AS DIRETRIZES DE COMBATE À CORRUPÇÃO NOS PROCESSOS DE CONTRATAÇÃO PÚBLICA

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Antes do trato pormenorizado sobre o assunto, importante ressaltamos que o termo corrupção que nos utilizaremos terá sentido amplo, não se restringindo, portanto, ao seu aspecto penal, ou seja, à descrição típica constante nos arts. 317 (Corrupção passiva

 Disposições iniciais sobre a corrupção e a diretrizes anticorruptivas e de integridade nos processos de contratação pública

Antes do trato pormenorizado sobre o assunto, importante ressaltamos que o termo corrupção que nos utilizaremos terá sentido amplo, não se restringindo, portanto, ao seu aspecto penal, ou seja, à descrição típica constante nos arts. 317 (Corrupção passiva) e 333 (Corrupção ativa) do Código Penal Brasileiro.

Pode-se grafar que a abrangência do termo se estende a todo e qualquer ato comissivo ou omissivo contrário ao resguardo da ética, da moral, dos princípios administrativos e do patrimônio público substancial, com o fito de lograr alguma vantagem. Portanto, o termo é amplo, não sendo restrito ao mero aspecto da tipicidade penal.

Tratando-se, portanto, de gênero. A corrupção abrange o tráfico de influência, a concussão, o peculato, a prevaricação, a fraude, a improbidade administrativa, os crimes de responsabilidade, a advocacia administrativa, a fraude, a falsidade, dentre tantas outras condutas que maculam a moralidade e afetam direta ou indiretamente o patrimônio público.

Tutela-se a Administração Pública, como bem jurídico amplo consignado expressamente na Constituição Federal. Portanto, as condutas que configuram atos fraudulentos ou corruptivos são de diversas naturezas, incidindo sobre eles várias regras impeditivas e sancionatórias das respectivas condutas.

No curso dos processos de contratação pública – onde se evidencia percentual significativo de atos corruptivos e fraudulentos - além dos aspectos específicos inerentes ao planejamento e as etapas do processo que possuem em si a prevenção e a repressão à corrupção - onde os agentes responsáveis exercem o denominado autocontrole - há uma ingerência maior, relacionada à gestão dos contratos e as políticas de governança, que são, hodiernamente, instrumentos de boa administração e controle.

 Muitos atos praticados no curso dos processos de contratação se enquadram como fraude ou corrupção. Portanto, para nós, o processo de contratação pública é a maior porta de oportunidades para a prática de atos dessa natureza, pois existem centenas de formas ardilosas criadas pelos agentes públicos e por pessoas privadas para burlá-lo, causando, assim, prejuízos formais e materiais ao erário, aos interessados e, consequentemente à população, a principal vítima dos atos de corrupção.

A Instrução Normativa nº 05, de 26 de maio de 2017 do Ministério do Planejamento andou bem ao estabelecer como uma das fases do processo de contratação pública o “Planejamento”.

Em que pense as diversas classificações legais e doutrinárias, ao nosso ver, tal processo deveria ser composto das seguintes fases: a) planejamento; b) licitação em sentido estrito – como fase competitiva e; c) execução do contrato.

Consideramos a fase de “seleção do fornecedor”, por sua indeterminação técnica, como corolária do planejamento. Todavia, resquícios tocam na fase de licitação. A indefinição é prejudicial didaticamente e tecnicamente aos anseios da clareza do certame.

Além disso, a denominada fase de “gestão do contrato” não poderia ser considerada uma fase do processo de contratação. Deveria ser considerada atribuição ou competência, pois exercida no curso da execução do contrato por determinados agentes públicos. A verdadeira fase seria, para nós, a execução do contrato. Enfim, pensamento nosso que não pode alterar outras concepções e nem as declarar impróprias.  

A fase de Planejamento em verdade, e indiscutivelmente, é a fase mais importante do processo de contratação pública, onde se planta a semente para um escorreito e concatenado processo de aquisição. Comparamo-la com os alicerces de um edifício que, para não sucumbir, precisa de uma base sólida, forte e irretocável técnica e operacionalmente. Por isso, indispensável a incidência de um controle rígido sobre a licitação, principalmente na fase de planejamento, tendo em vista que perfar-se-á como ato preventivo e, por consequência, eficaz. Os atos normativos anteriores à Instrução Normativa nº 05/2017, não deram o devido valor à fase de “Planejamento”.

Concepção nossa, é o Planejamento um dever da Administração e, consequentemente, um direito público subjetivo dos interessados, incluindo licitantes, cidadãos, pessoas físicas e jurídicas. A indisponibilidade do interesse público pela Administração obriga-a planejar, principalmente quando se resvala em despesa pública.

A fase de planejamento da contratação vem respaldada por atos e procedimentos indispensáveis ao controle de irregularidade concomitante e prévio, que o ato normativo denomina de “etapas do planejamento”. São etapas do planejamento os estudos preliminares, o gerenciamento de riscos e, como resultado formalizado das duas etapas anteriores, o termo de referência ou projeto básico. Todas essas etapas nortearão a elaboração do Edital de Licitação que, ao final, regerá as relações jurídicas entre a Administração e os licitantes ou contratados.

Importante frisarmos que o “gerenciamento de riscos” é uma etapa permanente que norteia as alterações em busca do aperfeiçoamento e da boa administração, visando mitigar os riscos das contratações futuras. Busca assim, avaliar, analisar e mitigar os riscos de irregularidade e danos. Não se restringe, portanto, ao processo de contratação, estendendo-se à execução do contrato e seus defeitos. O gerenciamento de riscos deve nortear toda atuação administrativa, inclusive, o processo político, que resulta nas decisões fundamentais do Estado relacionas às necessidades públicas que poderão ou não ser objeto de processo de contratações públicas. Basicamente, o gerenciamento de riscos previne e trata os riscos existentes.

A gestão de riscos é demasiadamente importante para detectar irregularidades despercebidas, que se travestem de legalidade, mas que obscuramente buscam a fraude e a corrupção, o proveito próprio e alheio em detrimento do patrimônio público.

A Instrução nº 05/2017 do Ministério do Planejamento, apesar de algumas críticas, que poderíamos apontar, arraiga tendências dos órgãos de controle (interno e externo) que visam mitigar ocorrências de irregularidades, incluindo a corrupção e a fraude.

A noção do planejamento como instrumento de aperfeiçoamento já merece elogios. Tudo o que é planejado ganha em organização, economicidade, segregação de atribuições e controle.

Retomando a noção de corrupção, como gênero, apesar da análise objetiva que circunda os danos ocasionados pelas condutas, pensamos que a corrupção é inerente à índole, à volitividade e a cognoscibilidade do ser humano; ideia inerente à capacidade cognitiva de saber o que é certo e o que é errado, o que é lícito e o que é ilícito.

O grau de reprovabilidade que deve recair sobre o corrupto deve ser proporcional às suas competências e a sua importância decisória nos processos de contratação. Portanto, não somos a favor de uma padronização sancionatória, devendo estar presente neste meio graus de reprovabilidade com base na conduta e no bem juridicamente tutelado.

Não se pode excluir, todavia, o desconhecimento das formalidades exigidas pela lei (forma) como instrumentos de análise de ilegalidade. Às vezes, as faltas não se relacionam com a volitividade, mas com a ignorância ou o mero erro, que poderá ser exculpável a título de responsabilidade subjetiva. Entretanto, poderá ser culpável sob o aspecto da responsabilidade objetiva no que concerne à reparação do dano ocasionado à Administração. Por isso que a denominada Lei Anticorrupção adota expressamente a responsabilidade objetiva das pessoas jurídicas privadas em casos de danos ocasionados nas relações com a Administração Pública. Não podemos olvidar que, no caso de reparação de dano, esta será imprescritível.

Assim, estamos a afirmar que a corrupção deve ser considerada no seu sentido doloso ou volitivo- finalístico, incluindo aqui atos e omissões temerários que põem em risco a boa administração, a eficiência e a economicidade dos serviços prestados à sociedade, bem como aqueles em que o administrador ou o beneficiário agem no sentido específico de lograr vantagens em detrimento da sociedade, do patrimônio público e da moralidade.

Apesar da extensão do conceito, a praxe internacional classifica a corrupção conforme o âmbito em que ocorre e pelo prejuízo ocasionado em razão dos atos ilícitos. Dessa feita, a corrupção poderá ser grande, pequena, política e sistêmica.

Para nós, somente poderemos concluir sobre a natureza efetiva de um ato corruptivo e seus efeitos por meio do devido processo legal, incluindo, os de natureza administrativa, inquisitiva, fiscalizatória e judicial.

A corrupção sistêmica que se relaciona intimamente à corrupção política, ao nosso ver, é bastante difundida nos dias atuais, perfeitamente aplicável ao que ocorre nos processos de contratação pública. Afinal, repisando, a decisão sobre as necessidades de contratação de bens e serviços tem natureza política.

A corrupção sistêmica refere-se à ineficiência do controle e da fiscalização do sistema jurídico (que poderá ser dolosa ou culposa), judicial e demais órgãos responsáveis pelo seu controle e repressão, inclusive dos órgãos internos e externos de controle.

Não poucas vezes tais órgãos se ausentam, volitivamente, dos casos em concreto, pois o compadrio exerce grande influência no grau de visibilidade das ilicitudes – a gnose dos atores obscurece a visão dos fiscais e controladores.

O problema se perfaz quando os órgãos responsáveis não querem enxergar as ilicitudes – fingem não ver a forma dolosa da conduta praticada pelo agente público ou pela pessoa contratada.  Tal noção configura a ideia de corrupção de dentro para fora, ou seja, apenas confirma que o maior dos problemas se encontra no seio da própria administração: na integridade e honestidade dos agentes políticos e administrativos. Obviamente que não se pode generalizar, pois devemos presumir que grande parte é honesta. Entretanto, a pequena parcela que permite culposa ou dolosamente a ocorrência de irregularidade ocasiona sérios danos ao erário, inclusive morais e de desconfiança pública.

Infelizmente, não concordamos em sua inteireza com Tribunal de Contas da União, ao dispor em sua Apresentação, no oportuno Referencial de Combate à Corrupção (demasiadamente útil), de que a linha de defesa da corrupção aponta o administrador público como o principal agente nesse combate (deveria ser, mas não é).

Em verdade, há um contrassenso a partir do instante que considerarmos que esses mesmos agentes, possam figurar como os responsáveis pela abertura ou possibilidade de ocorrências corruptivas.  Obviamente, jamais atuariam na linha de frente para combater os próprios atos corruptivos ou de amigos próximos, às vezes responsáveis pelos status que detêm na hierarquia administrativa e nas instâncias judiciais superiores.

 Repisemos: detentores que são das chaves que abrem as portas do dispêndio público e das irregularidades, referidos agentes não atuariam contrariamente a si mesmos e nem aos seus “amigos ou companheiros”. O combate à corrupção depende de leis mais rígidas, de maior transparência no trato do patrimônio público, na maior vigilância social e no fator educacional e didático dos órgãos de controle e agentes; na forma de escolha dos agentes públicos, ordenadores de despesas, que respondem pelo atendimento das necessidades sociais. Essas são desvirtuadas em benefício próprio ou de terceiros.

Todos devem cientificar-se que a impunidade não pode servir de mola propulsora para condutas ilícitas. Ao judiciário compete o juízo individual de culpabilidade que deve ser severamente analisando quando estiverem no banco dos réus autoridades que o povo depositou confiança, na esperança da eficiência das competências do Estado, principalmente em relação à saúde, educação, infraestrutura, segurança pública e saneamento básico. 

Ante o subjetivismo doloso que norteia nossas ideais, consideramos a integridadehoje um assunto em voga no âmbito dos sistemas de controle - uma das principais frentes de combate à corrupção, pois parte de um pressuposto interno subjetivo relacionado à índole, à ética e a moral do agente público.

Dessa forma, a linha de frente para o combate à corrupção é a própria índole do agente público (origem e fonte da correição) bem como a consciência do eleitorado na escolha dos seus representantes.

Agente Público é gênero, abrangendo para o contexto, os agentes administrativos, com ou sem vínculo efetivo com a Administração, e os denominados agentes políticos, empossados por escrutínio ou discricionariamente, que exercem poderes decisórios e cujas atribuições estão, em grande parte, estabelecidas na Constituição.

Relacionado à primeira linha de frente de combate à corrupção, está o acesso aos cargos públicos administrativos e políticos. A entrada no serviço público deve ser mais rigorosa, tanto sob o aspecto do conhecimento indispensável para a eficiência na prestação dos serviços, quanto na análise e busca pela real intenção do agente em fazer parte dos quadros do Governo (aspecto subjetivo).

Não poucas vezes ouviu-se dizer sobre o financiamento por organizações criminosas de pessoas para o êxito em concurso público e lá servirem aos anseios dessa organização. O mesmo ocorre no financiamento de campanhas políticas que visam empossar representantes eleitos por analfabetos políticos para preencherem a cúpula dos poderes e servirem a essas organizações. Encontra-se na declaração a fusão de pretensões corruptivas de natureza política e sistêmica.

Grandes empresas ou empresários, que financiam políticos, não o fazem gratuitamente. Esperam o retorno, que será demasiadamente ofensivo ao patrimônio público, principalmente no âmbito das contratações públicas.

Deve-se extirpar dos Poderes de Estado esses agentes, que estão em suas cúpulas para a tutela de organizações criminosas. É uma necessidade indispensável ao país, como Estado de Direito, Republicano e Democrático.

 A corrupção é um câncer que corrói as entranhas do Estado, gerando a miséria da maioria do povo e a dependência em face dos mesmos responsáveis pelos desfalques. No Brasil há uma cultura da corrupção sistêmica ou endêmica.

Ato contínuo, retornando, o conceito de integridade é demasiadamente amplo, inerente à honestidade, a ética e a moral, substantivos que devem assolar o exercício das competências públicas, administrativas ou políticas.

Os agentes políticos são os maiores ordenadores de despesas, basta analisarmos os regimentos ou atos normativos que estabelecem tais competências, geralmente ordenadas em graus progressivos de valores, conforme a hierarquia do cargo ou função de direção.

 Pensamos tratar a integridade de um valor supremo da Administração Pública que deve traçar as diretrizes das competências e dos objetivos pela lei almejados.

Indiscutivelmente a Administração Pública está carente de integridade, por isso em voga nos noticiários os prejuízos ocasionados ao erário público em razão da má administração ou mesmo do dolo corruptivo dos agentes públicos ou de pessoas outras que manejam receitas dessa natureza.

São noções que se enquadram no conceito de integridade. O termo é demasiadamente amplo, possuindo sentidos variados, mas que se fundem em uma ideia principal: a honestidade no trato da coisa pública. A integridade é inerente à própria noção dos princípios da moralidade e da imparcialidade.  

O termo ainda pode ser visto sob dois aspectos: um subjetivo e outro objetivo.

Sob o aspecto subjetivo, refere-se, como grafado, à ética, a moral e a honestidade do agente público, características pessoais relacionadas à própria índole, educação e temor da lei. O aspecto objetivo do termo refere-se à atividade desenvolvida, ou seja, a operacionalidade, o seguimento das linhas traçadas pelas normas; seguir as formalidades em sua inteireza, tendo em vista que os processos visam o resguardo de direitos e legitimam a atividade administrativa.

Além da Constituição que grafa os princípios fundamentais da Administração, e das leis que ventilam a necessidade da integridade, tais quais a lei do processo administrativo, lei de licitação, lei anticorrupção, lei de improbidade administrativa, o Decreto nº 9.203/2017 traz os contornos da integridade e nele depositaremos os nossos breves e singelos comentários relacionando-a à corrupção e a fraude como espécie desta última.

O art. 19 do Decreto referido determina que os órgãos as entidades da administração direta, autárquica e fundacional instituirão programa de integridade, com o objetivo de promover a adoção de medidas e ações institucionais destinadas à prevenção, à detecção, à punição e à mediação de fraudes e atos de corrupção, estruturado no comprometimento e apoio da alta administração; na existência de unidade responsável pela implementação no órgão ou entidade; na análise, avaliação e gestão dos riscos associados ao tema da integridade; e no monitoramento continuo dos atributos do programa de integridade.

Vejamos que a linha trilhada pelo decreto é mais objetiva, quando, para nós, a integridade deveria estar intimamente relacionada ao subjetivismo do agente público (ainda que houvesse traços objetivos), ou seja, ao seu comportamento ético e moral no exercício de suas competências.

Inclusive, a questão da integridade, vista sob o aspecto da ética e da moral do agente público ou mesmo do particular que se envolva em relações jurídicas com a Administração reflete no aprimoramento da organização administrativa e da própria pessoa jurídica, pois a segregação ou mapeamento de competências, bem como a autuação da integridade, também denominada compliance em sentido amplo, reflete na eficiência das relações.  Importante que dirigente, coordenadores, chefes e agentes públicos e privados estejam munidos dessa formação ética para a boa administração de suas organizações.

Importante frisarmos que os órgãos de controle, interno e externo, como referenciais, devem conduzir as linhas ou diretrizes para a melhoria e a tutela da Administração mitigando riscos e orientando didaticamente a forma de condução pelos agentes de suas competências legais.

Corroborando a integridade, como valor, deve se espraiar por toda administração, inclusive na razoabilidade da determinação de competências, nas decisões e processos administrativos.

Por fim, deve-se ressaltar que a Administração Pública e os órgãos de controle, individual ou conjuntamente, têm desenvolvido um trabalho voltado para a integridade nas organizações, fundindo institutos importantes de combate à fraude e a corrupção que, se implementados, para nós deveria ocorrer de forma menos burocratizada, mitigará tais ocorrências. Todavia, não se pode olvidar que todo ato fraudulento ou corrupto se mantem no âmago da índole do ser humano que, necessita, urgentemente de uma imersão na ética, na moral e no bom senso.

 

O desvirtuamento da Teoria da Separação dos Poderes no Estado de Direito Brasileiro e a contribuição para a corrupção

O art. 2º da Constituição Federal faz expressa menção a um dos princípios norteadores ou fundamentais de uma República Federativa e de um Estado Democrático de Direito.

Quando a Constituição grafou a independência e a harmonia entre os Poderes, logo à frente desqualificou as principais características e finalidades desse princípio fundamental: que é a fiscalização e o controle de um Poder pelo outro.

 Sabido que a fonte substancial de criação dessa teoria adveio da necessidade de limitação do arbítrio ocasionado pela Monarquia Absolutista que tinha como característica a irresponsabilidade do monarca, que estava acima da lei e de suas consequências – Teoria da Irresponsabilidade do Governante.

Acreditamos que no Brasil há um desvirtuamento dos ideais iluministas dos filósofos franceses que fundamentaram a Revolução, principalmente relacionados à Separação dos Poderes. Há demasiada ingerência de um Poder sobre o outro, o que põe em dúvida o respeito da essência desse fundamento democrático do Estado de Direito.

A partir do momento que um dado poder exercer influência política sobre o outro, inclusive de escolha da cúpula – membros - de um outro poder, não há de se falar em independência. Ao contrário, no caso do Brasil, como exemplo, os Ministros da Suprema Corte Judicial do país (STF) são indicados e nomeados pelo Presidente da República – chefe do Poder Executivo.

Sinceramente, não vemos lógica e nem a possiblidade de se qualificar tais relações como independentes, afinal, compete ao STF processar e julgar o Presidente da República nas infrações penais comuns (alínea “b” do inciso I do art. 102 da Constituição Federal).  Pior, ainda são competentes para processar e julgar por infrações penais comuns os próprios pares. Quer dizer, decidem conforme as suas convicções, muitas vezes fora do sistema jurídico, exculpam amigos, mesmo o processo carreado por elementos probatórios, e, caso sejam julgados por crimes comuns, os seus amigos de colegiado que possuirão a competência para julgar o magistrado subversivo. Infelizmente, não é uma anedota.

Pensamos que seria correto se os próprios pares do Poder Judiciário (todos os membros efetivos e vitalícios nomeados por concurso público), por exemplo, elegessem os Ministros da Suprema Corte e dos demais Tribunais Superiores, por meio de critérios rígidos, inclusive de moralidade, probidade e ética, além pois, da exigência indispensável do culturalismo do magistrado para o exercício de tão importante função na República.

A imparcialidade é um princípio fundamental para o exercício da função jurisdicional. Processar e julgar quem os nomeia ou julgar os próprios pareces de um órgão colegiado definitivamente não adjetiva o Estado como de Direito, nem como sério e respeitado.

Indiscutível se torna o vínculo estreito entre o Judiciário e o Executivo, quando este último indica e, após sabatina do Legislativo, nomeia quem eventualmente poderá julgá-lo. Trata-se de uma aberração jurídica, quando não política. Definitivamente não há de falar em independência entre tais Poderes. Além disso, fica descaradamente caracterizado o aparelhamento do Estado, tendo em vista que a vitaliciedade se aplica a esses “magistrados” que, em sua grande maioria, não fizeram parte dos seus quadros, antes da escolha e nomeação como Ministros. Ainda, muitos não tiveram a competência de lograr êxito no difícil concurso público, todavia, estão lá, julgando politicamente e impondo decisões absurdas aos magistrados de carreira, que devem seguir súmulas vinculantes, decisões uniformizadas e jurisprudências predominantes. Não podemos considerar essas regras como pertencentes a uma democracia e a um Estado de Direito.

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O Poder Judiciário deveria ser composto tão somente por magistrados de carreira, pois esses tiveram o labor do estudo incessante, árduo para passar no concurso público para a magistratura. Além disso, os magistrados devem, obrigatoriamente, ficar longe de qualquer senário ou ideologia política, sob pena de ferir o princípio mais importante da magistratura: a imparcialidade.

Dessa forma, a Tribunais Superiores, o Ministério Público que atua perante essas cortes, os membros da Advocacia da União e Defensoria Pública que atuarem nessas instâncias, todos esses membros deveriam ser nomeados pelos seus pares (de carreira). Nada de intervenção política, ou seja, de escolha por agentes políticos que foram nomeados por voto popular, pois a troca de favores se torna um vício eterno, que macula a imparcialidade, põe em dúvida a democracia e a justiça.  Enfim, não há segurança jurídica e nem confiança por parte da população. São competências exercidas sem a devida legitimidade do detentor da soberania subjetiva.

Os critérios de escolha, além de originários da carreira, da idade, do conhecimento, da reputação, do culturalismo, da moral, da ética, da probidade, dos títulos, devem ocorrer tão somente com o voto majoritário dos seus pares.

Indispensável, portanto, que se altere a Constituição no sentido exposto do que hoje nos deparamos. Não temos menor dúvida que esse primeiro passo restringiria demasiadamente e, principalmente, a impunidade dos agentes corruptos, agentes políticos, que são os maiores ordenadores de despesa.  A corrupção é uma doença que tem assolado a nossa república e se espraia por todos os Poderes, além, pois, dessa cultura no seio da própria sociedade.

No que concerne ao compadrio para o processamento e julgamento desses processos, estes ficam guardados nos órgãos à espera da prescrição e consequente extinção da punibilidade. Nem mesmo sob o aspecto reparatório, onde não há prescrição, tem se conseguido êxito ante esse conluio e essa demasia “harmonia”.

O mesmo deve ser aplicado ao Executivo quando da escolha dos Ministros e Secretários de Estado, cargos de Cúpula da Administração Pública, ordenadores de despesas exorbitantes. A escolha deve ser técnica e, de preferência entre os servidores da carreira dos órgãos e entidades vinculados a esses Ministérios. Chega de loteamento de interesses. Tal situação é uma das principais causas de contratos fraudulentos com o intuito de alimentarem a manterem esses agentes no poder. Sucatearam as estatais, tratando-as como patrimônio próprio, e delas fizeram a fonte de onde se extraia o dinheiro do financiamento e da manutenção no poder.

 

Linhas de enfrentamento da corrupção no processo de contratação pública

O foco deste tema se relaciona aos meios ou instrumentos que podem ser utilizados pela Administração e pelos particulares para mitigar as ocorrências corruptivas no âmbito laboral, orgânico ou institucional, especificamente no processo de contratação pública. Impossível exauri-lo no presente, todavia, a ideia de enfrentamento, ainda que meramente teórica, propulsiona ou viabiliza a criação de instrumentos normativos e substanciais para combater a corrupção.

O combate perfaz-se por uma sistemática formada por diversos instrumentos, incluindo atos normativos, órgãos, agentes públicos, pessoas privadas, procedimentos e mudanças dos valores sociais, culturais e da praxe administrativa. 

Grafaremos, teoricamente, sobre as linhas anticorruptivas; concepção nossa derivada da experiência e dos achados nos trabalhos de auditorias desempenhados pelos órgãos de controle. No que concerne à nossa classificação, não se pode excluir classificações outras convenientemente, criadas e fundamentadas pelos órgãos institucionalizados para o combate aos desvios nas licitações.

Oportuno a ideia inicial de prevenção, como instrumento obstativo da fraude e da corrupção. A prevenção poderá advir das conclusões extraídas do mapeamento de riscos que servirá de fonte substancial para a criação de atos normativos que regulamentem os achados, no sentido de evitar irregularidades.

A prevenção não se restringe a esse aspecto normativo, vai além, pois todo e qualquer agente público deve, contemporaneamente ao seu ato, antes que este produza seus efeitos, verificar se seus elementos constitutivos estão em sintonia, se o ato efetivamente é legal e razoável, e se é o conveniente e oportuno para a ocasião.

Após a prática de dado ato administrativo, este produzirá efeitos, instantâneos, contínuos ou perenes. Indispensável, portanto, o monitoramento desses atos e dos seus efeitos; se estão condizentes com a suas finalidades legais e institucionais. Muitos órgãos públicos criam áreas de monitoramento visando acompanhar a prestação dos serviços no momento que estão sendo prestados. Os órgãos de monitoramento são demasiadamente importantes para o imediatismo das providências saneadoras. O posicionamento dessa competência, se insere entre a prevenção e os repressivos, tendo em vista que nem sempre conseguiram sanar as faltas em momento anterior aos efeitos do ato proferido. Dessa forma, o monitoramento poderá gerar ato posterior, toda, imediato, que revogará, anulará ou mesmo saneará imediatamente o ato proferido. Vejamos que diverge do monitoramento operacional, cujo imediatismo é ainda mais célere à ponto de se evitar qualquer efeito do ato, sendo prontamente corrigido.

Consequência das ideais anteriores, está a correção do ato que, para nós, deverá ocorrer em momento oportuno no sentido de se evitar danos. A correção formal ou substancial do ato deve ser logo após ou imediatamente posterior à sua ocorrência, no sentido de se evitar maiores prejuízos.

Vejamos que os atos de efeitos instantâneos geram imediatamente alguns efeitos, que poderão ocasionar na mesma tempestividade ou concomitantemente prejuízos. Nesses casos, apesar da correção, os prejuízos gerados deverão ser imputados aos responsáveis, que não exerceram, com eficácia, o dever de autocontrole ou de vigilância, de acordo com a suas competências. A correção, ante a hierarquia administrativa, deverá ser exercida pelos superiores hierárquicos.

Não há empecilho para que a correção seja feita pelo Poder Judiciário quando o ato for ilegal ou desproporcional. Exemplo que poderíamos dar, se refere à errônea tipificação de infração administrativa, onde o Judiciário, poderá analisar, quando assim determinado em lei ou instrumento outro, como o Edital de Licitação, se o enquadramento de dada conduta está condizente com os termos da lei, do edital ou do contrato, tendo em vista que à Administração deve observância a esses instrumentos. O judiciário poderá anular o ato ou mesmo corrigi-lo, no sentido de concluir que efetivamente houve infração, todavia, nos termos da lei, do edital ou do contrato, o enquadramento não é o que a autoridade responsável concluiu, ou seja, apenas ajusta o ato com o fito de legaliza-lo.

Ato contínuo, caso não seja possível a correção do ato, este deverá ser anulado ou revogado. Trata-se do exercício da autotutela hierárquica que pode ser extraída das súmulas 346 e 473 do Supremo Tribunal Federal, que a viabilização à Administração anular ou revogar os próprios atos quando eivados por vícios tais que se enquadram na anulação ou revogação.

A lei determina que a autoridade competente para a aprovação (ordenador de despesa) do processo de contratação pública somente poderá revogar a licitação por razões de interesse público decorrente de fato superveniente devidamente comprovado, pertinente e suficiente para justificar tal conduta, devendo anulá-la por ilegalidade, de ofício ou por provocação de terceiros, mediante parecer escrito e devidamente fundamentado. No que concerne à anulação, está ocorrerá por motivo de ilegalidade. Geralmente, em razão dos efeitos da anulação, não se pode falar em obrigação de indenizar terceiro. E, a nulidade do processo de contratação induz a anulação do contrato firmado.

Por fim, a responsabilização por atos irregulares ou faltosos. A responsabilização de agente faltoso tem finalidade preventiva geral e repressiva individual. Evitar-se a ocorrência de novas falhas e serve de exemplo aos demais servidores. Não se pode olvidar a reparação do dano ao erário em caso de prejuízo, que é imprescritível.

Importante frisarmos que o conhecimento, pela sociedade, incluindo licitantes, cidadãos, fornecedores e contratados, do que ocorre em termos de inovações legislativas, trabalhos de auditorias, enfim, da maturidade do enfrentamento da fraude e da corrupção, é demasiadamente importante para que esses atores fundamentem suas pretensões, sejam administrativas ou judiciais.

Obviamente que não existe uma fórmula anticorrupção, tendo em vista que parcela dos que se voltam à política da moralidade tem perdido a guerra, tendo em vista que o principal fator está relacionado à índole, à própria moral do agente público e do particular. Isso faz-nos acreditar que a educação primária da moralidade deve ser vista como instrumento propicio à mitigar ocorrências futuras.

Criam-se instrumentos, os mais variados, formais e materiais, como as leis e atos outros normativos; atos materiais imperativos; sanções, procedimentos reparatórios, etc. Todavia, o que se encontra é o aumento da criminalidade governamental – assim considerada qualquer ato ilícito que macule ou lesione um bem jurídico de natureza pública, em sentido formal ou material, por pessoa pública ou particular.

Infelizmente, uma das principais frentes inimigas que favorecem a corrupção é o loteamento dos cargos políticos nas instituições estratégicas de governança. O despreparo é notório. Elegem-se analfabetos e com eles administradores ou gestores incompetentes, como os nomeados para dirigir órgãos, Ministérios, Secretarias, entre outras entidades ou órgãos públicos que desempenham atividades relevantes para a sociedade e possuem largo lastro orçamentário.

Além disso, os que assumem cargos de cúpula, não todos obviamente, pois tem-se excelentes gestores, considerados em sentido técnico e de honestidade, podem estar desempenhando suas atribuições com uma missão sorrateira (refiro-me a uma parcela desses agentes): voltam-se a governança para interesses particulares dos partidos, políticos, servidores e particulares.

Importante! O processo de contratação pública é uma janela de oportunidades para os atos corruptivos. Inclusive, muitos políticos possuem empresas que fornecem bens ou serviços para o Estado em nome de terceiros (laranjas), situação esta imoral, aética e ilícita.

Dessa feita, o rigor ético e moral como pressuposto para a escolha desses dirigentes deve prevalecer sobre as decisões partidárias. Além disso, o desconhecimento técnico desses políticos obsta o desenvolvimento de uma Administração mais eficiente. Importante que tais cargos sejam efetivamente preenchidos por pessoas competentes ética e tecnicamente. Portanto, parte-se a primeira linha de defesa no próprio escrutínio, tendo em vista que os representantes democráticos que criam as leis, que podem seguir um viés de transparência e sanção ou obscuridade e impunidade.

Sob o aspecto da escolha por escrutínio, derivado da representatividade democrática, indispensável maior rigidez das leis quanto à possiblidade de participação passiva ou de elegibilidade de agentes públicos com problemas na justiça relacionados à moral, à probidade e a ética. Exige-se o trânsito em julgado ou decisão em segunda instância, todavia a morosidade intencional ocasiona o que se denomina de extinção de punibilidade. A exigência de confirmações de instâncias, cujos processos são julgados por companheiros, tão somente torna ineficaz a legislação, trazendo às instituições maiores desconfianças morais. O povo não acredita mais em suas instâncias judiciais e administrativas. Querem resultado. Desejam a isonomia na aplicação da lei, sem a separação entre ricos e pobres, poderosos e cidadãos comuns, ideologias ou sexo. Referimo-nos à necessidade da mudança de escolha dos Ministros dos Tribunais Superiores.

A segunda linha que, cronologicamente, pode ser considerada medida anticorrupção, deve ocorrer na porta de entrada de acesso aos cargos e empregos públicos (inciso I do art. 37 da Constituição Federal): maior rigor nos concursos, exigência de melhor qualificação e especialização, gestão de competência conforme a capacidade cognitiva do agente, antecedentes éticos e morais e melhores salários, principalmente para a área meio, pois responsável pelos processos de aquisições.

O concurso é um procedimento, em princípio meritório, que visa a escolha das pessoas mais aptas ao exercício de atribuições necessárias ao Estado e à Administração. Portanto, é um procedimento cujo planejamento se torna indispensável para a escolha dessas pessoas, conforme o cargo, suas atribuições, formação e integridade.

Corolária a essa linha, é a ausência de estudos de necessidade para se evitar o desperdício do dinheiro público em quantidade de servidores e má qualidade na prestação dos serviços. A essa situação deve ser incluído o que hoje se denomina de “mapeamento de competência”.  Conceitualmente, o mapeamento de competências pode ser resumido como o processo de identificação das qualidades técnicas e comportamentais das pessoas para o enquadramento em cargos ou funções que possuam um nexo técnico estreito com a necessidade e a utilidade deste funcionário para o exercício do cargo ou emprego.

No âmbito da Administração Pública, a relação jurídica estatutária com os servidores efetivos é demasiadamente precária sob esse aspecto: a da formação do servidor com o seu enquadramento nas competências do órgão.

Em verdade, há percentual significativo de descompasso entre a formação e as qualidades profissionais do agente público com as atribuições que desempenha. Consequência: ineficiência, erros e antieconomicidade. Muitos erros ou irregularidade derivam diretamente dessa falha na distribuição de competências ou segregação de funções, principalmente no âmbito dos processos de contratação.

Portanto, vemos como primeiro ponto essa necessidade de um estudo planejado ou mapeado de competências na Administração conforme a necessidade. Trata-se de um instrumento que revelará a necessidade, a quantidade de servidores indispensáveis ao atendimento da demanda e dará celeridade aos processos de atendimento. Além disso, a certeza de eficiência e conhecimento possui importante função: a certeza, pelo servidor, do que está fazendo, exercendo um autocontrole de sua própria competência, excluindo erros ou mesmo argumentos de que não teria competência técnica para o exercício de dada atribuição. Significa que a responsabilização seria melhor direcionada, excluindo da cadeia de responsabilidade pessoas que desconhecem a técnica ou assinaram com base em critério de confiança cognitiva.

O principal prejudicado pela corrupção é o povo, detentor do Poder Constituinte Originário, do qual emana a soberania popular. Serviços públicos ineficientes, aumento de tributos, falência de milhares de empresas e, por fim, o desemprego. São os resultados da má gestão, da corrupção volitiva e finalística. Com o desemprego, o aumento da dependência assistencial do Estado e da violência.  

Alhures referido, no Brasil, a corrupção é sistêmica e, para nós, deriva da própria Administração, tendo vista ser a ordenadora das despesas e gestora dos contratos e da descentralização de determinadas atribuições que, ao nosso ver, deveriam ser de responsabilidade unicamente privada.  

Administrativamente, a desburocratização, a transparência, a integridade, o controle interno de gestão, a gestão eficaz de competência, a gestão de riscos, a responsabilização, a compliance, a accountability e o planejamento são instrumentos de mitigação de ocorrências, logo, instrumentos fundamentais para óbices corruptivos. São institutos utilizados no âmbito da Administração e norteiam a atividade dos órgãos de controle.

Entretanto, o excesso de subdivisões e atos normativos para respaldar os atos administrativos, transformam o controle em formalidades que, ao final, não surte o efeito esperado, tendo em vista que, pela experiência, o martelo permanece batendo no mesmo prego: por mais que os órgãos de controle recomendem, punam, os atores administrativos continuam “errando”.

Como o processo de contratação pública é um processo de natureza administrativa, portanto, instrumental, todos esses institutos são a ele aplicáveis. Já nos referimos que o planejamento da contratação é a principal fase do certame, tendo em visa que é a etapa que planta a semente da moralidade e dos traçejos a serem seguidos pela Administração e pelos interessados no curso do progresso do procedimento.

Não se pode olvidar que a primeira lei geral traçou os princípios e as principais diretrizes que norteiam o devido processo licitatório, incluindo vedações aos agentes públicos. Assim, a licitação, primariamente, se destina a garantir a observância do princípio constitucional da isonomia, a seleção da proposta mais vantajosa e a promoção do desenvolvimento nacional sustentável, devendo ser processada e julgada em estrita conformidade com os princípios básicos da legalidade, impessoalidade, moralidade, igualdade, publicidade, probidade, vinculação ao instrumento convocatório e julgamento objetivo das propostas.

Percebamos que todos esses princípios acabam por corroborar os principais institutos dos sistemas de controle, pois se relacionam, em última instância, à economicidade, honestidade, isonomia, prestação de contas e responsabilidade.

No que concerne à responsabilidade, a lei geral veda aos agentes públicos – orientações anticorruptivas administrativas – a admissão, a previsão, a inclusão, a tolerância nos atos convocatórios de cláusulas que restrinjam ou frustrem o seu caráter competitivo.

Todos esses institutos, valores e princípios norteiam as atividades dos órgãos de controle no combate à corrupção em forma de auditorias, recomendações, penalidades e orientações.

Criticamos, como referimos, os excessos de teorias e classificações dos órgãos de controle para mitigar erros e nortear a boa administração, sendo que poucos valores ou fins já seriam suficientes para tracejar a verdadeira finalidade da decência nos processos de contratação e em todas as atuações administrativas.

No processo de contratação é preciso desburocratizar. O excesso de formalidades ou mesmo a avalanche legislativa subverte as intenções, obscurecendo o certame, produzindo efeito contrário, que reflete nos critérios de habilitação, na isonomia e na competividade dos interessados. Essas obscuridades podem servir de fundamentos para atos impugnativos, de esclarecimentos ou mesmo de medidas judiciais tomadas por parte dos interessados com a o intuito de rechaçar tais irregularidades. A desburocratização é corolária da transparência e da publicidade. Como elemento subjetivo de planejamento e atuação, a integridade.

Verificamos que a corrupção nos processos de contratação pública se posiciona de forma articulada, uma forma de mecanismo bem trabalhado que, em muitos casos, inviabiliza até mesmo a atuação dos órgãos internos e externos de controle.

Quando o agente público se inclui no conluio  (fraude ou corrupção) é possível, por exemplo, que inclua nos Editais determinados requisitos habilitatórios que tenha por finalidade restringir a competitividade, direcionando o certame; podem, ainda, transacionarem extraprocessualmente, determinando cartas marcadas, abrindo mão de dado certame para vencer outro (relação de conluio entre as empresas);  outra situação comum é o conluio de empresas quando duas ou mais se aventuram para, posteriormente, sabedoras que serão desabilitadas, direcionam a uma outra a certeza da vitória. Ainda, interpõem recursos com o conhecimento do agente competente com o intuito de desclassificar a empresa que melhor apresentou a propostas, às vezes com argumentos sem o nexo devido. Enfim, a tecnologia ou o mecanismo corruptivo é variado, de diversas naturezas, ângulos e fundamentos.

Nosso posicionamento é o de que a corrupção pública somente existe se assim permitir o Governo ou a Administração, pois é uma porta que se abre por dentro. Dessa forma, achamos tendenciosa a Lei nº 12.846, de 1º de agosto de 2013, pois, não sei se a hermenêutica é pessoal, mas entendemos que a finalidade foi dizer o contrário, ou seja: os agentes públicos somente desviam de seus afazeres em razão das pessoas jurídicas que oferecerem vantagens.

A Lei Anticorrupção, assim, dispôs sobre a responsabilização administrativa e civil de pessoas jurídicas pela prática de atos contra a administração pública. Interessante salientarmos que, enquanto a responsabilidade do agente público é subjetiva, onde se deve comprovar veementemente o dolo ou a culpa, o art. 1º da lei referida dispõe que a responsabilização administrativa e civil de pessoas jurídicas é objetiva. O que alivia a tendenciosidade é a indispensabilidade de que os atos praticados por ela sejam contra a administração, o que, em verdade, pode trazer um ponto de fusão com a responsabilidade subjetiva, tendo em vista que a direção do ato corruptivo contra alguém indica dolo específico. O art. 3º determina que a responsabilização da pessoa jurídica não exclui a responsabilidade individual de seus dirigentes ou administradores ou de qualquer pessoa natural, coautora ou partícipe do ato ilícito.

Tratando-se de processo de contratação pública – Devido Processo Licitatório – os atos lesivos, conforme as alíneas do inciso IV do art. 5º da Lei, tais atos se resumem em: a) frustrar ou fraudar, mediante ajuste, combinação ou qualquer outro expediente, o caráter competitivo de procedimento licitatório público; b) impedir, perturbar ou fraudar a realização de qualquer ato de procedimento licitatório público; c) afastar ou procurar afastar licitante, por meio de fraude ou oferecimento de vantagem de qualquer tipo; d) fraudar licitação pública ou contrato dela decorrente; e) criar, de modo fraudulento ou irregular, pessoa jurídica para participar de licitação pública ou celebrar contrato administrativo; f) obter vantagem ou benefício indevido, de modo fraudulento, de modificações ou prorrogações de contratos celebrados com a administração pública, sem autorização em lei, no ato convocatório da licitação pública ou nos respectivos instrumentos contratuais; g) manipular ou fraudar o equilíbrio econômico-financeiro dos contratos celebrados com a administração pública.

Todo processo de contratação pública tem início com a necessidade de aquisição de bens ou de prestação de serviços. O setor demandante realiza juízo valorativo de indispensabilidade que deverá ser bem fundamentado. O documento inicial, denominado “demanda” ou “documento de oficialização de demanda” deve vir munido dos fundamentos fáticos e jurídicos da necessidade, da licitude do objeto, quantidade e qualidade, preço estimado. Referindo-se à bens e serviços comuns a modalidade licitatória utilizada é o pregão, independentemente da complexidade ou do valor estimado da contratação. Trata-se um critério qualitativo. O ordenador de despesa exercerá fiscalização sobre a estimativa, quantidade e licitude do objeto, além pois dos fundamentos relacionados aos estudos preliminares e gerenciamento de riscos, que são instrumentos de controle e eficácia no processo de contratação.

O importante no âmbito do processo de contratação é a determinação de uma cultura de integridade que deve ter início no emanador do ato, pois consciente de suas competências e limites. Essa gestão de autocontrole principia e cultiva por osmose, e no curso do tempo, que tal controle deve fazer parte da competência do agente. Trata-se um instrumento de prevenção e de aperfeiçoamento de pessoal. Reduziria em demasia a inconsistências. Além disso, o trabalho do superior hierarquia também deveria se pautar nessa reanálise de legalidade de proporcionalidade dos atos. Essa cultura de determinação de graus de controle interno de gestão seria demasiadamente importante para se filtrar inconsistências.

Reparamos que, apesar do constante trabalho de auditoria dos órgãos de controle, as recomendações e as determinações são muito assemelhadas. Evidencia que a gestão de risco não tem sido realizada ou mesmo não tem gerado o efeito esperado. Apesar dos erros operacionais, tal fato poderá, inclusive, indicar má fé, ou dolo no proceder ilícito, o que caracteriza como forma de corrupção.

Além do procedimento, da operacionalidade desencadeada pelos fluxos e ritos dos processos, os órgãos de controle têm se preocupado com o elemento volitivo do agente propulsor do ato. O dolo e a culpa devem ser analisados, como instrumentos de culpabilidade e responsabilização. Dessa feita, esse papel dos órgãos de controle tem abarcado a sua competência para os demais órgãos, de outras naturezas, possam dar início às suas finalidades com um mínimo de elemento probatório – independência de instâncias.  

Veremos, em capítulo próprio, os principais problemas, se assim podemos dizer, que ocorrem nos processos de contratação pública, incluindo o fluxo, a volitividade, a desproporcionalidade, bem como os meios e métodos externos que ocorrem nas praxes empresariais para, de algum modo, burlar os certames.  Percebamos que as fraudes e a corrupção podem ocorrer de ambos os lados, Administração e interessados particulares, relação bilateral negativa. Todavia, sempre apontaremos que as chaves que abrem as portas da corrupção indiscutivelmente pertencem ao Estado, pois responsável pela atividade financeira, a arrecadação e as despesas.

 

As políticas e planos governamentais como instrumentos anticorruptivos

Referimo-nos ser demasiadamente burocrático o fato de subdividir em dezenas de ações e diretrizes os objetivos da Administração, tendo em vista que a morosidade de criação ou o excesso de pormenores de cada conceito, ao invés de corroborar, obstam a substancialidade dos objetivos que se resumem, como alhures referido, na honestidade, desburocratização, economicidade e bom senso nas decisões e atos, nos limites da competência.

A Administração, incluindo os órgãos de controle, possui boas intenções para a melhoria da eficiência dos gastos públicos. Cria instrumentos legais e substanciais para o aprimoramento da máquina pública sob o aspecto financeiro, operacional, contábil e de integridade.

Os atos normativos podem ser fontes formais para a criação de “Planos”, ou, em razão dos resultados desses podem ser modernizados, conforme a própria evolução das necessidades públicas.

Fala-se em planos de gestão, de governo, de integridade, de governança, de gestão de riscos, dentre outros instrumentos nomeados para direcionar a forma como as atribuições serão exercidas pelos agentes públicos, em prol da boa governança.

O denominado “Plano de Integridade”, por exemplo, para nós, sob o aspecto negativo, é uma forma de burocratizar esses fins, pois a integridade faz parte da própria consciência, da volitividade e dos fins que cada agente deve conhecer para o exercício de suas competências. A integridade deve ser dinâmica, cotidiana e fazer parte dos atos proferidos por todos os administradores públicos (forma de autocontrole subjetivo).

Os planos de governança e planos estratégicos também são instrumentos direcionadores, todavia, sempre estarão ou deverão estar condizentes com os fins aos quais as organizações foram instituídas. Dessa forma, essas estruturas finalísticas criadas, com objetivos específicos e próprios são didaticamente importantes, mas arraiga-los na mente ou no subconsciente dos agentes públicos que possuem vícios de índole é um trabalho árduo e moroso. Importante que esses vieses da boa administração tenham o ideal da desburocratização, mitigando a complexidade que sempre depositam ou circundam os conceitos.  

As frentes de combate devem partir de uma legislação que tenha como principal fundamento de constituição os valores éticos e morais que devem estar arraigados nos seres humanos desde do seio familiar. A lei tem a finalidade de modelar condutas, apaziguar as relações sociais e estabelecer formas de proceder, tutelando determinados bens.

 Dispor sobre um ‘Plano” movimenta toda uma máquina pública, órgãos, entidades, pessoas, objetivos, regras; ou seja, apenas burocratiza, com a avalanche legislativa e, ao final, a essência pertencente à moralização não é atingida, pois, preterem a forma ao fundo, ou seja, o cunho objetivo ao elemento subjetivo da conduta.

Para um plano de integridade é indispensável a existência de um órgão, que os órgãos de controle denominam de Unidade de Gestão da Integridade. Em verdade, não seria necessário um órgão para tanto, pois muitos são os órgãos de controle. A integridade deveria ser um adjetivo da competência. Afinal, não é obrigação, mas é um dever, inerente à própria atividade pública. Não é nenhum benefício ser honesto, é um adjetivo que deve ser inerente a todos e a própria competência do agente público.

Em caso da necessidade indispensável de um órgão, competirá a este coordenar, estruturar e monitorar os fins que visa. Isso poderia ser feito por cada servidor, ordenador, coordenador, gestor, como inerente à competência sem a necessidade um órgão. Os órgãos de controle devem possuir a integridade em seu âmbito de ação.

 Podemos incluir entre os fins: capacitações, orientações, expedição de atos normativos orientadores etc. Assim, os órgãos superiores, geralmente Ministérios ou Secretarias descentralizarão a competência referida a um setor já existente por meio de Portaria. Ressaltamos que, conforme a Constituição, somente por lei se pode criar órgãos. Dessa forma, leis infralegais podem distribuir competências inter-relacionadas. Essa descentralização já deve estar fundamentada num plano de integridade. Interessante que os órgãos de controle devem ser cientificados dessa designação, tendo em vista que facilitará as relações.

 Mantemos o nosso posicionamento de que a maioria das diretrizes e valores são inerentes ao subjetivismo, não necessitando a Administração criar órgãos ou distribuir competências, tendo em vista que são deveres dos agentes e não obrigações. Além disso, órgãos de controle interno e externo são criados para esses fins, sem os quais não haveriam razão de existir. Cabe-lhes referenciar a Administração.

O Plano de Integridade deveria ser tão somente formalizado em normativos simples e desburocratizados, abertos e transparentes, para que os organismos pudessem imbuir na praxe a integridade, sem a necessidade da realização de bruscas transformações orgânicas e de competências. Todavia, o art. 19 do Decreto nº 9.203, de 22 de novembro de 2017, dispôs que os órgãos e as entidades da administração direta, autárquica e fundacional instituirão programa de integridade, com o objetivo de promover a adoção de medidas e ações institucionais destinadas à prevenção, detecção, à punição e à remediação de fraudes e atos de corrupção, estruturado nos seguintes eixos (que não precisariam estar expressos, mas relacionados diretamente às competências): comprometimento e apoio da alta administração; existência de unidade responsável pela implementação no órgão ou na entidade;  análise, avaliação e gestão dos riscos associados ao tema da integridade; e  monitoramento contínuo dos atributos do programa de integridade.

Apesar de nosso posicionamento, o controle da fraude e da corrupção tem sido objeto de grande desenvolvimento, tendo por precursores os órgãos de controle e os órgãos de persecução penal. Entendemos que a governança deve ser vista em um sentido mais objetivo, com traçados devidamente delimitados para que as competências sejam exercidas e direcionadas em um único sentido.

O Decreto nº 9.203/17, de 22 de novembro de 2017, que dispõe sobre a política de governança da administração pública federal, direta, autárquica e fundacional. Não se aplica, portanto, às estatais, que devem dispor sobre tais políticas internamente, pois o regime privado poderá variar.

A integridade é um adjetivo inerente. Sob o aspecto mais abstrato, pode-se citar a governança e o gerenciamento de riscos, cuja normatização ou operacionalidade deve ser regulamentada para que haja dada uniformização.

 

Governança Pública no processo de contratação e corrupção

Entendo a governança como a capacidade e a forma de administrar em um nível mais elevado. A governa é um termo amplo, podendo ser aplicado em qualquer organização que tenha planos e projetos de desenvolvimento. Não seria diferente na Administração pública, dotada de desconcentração e descentralização, objetivos e competências segregadas com a finalidade de cumprir os desideratos da organização.

Importante frisarmos que as necessidades públicas derivam de decisões políticas e tais decisões surgem de juízos valorativos sobre a indispensabilidade perene ou temporária de dado bem ou serviço.

Dessa forma, há nítida relação entre Governança, necessidades públicas e processo de contratação (licitação) e, por fim, a ocorrência de condutas irregulares. Quanto maior o grau hierárquico maior o grau de responsabilidade. Apesar da declaração-regra, importante adentrar na seara das responsabilidades nos aspectos das competências técnicas sem as quais o superior hierárquico não teria embasamento fático para decidir com maior propriedade e certeza, baseado no princípio da confiança funcional.

Nos termos do Decreto nº 9.203/17, de 22 de novembro de 2017, a governança pública é composta por alguns princípios básicos, indispensáveis à sua efetivação: capacidade de resposta, integridade, confiança, transparência, regulamentação e prestação de contas e responsabilidade.

A atividade administrativa é dinâmica, servindo aos fins do Estado estampados na Constituição Federal. Alguns fins são imediatos outros, todavia, pragmáticos. A capacidade de resposta relaciona-se ao imediatismo no atendimento do interesse público, indispensável ao resguardo de determinados direitos e da tutela do próprio patrimônio públicos. Determinados atos administrativos são imperativos, tal qual o ato munido de poder de polícia. O ato que possui essa imperatividade é denominado de poder extroverso.

Muitas reações advindas da administração pública precisam ser rápidas para a salvaguarda desses interesses, é o que ocorre com a suspensão de um processo de contratação quando se está evidente prejuízo, determinações antisonômicas ou contrárias à competividade. A administração poderá revogar o certame ou anulá-lo, total ou parcialmente. Dependerá do grau de extensão da lesividade do ato praticado ou da determinação editalícia. 

Entre as diretrizes da governança pública há a obrigatoriedade de os atos e normas direcionarem as ações para a busca de resultados para a sociedade, encontrando soluções tempestivas e inovadoras para lidar com a limitação de recursos e com as mudanças de prioridades. Essa determinação deve ser esmiuçada, pois efetivamente relacionada à atividade do agente público, sua capacidade resolutiva e proporcional, a economicidade e a finalidade dos processos públicos. Todas essas situações, a depender do ato praticado, podem consolidar irregularidades e, consequentemente, a responsabilização do agente. Tanto poderá haver o dolo corruptivo quanto apenas, e tão somente, o erro. Veja-se que há nexo entre a capacidade de resposta e o direcionamento das ações para a busca de resultados para a sociedade, encontrando soluções tempestivas e inovadoras para lidas com a limitação de recursos e com as mudanças de prioridades.

Esmiuçando, a diretriz de governança referida e aplicando-a aos processos de contratação pública, podemos ressaltar que os atos do processo licitatório deverão estar dirigidos uma finalidade geral: a contratação de bens ou serviços que atenda as necessidades públicas. O resultado buscado é de interesse público, que pode ser resumido no atendimento de dado interesse, geral ou específico, que depende de uma decisão política.

A capacidade de resposta ao público e à proporia Administração também possui relação com os princípios da economicidade e celeridade, que estão pulverizados na promoção e simplificação administrativa, a modernização da gestão pública e a integração dos serviços públicos. Trata-se da desburocratização com eficiência e segurança jurídica. Demasiadamente importante, a capacidade de resposta às necessidades públicas nos processos de contratação, tendo em vista que muitos bens e serviços a serem adquiridos são essenciais e necessários ao funcionamento da Administração e ao interesse dos administrados, que são por eles beneficiados direta ou indiretamente.

Alhures, referimo-nos ao monitoramento como instrumento de contenção de irregularidades. Aqui, no sentido operacional, a governança possui a finalidade, como o monitoramento de melhor o desempenho e a avaliação dos resultados das políticas e das ações prioritária para assegurar que as diretrizes estratégicas sejam observadas.

A integração entre órgãos e entidades é essencial à boa governança. Dessa feita a alta administração deve se valer de instrumentos de agregação tendo em vista a interdisciplinaridade existente e as finalidades visadas pelos atos de controle e fiscalização.  Dessa forma, abrange a governança a articulação das instituições e a coordenação dos processos para melhorar a integração entre os diferentes níveis e esferas do setor público, com vistas a gerar, preservar e entregar valor público.

Relacionada à integridade, como instrumento de moralidade administrativa, a governança abrange a incorporação de padrões de conduta para orientar comportamentos em consonância com as funções e as atribuições de seus órgãos e de suas entidades.  Busca-se relacionar a integridade e a boa conduta com a competência, afinal as condutas podem ser diversificadas conforme as atribuições do cargo ou função, por isso a necessidade dessa tipificação especifica. Há comportamentos que são padrões e gerais, outros, todavia, ante as atribuições do cargo, são específicos.

Retomando a questão da prevenção, liga-se intimamente ao controle interno, ao monitoramento, à confecção de normas preventivas e gestão de riscos. A gestão de riscos, para nós, é uma fonte substancial para a criação da operacionalidade e de normas para combate os riscos. Assim, a alta administração deverá implementar

controles internos fundamentados na gestão de risco, que privilegiará ações estratégicas de prevenção antes de processos sancionadores. A gestão de riscos não somente fundamentará o controle, mas todos os processos e procedimentos administrativos, inclusive, é considerado como competência permanente no processo de contratação pública.

O Decreto nº 9.203/17 dispõe no art. 5º os “mecanismos” para o exercício da governança pública: a) liderança: integridade; competência; responsabilidade e motivação; b) estratégia e; c) controle.

Nos termos do decreto, a liderança compreende conjunto de práticas de natureza humana ou comportamental exercida nos principais cargos das organizações, para assegurar a existência das condições mínimas para o exercício da boa governança, elencando, posteriormente a integridade; competência; responsabilidade e motivação.

A estratégia, compreende a definição de diretrizes, objetivos, planos e ações, além de critérios de priorização e alinhamento entre organizações e partes interessadas, para que os serviços e produtos de responsabilidade da organização alcancem o resultado pretendido. 

O controle compreende processos estruturados para mitigar os possíveis riscos com vistas ao alcance dos objetivos institucionais e para garantir a execução ordenada, ética, econômica, eficiente e eficaz das atividades da organização, com preservação da legalidade e da economicidade no dispêndio de recursos públicos.

 

A prevenção como instrumento de combate à corrupção nos processos de contratação pública

A prevenção, sob o aspecto aqui estudado, é a cautela, o cuidado a diligência, a previdência que deve nortear as atividades públicas com o fito de mitigar os riscos de irregularidades no curso do processo de contratação pública e na fase de execução do contrato.

As fontes substanciais, que resultam nas medidas de prevenção, podem ser notórias. Quando assim, a lei determina de pronto as linhas que devem ser observadas previamente, pois inegável e indiscutível que determinas providências sejam essenciais para acautelar possíveis desvios ou danos ao erário. Podemos exemplificar a exigência dos preços compatíveis com os de mercado. Obviamente, se a Administração contratar com preços bem acima dos de mercado estar-se-á diante de um possível superfaturamento, logo de indício de fraude ou mesmo corrupção no certame. Essa questão, por ser objetiva, vista de pronto, pode ser evitada com o atendimento das regras de pesquisas de mercado, que são previamente determinadas pela lei e atos normativos. 

 Entretanto, a prevenção poderá advir da praxe, principalmente da gestão de risco, que serve como fonte substancial. Nesse último caso, os riscos, as irregularidades e danos vão sendo conhecidos com o tempo, com a praxe, e com a própria falha na fiscalização.

A Administração busca evitar tais erros, dispondo sobre suas ocorrências e orientando os administradores para que sejam prudentes e precavidos. Essas orientações não são exigidas aleatoriamente. Pode-se afirmar que o gerenciamento de riscos, por exemplo, traceja instrumentos formais e materiais de combate à fraude e a corrupção, não somente no processo de contratação pública, mas em todos os processos e procedimentos que manuseiam atividades públicas prestativas que podem ou não ocasionar prejuízos ao erário, a terceiros ou mesmo administrados.

A prevenção faz com que se criem medidas de premeditação, que antecipam desvios e prejuízos, tendo por consequência a devida orientação, sob pena de responsabilidade, em caso de omissão do atendimento. Entretanto, a dinâmica administrativa respalda o administrador, no sentido de ter tomado a melhor providência ante um caso concreto específico, mesmo fugindo de alguns padrões determinados pelos órgãos de controle.

A prevenção é um termo bastante extenso e pode ser analisado, definido ou conceituado por vários ângulos apesar da essência comum. Perfaz-se pelo teor de uma lei ou de outro ato normativo, por normas operacionais de execução, por atos substanciais ou executivos de autovigilância. O agente público deve conduzir as suas atribuições da melhor maneira possível, como um piloto que guia manualmente a sua aeronave, onde qualquer erro poderá ser fatal. Esta deve ser a noção de autovigilância da própria atribuição ou competência.

No processo de contratação pública, desde do seu início material, com o pedido de demanda, o agente que grafou sua assinatura na solicitação deve estar cientificado de suas atribuições, deve conhecer o objeto da contratação, pois referido setor será o responsável pela elaboração do Termo de Referência. Ante a peculiaridade de cada órgão ou entidade, acreditamos que a padronização específica poderá colidir com os fins institucionais do órgão ou entidade. Por isso que, as fiscalizações devem estar cientes que não bastam diretrizes de auditoria, importante que o auditor ou fiscal interno ou externo saibam enquadrar as exigências conforme cada caso, com observância do material pessoal, cognitivo, técnico e, principalmente o aspecto subjetivo-volitivo, ou seja, a intenção dos agentes públicos responsáveis. Infelizmente, é sabido que a maioria dos responsáveis pela elaboração termos de referência simplesmente extraem o documento por meio do “copiar e colar” e muitas vezes não se relaciona com a verdadeira necessidade do órgão.

Dessa feita, o órgão demandante deve possuir um bom conhecimento do bem ou do serviço que pretende adquirir para assessorar o exercício de suas competências. Não podemos esquecer que os empresários (o termo empresa significa atividade de produção e circulação de bens ou serviços) possuem conhecimento técnico sobre a sua atividade empresarial superior à administração. Tal falto enseja o acautelamento da administração, pois esta corre o risco de tecer termos de referência, contratos e editais que não estão totalmente de acordo com a própria atividade empresarial.

A Instrução Normativa nº 05/2017 do Ministério do Planejamento frisa a importância do conhecimento e própria inclusão das leis e atos normativos que tratem especificamente do objeto da contratação para a elaboração dos documentos componentes do Edital. Trata-se de uma medida preventiva. Além disso confirme a ideais a de que o Edital funde uma série de leis e normas de natureza pública e privada.

Retomando, no processo de contratação pública, como instrumento de dispêndio orçamentário, é indispensável a adoção de medidas preventivas anticorruptivas. Tais medidas serão operacionalizadas por meio de leis, procedimentos, fiscalizações, autovigilância, busca do conhecimento por parte do agente público, além, pois, da adoção de medidas prévias obstativas de futuros prejuízos.

No mais, veremos o labor dos órgãos de controle nos trabalhos de auditoria, as matrizes que ensejam as análises, as faltas da Administração e dos seus agentes públicos, a necessidade da mudança na postura cultural da ética administrativa, da gestão e controle interno, e, por fim a indispensabilidade da adoção de medidas que se enquadrem no conceito de compliance.

Sobre o autor
David Augusto Souza Lopes Frota

DAVID AUGUSTO SOUZA LOPES FROTA Advogado. Servidor Público Federal. Pós-graduado em Direito Tributário. Pós-graduado em Direito Processual. Especialista em Direito Administrativo. Especialista em Licitações Públicas. Especialista em Servidores Públicos. Foi analista da Diretoria de Reconhecimento Inicial de Direitos – INSS – Direito Previdenciário. Foi analista da Corregedoria Geral do INSS – assessoria jurídica e elaboração de pareceres em Processos Administrativos Disciplinares - PAD. Foi Analista da Diretoria de Recursos Humanos do INSS - Assessor Jurídico da Coordenação de Recursos Humanos do Ministério da Previdência Social – Lei nº 8.112/90. Chefe do Setor de Fraudes Previdenciárias – Inteligência previdenciária em parceria com o Departamento de Polícia Federal. Ex-membro do ENCCLA - Estratégia Nacional de Combate a Corrupção e à Lavagem de Dinheiro do Ministério da Justiça. Convidado para ser Conselheiro do Conselho de Recursos da Previdência Social - CRPS. Convidados para atuação junto ao Grupo Responsável pela Consolidação dos Decretos Federais da Presidência da República. Assessor da Coordenação Geral de Recursos Logísticos e Serviços Gerais do MPS - COGRL. Elaboração de Minutas de Contratos Administrativos. Elaboração de Termos de Referência. Pregoeiro. Equipe de Apoio. Análise das demandas de controle interno e externo do MPS. Análise das demandas de Controle Interno e Externo do Ministério da Fazenda - SPOA. Assessor da Coordenação Geral do Logística do Ministério da Fazenda - CGLOG – SPOA. Assessor da Superintendência do Ministério da Fazenda no Distrito Federal - SMF-DF. Membro Titular de Conselho na Secretaria de Direitos Humanos para julgamento de Processos. SEDH. Curso de Inteligência na Agência Brasileira de Inteligência - ABIN. Consultoria e Advocacia para prefeitos e demais agentes políticos. Colaborador das Revistas Zênite, Governet, Síntese Jurídica, Plenus. Coautor de 3 livros intitulados "O DEVIDO PROCESSO LICITATÓRIO" tecido em 3 volumes pela editora Lumen Juris.

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