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Doença de Minamata: Japão, 1954

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O presente artigo apresenta um breve estudo acerca da Doença de Minamata.

1. INTRODUÇÃO

A doença de Minamata tem seu nome derivado da cidade costeira japonesa de Minamata, localizada ao sul da província de Kumamoto, Japão, cidade que sofreu o pior desastre ambiental da história em uma cadeia alimentar provocado pela poluição industrial. Desde 1930, uma indústria local de propriedade da corporação Chisso, lançava, em grande quantidade sem qualquer tratamento, dejetos com carga mercúrio, na baía de Minamata. Estima-se que a empresa descartou de centenas de toneladas de metilmercúrio no local. Porém somente 20 (vinte) anos depois, começaram a surgir sintomas de contaminação.

Primeiramente, a doença foi reconhecida nos pássaros, que perdiam a coordenação motora, voavam de forma descontrolada e caíam no solo, além dos gatos que corriam em círculos e espumavam pela boca. A doença posteriormente afetou pessoas, mais especificamente as famílias de pescadores, pois essas faziam grande consumo de peixes e moluscos provenientes da Baía de Minamata, os quais estavam contaminados.

A doença foi determinada como uma síndrome neurológica causada por sintomas de envenenamento por mercúrio. No entanto, os médicos só conseguiram chegar a essa conclusão após 10 (dez) anos após do surgimento dos primeiros casos. Inicialmente os sintomas a surgirem nos humanos eram sutis: fadiga, irritabilidade, dores de cabeça, falta de sensibilidade nos braços e nas pernas e dificuldade de deglutição. Os sintomas mais graves envolviam distúrbios sensoriais nas mãos e pés, danos à visão e audição, fraqueza e, em casos extremos, paralisia e morte. Além de problemas nos nascituros. Na época milhares de pessoas daquela região ficaram com sequelas permanentes e outras tantas morreram aproximadamente 20.000 (vinte mil) pessoas se declararam afetadas.

Depois de várias ações judiciais, várias pessoas conseguiram ser indenizadas pela empresa e o governo. Dessa forma, o presente trabalho tem como tema: “Doença de Minamata - 1954 - Japão”. Tem como objetivos realizar um estudo sobre os danos ambientais, causas e consequências, agentes responsáveis e a eventual condenação e reparação que esses agentes sofreram, no presente caso.


2. DOENÇA DE MINAMATA – 1954 - JAPÃO

Desastre de Minamata é o nome dado ao envenenamento de inúmeras pessoas por mercúrio, ocorrido na cidade de Minamata, no Japão, em razão de dejetos contendo mercúrio, em sua forma orgânica, terem sido lançados por uma indústria de acetaldeído e PVC de propriedade da Corporação Chisso, na Baía de Minamata, localizada ao sul da Província de Kumamoto, desde 1930. O Acervo O Globo tratou do assunto:

A história teve início na década de 40, logo após a guerra. A Chisso começou a usar mercúrio para fabricar cloreto de vinila e acetaldeído, jogando os resíduos num rio que desaguava na Baía de Minamata. No dia 21 de abril de 1956, uma criança de 5 anos chegou ao hospital com disfunção nervosa. Foi o primeiro de uma série de casos que terminavam com loucura ou morte.1

Em 1956, o primeiro caso de contaminação em ser humano foi registrado, sendo uma criança com danos cerebrais. Após, apareceram outras pessoas com os sintomas: convulsões severas, surtos de psicose, perda de consciência, febre muito alta e, posteriormente, morte. De início, os médicos trataram a doença, como uma desconhecida doença contagiosa.

O fato em comum entre todas as vítimas era de que todas ingeriram grande quantidade de peixes da Baía de Minamata, concluindo-se que estavam envenenadas por mercúrio, que era utilizado no completo Chisso como catalisador para a produção de plásticos. A professora Luciane Kawa, em seu blog, expôs sobre o assunto que:

Seus resíduos eram despejados no mar, sem qualquer tratamento e continham grande carga de mercúrio. O mercúrio é um metal pesado, teratogênico (quer dizer causa problemas na formação dos fetos durante a gravidez). Em 1953, depois de várias observações de animais com comportamento estranho (gatos realizando estranhos movimentos), também começaram a se identificar vários problemas de coordenação motora na população humana, além dos problemas dos nascituros. Na cidade japonesa de Minamata houve mais um desdobramento trágico que hoje se repete de uma forma muito comum.2

O mercúrio pode ser encontrando nos lugares mais distantes do planeta Terra, em razão de sua volatilidade. Rafaela Rodrigues da Silva explicou sobre esse metal:

O mercúrio é um metal líquido nobre que se apresenta nas espécies metálico elementar, em compostos orgânicos e inorgânicos e nos estados de oxidação Hg°, Hg1 e Hg2. O metal é tóxico e vaporiza mesmo a zero grau célsius. É persistente no meio ambiente, sendo ainda muito utilizado na sociedade.

Esse metal é uma ameaça à vida no meio ambiente, tendo em vista a impossibilidade de ter controle do metal após sua emissão.

A Síndrome de Minamata, também assim denominada, demora cerca de 20 (vinte) anos para se manifestar após o início da contaminação.

Com relação à regeneração da Baía de Minamata, foi realizado um projeto para retirada da lama contaminada com mercúrio, a empresa Chisso e a Câmara de Kumamoto, compartilharam as despesas para dragarem da lama e recuperação do solo em torno do local, a qual teve um custo de 48,5 bilhões de Yens (moeda japonesa):

Em 1976 a Câmara de Niigata encarregou-se do trabalho de dragagem do fundo do rio no entorno das tomadas da drenagem da fábrica da Showa Denko que contiveram mais mercúrio (Hg) do que o padrão legal para a remoção, cujo custo por esse trabalho foi pago pela empresa responsável pela poluição.3

Em março de 1990, a recuperação de 58 hectares de solo recuperado com aterro que conteve mais do que o padrão regulamentar, isto é, acima de 25 ppm (parte por milhão) ou 0,0025% de mercúrio total ou os mais elevados, o qual teve um custo de aproximadamente 48,5 bilhões de Yens (moeda japonesa) em um período de 14 longos anos (o que nos dias atuais corresponderia a aproximadamente 427,72 milhões de dólares americanos ou a 1,4 bilhões de reais. Desse total, a empresas Chisso assumiu o custo de 30,5 bilhões de Yens (63% do custo total). A compensação à indústria da pesca em torno da baía de Minamata paga pela Chisso Co. Ltd foi de 140 milhões de Yens no ano de 1959 e de 3,93 bilhões de Yens nos anos de 1973 a 1974. 4

O processo de melhoria da Baía de Minamata levou décadas, no entanto no dia 29 de julho de 1997, o Governador da Província de Kumamoto declarou que os níveis de mercúrio presentes nos peixes e mariscos no local estavam seguros para o consumo.

Já com relação às de vítimas afetadas pela contaminação, várias delas ingressaram com ação judicial conta a empresa Chisso, sendo ao final concedida a indenização de 600 (seiscentos) milhões de dólares às 138 (cento e trinta e oito) pessoas que moviam o processo. Sendo a primeira vez que uma empresa era responsabilizada por um desastre ambiental:

O juiz Jiro Saito, do tribunal de Kumamoto, leu a sentença: a fábrica de produtos químicos Chisso era culpada. Sua negligência ao jogar na Baía de Minamata toneladas de mercúrio tinha provocado a debilidade mental e a morte de centenas de moradores da ilha de Kyushu, no Sul do Japão. Coroando uma luta de mais de 20 anos, a Chisso era condenada a pagar o equivalente a US$ 600 milhões às 138 pessoas que moviam o processo. Naquele 20 de março de 1973, pela primeira vez na História, uma empresa era oficialmente responsabilizada por um desastre ambiental.5

O governo também estabeleceu medidas para cadastrar as vítimas da doença de Minamata. Primeiramente às vítimas precisavam ganhar uma certificação oficial, para serem oferecidas posteriormente indenizações. No total 13 (treze) mil pessoas se inscreveram a certificação, no entanto destas aproximadamente apenas 3 (três) mil pessoas foram certificadas e assim aptas para receber indenização. Diante disto, as vitimas ingressaram com processos judicias contra o governo nacional. Destaca-se que:

A maioria desses casos foi resolvida pelo governo em 1995, com o pagamento de uma indenização única às vítimas não certificadas que apresentavam transtornos sensoriais nos membros. Cerca de 10 mil pessoas das Províncias de Kagoshima, Kumamoto e Niigata, incluindo os já falecidos, receberam as indenizações. O último processo judicial remanescente sobre as indenizações da doença de Minamata, movido por pessoas que não aceitaram a oferta do governo de 1995, foi finalmente resolvido em 2004 com uma decisão da Suprema Corte que reconheceu a responsabilidade administrativa do governo nacional e da Província de Kumamoto. 6

No ano de 2005, após quase 50 (cinquenta) anos do reconhecimento de Minamata o governo do Japão, anunciou diversas iniciativas para fornecer apoio adicional às vítimas da doença. Em 2009, o governo japonês também aprovou uma lei com medidas especiais para auxiliar as vítimas não certificadas da doença de Minamata.

Também foi realizado um tratado internacional com o objeto de oferecer proteção à saúde humana e ao meio ambiente, sendo reconhecido o impacto do mercúrio e seus compostos. Em outubro de 2013, aprovado o texto final da Convenção de Minamata, aprovado e assinado por 92 (noventa e dois) países, incluindo o Brasil:

A Convenção de Minamata sobre Mercúrio tem sua origem nas discussões que ocorreram no âmbito do Programa das Nações Unidas para o Meio Ambiente (PNUMA), sobre os riscos do uso de mercúrio. A partir da Decisão 25/5 UNEP/GC de 2009, que convocou os governos a elaborar um instrumento legalmente vinculante para o controle do uso de mercúrio visando proteger à saúde humana e ao meio ambiente, foi iniciado um processo de negociação global. Um Comitê de Negociação Intergovernamental ou Intergovernamental Negotiating Comittee (INC) foi instituído em 2009 e cinco rodadas de negociações foram realizadas entre 2010 e 2013. Cerca de 140 países envolveram-se e aprovaram o texto final em 19 de janeiro de 2013, em Genebra, Suíça. O Ministério do Meio Ambiente participou ativamente das negociações, pautado pela busca de um instrumento ambicioso nos marcos do desenvolvimento sustentável e dos resultados da Rio+20. Em 10 de outubro de 2013, representantes do Governo brasileiro participaram da Conferência Diplomática para assinatura da Convenção de Minamata sobre Mercúrio. O instrumento de ratificação brasileira foi depositado na sede das Nações Unidas em Nova York em 08 de agosto de 2017, entrando em vigor para o Brasil em novembro de 2017.7

O intuito da Convenção de Minamata é a proteção, notadamente, dos considerados mais vulneráveis ao mercúrio, como gestantes, crianças e fetos. O mercúrio orgânico pode ultrapassar a barreira placentária com maior eficiência, sendo possível encontrar a espécie inorgânica no líquido amniótico e também no leite materno.8

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O Brasil, ao fazer parte da Convenção de Minamata sobre mercúrio, retoma a importação de mercúrio com restrições, sendo controlada pelo IBAMA (Instituto Brasileiro do Meio Ambiente e dos Recursos Naturais Renováveis).

A Convenção demonstra importante avanço regulatório para o controle de substâncias químicas, determinando obrigações ao comércio de mercúrio, dispondo, ainda, sobre meios para a redução de emissões de mercúrio e controle destas. Também consta da Convenção de Minamata:

A eliminação ou redução do uso do mercúrio em determinados produtos e processos industriais (como, por exemplo, baterias, interruptores, lâmpadas fluorescentes, pesticidas e cosméticos), assim como o manejo ambientalmente adequado de seus resíduos, o gerenciamento de áreas contaminadas por mercúrio e medidas relativas à mineração de ouro artesanal e em pequena escala.9

Dessarte, essa Convenção é de extrema importância para preservação do meio ambiente e proteção das gerações futuras, pois os resíduos lançados no meio ambiente atualmente se manifestarão depois de 20 (vinte) anos, causando sérios problemas a todos os seres vivos.


3. CONCLUSÃO

O tema desta pesquisa tratou-se da Doença de Minamata, ocorrida no Japão, em 1954, durante o desenvolvimento industrial da região. A fábrica de produtos Chisso foi a culpada pela catástrofe, a principal fornecedora de alimentos às comunidades da cidade. A indústria por ato de negligência despejou constantemente na Baía de Minamata os seus resíduos com grandes toneladas de mercúrio. Alguns anos depois, surgiram os primeiros sintomas de contaminação, primeiro nos animas e depois nos seres humanos.

É importante esclarecer que o mercúrio é um elemento químico que possui alta volatilidade no meio ambiente, é um metal pesado e um dos mais poluentes. Possui propriedades neurotóxicas e teratogênicas. A sua livre exposição afeta vários órgãos, como o cérebro, rins, a medula, fígado e pode também atravessar muito fácil a placenta, ocasionando assim, uma danificação do desenvolvimento neurológico do bebê.

Diversos estudos mostraram que a elevada exposição de mercúrio tem como consequências problemas respiratórios, como por exemplo, dor no peito, tosse, dispneia, entre outros. Já a baixa exposição do mercúrio resulta em sintomas neurológicos, como distúrbios cognitivos e emocionais, bem como tremores.

A empresa foi processada e o julgamento foi a favor de todos os pacientes. A empresa foi condenada por negligência corporativa e ao pagamento por danos a cada paciente que havia morrido, bem como aos pacientes sobreviventes. Por um outro lado, é importante destacar que essa empresa japonesa empregava vários trabalhadores, e se ela fechasse muitos ficariam sem trabalho, assim, os parentes e empregados das vítimas confrontaram a empresa com o objetivo de requerer essas indenizações. Logo mais tarde, a empresa mudou o ramo de suas atividades.

Várias políticas em âmbito Global foram demandadas a fim de dirimir a eliminação do mercúrio. A OMS, por exemplo, difundiu uma política demandando ações de curto, médio e longo prazo de substituição de produtos médicos que contenham mercúrio por outras alternativas que não sejam nocivas à saúde. Outro exemplo é a Associação Médica Mundial, que convocou a substituição de insumos com mercúrio por outras alternativas que sejam seguras.

Além das políticas é necessária uma educação ambiental em que o Poder Público promova a educação em todos os níveis de ensino, uma vez que, ela busca valores entre uma convivência harmoniosa com o ambiente e as demais espécies que habitam o planeta. A sustentabilidade está relacionada ao meio ambiente ao desenvolvimento material e econômico sem agredir o meio ambiente, em outras palavras, é um meio para diminuir os impactos ecológicos, ou seja, suprir as necessidades atuais dos seres humanos sem comprometer a capacidade de satisfazer as necessidades das gerações futuras, no entanto, isso só será possível através de uma educação ambiental.


REFERÊNCIAS

1 ACERVO O GLOBO. Desastre de Minamata, crime ecológico que deixou marcas por décadas no Japão. Disponível em: <https://acervo.oglobo.globo.com/fatos-historicos/desastre-de-minamata-crime-ecologico-que-deixou-marcas-por-decadas-no-japao-10102255>. Acesso em: 17 de setembro de 2018.

2 KAUA, Luciane. O Desastre de Minamata. Disponível em: <http://professoralucianekawa.blogspot.com/2015/04/o-desastre-de-minamata_9.html>. Acesso em 17 de setembro de 2018.

3 CAMPOS, Josué Castro. O mal de minamata – cidade onde os gatos dançavam e as pessoas morriam. Disponível em: <https://pt.linkedin.com/pulse/o-mal-de-minamata-cidade-onde-os-gatos-dan%C3%A7avam-e-pessoas-campos>. Acesso em: 15 de setembro de 2018.

4 Ibidem.

5 ACERVO O GLOBO. Desastre de Minamata, crime ecológico que deixou marcas por décadas no Japão. Disponível em: <https://acervo.oglobo.globo.com/fatos-historicos/desastre-de-minamata-crime-ecologico-que-deixou-marcas-por-decadas-no-japao-10102255>. Acesso em: 17 de setembro de 2018.

6 JAPAN, Fact Sheet. Questões Ambientais. Disponível em: <http://www.br.emb-japan.go.jp/cultura/pdf/ambiente.pdf>. Acesso em: 15 de setembro de 2018.

7 BRASIL. Convenção de Minamata. Disponível em: <http://www.mma.gov.br/seguranca-quimica/conven%C3%A7%C3%A3o-minamata>. Acesso em: 17 de setembro de 2018.

8 AZEVEDO, F. A Toxicologia do mercúrio. Rima: São Carlos, 2003.

9 BRASIL. Promulgação da Convenção de Minamata sobre Mercúrio. Disponível em: <http://www.itamaraty.gov.br/pt-BR/notas-a-imprensa/19315-promulgacao-da-convencao-de-minamata-sobre-mercurio>. Acesso em: 17 de setembro de 2018.

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Sobre as autoras
Sarah Cristina Silva Pereira

Discente do curso de Bacharelado em Direito no ILES/ULBRA Itumbiara/GO.

Isadora Ferreira Oliveira

Discente do Curso de Bacharelado em Direito no ILES/ULBRA Itumbiara/GO.

Informações sobre o texto

Este texto foi publicado diretamente pelos autores. Sua divulgação não depende de prévia aprovação pelo conselho editorial do site. Quando selecionados, os textos são divulgados na Revista Jus Navigandi

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