhais, fotografias (todos possuem celular) etc. Por informações veiculadas na mídia o laudo pericial que atestou a morte de Eliza Samudio, no conhecido caso Bruno, foi um laudo pericial indireto.

Mas atenção, existe uma diferença entre laudo pericial indireto e prova testemunhal. Na prova testemunhal a pessoa se dirige à autoridade e presta seu depoimento, as falas são reduzidas a termo e este documento constará nos autos. Já o exame de corpo de delito indireto com base em depoimentos é algo distinto. O perito usará depoimentos para então concluir pela materialidade do crime. No exame de corpo de delito indireto, há um laudo, firmado por perito, atestando a ocorrência do delito, embora esse laudo não tenha sido feito com base no contato direto com os vestígios do crime.

Parte da Doutrina, na verdade, entende que o exame de corpo de delito indireto não é bem um exame, pois não se está a inspecionar ou vistoriar qualquer coisa. Este exame pode ocorrer tanto na fase investigatória quanto na fase de instrução do processo criminal. Inclusive, o art. 184 do CPP determina que a autoridade não pode indeferir a realização de exame de corpo de delito:

“Art. 184. Salvo o caso de exame de corpo de delito, o juiz ou a autoridade policial negará a perícia requerida pelas partes, quando não for necessária ao esclarecimento da verdade”.


MOMENTO 

O momento de “ardência” de um delito, aquele momento que autorizam, por exemplo, a prisão em flagrante, onde estão imaculados os vestígios de um crime, se dá na fase pré-processual da persecução criminal. Então, o melhor momento, sem sombra de dúvidas, é durante a investigação criminal.

Mas, também, poderá ser feito o exame pericial na fase de instrução criminal, lembrando a necessária busca da verdade real no processo criminal.


OBRIGATORIEDADE 

Em regra, a lei processual penal assegura a obrigatoriedade da realização do exame pericial em crimes que deixam vestígios, como já foi dito. Porém, pode ser dispensando nos casos de crimes de baixo potencial ofensivo (de competência do juizado especial criminal) já que os crimes que possuem um rito célere, sumaríssimo, seria prejudicado pela complexidade que pode se dar em um exame pericial.

Podemos extrair do art. 77 §1º da lei 9.099/95 que o exame de corpo de delito também está dispensado no caso de infrações de menor potencial ofensivo desde que a inicial acusatória venha acompanhada de boletim médico, ou prova equivalente, atestando o fato.

Agora imagine o seguinte: ocorre um crime de estupro, a vítima esconde isso da família e passa-se 1 ou 2 meses da ocorrência desse fato. Após 1 ou 2 meses a vítima, por incentivo da família, resolve procurar a autoridade para relatar o ocorrido. O crime de estudo é um crime não transeunte, por tanto ele deixa vestígio, só que o fato aconteceu a 1 ou 2 meses e fica impossível auferir, por exame pericial, a ocorrência do crime. Neste caso o que ocorre? A jurisprudência entende que qualquer prova pode substituir o exame de corpo de delito, por exemplo, a prova testemunhal. No exemplo acima imagine que alguém tenha passado pelo local onde ocorria o estupro e foi buscar ajuda, mas ao retornar não encontrou ninguém e ficou sabendo, bem depois, a identidade da vítima e autor daquele fato que presenciou. Temos uma testemunha ocular do fato que suprirá o exame de corpo de delito.


FORMALIDADES 

Em regra, o exame deve ser realizado por um perito oficial. Se não for possível é admitido que seja realizado por 2 (dois) peritos não oficiais.

Também, tratando-se de perícia complexa, aquela que abrange mais de uma área do conhecimento, poderá, o juiz, admitir quantos peritos oficiais forem necessários. Imagine o caso de uma pericia complexa em que se precisa de um ortopedista, um ginecologista e um neurologista. Neste caso, teremos 3 peritos, uma para cada área do conhecimento. Nada impede, porém, que um só perito oficial tenha habilitação para emitir laudos técnicos de várias áreas do conhecimento.

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Havendo mais de um perito, pode ocorrer divergências entre laudos periciais, nem sempre será unanime. Assim, também, o juiz pode convocar um 3º... 4º ... 5º perito que concordará ou discordará de todos os laudos.

Lembrando sempre que o juiz não e vincula ao laudo de um perito oficial pois, rege em nosso ordenamento jurídico, o livre convencimento do juiz.

Percebam que o perito é um auxiliar do juízo e não das partes. Mas a lei garante ao ofendido e ao assistente da acusação a indicação de assistente técnico. Desta forma, o assistente pode acompanhar a pericia durante sua realização, observar procedimentos, auxiliar as partes na formulação de quesitos que serão propostos aos peritos oficiais para que respondam.

Quesitos são perguntas que serão feitas ao perito. Por exemplo:

  1. “perito, esclareça por favor se o cadáver foi encontrado de bruços (decúbito ventral), ou de barriga para cima (decúbito dorsal)?”
  2. “perito, a ferida encontrada no cadáver sugere que o instrumento do crime pode ser por um bisturi médico (instrumento perfuro-cortante) ou por uma navalha de barbeiro (instrumento corto-deslizante)?”

Então, a finalidade dos quesitos é induzir o perito a responder aquelas perguntas coerentes com a linha de defesa ou acusação que a parte deseja.

Ponto importante, que merece esclarecimento, é sobre formular quesitos e prestar esclarecimentos. Pois bem, vamos montar uma linha temporal. Antes da realização da pericia a parte pode formular os quesitos que, durante a realização da pericia serão juntados esclarecimentos afins de responder aquelas perguntas elaboradas pelas partes.

Já a prestação de esclarecimento se dará depois de feita a perícia onde o perito será questionado, inquirido sobre pontos importantes do que consta no laudo.

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Sobre o autor
Diemes Vieira Santos

Advogado. Formado em Direito pela Pontifícia Universidade Católica de Minas Gerais em 2015. Especializado em Direito Penal e Processo Penal pela PUC - MG Possui incondicional amor ao desafio e vê o estudo como uma forma de autoconhecimento e desenvolvimento pessoal. Apaixonado pelo conhecimento jurídico, psicológico e científico. Experiente em Direito Criminal.

Informações sobre o texto

Este texto foi publicado diretamente pelos autores. Sua divulgação não depende de prévia aprovação pelo conselho editorial do site. Quando selecionados, os textos são divulgados na Revista Jus Navigandi

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