O presente artigo jurídico tem como objetivo expor brevemente sobre algumas normas aplicáveis e entendimentos jurisprudenciais referentes à perda da pretensão punitiva pela prescrição em abstrato, consoante o art. 107, IV, do CPB, para crimes praticados antes da vigência da lei n.º 9.271/96, pela análise da impossibilidade de suspensão do processo e do curso do prazo prescricional, nos termos do vigente art. 366, do CPP.
Trata-se de hipótese rara, por demandar a aplicação de norma prevista em uma legislação especial e de institutos de lei penal no tempo, e icônica, por representar caso de incidência em delito praticado antes da vigência da lei n.º 9.271/96, referente ao processamento do crime previsto no art. 12, da lei n.º 6.368/76 (atualmente art. 33, caput, da lei n.º 11.343/06), cometido, no presente caso, no dia 03/02/1995, com recebimento da denúncia em 12/05/1995, portanto, há mais de 23 (vinte e três) anos, desde o último marco interruptivo, mesmo com a aplicação do disposto no art. 366, do CPP.
Explica-se.
O art. 366, do CPP, vigente à época dos fatos, apresentava a seguinte redação:
Art. 366. O processo seguirá à revelia do acusado que, citado inicialmente ou intimado para qualquer ato do processo, deixar de comparecer sem motivo justificado.
Esta redação é bem diferente da atualmente disposta no art. 366, do CPP, dada pela lei n.º 9.271/96, o que acaba originando uma aparente contradição.
Art. 366. Se o acusado, citado por edital, não comparecer, nem constituir advogado, ficarão suspensos o processo e o curso do prazo prescricional, podendo o juiz determinar a produção antecipada das provas consideradas urgentes e, se for o caso, decretar prisão preventiva, nos termos do disposto no art. 312.
Dessa forma, de acordo com a melhor hermenêutica de legislação penal, verifica-se que entre a data do último marco interruptivo (12/05/1995) até a presente data, transcorreram mais de 23 (vinte e três) anos, sem ocorrência de qualquer nova causa interruptiva/suspensiva legalmente prevista, posto que os fatos datam de antes da vigência da lei n.º 9.271/96, que justamente alterou o atualmente disposto no art. 366, do CPP, tendo, dessa forma, escorrido o curso do prazo prescricional (20 anos), disso exsurgindo a conclusão de inevitável prescrição da pretensão punitiva estatal em abstrato.
Isso porque a nova redação do art. 366, do CPP, dada pela lei n.º 9.271/96, trata-se, em relação à disposição anterior, de novatio legis in pejus, tendo a jurisprudência do Superior Tribunal de Justiça (STJ) firmado entendimento de que não é possível a suspensão do processo e do curso do prazo prescricional, nos termos do vigente art. 366, do CPP, nos feitos relativos a crimes praticados antes da vigência da lei n.º 9.271/96, pois a suspensão do prazo prescricional constituiu novatio legis in pejus, não se admitindo, ainda, a cisão da referida norma, como segue:
HABEAS CORPUS. ART. 366 DO CÓDIGO DE PROCESSO PENAL. LEI Nº 9.271/96. NOVATIO LEGIS IN PEJUS. IRRETROATIVIDADE. REVELIA. SUSPENSÃO DO PROCESSO E DO CURSO DO PRAZO PRESCRICIONAL. CRIME COMETIDO ANTES DA ALTERAÇÃO LEGISLATIVA. IMPOSSIBILIDADE DE CISÃO DE LEI.
1. A teor da jurisprudência do Superior Tribunal de Justiça, não é possível a suspensão do processo e do curso do prazo prescricional, nos termos do vigente art. 366 do Código de Processo Penal, nos feitos relativos a crimes praticados antes da vigência da Lei nº 9.271/96, pois a suspensão do prazo prescricional constituiu novatio legis in pejus. Não se admite, ainda, a cisão da referida norma.
(...)
(HC 206.748/SP, Rel. Ministra MARIA THEREZA DE ASSIS MOURA, SEXTA TURMA, julgado em 20/03/2014, DJe 07/04/2014)
Consequentemente, observadas as formalidades legais, na hipótese deve ser declarada a extinção da punibilidade, perante a ocorrência da perda da pretensão punitiva pela prescrição em abstrato, consoante o art. 107, IV, do CPB, uma vez que entre os marcos legais transcorreu mais de 20 (vinte) anos, não incidindo a nova redação do art. 366, do CPP, dada pela lei n.º 9.271/96, por tratar-se, em relação à disposição anterior, de novatio legis in pejus, conforme firmado pelo STJ.