Criminologia: a seletividade do sistema penal e o crime de tráfico de drogas praticado por mulheres

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5. CONSIDERAÇÕES FINAIS

O sistema penal brasileiro é seletivo, e a grande maioria da população carcerária é composta por negros, pobres e favelados. A “balança” que se utiliza para pesar a justiça possui dois pesos e uma medida, não é justa e igualitária, sobrepesa para os menos favorecidos, usa do abuso de poder e do autoritarismo.

O Estado, não dispõe de meios plausíveis para fornecer educação, saúde, transporte, moradia e outros bens indispensáveis para a mantença da população em massa, assim, os fornece de maneira escassa e ineficaz, logo a ausência de tais recursos e a falta de emprego acaba por serem fortes impulsionadores para a criminalidade, que encontra nas falhas do Estado Democrático de Direito uma forte fonte de renda com o comercio ilegal.

É neste contexto turbulento que o tráfico de drogas ganha espaço, aliciando cada vez mais pessoas, sejam elas usuárias ou traficantes. Normalmente o que ocorre é que o usuário para manter seu vicio, passa a traficar, ou então, a falta de oportunidades para inserir-se no mercado de trabalho (que exige qualificação) contribui para a adesão ao tráfico.

A mulher normalmente insere-se no tráfico por meio de seu companheiro, que em muitos casos acaba preso e então ela assume o comando da boca, muitas são presas ao tentar entrar com drogas dentro do presidio e assim por diante. O fato é que uma vez presa, seja pelo tráfico ou qualquer outro crime, a vida dessas mulheres se modifica por completo.

O cárcere feminino é uma realidade triste, ao qual falta de tudo, inclusive amor. Falta acompanhamento psicológico e médico, produtos para limpeza, os recursos para a educação e investimento em cursos profissionalizantes são escassos, falta respeito à dignidade da pessoa humana, as presas que ali vivem, passam por situações degradantes e constrangedoras.

Muitas das detentas ficam presas durante anos sem receber qualquer visita de seus familiares, são privadas da convivência de seus filhos, além de perder o pátrio poder, outras dão “a luz” em situações extremamente precárias, expondo seus bebês a traumas permanentes e irreversíveis. A solução seria o Estado priorizar a melhoria dos bens indispensáveis para boa sobrevivência de sua população, assim, com certeza reduziria o número de presos no Brasil.

Há de se verificar ainda que, após o cumprimento da pena não há incentivos por parte do Governo para que as ex-presidiárias sejam inseridas no mercado de trabalho, tornando, assim, o reingresso extremamente difícil, de forma que a busca por emprego formal e licito seja fadada ao insucesso. Com isso, o mercado negro se fortalece, e por falta de opções, estímulos e apoio material e moral, muitas das ex-detentas voltam a denigrir, e, novamente são presas.

O fato é que, enquanto o Estado não tomar partido, a começar por inibir a corrupção dentro de seus órgãos, a situação irá continuar a mesma por muitas gerações.


REFERÊNCIAS

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Notas

1 A portaria nº344/98 trata- se de regulamentações técnicas sobre substâncias e medicamentos que devem ser submetidos a controle especial. Dentro deste controle, são classificadas as substâncias consideradas entorpecentes e que causam dependência química, seja ela física ou psíquica.

2 Grifos nosso.

3 Gráfico de percentual de presos por tráfico de drogas no Brasil. Disponível em: https://g1.globo.com/política/noticia/um-em-cada-tres-presos-do-pais-responde-por-trafio-de-drogas.ghtml.

4 Gráfico proveniente do site G1, elaborado por Clara Velasco, Rosanne D’ Agostino e Thiago Reis em 02/02/2017.

5 Matéria disponibilizada no portal EBC, artigo escrito pela jornalista Daniella Jinkings em 2010.

6 Titulo do artigo: Sistema carcerário brasileiro: a ineficiência, as mazelas e o descaso presentes nos presídios superlotados e esquecidos pelo poder público

7 Grifos nossos.

8 Grifos nossos.

9 Grifos nossos.

10 Noticia proveniente do portal G1, matéria tem como titulo: Três mulheres são presas tentando entrar no presídio com drogas escondidas nas partes intimas.

11 Titulo da reportagem: Filho e mulheres são flagrados com drogas em visita a presídios da região.

12 Grifos nossos.

13 Grifos nossos.

14 Reportagem extraída do portal Correio 24 horas, como titulo: Presença de mulheres no crime é maior atualmente, diz polícia.

15 Informação proveniente do portal Rede Brasil Atual.

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Este texto foi publicado diretamente pelos autores. Sua divulgação não depende de prévia aprovação pelo conselho editorial do site. Quando selecionados, os textos são divulgados na Revista Jus Navigandi

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