01. Introdução:
- Origem e contexto Histórico do Principio da Proporcionalidade
A origem e desenvolvimento do principio da proporcionalidade se dá com a evolução dos direitos fundamentais e garantias individuais da pessoa humana, que é verificada a partir do surgimento do Estado de Direito burguês na Europa.
Sendo assim, sua origem remonta os séculos XII e XVIII, quando surge na Inglaterra as Teorias Jusnaturalistas, onde se defende que o homem tem direitos anterior ao aparecimento do Estado e que é dever do soberano respeitar esses direitos. E é durante a passagem do Estado Absolutista (que os governantes tinham poderes ilimitados) para o Estado de Direito, que pela primeira vez se usa o Princípio da Proporcionalidade, visando a limitação do poder de atuação dos governantes em relação aos governados.
Essa passagem de Estado Absolutista para Estado de Direito tem início com as revoluções liberais burguesas. Sendo a Revolução Francesa em 1789 e a Revolução dos EUA em 1776, essas revoluções possuíam cunho liberal por defenderem a descentralização do poder, que se concentrava todo nas mãos do Monarca, e assim impedia a ascensão da classe burguesa, pois esta não tinha liberdade para se desenvolver na sociedade porque se encontrava submissa as vontades do Soberano. Com a superação dessa centralização do poder surge o Estado de Direito, e a modernidade Jurídica, onde a supremacia e soberania se encontravam na voz do povo e á luz dessa vontade emanada pelo povo cada Estado criaria a sua Constituição, sendo esta soberana sobre as demais leis e atos normativos do Estado.
O Estado de Direito tem como traços marcantes os princípios da soberania nacional, da independência dos poderes e da supremacia constitucional. O principio da separação dos poderes se trata de uma técnica usada para conter o Absolutismo, dividindo os poderes em Poder Legislativo, Executivo e Judiciário, preservando a harmonia e independência desses poderes entre si. O traço marcante do movimento Constitucionalista é a limitação do poder do governante diante dos governados, visando à preservação dos direitos e garantias fundamentais defendidas na Constituição de cada Estado, se baseando em princípios que fundamentem a aplicabilidade de cada um desses direitos defendidos pelo ordenamento. “A Carta Magna, na acepção liberal, apresenta-se como uma ordenação sistemática da comunidade política, plasmada em regra num documento escrito, mediante o qual se estrutura o poder político e se asseguram os direitos fundamentais.”
Assim, se observa que o principio da proporcionalidade nasceu no âmbito do Direito Administrativo, pois era utilizado na França como técnica voltada para o controle do poder de policia da Administração Pública. Mas, a proporcionalidade só veio ganhar foro Constitucional e reconhecimento como principio em meados do século XX, na Alemanha.
A inserção da proporcionalidade no campo constitucional se deve também às revoluções burguesas do século XVIII, que eram influenciadas pela doutrina iluminista, defendendo a necessidade incondicionada de respeito à dignidade da pessoa humana.
02. Desenvolvimento e conceituação do principio da proporcionalidade:
A concepção de proporcionalidade reclama o apelo à prudência na determinação da adequada relação entre as coisas. Porquanto, a idéia de proporcionalidade revela-se não só como um importante princípio jurídico fundamental, mas também consubstancia um verdadeiro referencial argumentativo, ao exprimir um raciocínio aceito como justo e razoável de um modo geral, de comprovada utilidade no equacionamento de questões práticas, não só do Direito em seus diversos ramos, como também em outrasdisciplinas, sempre que se tratar da descoberta do meio mais adequado para atingir determinada finalidade.
Segundo Willis Guerra Filho, o princípio da proporcionalidade pode ser entendido como um mandamento de otimização do respeito máximo a todo direito fundamental em situação de conflito com outro(s), na medida do jurídico e faticamente possível, traduzindo um conteúdo que se reparte em três princípios parciais: a adequação, a exigibilidade e a proporcionalidade em sentido estrito.
Afirma Paulo Bonavides que o princípio da proporcionalidade está naquela classe de princípios que são mais facilmente compreendidos do que definidos. Sucede que, embora não esteja expresso no texto constitucional, a sua presença é inequívoca na Carta Magna. Isto porque a circunstância do princípio da proporcionalidade decorrer implicitamente da Constituição não impede queseja reconhecida sua vigência, por força, inclusive, do quanto disposto no parágrafo 2º do art. 5º, segundo o qual “os direitos e garantias expressos nesta Constituição não excluem outros decorrentes do regime e dos princípios por ela adotados”.
Disserta Humberto Ávila o princípio constitucional da proporcionalidade é aplicado somente em situações em que há uma relação de causalidade entre dois elementos empiricamente discerníveis, um meio e um fim, de tal modo que o intérprete do direito possa proceder ao exame de três parâmetros fundamentais e complementares: a adequação, a necessidade e a proporcionalidade em sentido estrito.
A adequação de um processo decisório exige uma relação empírica entre o meio e o fim: o meio deve levar à realização da finalidade normativa. Logo, administração, o legislador e o julgador têm o dever de escolher um meio processual que simplesmente promova o fim da ordem jurídica. O processo será adequado somente se o fim for efetivamente realizado no caso concreto; será adequado se ofim for realizado na maioria dos casos com a sua adoção; e será adequado se o intérprete avaliou e projetou bem a promoção do fim no momento da tomada da decisão.
A necessidade de um processo decisório envolve duas etapas de investigação: o exame da igualdade de adequação dos meios, paraverificação se os diversos meios promovem igualmente o fim; e o exame do meio menos restritivo, para examinar se os meios alternativos restringem em menor medida os direitos fundamentais colateralmente afetados. A ponderação - sopesamento entre o graude restrição e o grau de promoção dos direitos fundamentais torna-se, portanto, inafastável para a tomada de uma decisão.
A proporcionalidade em sentido estrito de um processo decisório é examinada diante da comparação entre a importância da realização do fim e a intensidade da restrição aos direitos fundamentais. O julgamento daquilo que será considerado como vantagem e daquiloque será considerado como desvantagem depende do exame axiológico do decisor, em face das circunstâncias da lide e da apuração do binômio utilitário do custo-benefício.
Tal como sustenta Luís Barroso o princípio da proporcionalidade funciona como um parâmetro hermenêutico que orienta como uma norma jurídica deve ser interpretada e aplicada no caso concreto, mormente na hipótese de incidência dos direitos fundamentais, para a melhor realização dos valores e fins do sistema constitucional.
03. Insuficiência da subsunção
A subsunção se define pela ideia de que a ordem jurídica resolve conflitos de interesses analisando fatos concretos (premissas menores) em face de normas gerais (premissas maiores) ordenadas por critérios notadamente racionais. Nisso retomamos os dogmas já destacados: a completude do sistema normativo e a racionalidade como ferramenta, não só de seu tratamento, mas também da própria delimitação entre o fato e o direito. Este pensamento ainda serve para a aplicação de algumas regras do direito, como por exemplo o art. 40, da CF/88 – aposentadoria compulsória do servidor público ou o art. 18 da CF/88 – Brasília é a capital do Brasil.
A distinção entre fato e direito permanece num segundo plano quando se trata de questionar a atualidade do paradigma subsuntivo – talvez porque a distinção entre fato e direito esteja profundamente ligada ao nosso modo de pensar. Prova disso é que ela dá sentido à concepção de sistema normativo.
Então podemos dizer que a aplicabilidade da subsunção torna-se insuficiente para a solução de alguns casos, estes denominados hard cases, que é quando não há no caso concreto, regra que se aplica a tal no ordenamento jurídico, ou ainda quando há mais de uma regra solucionadora de tal caso, ou então, quando a solução do caso causa extrema estranheza aos costumes e a coletividade, o magistrado então irá se deparar com o um caso difícil (hard case), diferente dos casos fáceis (easy cases), onde simplesmente com a regra o magistrado soluciona a lide, em tese, pragmática e analiticamente.
Há muito se discorre acerca do conceito de direito e das formas de solução de casos onde não se encontra guarida na norma positivada. Os posicionamentos doutrinários divergem, e cabe a cada operador analisar e retirar o conceito que melhor lhe ocorre dos julgamentos de casos onde não se encontra regra, ou ainda, quando mais de uma regra os disciplina. Nesta seara, têm-se dois importantes doutrinadores, de um lado Herbert Lionel Adolphus Hart e de outro Ronald Dworkin. O primeiro defende que quando não há solução aparente para o caso na regra, ou seja, diante de um caso difícil, o julgador deve utilizar de sua discricionariedade e decidir o caso por suas próprias convicções, enquanto o segundo propõe a incompatibilidade do uso da discricionariedade plena para julgamento do caso, devendo o julgador socorrer-se nos princípios que regem aquela sociedade e aquele sistema legal, caso em que deverá descobrir o direito do caso e proclamá-lo ao vencedor. Enquanto um prega a discricionariedade do julgado e consequente criação de um direito ao caso, o outro propõe a busca através da hermenêutica do direito já preexistente para solucionar o caso.
04. Ponderação de bens e/ou interesses
Diante da insuficiência da subsunção para solucionar certos casos do Direito, e também à frente das normas principiológicas consubstanciarem valores e fins não raros distintos, em direção as perspectivas contraditórias desses casos mais complexos, denominados hard cases, ou casos difíceis ou casos não concretos, surge um novo instrumento metodológico para a aplicação de um direito justo e capaz de materializar a dignidade da pessoa humana: Ponderação de bens e/ou interesses.
Esse método pode ser divido em três partes: identificação das normas pertinentes, onde o intérprete submete-se a detectar no sistema as normas relevantes para a solução do caso concreto, fazendo a identificação dos possíveis conflitos entres elas. Seleção dos fatos relevantes, onde nesta segunda etapa, examina-se os fatos e as circunstâncias concretas do caso concreto e sua interação com os elementos normativos. E a terceira etapa, chamada de atribuição geral de pesos, os diferentes grupos de normas e a repercussão dos fatos do caso concreto serão examinados conjuntamente, ao modo que se apure os pesos que devem ser atribuídos aos vários elementos em disputa ao passo que o conjunto normativo deve preponderar no caso concreto.
Ao observamos a ordem jurídica brasileira, podemos exemplificar a aplicabilidade do pensamento ponderativo na apropriação das dimensões da dignidade da pessoa humana: 1) o debate acerca da relativização da coisa julgada onde se contrapõem o princípio da segurança jurídica e o princípio da realização da justiça; 2) a discussão entre os princípios da liberdade de expressão e proteção aos valores éticos e sócias da pessoa ou da família; 3) o debate sobre a eficácia horizontal dos direitos fundamentais, onde se contrapõem princípios como a autonomia da vontade e a dignidade da pessoa humana; 4) o embate entre os princípios da liberdade religiosa e proteção da vida, em ocasiões que liguem a transfusão de sangue para testemunhas de Jeová; 5) a polêmica ativa entre os princípios da liberdade de expressão e informação e políticas públicas de proteção da saúde. Nas sociedades pluralistas atuais, o papel da Constituição já não é tanto o de estabelecer um projeto predeterminado de vida em comum, mas sim o de criar condições para que a mesma se desenvolva. Para que isso seja possível, é essencial a coexistência de valores e princípios diversos, que devem assumir caráter necessariamente não absoluto, sob pena de inviabilizar a concretização da norma.
Percebemos que os casos citados, todos nos mostram conflitos entre princípios, onde a subsunção torna-se insuficiente na tentativa de resolução destes, e nessa insuficiência entra a ponderação de bens e/ou interesses para solucioná-los de maneira justa visando a materialização da dignidade da pessoa humana.
05. Conclusão
Democratização da Hermenêutica
Como o próprio nome diz, a democratização da Hermenêutica se trata da tentativa de tornar a linguagem e interpretação jurídica menos sofisticada e mais disponível a toda a sociedade, principalmente em relação a nossa Constituição, e assim utilizá-la, a certo grau, independente dos agentes jurídicos. E de tornar a participação popular maior dentro do sistema judicial.
A ideia é que como a Lei Maior, nossa Constituição, é um instrumento jurídico para o povo e em prol desse, nós como cidadãos devemos conhecê-la e interpretá-la, usufruindo assim melhor de nossos direitos.
Essa tentativa se dá por meio da linguagem jurídica, principalmente. O Direito é conhecido e exteriorizado por meio de palavras, manifestadas nas diversas normas. Nessa sistematização, contudo, é utilizada uma escrita muito rebuscada com termos conhecidos apenas por agentes do Direito. Para que o cidadão tenha entendimento das leis que consulte, essas devem estar adaptadas a ele, se expressando de forma que qualquer um que a leia possa interpretá-la.
É, como os que defendem essa tese afirmam, tornar a ciência mais presente ao senso comum, criando assim um novo senso comum com conhecimento mais abrangente (nesse caso, conhecimento jurídico). Seguindo o raciocínio, para criar esse novo senso comum, primeiro a ciência é adaptada para compreensão popular; depois, essa ciência é ensinada durante a formação dos cidadãos, para que seja associada aos conhecimentos comuns da sociedade.
Desta forma, com a adaptação da linguagem e sistemática jurídica a sociedade, as leis que devem esta a conhecimento de todos como a Lei Maior podem ser ensinadas aos nossos adolescentes no ensino médio como um conhecimento necessário para sua formação. Ao mesmo tempo que a aquisição de conhecimento sobre essas leis e a disponibilidade de análise destas devem estar sempre a disponibilidade de todos.
Além disso, outras alternativas sociojurídicas podem ser citadas: alargamento dos legitimados para a propositura de Ação Direta de Inconstitucionalidade; utilização de consulta popular para escolha de Ministros do STF, a fim de permitir um maior controle da opinião pública no exercício da hermenêutica constitucional; e o progressivo reconhecimento do amicus curiae nos processos constitucionais.