Anotações sobre a dação em pagamento, a assunção e a cessão de crédito

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30/11/2018 às 20:21

Resumo:


  • A dação em pagamento é um meio de extinção de uma obrigação no qual o devedor entrega ao credor algo diferente do que foi originalmente pactuado, mas que é aceito como forma de pagamento.

  • A assunção de dívida envolve a substituição do devedor original por um terceiro, que assume a obrigação de pagar a dívida existente com o consentimento do credor.

  • A cessão de crédito ocorre quando um credor transfere seu direito de crédito a um terceiro, que passa a ter o direito de cobrar a dívida do devedor original.

Resumo criado por JUSTICIA, o assistente de inteligência artificial do Jus.

9. O USUFRUTO COM FIM DE GARANTIA

A noção de garantia é estranha ao usufruto. Se a quem tem direito real de garantia se outorgou uso e fruição sobre o imóvel, o instituto, que se configura é o da anticrese.

A anticrese é transmissível entre vivos e a causa de morte; o usufruto não o é.

Para Pontes de Miranda (obra citada, pág. 283) fala-se no usufruto com fim de garantia (usufruto de segurança).

O usufruto fiduciário não é um usufruto sucessivo.

O usufruto sucessivo é o usufruto posterior a outro usufruto. Admitido que a outorga de usufruto se possa fazer com cláusula sucessiva (termo ou condição), o usufruto sucessivo é o usufruto que somente se inicia com o advento da condição ou termo depois de ter extinguido usufruto que o precedia.

Trata-se de um usufruto sob condição inicial ou sob termo inicial, se outro usufruto há. O usufruto que há, como ensinou Pontes de Miranda (Tratado de direito privado, volume XII, pág. 209), ou usufruto precedente, tem de extinguir-se para que possa iniciar-se outro.

A constituição de usufruto por parte de nu-proprietário, como por parte do dono do prédio enfitêutico, é constituição a termo inicial ou condição inicial, que se estabelece com a extinção do usufruto ou da enfiteuse.

O usufruto fiduciário não oferece qualquer particularidade em relação às outras fidúcias. A propriedade, finda a fiduciação, consolida-se.

Pode haver fidúcia, sem haver garantia ou segurança, como pode haver garantia ou segurança, sem haver fidúcia. O que é essencial ao usufruto de segurança, como revelou Pontes de Miranda, é que haja a causa solvendi. O usufruto com que se solveu, o usufruto pelo qual se deu em soluto, não é usufruto de segurança: foi apenas o objeto da datio in solutum.

A dação em pagamento (datio in solutum) não deve ser confundida com a dação "pro solvendo", que não extingue a obrigação, mas apenas facilita o seu cumprimento. A dação pro solvendo ocorre na dação de um crédito sem extinção da dívida originária, que, ao contrário, é conservada, suspensa ou enfraquecida. Havendo datio pro solvendo, a dívida primitiva só se extingue ao ser paga a nova.

Trata-se de forma de pagamento especial em que se dá coisa diversa do dinheiro para cumprimento da obrigação.

Se foi dado em soluto usufruto, a morte prematura do usufrutuário importa em que o valor dado foi inferior ao débito, mas não há pensar-se em haver resto da dívida. A dação em soluto extinguirá a dívida. Se foi dado usufruto, em segurança, a morte prematura deixa o devedor a dever o resto. Isto é, o que não foi solvido pelo exercício do usufruto.

O usufruto fiduciário e o usufruto com fim de garantia não são inconfiguráveis.

No ensinamento de Pontes de Miranda (obra citada), o usufruto fiduciário não oferece qualquer particularidade em relação às outras fidúcias, mas não é usufruto sucessivo. A propriedade, finda a fiduciação, consolida-se. É o que os alemães chamavam de fenômeno de elasticidade da propriedade, como expôs o ministro Moreira Alves (Da alienação fiduciária em garantia).

G. Plank (Kommentar, III, 600; Schneider, dentre outros) estiveram contra o usufruto com fins de garantia.

Pontes de Miranda, na linha de Goldmann, K.Kober, entendeu o instituto perfeitamente construível no direito brasileiro e no direito alemão. Pode ser combinado ou não com a hipoteca. Ainda que se trate de garantia sobre o imóvel em que se já se tem a anticrese.

Ou na constituição do usufruto: a) se determina que ele termina, com a extinção da dívida que ele garante, ou se lhe deu outro prazo; b) maior ou ; c) menor, e então ele subsiste ou acaba antes de se extinguir a dívida.

O usufruto de segurança tem implícito termo final que é o da data da solução do débito. Dívida solvida, extinto o usufruto de segurança. Ou se deu valor ao tempo do exercício, de modo que a cada período corresponde prestação periódica, ou parcela da dívida; ou se fez o valor do uso e da fruição dependente de aplicação de algum critério estimativo.

O usufrutuário de segurança não pode executar a dívida enquanto está no exercício do usufruto. Está a pagar-se do crédito. Se o dono do bem dado em usufruto de segurança turba ou esbulha a posse do usufrutuário da segurança, ou lhe ofende o direito real de usufruto, competem-lhe as ações adequadas. A ação de turbação - manutenção (mandamental), a de esbulho-reintegração (executiva) e a de natureza preventiva (mandamental e preventiva).

O negócio jurídico básico não influi no usufruto de segurança se não lhe imprimiu, através do ato de constituição, alguma cláusula que seja compatível com o direito real de usufruto.

Não são atingidos com a constituição do usufruto de segurança, os direitos dos credores preferentes por direito real de garantia. Como disse Pontes de Miranda, nem tal constituição impede que os créditos posteriores, por direito real, exerçam pretensões oriundas da insolvência do devedor.

A constituição fiduciária do usufruto pode ocorrer no mesmo caso em que ocorre a transmissão fiduciária do domínio, como afirmou Pontes de Miranda (Tratado de direito privado, volume XIX, ed. Bookseller, pág. 285). Extingue-se ele quando se extinguiria a propriedade para o dono fiduciário, se fosse caso de domínio.

O usufruto de segurança extingue-se: pela morte do usufrutuário; pelo termo de sua duração; pela cessação da causa em que se origina; pela consolidação, a partir da data do cancelamento; pela prescrição da ação do usufrutuário; pela culpa do usufrutuário, quando aliena, deteriora ou deixa arruinarem-se os bens.

A morte do usufrutuário extingue o usufruto de segurança.


10. A VENDA COM RESERVA DE DOMÍNIO

São distintas a transmissão da propriedade em segurança e venda com domínio reservado.

Na transmissão da propriedade em segurança, o domínio passa ao outorgado; na venda com reserva de domínio, não. Nesta, a propriedade ainda não foi adquirida; está suspensa a aquisição. O que passou ao outorgado não é domínio, nem passou apenas o direito da obrigação; passou o direito ao uso e à posse, passou direito expectativo. É isso o que se penhora. A coisa vai a leilão, é penhorada, porque está na esfera do dono e na esfera jurídica do outorgado da venda com reserva de domínio. A venda com reserva de domínio é venda, com entrega da coisa e direito expectativo à aquisição.

A expectativa de direito consiste em um direito que se encontra na iminência de ocorrer, mas que não produz os efeitos do direito adquirido, pois não foram cumpridos todos os requisitos exigidos por lei. A pessoa tem apenas uma expectativa de ocorrer. Nesses casos as novas regras podem incidir. É um direito sujeito à condição.

Já o direito expectado é aquele que já preencheu todos os requisitos para sua aquisição, mas, por discricionariedade, ainda não foi exercido.

Na compra com reserva de domínio, com o advento da condição, não mais se exige qualquer ato ou manifestação de vontade do vendedor. Por isso mesmo, não se transferiu a propriedade, o bem é do vendedor e sujeita-se à falência desse, mas se entenda que o comprador, em tal espécie já tem algo de execução do contrato de compra e venda e certa eficácia do acordo de transmissão, como ensinou Pontes de Miranda (obra citada, tomo 21, pág. 385).

Quando o vendedor da coisa móvel se reserva a propriedade até se lhe pagar o preço, ou todo o preço, o que se há de entender é que o acordo transmissão é sob condição suspensiva.

M as, se há a transmissão da propriedade em segurança e se atribui ao adquirente a posse imediata, tem ele a propriedade e posse.

A transmissão da propriedade mobiliária válida e eficaz persiste ainda que o pacto subjacente (de segurança) não o seja.

Mas, se para o que tem de garantir dívida sua ou de outrem há conveniência em que lhe fique a posse imediata, os caminhos que tem, conforme ensinou Pontes de Miranda (obra citada, volume 21, pág. 389), são os de empenhar sem transmissão da posse imediata, e o de transferir a propriedade sem a posse imediata. Nesse caso, a transmissão da propriedade é em segurança, mas incondicional (no plano do direito das coisas, porque só aí é que se pode falar em transmissão da propriedade). O credor é obrigado a retransferir a propriedade do bem ao ver solvida a dívida, ou extinta por outra causa (condição suspensiva). Na propriedade resolúvel, a reversão é automática: a pretensão é a ação de restituição são reais.

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No que concerne à transmissão de propriedade mobiliária, Pontes de Miranda (obra citada, tomo 21, pág. 390) advertiu que todo acordo de transmissão, trata-se de propriedade sobre bens móveis, é negócio abstrato. A transmissão poderia ser de propriedade resolúvel, com a condição (resolutiva) do pagamento da dívida, mas, em tal espécie, não haveria a transmissão da propriedade em segurança.

Como negócio jurídico, nos direitos das obrigações, incidem as causas de nulidade e anulabilidade do Código Civil, incidindo, outrossim, as causas de ineficácia e invalidade que já ocorriam na falência.


11. NEGOCIO JURÍDICO INDIRETO

Diferente do negócio fiduciário, segundo a construção romana ou a de Dernburg, é o negócio jurídico indireto em sentido estrito, como ensinou o ministro Moreira Alves (A retrovenda, segunda edição, pág. 8). Este se dá quando as partes recorrem a um negócio jurídico típico, sujeitando-o à sua disciplina formal e substancial para alcançar um fim prático ulterior (o escopo da garantia que é motivo e não a causa), o qual não é normalmente atingido por meio desse negócio.

No negócio jurídico indireto, em sentido estrito, as partes querem que ele produza todas as suas consequências jurídicas, mas para atingirem escopo que não se coaduna a essas consequências, não havendo, entretanto, como ocorre no negócio juridico (segundo a construção romana ou a devida por Dernburg), questão de plus ou de minus entre as finalidades jurídica e econômica. No negócio fiduciário, sua finalidade é mais restrita do que a do negócio jurídico adotado, ao passo que, como revelou o ministro Moreira Alves, o negócio jurídico indireto em sentido estrito, é ela apenas diferente.

O negócio fiduciário se caracteriza principalmente pelo fato de que a relação negocial eleita pelas partes extrapola, em seus efeitos, aqueles desejados por elas. Isso tudo acontece com a consciência de ambas as partes de que existe esse excesso no negócio escolhido para a realização de suas vontades.

Veja-se o negócio jurídico indireto.

Na lição do ministro José Carlos Moreira Alves (Da alienação fiduciária em garantia, 4º edição, pág. 5), "o negócio se diz indireto quando as partes recorrem a um negócio jurídico típico, sujeitando-se à sua disciplina formal e substancial, para alcançar um fim prático ulterior ( o escopo de garantia, que é motivo, e não causa), o qual não é o normalmente atingido por meio desse negócio.Tal é o caso da retrovenda.

Assim, a compra e venda tem como causa a troca de coisa por dinheiro, e, como escopo último (motivo) qualquer utilização da coisa pelo comprador como proprietário; já a compra e venda com o fim de garantia (negócio jurídico indireto) é uma compra e venda (negócio jurídico típico) em que a causa é a desta (troca da coisa por dinheiro), mas em que o escopo último (motivo) não é aquele a que normalmente se visa quando se celebra uma compra e venda (qualquer utilização da coisa pelo comprador como proprietário), mas o de a coisa adquirida servir ao seu proprietário como garantia do pagamento do crédito”.

Há negócio jurídico indireto, segundo a maioria dos doutrinadores, quando se procura alcançar o escopo ulterior (a garantia) pela aposição de cláusula compativel com a estrutura substancial do negócio juridico típico utilizado (por exemplo, uma condição resolutiva), ou, então, nos casos em que for possivel, quando há o uso puro e simples do negócio jurídico utiilizado, sem a aposição de qualquer cláusula que manifeste, em sua estrutura jurídica, o escopo da garantia a que ele se destina. Não se trata de negócio jurídico simulado.

Mas disse Cariota-Ferrara (El negocio jurídico, pág. 273) que "se o fim perseguido num caso concreto fica puramente como psicológico, ainda que seja comum a ambas as partes, não se pode falar em negocio jurídico indireto, inclusive se este consiste num fim estranho ao negócio utilizado. Ter-se-ão, portanto, as consequências próprias de cada negócio juridico realizado por este ou por aquele motivo".

Ensinou o ministro Moreira Alves (Da alienação fiduciária em garantia, terceira edição, pág. 3) que "o que é certo, portanto, é que, a partir, precipuamente, do século XIX, se tem sentido, cada vez mais, a necessidade da criação de novas garantias reais para a proteção do direito de crédito." Isso porque as existentes nos sistemas jurídicos de origem romana - a hipoteca, o penhor e a anticrese - não mais satisfazem a uma sociedade industrializada, nem mesmo nas relações creditícias entre pessoas físicas.

Apesar de já se utilizar do pacto de reserva de domínio que, por meio da propriedade, garante o vendedor e possibilita o comprador de usar, imediatamente, da coisa, surgiram, no último quartel do século XIX, graças ao trabalho de juristas germânicos, secundados por italianos, as figuras do negócio jurídico fiduciário e do negócio jurídico indireto. Veio, com Regelsberger ,o ponto de partida para a formulação moderna da teoria do negócio fiduciário. Em 1878, Kohler distinguia negócio jurídico indireto - negócio encoberto - do negócio jurídico simulado.

O negócio jurídico fiduciário e o negócio jurídico indireto são meios indiretos de garantia do crédito.

Sobre o autor
Rogério Tadeu Romano

Procurador Regional da República aposentado. Professor de Processo Penal e Direito Penal. Advogado.

Informações sobre o texto

Este texto foi publicado diretamente pelos autores. Sua divulgação não depende de prévia aprovação pelo conselho editorial do site. Quando selecionados, os textos são divulgados na Revista Jus Navigandi

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