Anotações sobre o direito de vizinhança

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05/12/2018 às 12:16
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Os direitos de vizinhança limitam o uso da propriedade para proteger segurança, sossego e saúde dos moradores. Quais medidas judiciais, como ação de dano infecto ou demolitória, são aplicáveis?

1. GENERALIDADES

As limitações e determinações do conteúdo da propriedade são assunto de direito público ou de direito privado. Se elas são permitidas como regras legais responde a Constituição de 1988, principalmente os artigos 170 e seguintes.

A natureza jurídica destes direitos [direitos de vizinhança], na opinião majoritária da doutrina, é que tratam-se (sic) de obrigações propter rem, ‘da própria coisa’, advindo os direitos e obrigações do simples fato de serem os indivíduos vizinhos

Sempre que o exercício do direito de outrem, chocando-se com esse, e pois podendo ser proibida a incursão por aquele, nasce aos legisladores o problema de técnica legislativa consistente em se ajustarem os interesses.

A matéria do uso nocivo da propriedade era objeto do artigo 554 do Código Civil que assim definia:

Art. 554. O proprietário, ou inquilino de um prédio tem o direito de impedir que o mau uso da propriedade vizinha possa prejudicar a segurança, o sossego e a saúde dos que o habitam.

Há correspondência no artigo 1.277 do Código Civil de 2002:

Art. 1.277. O proprietário ou o possuidor de um prédio tem o direito de fazer cessar as interferências prejudiciais à segurança, ao sossego e à saúde dos que o habitam, provocadas pela utilização de propriedade vizinha.

Parágrafo único. Proíbem-se as interferências considerando-se a natureza da utilização, a localização do prédio, atendidas as normas que distribuem as edificações em zonas, e os limites ordinários de tolerância dos moradores da vizinhança.

A regra limita o conteúdo do direito de propriedade do proprietário vizinho, nascendo no outro proprietário o direito de vizinhança.

A ação, como a pretensão, dirige-se contra ele, ou contra quem exerça a posse direta. Aliás, não só ao inquilino: o foreiro, o usufrutuário o que tem o direito real de usufruto; o usuário, a quem somente, no caso, se pode imputar o mau uso; o habitador, que também é titular de um direito real e, pois, limitado, por igual, o seu direito real; o credor anticrético.

É certo que todo proprietário pode exercer o direito de propriedade a seu libito, mas o exercício irregular leva ao abuso do direito; ou exceder linhas que o direito traçou a cada proprietário, levando em conta o interesse dos vizinhos.

Essas limitações ao direito de propriedade são limitações ao próprio conteúdo do direito de propriedade.

O uso da propriedade, dentro do que rezam os artigos 5º, XXIII; 170, III; 186, I a IV, está condicionado ao bem estar social.

O Código, portanto, confere proteção contra atos que impliquem risco à segurança, ao sossego e saúde, Como exemplifica Washington de Barros Monteiro (Curso de Direito Civil. Direito das Coisas. Editora Saraiva. 37ª edição. São Paulo, 2003, p. 135/136.):

“São ofensas à segurança pessoal, ou dos bens, todos os atos que possam comprometer a estabilidade e a solidez do prédio, bem como a incolumidade de seus habitantes. Constituem exemplos a exploração de indústrias perigosas, como a de explosivos e inflamáveis, o funcionamento de indústrias que provoquem trepidações excessivas, capazes de produzir fendas ou frinchas no prédio, e armazenamento de mercadorias excessivamente pesadas, acarretando o recalque do terreno, as escavações muito profundas, a existência de árvores de grande porte, que ameaçam tombar na propriedade vizinha.

São ofensas ao sossego ruídos exagerados que perturbam ou molestam a tranquilidade dos moradores, como gritarias e desordens, diversões espalhafatosas, bailes perturbadores, atividades de discotecas ou danceterias, artes rumorosas, barulho ensurdecedor de indústria vizinha, emprego de alto-falantes de grande potência nas proximidades de casas residenciais para transmissões de programas radiofônicos ou televisivos e instalação de aparelhos de ar condicionado ruidosos.

Finalmente, constituem ofensas à saúde as emanações de gases tóxicos, as exalações fétidas, a poluição de águas pelo lançamento de resíduos, a presença de substâncias putrescíveis ou de águas estagnadas e o funcionamento de estábulos ou de matadouros.”

A segurança que a lei trata é a material e é a pessoal e moral. No ensinamento de Pontes de Miranda (Tratado de direito privado, tomo XIII, ed. Bookseller, pág. 382), tanto ofende a segurança, ou pode vir a ofendê-la quem trabalha na casa vizinha com explosivos quanto quem acoita bandidos ou recebe jogadores que costumam brigar a tiros. O bordel e a casa de tolerância podem ser ofensivos ao sossego, podem mesmo criar situação de insegurança para os vizinhos. O calor excessivo, as trepidações perigosas, os corpos gaseiformes que possam produzir uma explosão, a penetração de líquidos nas paredes-nuas deve ainda ser enquadrados nessas situações do artigo 554 do Código Civil de 1.916 que são nocivas à vizinhança.

A indenização com base naquele artigo 554 do Código Civil de 1916 não exige culpa por parte do responsável.

É certo que questões surgidas envolvendo enfermidades têm de atender à localização dos prédios e às leis sanitárias têm importante papel.

Pontes de Miranda exemplifica alguns casos (obra citada, páginas. 384. e 385):

  1. A queima de detritos, com produção de fumaça que invada as propriedades vizinhas, causando prejuízos pessoais e incômodos à saúde;

  2. O badalar de sinos das igrejas sem a necessidade de culto (2ª Turma do STF, 3 de julho de 1947, RF 116/432);

  3. As queimadas, a poluição de águas, os rumores excessivos, os odores fortes ou outras imissões que causem dano;

  4. O deixar de cortar as árvores que causem dano se o dano sem o corte é inevitável;

  5. O ter apiário cujos incômodos que causa desgarram dos hábitos do lugar;

  6. Construir ou mandar construir de modo que causa danos, ainda se a construção obedeceu exigências das posturas municipais (RT 170/748);

  7. Qualquer imissão ofensiva ao sossego ou à saúde do vizinho;

  8. O ter açudes de que resultem casos de impaludismo na vizinha (Câmara Civil do Tribunal de Justiça de São Paulo, 9 de maio de 1928, RT 67/118);

  9. Haver enxurradas e barreiras devidas à elevação de nível em aterros ainda se necessários à construção no prédio (RT 76/145);

  10. Exceder a carga que a construção pode suportar, pondo em risco a vizinhança (não é de exigir-se culpa, imprudência, que adentre no ato ilícito);

  11. Usar pulverizador de óleo, de modo que se manchem ou impregnem paredes ou outras partes ou pertenças do prédio vizinho ou objetos aí postos, como alfaias, tapeçarias e mobiliário;

  12. Montar garagem ou posto de gasolina ou lubrificação ou de consertos de automóveis;

  13. Ter ou plantar árvores que sejam ruinosas;

  14. Não aterrar o prédio na parte abaixo do nível da rua ou não a rebaixar até onde evite danos aos vizinhos;

  15. Fazer derivarem águas com detritos industriais ou agrícolas para a propriedade vizinha;

  16. Não murar o terreno na faixa que não corresponde ao prédio com que confina no resto;

  17. Manter salões de clubes que façam algazarra;

  18. Construir ou manter fossa junto ao prédio de outrem;

  19. Deixar de construir muro de arrimo para evitar invasão de águas pluviais;

  20. Lançar pontas de cigarro, carteiras de cigarro, brinquedos de criança, papeis, fósforos ou outros objetos, no prédio vizinho, de modo que causem danos, obstruam calhas ou ralos ou manchem paredes, ou simplesmente sujem o terreno alheio.

O sossego que se exprime é a relativa tranquilidade, o ter-se o que permite a normalidade da vida com as horas de atividade e as de descanso, que hão de ser especialmente distintas.

Assim o proprietário que produz ruído de sorte a incomodar seus vizinhos é obrigado a se abster de tais atos, mas o ruído que autoriza um procedimento judicial deve ser o ruído excessivo ou anormal, que extrapolem as exigências do meio.

O proprietário, morador de recanto sossegado, tem ação contra quem, com a instalação de indústria, lhe vem perturbar a paz e a comodidade.

Nenhum vizinho tem o direito de produzir os danos, as importunações, os incômodos, o desassossego e o perigo que entender, só porque ocupou a vizinhança antecipadamente, fazendo tábula rasa do direito alheio e da legislação que regula a boa convivência entre proprietários confinantes ou próximos.

O sossego não é perturbável apenas pelo som. Também o é pela luz, pelo cheiro, por apreensões e choques psíquicos, ou outros motivos de inquietação.

A licença administrativa que for dado pelo Município é dada sob a reserva implícita de não serem lesados os direitos alheios; e só tem o efeito de isentar o proprietário da responsabilidade penal, em que incorreria, se levasse a termo a obra, sem a devida licença e observância dos preceitos regulamentares.

O fato de estar o prédio situado em via pública de intenso movimento diurno e noturno, com os ruídos causados pela passagem de veículos de transporte, não faz com que os seus habitantes sejam obrigados a suportar outros barulhos que não são estritamente indispensáveis à vida de uma cidade.

Saúde de que fala a lei é a saúde do que habita, ou tem de frequentar o prédio, ou de qualquer ser, que viva no prédio, se pode aí ser alojado.


2. REMÉDIOS PROCESSUAIS

Fora do texto do Código de Processo Civil podemos encontrar importantes remédios processuais, alguns em proteção da eficácia da posse. É próprio da posse o juízo sumário de natureza satisfativa.

Para exemplificar tem-se: a ação de dano infecto; a nunciação de obra nova e a ação de demolição.

Todas elas têm uma nítida conotação formal sumária, própria dos interditos, na defesa do interesse do juízo possessório.

2.1. CAUTIO DANO INFECTO

Necessário estudar a cautio dano infecto, que para Hely Lopes Meirelles (Direito de construir) é

a medida preventiva autorizada pelo CC e pelo CPC dentre os procedimentos cautelares específicos, com conceituação própria e rito especial (CPC 826 a 838 do CPC de 1973), podendo ser utilizada nos casos em que a natureza dos trabalhos ou o estado da obra ofereçam perigo ao vizinho. (...) qualquer eventual vítima pode requerer a caução de dano iminente em procedimento autônomo ou como medida preparatória de futura ação demolitória do que já foi feito (v. CPC 806). (...) A caução pode ser em dinheiro ou em fiança, a critério do requerente, que indicará o seu valor para apreciação e julgamento do juiz (CPC 829 a 838). Essa caução é passível de ser requerida mesmo depois de ajuizada qualquer ação de vizinhança, desde que persista a iminência de continuação do dano pela obra ou pelos trabalhos vizinhos.

Ação de dano infecto é a medida preventiva como se vê no interdito proibitório, tipicamente mandamental, e dá-se quando o possuidor tenha fundado receio de que a ruína de prédio vizinho ao seu, ou vício na construção, possa vir a causar-lhe prejuízo. Assim ao se precaver, o autor obtém que a sentença comine ao réu a prestação da causação que a assegure contra o dano futuro – a cautio damni infecti.

Essa ação não se alinha por ser com as conhecidas ações possessórias: de reintegração, de manutenção de intedito proibitório, com quem mantém o vínculo preventivo.

Guasp (Derecho procesal civil, 1968, 3 edição, tomo II, pág. 445) ressaltou, dentro do processo interinal, no ordenamento espanhol, a circunstância de que na ação de denúncia de obra nova (nossa nunciação) o pedido de demolição não faz parte da respectiva demanda, só se suspendendo postular aí a suspensão da obra.

Viam nessas ações, algo similar as ações cautelares, típicas do Código de Processo Civil de 1973, uma inexistência de coisa julgada material, não ficando assim vedada o reexame de questões suscitadas que poderão ser novamente apresentadas pelo juízo na ação posterior.

Mas ele, Guasp, via na ação de nunciação de obra nova uma ação cautelar típica, mas autônoma.

Isso porque, nesse entendimento, toda ação cautelar tinha de ser acessória, razão pela qual Guasp via que ele seria uma autêntica cautelar, o pedido incidental, do dono da obra nova para que lhe autorize o juiz a continuação provisional da obra.

Mas, no entanto, ele afirma que, no interdicto de obra ruinosa (de dano infecto) quando a demanda vise, tão-somente à adoção de medidas urgentes de cautela, a natureza interdital da lide seria duvidosa e até mesmo a existência de um verdadeiro processo seria discutível, tudo indicando que tais medidas urgentes de segurança teriam fisionomia administrativa.

O Código Civil de 2002 cuidou da matéria:

Trata-se da ação judicial proposta com base no art. 1.280, CC, e que visa à acautelar o proprietário de um dano iminente ou infecto. Vejamos o dispositivo em questão:

Art. 1.280. O proprietário ou o possuidor tem direito a exigir do dono do prédio vizinho a demolição, ou a reparação deste, quando ameace ruína, bem como que lhe preste caução pelo dano iminente.

A ação de dano infecto tem cabimento naquelas situações em que o proprietário ou possuidor de um imóvel esteja sofrendo, ou tenha justo receio de sofrer, dano ou prejuízo pelo uso nocivo de: – barulho excessivo – desordem – criação de animais – armazenagem de produtos perigosos, como inflamáveis e explosivos – exalações fétidas – entre outros, ou ruína , de prédio vizinho.

O objetivo primordial desta ação é cominar pena ao proprietário do imóvel, até que cesse a situação que fundamenta o pedido, ou a prestação de caução pelo dano iminente.

A ação de dano infecto tem como pressupostos os artigos 1.277 e, seguintes do Código Civil. Seu fundamento legal se encontra no artigo 1.280 no qual dispõe: “O proprietário ou o possuidor tem direito a exigir do dono do prédio vizinho a demolição ou a reparação deste, quando ameace ruína, a um bem como que lhe preste caução pelo dano iminente”. Destaca-se que o receio deve ser real, e não baseado em um temor infundado.

Segundo Venosa (Direito Civil, direitos reais, (2012,v. V, p. 301), “Na caução de dano infecto, aquele que teme a ruína ou prejuízo em sua propriedade pede garantia de futura reparação”.

2.2. AÇÃO DE NUNCIAÇÃO DE OBRA NOVA

Diversa é a ação de nunciação de obra nova.

Quando a moléstia possessória consiste em construção que levante o vizinho, dentro de suas próprias linhas lindeiras, o possuidor tem, para o efeito de sustar o seu prosseguimento e desfazer o que se acha edificado, uma ação específica, mista de possessória e cominatória, denominada de embargo de obra nova. Nada se vê nela de cautelar. Há um evidente caráter mandamental, no caráter já previsto no antigo artigo 461 do CPC de 1973 (tutela inibitória), com suas reformas, objetivando cessar um ato ilícito ou evita-lo.

Sendo ação propter rem é ação real, havendo a presença de litisconsortes cônjuges. É ação na defesa de direito real e não pessoal.

Mas uma construção que prejudicasse a visão belíssima que se tinha antes, como de uma praia, não será inserida em tal caso.

Como revela Caio Mário da Silva Pereira (Instituições de direito civil, volume IV, pág. 72) seu principal objetivo é o embargo da obra, ato é o obstáculo a que seria concluída e, secundariamente, a cominação de multa para o caso de reinício ou de reconstrução. E pode acontecer que a obra não cause um dano atual, mas permita antever resultado turbativo, se vier a completar-se.

Se já há fundação construída, deve-se ajuizar a ação. Se a obra já está completa ou na fase de reparos e finais conclusões, já não cabe, como a colocação de telhas, pinturas etc.

Para tanto é preciso que: haja posse, que o vizinho esteja realizando uma obra dentro de seus próprios confins, porque se estiver na área do vizinho a questão é de turbação e a ação é tipicamente possessória; que se trate de obra nova que cause moléstia, em vias de construção. Repita-se, descabe o remédio se já estiver concluída. Se a obra já estiver concluída a ação é a demolitória.

Hoje essa ação de nunciação de obra tem rito ordinário.

2.3. AÇÃO DEMOLITÓRIA

Diversa é a ação demolitória.

Sobre ela já se pronunciou o Superior Tribunal de Justiça:

PROCESSUAL CIVIL. AÇÃO DEMOLITÓRIA. NATUREZA REAL. CÔNJUGE. LITISCONSÓRCIO NECESSÁRIO. AUSÊNCIA DE CITAÇÃO. NULIDADE. 1. Cinge-se a controvérsia a definir qual a natureza da Ação Demolitória e, em consequência, se a hipótese exige a formação de litisconsórcio necessário passivo entre os cônjuges. 2. O Tribunal a quo entendeu que, por se tratar de ação pessoal, "a citação do cônjuge torna-se dispensável, posto que a ação demolitória não afeta diretamente o direito de propriedade das partes" (fl. 130). 3. A Ação Demolitória visa à demolição de: a) prédio em ruína (art. 1.280. do CC); b) construção prejudicial a imóvel vizinho, às suas servidões ou aos fins a que é destinado (art. 934, I, do CPC); c) obra executada por um dos condôminos que importe prejuízo ou alteração de coisa comum por (art. 934, II, do CPC); d) construção em contravenção da lei, do regulamento ou de postura estabelecidos pelo Município. 4. No sistema do Código Civil, a construção é tratada como uma das formas de aquisição da propriedade imóvel (arts. 1.253. a 1.259). Por outro lado, o direito de exigir a demolição de prédio vizinho encontra-se previsto no capítulo que trata dos direitos de vizinhança e está associado ao uso anormal da propriedade (Seção I do Capítulo V do Título III do Livro dos Direitos das Coisas). 5. A Ação Demolitória tem a mesma natureza da Ação de Nunciação de Obra Nova e se distingue desta em razão do estado em que se encontra a obra (REsp 311.507/AL, Rel. Ministro Ruy Rosado de Aguiar, Quarta Turma, DJ 5/11/2001, p. 118). 6. Assentada a premissa de que a Ação Demolitória e a Ação de Nunciação de Obra Nova se equivalem, o art. 95. do CPC corrobora a tese sobre a natureza real de ambas. O dispositivo prescreve que, nas ações fundadas em direito real sobre imóveis, o foro competente é o da situação da coisa, com a ressalva de que as referidas ações podem ser propostas no foro do domicílio ou de eleição, desde que o litígio não recaia sobre propriedade, vizinhança, servidão...

REsp 1.374.593/SC, publicado em 1/7/2015

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RECURSO ESPECIAL. AÇÃO DEMOLITÓRIA. PRAZO DECADENCIAL. ART. 576. DO CCB/1916. JANELA, SACADA, TERRAÇO, GOTEIRA OU SIMILARES. ESCADA CONSTRUÍDA INTEGRALMENTE EM TERRENO ALHEIO. INAPLICABILIDADE. 1. O prazo decadencial de ano e dia para a propositura da ação demolitória previsto no artigo 576 do Código Civil/1916 é limitado às espécies nele mencionadas: janela, sacada, terraço, goteira ou similares. 2. Referido prazo não tem aplicação no caso dos autos, que trata de construção de escada externa integralmente em terreno alheio, invadindo 15 m2 (quinze metros quadrados) do lote limítrofe. 3. Recurso especial provido.

Resp 1.218.605/PR, DJ de 9 de dezembro de 2014.

A ação demolitória é ação real e exige a citação do cônjuge.

A ação demolitória é medida extrema, de caráter punitivo, que contempla os direitos da vizinhança, cuja finalidade é a demolição de obra em propriedade vizinha que não se adéqua a legislação e cujos vícios são insanáveis, de forma que a sua manutenção prejudicaria edifícios alheios.

A medida demolitória, tendo em vista o seu caráter excepcional, só é possível nos casos em que a construção em vizinho traz sérios prejuízos a outras propriedades.

Saliente-se que a ação demolitória segue o rito ordinário e tem natureza jurídica de direitos da vizinhança e está prevista no artigo 1.280 de Código Civil.

2.4. AÇÃO COMINATÓRIA

Muito comum, como se via do CPC de 1939, a chamada ação cominatória.

Para Pontes de Miranda (obra citada, pág. 395) a condenação, na ação de que se cogita no artigo 554 do Código Civil de 1916 , pode ter como conteúdo fazer cessar o dano ou o risco, ou prestar-se a indenização.

Por sua vez, a ação de demolição ou de reparação não fica dependente de rito cominatório. Primeiro, porque o dano pode ser de tal maneira iminente que não haja tempo para cominação, prazo e era especial (Código de processo civil de 1939, artigos 302, VII e 304) e hoje rito comum.

No caso da declaração de vontade, que era prevista no artigo 641 do CPC, a ação cominatória toma o caráter de executiva.

A ação cominatória sempre foi utilizada para impedir a continuação ou a repetição do ilícito, tendo recebido este nome em razão de permitir a cominação de multa para obrigar alguém a fazer ou não fazer alguma coisa. No entanto, sustenta-se que a tutela inibitória (ação preventiva com objetivo de cessar o ilícito), sob o rótulo de ação cominatória, jamais foi capaz de permitir uma tutela jurisdicional efetiva, mesmo reconhecendo o caráter preventivo que a revestia, ao dizer também que “não tem qualquer relevância o ato ilícito que já foi praticado e cuja repetição ou continuação não se puder cessar".

A natureza dessa ação inibitória, que já era prevista no artigo 461 do CPC de 1973, com suas mudanças, era de natureza mandamental.

Foi por demais importante a menção da chamada ação cominatória no Código de Processo Civil de 1939.

Com a reunificação processual aperfeiçoada em 1939, voltou a existir, como figura geral no direito processual pátrio, o preceito cominatório para a prestação de fato ou abstenção do ato. Previram-se onze casos especiais de deveres de fazer ou de não fazer e uma cláusula de encerramento de sistema, abrangendo a generalidade das prestações legais e convencionais com esse objeto (CPC de 1939, art. 302, I a XII).

Destaco do artigo 302 daquele diploma legal casos em que cabia a ação cominatória:

VII - ao proprietario ou inquilino do predio para impedir que o mau uso da propriedade vizinha prejudique a segurança, e socego ou a saúde dos que o habitam;

VIII - ao proprietário, inclusive o de apartamento em edificio de mais de cinco 5 andares, para exigir do dono do prédio vizinho, ou do condômino, demolição, reparação ou caução pelo dano iminente;

IX - ao proprietário de apartamento em edificio de mais de cinco 5 andares para impedir que o condômino transgrida as proibições legais;

XI - à União, ao Estado ou ao Municipio, para pedir:

a) a suspensão ou demolição de obra que contravenha a lei, regulamento ou postura;

b) a obstrução de valas ou excavações, a destruição de plantações, a interdição de predios e, em geral, a cessação do uso nocivo da propriedade, quando o exija a saúde, a segurança ou outro interesse público;

XII - em geral, a quem, por lei, ou convenção, tiver direito de exigir de outrem que se abstenha de ato ou preste fato dentro de certo prazo.

No entanto, confirmando-se a tendência que antes já se delineava, conferiu-se tratamento diferenciado para a ação cominatória para prestação de fato ou abstenção de ato (artigo 302 a 310) e o interdito proibitório (artigo 377 - 380).

Ambos desenvolviam-se por procedimento monitório. Na ação cominatória, o réu era citado para, em dez dias, cumprir dever de fazer ou de não fazer, sob a pena contratual, legal ou a pedida pelo autor, quando nenhuma estivesse prevista. Não cumprindo nem contestando, seria condenado imediatamente a seguir. Contestando, a ação prosseguiria com rito ordinário (artigo 303). No interdito proibitório, idêntica estrutura era adotada (artigos 379 a 380).

Entretanto, no interdito proibitório, desde o inicio, o juiz expedia mandato proibitório, segurando o autor da violência eminente, "com a cominação de pena pecuniária para o caso de transgressão" (artigo 378). Tal ordem desde logo era eficaz, não se suspendendo com a propositura da contestação. Tanto que, se no curso da ação o mandado fosse transgredido, o juiz imediatamente determinaria a manutenção ou reintegração da posse (art. 379).

Já na ação cominatória, a contestação afastava, como regra, toda a eficácia do mandado inicial. Apenas a sentença final, confirmando o mandado, teria força executiva e ser concretizada em subsequente processo de execução. Somente em dois casos excepcionais, a decisão liminar poderia desde logo ser efetivada nas hipóteses dos incisos VII e VIII do artigo 302, se houvesse perigo iminente e o réu não oferecesse uma oportuna caução (artigo 304); na hipótese do inciso XI, se verificada, por perito, a urgência alegada pela União, Estado ou Município (artigo 305).

Apenas em específicas hipóteses existiam adequadas cominações (exemplo, o descumprimento da determinação de reforço de garantia pessoal ou fidejussoria, inciso IV, geraria, em certas hipóteses, o vencimento antecipado da dívida; a não prestação de contas pelo devedor (inciso V), acarretaria a imposição da apresentada pelo credor. Na maioria dos casos, faltavam adequados mecanismos coercitivos, que conferissem eficácia à ação cominatória.

Com esse modelo do CPC de 1939, recaía-se no regime previsto no Código Civil; conversão em perdas e danos e (ou) a sub-rogação em terceiro, às custas do devedor, da prestação de fato ou destruição do indevidamente feito, quando fungíveis as atividades (artigos 878 a 883). Tais consequências, por guardarem equivalência econômica com a prestação específica pretendida, revestiam-se de pouca eficácia intimidativa para levar o réu ao cumprimento voluntário do mandado. Faltava verdadeiro mecanismo de pressão psicológica, consistente na atribuição de desvantagem maior do que a que o réu teria se cumprisse espontaneamente o comando.

O artigo 999, em regra ampla que abrangia as obrigações de fazer e de não fazer, estabelecia que o descumprimento do preceito executivo daria ao exequente a alternativa de requerer multa ou perdas e danos.

Mas, por outro lado, nos artigos 1.000 a 1.004, previu-se expressamente a possibilidade da prestação do fato fungível por terceiro, às custas do devedor - providência já contemplada no Código Civil de 1916 e que era, de há muito tempo, admitida na praxe luso-brasileira, como ensinou Dinamarco (Execução Civil, n. 30, pág. 69), Lobão (Tratado, I, § 510, pág. 338).

Mas, no artigo 1.005, para o "ato que só puder ser executado pelo devedor", estabeleceu-se que o juiz ordenaria que este o fizesse, no prazo fixado, "sob cominação pecuniária, que não exceda o valor da prestação".

Para Liebman (Processo de execução, n. 97. - 98, páginas 234 e 235), além de Bueno Vidigal (Da execução direta das obrigações de prestar declaração de vontade, n. 59, páginas 158 e 159), a "cominação pecuniária" do art. 1.005. teria finalidade indenizatória, não sendo cumulável com outra verba a tal título. Bueno Vidigal considerava que, por ser limitada ao "valor da prestação (artigo 1.005, parte final), essa verba propiciaria ao credor resultado pior do que o passível de abstenção pelo credor da obrigação de fazer fungível, cujo inadimplemento poderia ser ressarcido por montante não sujeito àquele limite (artigo 999).

Outra parte da doutrina reconhecia que a multa não se confundia na essência com a indenização.

O artigo 1.005, parte final, do CPC de 1939, reconhecia "cominação pecuniária, que não exceda o valor da prestação".

Some-se a isso o fato de que a jurisprudência fez prevalecer o entendimento de que a sanção cominada incidiria a partir do trânsito em julgado da sentença - e não do descumprimento do preceito cominatório.

2.5. AÇÕES DE DEMARCAÇÃO E DE DIVISÃO

É importante nas relações de vizinhança a definição das ações de demarcação e divisão.

Estamos diante de duas ações de procedimento especial.

O CPC de 2015 determina:

Da Demarcação

Art. 574. Na petição inicial, instruída com os títulos da propriedade, designar-se-á o imóvel pela situação e pela denominação, descrever-se-ão os limites por constituir, aviventar ou renovar e nomear-se-ão todos os confinantes da linha demarcanda.

Art. 575. Qualquer condômino é parte legítima para promover a demarcação do imóvel comum, requerendo a intimação dos demais para, querendo, intervir no processo.

Art. 576. A citação dos réus será feita por correio, observado o disposto no art. 247.

Parágrafo único. Será publicado edital, nos termos do inciso III do art. 259.

Art. 577. Feitas as citações, terão os réus o prazo comum de 15 (quinze) dias para contestar.

Art. 578. Após o prazo de resposta do réu, observar-se-á o procedimento comum.

Art. 579. Antes de proferir a sentença, o juiz nomeará um ou mais peritos para levantar o traçado da linha demarcanda.

Art. 580. Concluídos os estudos, os peritos apresentarão minucioso laudo sobre o traçado da linha demarcanda, considerando os títulos, os marcos, os rumos, a fama da vizinhança, as informações de antigos moradores do lugar e outros elementos que coligirem.

Art. 581. A sentença que julgar procedente o pedido determinará o traçado da linha demarcanda.

Parágrafo único. A sentença proferida na ação demarcatória determinará a restituição da área invadida, se houver, declarando o domínio ou a posse do prejudicado, ou ambos.

Art. 582. Transitada em julgado a sentença, o perito efetuará a demarcação e colocará os marcos necessários.

Parágrafo único. Todas as operações serão consignadas em planta e memorial descritivo com as referências convenientes para a identificação, em qualquer tempo, dos pontos assinalados, observada a legislação especial que dispõe sobre a identificação do imóvel rural.

Art. 583. As plantas serão acompanhadas das cadernetas de operações de campo e do memorial descritivo, que conterá:

I - o ponto de partida, os rumos seguidos e a aviventação dos antigos com os respectivos cálculos;

II - os acidentes encontrados, as cercas, os valos, os marcos antigos, os córregos, os rios, as lagoas e outros;

III - a indicação minuciosa dos novos marcos cravados, dos antigos aproveitados, das culturas existentes e da sua produção anual;

IV - a composição geológica dos terrenos, bem como a qualidade e a extensão dos campos, das matas e das capoeiras;

V - as vias de comunicação;

VI - as distâncias a pontos de referência, tais como rodovias federais e estaduais, ferrovias, portos, aglomerações urbanas e polos comerciais;

VII - a indicação de tudo o mais que for útil para o levantamento da linha ou para a identificação da linha já levantada.

Art. 584. É obrigatória a colocação de marcos tanto na estação inicial, dita marco primordial, quanto nos vértices dos ângulos, salvo se algum desses últimos pontos for assinalado por acidentes naturais de difícil remoção ou destruição.

Art. 585. A linha será percorrida pelos peritos, que examinarão os marcos e os rumos, consignando em relatório escrito a exatidão do memorial e da planta apresentados pelo agrimensor ou as divergências porventura encontradas.

Art. 586. Juntado aos autos o relatório dos peritos, o juiz determinará que as partes se manifestem sobre ele no prazo comum de 15 (quinze) dias.

Parágrafo único. Executadas as correções e as retificações que o juiz determinar, lavrar-se-á, em seguida, o auto de demarcação em que os limites demarcandos serão minuciosamente descritos de acordo com o memorial e a planta.

Art. 587. Assinado o auto pelo juiz e pelos peritos, será proferida a sentença homologatória da demarcação.

Seção III - Da Divisão

Art. 588. A petição inicial será instruída com os títulos de domínio do promovente e conterá:

I - a indicação da origem da comunhão e a denominação, a situação, os limites e as características do imóvel;

II - o nome, o estado civil, a profissão e a residência de todos os condôminos, especificando-se os estabelecidos no imóvel com benfeitorias e culturas;

III - as benfeitorias comuns.

Art. 589. Feitas as citações como preceitua o art. 576, prosseguir-se-á na forma dos arts. 577. e 578.

Art. 590. O juiz nomeará um ou mais peritos para promover a medição do imóvel e as operações de divisão, observada a legislação especial que dispõe sobre a identificação do imóvel rural.

Parágrafo único. O perito deverá indicar as vias de comunicação existentes, as construções e as benfeitorias, com a indicação dos seus valores e dos respectivos proprietários e ocupantes, as águas principais que banham o imóvel e quaisquer outras informações que possam concorrer para facilitar a partilha.

Art. 591. Todos os condôminos serão intimados a apresentar, dentro de 10 (dez) dias, os seus títulos, se ainda não o tiverem feito, e a formular os seus pedidos sobre a constituição dos quinhões.

Art. 592. O juiz ouvirá as partes no prazo comum de 15 (quinze) dias.

§ 1º Não havendo impugnação, o juiz determinará a divisão geodésica do imóvel.

§ 2º Havendo impugnação, o juiz proferirá, no prazo de 10 (dez) dias, decisão sobre os pedidos e os títulos que devam ser atendidos na formação dos quinhões.

Art. 593. Se qualquer linha do perímetro atingir benfeitorias permanentes dos confinantes feitas há mais de 1 (um) ano, serão elas respeitadas, bem como os terrenos onde estiverem, os quais não se computarão na área dividenda.

Art. 594. Os confinantes do imóvel dividendo podem demandar a restituição dos terrenos que lhes tenham sido usurpados.

§ 1º Serão citados para a ação todos os condôminos, se a sentença homologatória da divisão ainda não houver transitado em julgado, e todos os quinhoeiros dos terrenos vindicados, se a ação for proposta posteriormente.

§ 2º Nesse último caso terão os quinhoeiros o direito, pela mesma sentença que os obrigar à restituição, a haver dos outros condôminos do processo divisório ou de seus sucessores a título universal a composição pecuniária proporcional ao desfalque sofrido.

Art. 595. Os peritos proporão, em laudo fundamentado, a forma da divisão, devendo consultar, quanto possível, a comodidade das partes, respeitar, para adjudicação a cada condômino, a preferência dos terrenos contíguos às suas residências e benfeitorias e evitar o retalhamento dos quinhões em glebas separadas.

Art. 596. Ouvidas as partes, no prazo comum de 15 (quinze) dias, sobre o cálculo e o plano da divisão, o juiz deliberará a partilha.

Parágrafo único. Em cumprimento dessa decisão, o perito procederá à demarcação dos quinhões, observando, além do disposto nos arts. 584. e 585, as seguintes regras:

I - as benfeitorias comuns que não comportarem divisão cômoda serão adjudicadas a um dos condôminos mediante compensação;

II - instituir-se-ão as servidões que forem indispensáveis em favor de uns quinhões sobre os outros, incluindo o respectivo valor no orçamento para que, não se tratando de servidões naturais, seja compensado o condômino aquinhoado com o prédio serviente;

III - as benfeitorias particulares dos condôminos que excederem à área a que têm direito serão adjudicadas ao quinhoeiro vizinho mediante reposição;

IV - se outra coisa não acordarem as partes, as compensações e as reposições serão feitas em dinheiro.

Art. 597. Terminados os trabalhos e desenhados na planta os quinhões e as servidões aparentes, o perito organizará o memorial descritivo.

§ 1º Cumprido o disposto no art. 586, o escrivão, em seguida, lavrará o auto de divisão, acompanhado de uma folha de pagamento para cada condômino.

§ 2º Assinado o auto pelo juiz e pelo perito, será proferida sentença homologatória da divisão.

§ 3º O auto conterá:

I - a confinação e a extensão superficial do imóvel;

II - a classificação das terras com o cálculo das áreas de cada consorte e com a respectiva avaliação ou, quando a homogeneidade das terras não determinar diversidade de valores, a avaliação do imóvel na sua integridade;

III - o valor e a quantidade geométrica que couber a cada condômino, declarando-se as reduções e as compensações resultantes da diversidade de valores das glebas componentes de cada quinhão.

§ 4º Cada folha de pagamento conterá:

I - a descrição das linhas divisórias do quinhão, mencionadas as confinantes;

II - a relação das benfeitorias e das culturas do próprio quinhoeiro e das que lhe foram adjudicadas por serem comuns ou mediante compensação;

III - a declaração das servidões instituídas, especificados os lugares, a extensão e o modo de exercício.

Art. 598. Aplica-se às divisões o disposto nos arts. 575. a 578.

2.5.1. Finiun regundorum - ação de demarcação

É, pois, necessário que, para que o proprietário, titular de um direito real, possa ter o direito de usar, fruir da coisa em toda a sua plenitude tenha marcos visíveis que as diferenciem de outras propriedades, em correspondência com o título dominial que a representa. Daí a chamada ação de demarcação de terras particulares – finiun regundorum.

O autor, ao fazer o pedido de demarcação, deverá indicar o imóvel pela sua situação e denominação, bem como descrever os limite que pretende constituir, aviventar, nomeando os confrontantes que devem ser citados.

O valor da causa é da estimativa oficial do lançamento de imposto do imóvel mais valioso.

Marcos são destruídos, desaparecem, razão pela qual é possível tal pedido de demarcação, isso para dissipar a incerteza quanto a exata extensão das respectivas propriedades. Se há razoável dúvida quanto a certeza das linhas, quanto à justeza dessa verificação, será caso da ação em discussão.

Tal ação assiste direito ao proprietário, ao enfiteuta, ao usuário, ao usufrutuário. O condômino é parte legítima para ajuizar tal ação. Mas os coproprietários, assim como os demais proprietários, a bem do devido processo legal, devem ser chamados.

Na petição inicial, instruída com os títulos da propriedade, designar-se-á o imóvel pela situação e pela denominação, descrever-se-ão os limites por constituir, aviventar ou renovar e nomear-se-ão todos os confinantes da linha demarcanda.

A citação dos réus deve ser feita por correio (artigo 247 do CPC). Mas, havendo queixa turbação ou esbulho, a citação deverá ser sempre pessoal.

Não haverá prorrogação em caso de litisconsórcio para a defesa.

A demarcação pode ser total ou parcial.

Para tanto, será necessário uma prova pericial.

A sentença determinará a linha demarcanda, determinando-lhe o traçado.

Duas são as fases do procedimento de demarcação. A primeira, que vai até o julgamento da pretensão de demandar, e a segunda, que é a fase executória, que determinará com a homologação dos trabalhos materiais de demarcação e com ela definir-se-á o traçado da linha demarcanda. Ademais, determinará a restituição da área invadida, se houver, declarando o domínio ou a posse do prejudicado ou de ambos.

Artigo 562 - Transitada em julgado a sentença, o perito efetuará a demarcação e colocará os marcos necessários.

Parágrafo único. Todas as operações serão consignadas em planta e memorial descritivo com as referências convenientes para a identificação, em qualquer tempo, dos pontos assinalados, observada a legislação especial que dispõe sobre a identificação do imóvel rural.

A demarcação de terras patrimoniais públicas, transcritas em nome da União, Estado, Município, Distrito Federal e territórios, é passível a demarcação, que será realizada através de ação discriminatória (Lei 6383/76). A competência será da Justiça Federal, se houver interesse da União, empresas púbicas ou autarquias.

Art. 583. As plantas serão acompanhadas das cadernetas de operações de campo e do memorial descritivo, que conterá:

I - o ponto de partida, os rumos seguidos e a aviventação dos antigos com os respectivos cálculos;

II - os acidentes encontrados, as cercas, os valos, os marcos antigos, os córregos, os rios, as lagoas e outros;

III - a indicação minuciosa dos novos marcos cravados, dos antigos aproveitados, das culturas existentes e da sua produção anual;

IV - a composição geológica dos terrenos, bem como a qualidade e a extensão dos campos, das matas e das capoeiras;

V - as vias de comunicação;

VI - as distâncias a pontos de referência, tais como rodovias federais e estaduais, ferrovias, portos, aglomerações urbanas e polos comerciais;

VII - a indicação de tudo o mais que for útil para o levantamento da linha ou para a identificação da linha já levantada.

Art. 584. É obrigatória a colocação de marcos tanto na estação inicial, dita marco primordial, quanto nos vértices dos ângulos, salvo se algum desses últimos pontos for assinalado por acidentes naturais de difícil remoção ou destruição.

Art. 585. A linha será percorrida pelos peritos, que examinarão os marcos e os rumos, consignando em relatório escrito a exatidão do memorial e da planta apresentados pelo agrimensor ou as divergências porventura encontradas.

Art. 586. Juntado aos autos o relatório dos peritos, o juiz determinará que as partes se manifestem sobre ele no prazo comum de 15 (quinze) dias.

Parágrafo único. Executadas as correções e as retificações que o juiz determinar, lavrar-se-á, em seguida, o auto de demarcação em que os limites demarcandos serão minuciosamente descritos de acordo com o memorial e a planta.

Art. 587. Assinado o auto pelo juiz e pelos peritos, será proferida a sentença homologatória da demarcação.

O agrimensor deverá juntar, ainda, com a planta as cadernetas de camo, isto é, cadernos nos quais ele executa seus cálculos, anotando suas operações. Os técnicos os consideram como um documento complementar e informativo e cuja falta não acarretará nulidade.

Concluídos os trabalhos do agrimensor, a linha deverá ser percorrida pelos arbitradores para conferência de marcos e rumos, tudo a ser consignado em relatório para a sua exatidão.

Há autores que entendem que, cumulativamente, faça-se queixa de turbação ou esbulho, tanto pelo promovente como pelo promovido, que deverá ser reconhecida na primeira fase do processo, quando o juiz decidir sobre a pretensão de demarcação.

Tem-se que a lavratura do auto é o preparo da sentença homologatória da demarcação. Se as partes não são ouvidas sobre ele, não há que falar em recurso. O auto deve ser assinado pelo juiz, agrimensor e arbitradores, mas basta a declaração judicial para suprir mera omissão.

Pergunta-se sobre a sentença homologatória da demarcação. Será declaratória. As custas devem ser rateadas na proporção, a não ser que uma das partes tenha provocado ato desnecessário a tal procedimento.

Há possiblidade de demarcação amigável, pela Lei 7244/84.

2.5.2. Communi dividundo – divisão de terras particulares

A propriedade, em regra, deve ser exclusiva, já que, se mais de uma pessoa for dona de um imóvel, seu uso será sempre incômodo.

Busca-se, aqui, a copropriedade, onde cada condômino exerce seu direito sobre o todo, sem determinação da parte. Fala-se em parte ideal do condomínio.

Haverá no procedimento duas fases. Na primeira, decide-se sobre a pretensão de dividir; na segunda, executam-se os trabalhos divisórios.

Legitimado para o pedido de divisão é o condômino que apresentará seus títulos de domínio, indicando:

I - a origem da comunhão e a denominação, a situação, os limites e as características do imóvel;

II - o nome, o estado civil, a profissão e a residência de todos os condôminos, especificando-se os estabelecidos no imóvel com benfeitorias e culturas;

III - as benfeitorias comuns.

As citações serão feitas na forma do artigo 575 e na forma dos artigos 577 a 578.

O juiz nomeará um ou mais peritos para promover a medição do imóvel e as operações de divisão, observada a legislação especial na matéria.

Todos os condôminos serão intimados para apresentar, em 10 dias, os seus títulos e, se não os tiverem, a formular os seus pedidos sobre a constituição de quinhões.

O pedido de divisão se classifica, tal como o de demarcatória, como ação imobiliária, em que o cônjuge deve dar seu consentimento para a propositura da ação e será citado quando o outro for o promovido.

A competência para a ação é a do foro da situação do imóvel. Mas se ele estiver em mais de uma comarca, a competência deve ser firmada pela prevenção.

Entende-se que é possível cumular divisão e demarcação, sendo citados os condôminos e confrontantes.

Na inicial o imóvel deverá ser descrito com precisão, indicando-se a denominação, limites, suas características.

Os réus que residirem na mesma comarca serão citados pessoalmente.

Art. 591. Todos os condôminos serão intimados a apresentar, dentro de 10 (dez) dias, os seus títulos, se ainda não o tiverem feito, e a formular os seus pedidos sobre a constituição dos quinhões.

Art. 592. O juiz ouvirá as partes no prazo comum de 15 (quinze) dias.

§ 1º Não havendo impugnação, o juiz determinará a divisão geodésica do imóvel.

§ 2º Havendo impugnação, o juiz proferirá, no prazo de 10 (dez) dias, decisão sobre os pedidos e os títulos que devam ser atendidos na formação dos quinhões.

Art. 593. Se qualquer linha do perímetro atingir benfeitorias permanentes dos confinantes feitas há mais de 1 (um) ano, serão elas respeitadas, bem como os terrenos onde estiverem, os quais não se computarão na área dividenda.

A sentença da primeira fase julga a pretensão de dividir e será declaratória.

A divisão entre os condôminos é simplesmente declaratória não se atribuindo a titularidade da coisa, pela propriedade, direito real. Mesmo fazendo-se a divisão, o direito de propriedade, pode vir a ser discutido em outro processo. Entende-se que o pedido de declaração de propriedade poderá ser feito para julgamento conjunto com a divisão, bem como, contestando-se o domínio, poderá ser objeto de discussão.

Contra a sentença que julga a pretensão de dividir, o recurso próprio é a apelação, recebida em ambos os efeitos. Porém, há o entendimento de que o recurso da decisão que homologa a divisão na segunda fase do processo não terá esse efeito, mas o relator poderá lhe conceder.

Decretada em julgado a sentença que julgou procedente a pretensão de dividir, nomeiam-se agrimensor e agrimensores para os trabalhos divisórios, se não tiverem sido feitos.

Todos os condôminos serão intimados a apresentar, dentro de 10 (dez) dias, os seus títulos, se ainda não o tiverem feito, e a formular os seus pedidos sobre a constituição dos quinhões.

Art. 592. O juiz ouvirá as partes no prazo comum de 15 (quinze) dias.

§ 1º Não havendo impugnação, o juiz determinará a divisão geodésica do imóvel.

§ 2º Havendo impugnação, o juiz proferirá, no prazo de 10 (dez) dias, decisão sobre os pedidos e os títulos que devam ser atendidos na formação dos quinhões.

Art. 593. Se qualquer linha do perímetro atingir benfeitorias permanentes dos confinantes feitas há mais de 1 (um) ano, serão elas respeitadas, bem como os terrenos onde estiverem, os quais não se computarão na área dividenda.

Art. 594. Os confinantes do imóvel dividendo podem demandar a restituição dos terrenos que lhes tenham sido usurpados.

§ 1º Serão citados para a ação todos os condôminos, se a sentença homologatória da divisão ainda não houver transitado em julgado, e todos os quinhoeiros dos terrenos vindicados, se a ação for proposta posteriormente.

§ 2º Nesse último caso terão os quinhoeiros o direito, pela mesma sentença que os obrigar à restituição, a haver dos outros condôminos do processo divisório ou de seus sucessores a título universal a composição pecuniária proporcional ao desfalque sofrido.

Os peritos proporão, em laudo fundamentado, a forma da divisão, devendo consultar, quanto possível, a comodidade das partes, respeitar, para adjudicação a cada condômino, a preferência dos terrenos contíguos às suas residências e benfeitorias e evitar o retalhamento dos quinhões em glebas separadas.

Art. 596. Ouvidas as partes, no prazo comum de 15 (quinze) dias, sobre o cálculo e o plano da divisão, o juiz deliberará a partilha.

Parágrafo único. Em cumprimento dessa decisão, o perito procederá à demarcação dos quinhões, observando, além do disposto nos arts. 584. e 585, as seguintes regras:

I - as benfeitorias comuns que não comportarem divisão cômoda serão adjudicadas a um dos condôminos mediante compensação;

II - instituir-se-ão as servidões que forem indispensáveis em favor de uns quinhões sobre os outros, incluindo o respectivo valor no orçamento para que, não se tratando de servidões naturais, seja compensado o condômino aquinhoado com o prédio serviente;

III - as benfeitorias particulares dos condôminos que excederem à área a que têm direito serão adjudicadas ao quinhoeiro vizinho mediante reposição;

IV - se outra coisa não acordarem as partes, as compensações e as reposições serão feitas em dinheiro.

Art. 597. Terminados os trabalhos e desenhados na planta os quinhões e as servidões aparentes, o perito organizará o memorial descritivo.

§ 1º Cumprido o disposto no art. 586, o escrivão, em seguida, lavrará o auto de divisão, acompanhado de uma folha de pagamento para cada condômino.

§ 2º Assinado o auto pelo juiz e pelo perito, será proferida sentença homologatória da divisão.

Realizada a medição das terras com sua perfeita classificação em qualidade e valores, bem como dos acessórios a que elas se aderem, os condôminos deverão ser intimados para, no prazo de dez dias, apresentar seus títulos e requerer seus quinhões.

Às partes também se oferece o direito de requerer os seus quinhões.

Decidida a questão da constituição de quinhões, ou apenas suplantada a fase própria, não se fazendo a divisão geodésica, o agrimensor e os arbitradores proporão, em laudo fundamentado, a forma de divisão.

O plano de divisão deverá ser apresentado em cálculo e o deverá também ser consignado em esquema gráfico.

As partes serão ouvidas sobre o cálculo e plano de divisão, podendo também requerer diligências das mais variadas espécies.

Terminados os trabalhos e, desenhados na planta os quinhões e as servidões aparentes, o perito organizará o memorial descritivo.

§ 1º Cumprido o disposto no art. 586, o escrivão, em seguida, lavrará o auto de divisão, acompanhado de uma folha de pagamento para cada condômino.

§ 2º Assinado o auto pelo juiz e pelo perito, será proferida sentença homologatória da divisão.

§ 3º O auto conterá:

I - a confinação e a extensão superficial do imóvel;

II - a classificação das terras com o cálculo das áreas de cada consorte e com a respectiva avaliação ou, quando a homogeneidade das terras não determinar diversidade de valores, a avaliação do imóvel na sua integridade;

III - o valor e a quantidade geométrica que couber a cada condômino, declarando-se as reduções e as compensações resultantes da diversidade de valores das glebas componentes de cada quinhão.

§ 4º Cada folha de pagamento conterá:

I - a descrição das linhas divisórias do quinhão, mencionadas as confinantes;

II - a relação das benfeitorias e das culturas do próprio quinhoeiro e das que lhe foram adjudicadas por serem comuns ou mediante compensação;

III - a declaração das servidões instituídas, especificados os lugares, a extensão e o modo de exercício.

Art. 598. Aplica-se às divisões o disposto nos arts. 575. a 578.

Com as retificações que entender necessárias, ou sem elas, o juiz, por despacho, que é um provimento sem recurso, determina a lavratura do auto de divisão, seguido de uma folha de pagamento para cada condômino.

O auto deve conter a confinação e a área do imóvel; a classificação das terras com o cálculo das áreas de cada consorte e a respectiva avaliação ou valor e quantidade de terras que vai caber a cada condômino, bem como as reduções e compensações resultantes da diversidade de valores das glebas de cada quinhão.

As folhas de pagamento irão descrever as linhas divisórias, as confrontações, as benfeitorias, as culturas do que tem o quinhão e das que lhe forem adjudicadas, por serem comuns, ou mediante compensação; a declarações das servidões (direitos reais) instituídas, especificados os lugres, a extensão e o modo do exercício.

Verificando a conformidade do auto e das folhas de pagamento com o que se deliberou, o juiz homologa a divisão.

Repita-se que o recurso que homologa a divisão é o recurso de apelação, mas recebida apenas no efeito suspensivo.

Se todos forem capazes, a divisão poderá ser feita por escritura púbica ou particular, conforme o valor do imóvel. Poderá ser feita por instrumento particular, devidamente homologado pelo juiz, e com a presença do Ministério Público, se houver interesse de incapazes (artigo 57, Lei 9099/95).

2.6. A EFETIVIDADE DO PROCESSO E A PROTEÇÃO INTERINAL

Sabe-se que a proteção interdital - única, no direito romano, apta à tutela específica de deveres de fazer e não fazer (ainda que restrita em alguns campos) - veio a desaparecer, no que tinha de essencial, com o alargamento do conceito de "obrigação" e da condemnatio, na cognitio extraordinaria. Posterior retomada dos remédios interditais na Idade Média foi sustada pela afirmação do "nemo ad factum praecise cogi post", na Europa continental (excetuando a Alemanha). Já o direito anglo-saxão, sobretudo com o advento da equity, apresenta grande proximidade com o processo interdital romano.

Observa-se que a decisão condenatória tem o condão de autorizar o emprego de mecanismos de sujeitação em processo subsequente; a executiva traz em seu dispositivo a determinação de imediata atuação de meios de sujeitação (sub-rogatórios), independentemente de novo processo; a mandamental, em vez da predeterminação de formas substitutivas da conduta do devedor, dirige-lhe ordem cuja inobservância caracteriza desobediência à autoridade estatal e pode implicar a adoção de medidas coercitivas. Os provimentos condenatórios, mandamentais e executivo lato sensu podem ser reunidos em uma única categoria: provimentos de repercussão física - desde que não ignoradas as diferenças estruturais que levaram a doutrina a propor a distinção terminológica, e que se tenha consciência de que os três não suprem, indistintamente, com a mesma eficiência, as diferentes necessidades da tutela, como explicou Eduardo Talamini (Tutela relativa aos deveres de fazer e de não fazer, pág. 478).

A adequada tutela para os deveres de fazer ou de não fazer nas relações de vizinhança implica, portanto: a) provimentos mandamentais e executórios lato sensu (acompanhados de mecanismos aptos a lhes dar efetividade); b) tutela inclusive preventiva; c) a concessão de provimentos de urgência, via aparência ou de evidência.

O texto do artigo 461 do CPC de 1973 objetivava a concessão de tutela especifica, significando obtenção de resultado final a que o direito visava, mediante conduta do próprio réu, resultado prático equivalente com aplicação de meios de sujeitação.

Veja-se o que diz o artigo 497 do CPC de 2015:

Art. 497. Na ação que tenha por objeto a prestação de fazer ou de não fazer, o juiz, se

p rocedente o pedido, concederá a tutela específica ou determinará providências que

a ssegurem a obtenção de tutela pelo resultado prático equivalente.

Sobre o autor
Rogério Tadeu Romano

Procurador Regional da República aposentado. Professor de Processo Penal e Direito Penal. Advogado.

Informações sobre o texto

Este texto foi publicado diretamente pelos autores. Sua divulgação não depende de prévia aprovação pelo conselho editorial do site. Quando selecionados, os textos são divulgados na Revista Jus Navigandi

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