A escolha do perfil do adotado em contraposição aos princípios de proteção à criança

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A escolha durante o processo de adoção baseado nas características físicas, biologias ou etárias, se torna morosa devido à incompatibilidade do perfil escolhido pelo adotante. O objetivo do trabalho é demonstrar que possibilidade de escolha do perfil.

“O coração tem razões que a razão desconhece”.  (La. 423 e Br. 277).

RESUMO:A escolha durante o processo de adoção baseado nas características físicas, biologias ou etárias, se torna morosa devido à incompatibilidade do perfil escolhido pelo adotante. O objetivo do trabalho é demonstrar que possibilidade de escolha do perfil do adotado fere os princípios inerentes à criança e ao adolescente, provocando entrave nas solicitações processuais de adoção e discriminação. A adoção é um processo chancelado pelo Estado para tornar possível a inserção de uma criança ou adolescente em um seio familiar diferente do biológico, com a função de proporcionar todos os direitos previstos legalmente. Apesar do rigor que envolve o processo de adoção, que visa sempre o melhor interesse da criança, a escolha do perfil do adotado constitui uma afronta aos princípios protetores, pois evidencia exclusivamente o desejo do postulante, em detrimento ao interesse maior da criança.

Palavras-Chave: Adoção. Criança e adolescente. Perfil.

ABSTRACT:The choice during the adoption process based on physical characteristics, biological or age, becomes slow due to the incompatibility of the profile chosen by the adopter. The objective of the study is to demonstrate that the possibility of choosing the adoptee's profile violates the principles inherent to the child and the adolescent, causing obstacles in the procedural requests for adoption and discrimination. Adoption is a process called by the State to make it possible to insert a child or adolescent into a family other than the biological one, with the function of providing all legally prescribed rights. Despite the rigor that involves the adoption process, which always aims at the best interests of the child, choosing the adoptee's profile constitutes an affront to the protective principles, as it only highlights the wish of the applicant, to the detriment of the child's greater interest.

Keywords:  Adoption. Child and adolescent. Profile.


1 INTRODUÇÃO

A evolução legislativa, proporcionada pelo advento da Constituição Federal de 1988, e pelo estatuto da criança e do Adolescente, trouxer mudanças expressivas relacionadas às crianças e aos adolescentes, instituindo princípios capazes de transformar a realidade e promover um desenvolvimento livre de preconceitos, injustiças e desrespeito.

Os princípios constitucionais baseados na dignidade da pessoa humana se irradiaram e contemplaram mudanças relacionadas àquelas crianças que estão em estado de abandono e necessitam do instituto da adoção, para serem acolhidas e inseridas no convívio familiar, ainda, que não sejam todos.

Apesar dos avanços relacionados ao processo de adoção, existe uma infinidade de pessoas habilitadas que estão cadastradas, assim, como também, um grande número de crianças que possui disposição para ser adotado, o que demonstra a existência de uma lacuna quanto ao procedimento deste instituto, pois nem sempre o delineamento do rosto a ser adotado é compatível com a escolha realizada pelo adotando no momento do preenchimento do cadastro.

Desta forma, a pesquisa questiona se a possibilidade do habilitado a adotar e escolher o perfil da criança a ser adotada, não fere os princípios consagrados pela Lei que rege o Instituto da adoção, inclusive o princípio da dignidade da pessoa humana estatuído na Constituição da República Federativa do Brasil de 05 de outubro de 1988, em seu artigo 1º, inciso III.

O objetivo do trabalho é demonstrar que a possibilidade de escolha do perfil do adotado fere os princípios inerentes à criança e ao adolescente, provocando entrave nos processos de adoção e discriminação.           


2 PRINCÍPIOS DE PROTEÇÃO DA CRIANÇA E DO ADOLESCENTE

O artigo 227 da Constituição Federal positivou uma série de direitos fundamentais às crianças e aos adolescentes, até então não instituídos, servindo de base para que o Estatuto da Criança e do Adolescente (ECA) implantasse medidas protetivas capazes de fortalecer tais e direitos fundamentais, visando superar a cultura menorista e concretizar os princípios e diretrizes da teoria da proteção integral (CUSTÓDIO, 2009, p. 43).

Conforme ensina Barroso (2011, p.23) “os princípios podem ser conceituados como a verdade básica e imutável de uma ciência, funcionando como pilares fundamentais da construção de todo o estudo doutrinário”, portanto, tais princípios expressos no E.C.A. são responsáveis por nortear as ações que possam direcionar as crianças e os adolescentes a um estado digno de desenvolvimento.

A evolução legislativa em torno da criança e do adolescente impulsionou as mudanças necessárias para buscar um melhor desenvolvimento a este grupo social baseado em princípios estabelecidos pela dignidade da pessoa humana, proteção integral, prioridade absoluta e melhor interesse da criança.

Os princípios que permeiam a proteção da criança e do adolescente possuem, como base constitucionalista, a dignidade da pessoa humana, por se tratar do “primeiro fundamento de todo o sistema constitucional posto, e o último arcabouço da guarida dos direitos individuais” (NUNES, p.366).

Cabe, portanto ao Estado garantir que tal princípio seja efetivado, conforme dispõe Dias (2015, p.61-62):

O princípio da dignidade da pessoa humana é o mais universal de todos os princípios. É um macroprincípio do qual se irradiam todos os demais: liberdade, autonomia privada, cidadania, igualdade e solidariedade, uma coleção de princípios éticos. [...] o princípio da dignidade da pessoa humana não representa apenas um limite de atuação do Estado, mas constitui também um norte para a sua ação positiva. O Estado não tem apenas o dever de abster-se de praticar atos que atentem contra a dignidade humana, mas também deve promover essa dignidade através de condutas ativas, garantindo o mínimo existencial para cada ser humano em seu território.

Neste sentido, a garantia da dignidade para crianças e adolescentes não pode ser expressa apenas com medidas protetivas, é necessário que se avance com políticas públicas que promovam o ser ou a pessoa, para que a criança seja tratada com o devido respeito igualitário.

O princípio da dignidade da pessoa humana expresso no artigo nº 18, do E.C.A. descreve que: “É dever de todos velar pela dignidade da criança e do adolescente, pondo-os a salvo de qualquer tratamento desumano, violento, aterrorizante, vexatório ou constrangedor” (BRASIL, 1990).

Desta forma, o estatuto recomenda que toda a sociedade se empenhe em respeitar e fazer respeitar os direitos das crianças e dos adolescentes, em agir em sua defesa, e comunicar qualquer desrespeito ou violação à integridade humanística, pois a partir da afirmação do princípio da dignidade da pessoa humana, como fundamento na ordem constitucional, irradiam-se também outros princípios essenciais à proteção da criança e do adolescente.

O princípio da proteção integral surge, portanto, ancorado na Constituição e no E.C.A. E baseado na Convenção Internacional dos Direitos da Criança, de modo a substituir o paradigma da situação irregular e eleva as crianças e os adolescentes a sujeitos de direitos, transformando sobremaneira a forma que as crianças e os adolescentes deveriam ser tratados.

Este princípio reconhece que todos os dispositivos legais e normativos têm por finalidade proteger integralmente as crianças e os adolescentes em suas necessidades específicas, decorrentes da idade, de seu desenvolvimento e de circunstâncias materiais, sendo, portanto, o Estatuto da Criança e do adolescente o responsável por tal normatização:

Art. 3º A criança e o adolescente gozam de todos os direitos fundamentais inerentes à pessoa humana, sem prejuízo da proteção integral de que trata esta Lei, assegurando-lhes, por lei ou por outros meios, todas as oportunidades e facilidades, a fim de lhes facultar o desenvolvimento físico, mental, moral, espiritual e social, em condições de liberdade e de dignidade (BRASIL, 1990).

Desta forma, o citado artigo reafirma o valor essencial da criança como ser humano, expondo a real necessidade do respeito à sua condição de desenvolvimento, que deve ser valorizado em decorrência de sua importância para a continuidade das gerações. Portanto, sua vulnerabilidade deve ser reconhecida para que possam merecer a proteção integral por parte da família, da sociedade e do Estado, através de políticas públicas específicas.

O princípio da prioridade absoluta expresso no artigo 227 da Constituição Federal/1988, e, ratificado pelo E.C.A., expressa que as crianças e os adolescestes devem sempre estar em primeiro lugar no planejamento dos governantes, e que primeiro, necessariamente, devem ser atendidos todas as suas necessidades, pois o maior patrimônio de uma nação é o seu povo, e o maior patrimônio do povo são as suas crianças e os jovens, sendo, portanto, essencial o cumprimento efetivo do que está expresso no artigo 4º do Estatuto da Criança e do Adolescente:

Art. 4º - É dever da família, da comunidade, da sociedade em geral e do Poder Público, assegurar com absoluta prioridade a efetivação dos direitos referentes à vida, à saúde, à alimentação, à educação, ao esporte, ao lazer, à profissionalização, à cultura, à dignidade, ao respeito, à liberdade e à convivência familiar e comunitária.

    Conforme descreve Fonseca (2012), a prioridade absoluta vincula a família, os administradores, os governantes em geral, os legisladores em suas esferas de competência, os magistrados da Infância e da Juventude, os membros do Ministério Publico, os Conselheiros tutelares, bem como as demais organizações e este principio abarca superior interesse de crianças e adolescentes, portanto,  consiste em um tratamento prioritário a todas as relações que envolvem crianças e adolescente, para a família, a sociedade e Poder Público, mediante a necessidade de cuidado especial para com esse segmento de pessoas, muito  em decorrência da fragilidade com que se relacionam no meio social e o status de pessoas em desenvolvimento.

Neste sentido, o artigo 4º do E.C.A. complementa que para se garantir a prioridade elencada é necessário que se efetive tais direitos observando a primazia de receber proteção e socorro em quaisquer circunstâncias, a precedência do atendimento nos serviços públicos ou de relevância pública, a preferência na formulação e na execução das políticas sociais públicas e destinação privilegiada dos recursos públicos nas áreas relacionadas com a proteção à infância e à juventude.

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O princípio do melhor interesse da criança e do adolescente, apesar de não estar expresso no texto constitucional, foi adotado pelo seu cunho protecionista após sua ratificação pela Convenção Internacional das Crianças no Brasil, que dispõe em seu artigo 3º, inciso I: "todas as ações relativas às crianças, levadas a efeito por instituições públicas ou privadas de bem-estar social, tribunais, autoridades administrativas ou órgãos legislativos, devem considerar, primordialmente, o interesse maior da criança” (BRASIL, 1990).

O artigo nº 100, do E.C.A. em seu inciso IV dispõe que em relação ao  interesse superior da criança e do adolescente, a intervenção deve atender prioritariamente aos interesses e direitos da criança e do adolescente, sem prejuízo da consideração que for devida a outros interesses legítimos no âmbito da pluralidade dos interesses presentes no caso concreto.

Neste sentido, tal princípio deve nortear toda política voltada para a infância e adolescência, sendo que quando da formulação e execução das legislações inerentes a este público alvo, o mesmo deve ser considerado para a efetiva resolução entre interesses de crianças e terceiras pessoas (DINIZ, 2009).

Para Coelho (2012) aplicação deste princípio estabelece aos pais e responsáveis, além do papel do Estado, em garantir àqueles que não têm condições se assegurar para si, instituições e serviços de atendimento que obedeçam a normas segurança, saúde, idoneidade de pessoal atendente e supervisão.

Desta forma, o principio do melhor interesse da criança possui um sentido amplo tanto nas questões familiares quanto nas políticas públicas, devendo as decisões ser orientadas para efetivar e preservar o que melhor atende ao desenvolvimento sadio da pessoa em formação, sob todos os aspectos (SPOSATO, 2009).

Tal fundamento evidenciado pela condição de pessoa em formação pressupõe que as crianças e adolescentes devem ser defendidos e protegidos com a urgência necessária ao seu desenvolvimento favorável, enquanto ainda vivem a infância ou adolescência.


3 DESENVOLVIMENTO HISTÓRICO DO INSTITUTO DA ADOÇÃO

O instituto da adoção remonta desde a antiguidade conforme relatos  bíblicos no Livro de Genesis, onde Sara que era uma mulher estéril procura alcançar a maternidade através de uma escrava, que após gerar os filhos, os entregaria  a sua ama (GONÇALVES, 2017).

Durante o Império Romano a adoção era utilizada além da função religiosa, como um instrumento familiar, político e econômico que possuía duas modalidades, sendo a adotiva (adoção propriamente dita) um modelo que exigia apenas a anuência do pai biológico e do adotante, extinguia-se o pátrio poder do pai natural, que consistia na cessão de direito pura e simples em favor do adotante, que deveria ser realizada perante o pretor (PAPALEO, 2004).

No Brasil, a doção passou a ser disciplinada pelo Código Civil de 1916, estabelecendo que o adotante deveria ter, no mínimo, cinquenta anos, ser pelo menos dezoito anos mais velho que o adotado e não possuir outros filhos legítimos ou legitimados, com o objetivo de oportunizar a maternidade ou a paternidade àquele que não possuía ou gostaria de ter filhos biológicos (GONÇALVES, 2017).

Com a Lei nº 3.133, de 8 de maio de 1957 ocorreram profundas alterações em relação à adoção, a idade limite baixou para 30 anos, ao tutor e curador era defeso adotar o tutelado ou curatelado, para que assim se evitasse encobrir a má administração dos bens feita por aquele e  a distância entre as idades do adotante e do adotando também foi objeto de mudança pela supracitada lei, sendo a diferença minorada em dezesseis anos.

A Lei n. 4.655, de 2 de junho de 1965, instituiu a “legitimação adotiva”, como proteção à crianças em estado de abandono,  com a vantagem de estabelecer um vínculo de parentesco de primeiro grau entre adotante e adotado, desfazendo, portanto os laços com a família, após a legitimar  através de sentença, registrando os adotantes como se tivessem realmente tido um filho natural e se tratasse de registro fora do prazo (GONÇALVES, 2017).

Por meio da Lei nº 6.697, de 10 de outubro de 1979, foi recepcionado em nosso ordenamento jurídico o Código de Menores, dispondo a respeito de situações protetivas para pessoas com menos de 18 (dezoito) anos, que estivessem em situação irregular, caso em que prevaleceria a regra da sobredita Lei ante o Código Civil (GONÇALVES, 2017).

Com o Estatuto da Criança e do Adolescente (Lei n. 8.069, de 13-7-1990), a adoção passou por nova regulamentação, trazendo como principal inovação a regra de que a adoção seria sempre plena para os menores de 18 anos. A adoção simples, por outro lado, ficaria restrita aos adotandos que já houvesse completado essa idade. Passaram a ser distinguidas, assim, duas espécies legais de adoção: a civil para os casos envolvendo maiores – tratada pelo 

Código Civil de 1916 e a estatutária para os casos de menores, crianças e adolescentes – tratada pelo Estatuto da Criança e do Adolescente (E.C.A.). (GONÇALVES, 2017).

 O Código Civil de 2002 havia consolidado a matéria, não mais prevalecendo a divisão acima apontada, eis que o Código Civil de 1916, que tratava da adoção simples, foi totalmente revogado ou ab-rogado (art. 2.045 do CC). Assim sendo, o Código Civil de 2002 era tanto para a adoção de maiores quanto de menores de 18 anos (TARTUCE, 2017).

As promulgação da Lei 12.010, em 3 de agosto de 2009, conhecida como Lei Nacional da Adoção ou Nova Lei da Adoção, revogou vários dispositivos do Código Civil que tratavam da adoção, e determinou que determina que a adoção de crianças e adolescentes será deferida na forma prevista pela Lei 8.069, de 13 de julho de 1990 (ECA), ou seja, a matéria de adoção, relativa a menores e a maiores, passou a ser consolidada no Estatuto da Criança e do Adolescente (TARTUCE, 2017).           

3.1 Conceito de Adoção

De acordo com Dias (2015) a adoção é um ato jurídico em sentido estrito, cuja eficácia está condicionada à chancela judicial, sendo que tal instituto cria um vínculo fictício de paternidade-maternidade-filiação entre pessoas estranhas, análogo ao que resulta da filiação biológica, constituindo um parentesco eletivo, pois decorre exclusivamente de um ato de vontade.

Desta forma, a adoção é um processo chancelado pelo Estado para tornar possível a inserção de uma criança ou adolescente em um seio familiar diferente do biológico, com a função de proporcionar todos os direitos previstos legalmente.

Diniz (2009) conceitua adoção como “ato jurídico solene pelo qual, observados os requisitos legais, alguém estabelece, independentemente de qualquer relação de parentesco consanguíneo ou afim, um vínculo fictício de filiação, trazendo para sua família, na condição de filho, pessoa que, geralmente, lhe é estranha. Dá origem, portanto, a uma relação jurídica de parentesco civil entre adotante e adotado.

Rizzardo (2009, p. 543), ao tratar da adoção, faz questão de esclarecer que, “em termos singelos, nada mais representa esta figura que o ato civil pelo qual alguém aceita um estranho na qualidade de filho. Em última análise, corresponde à aquisição de um filho através de ato judicial de nomeação”.

3.2  Requisitos para adoção

Com a promulgação promulgada a Lei 12.010, em 3 de agosto de 2009, conhecida como Lei Nacional da Adoção (LNA) ou Nova Lei da Adoção, a matéria ficou consolidada no Estatuto da Criança e do Adolescente (ECA, Lei 8.069/1990), que passou a regulamentar através do art. 47  que a adoção sempre depende de sentença judicial no atual sistema, seja relativa a maiores ou menores (TARTUCE, 2017).

Neste sentido, a competência sobre o assunto cabe exclusivamente ao Poder Judiciário, ficando bem claro que não existe a possibilidade de adoção extrajudicial, portanto quem pretende adotar uma criança na atualidade, deve propor uma ação judicial correspondente.

O processo de adoção corre na Vara da Infância e Juventude nos casos de menores e na Vara da Família em casos de maiores, sempre com a intervenção do Ministério Público, pois se trata de questão envolvendo o estado de pessoas e a ordem pública (TARTUCE, 2017).

A responsabilidade institucional pela adoção está dividida entre a União, Estado e Comarca. Em termos de União, o CNJ tem a responsabilidade em relação ao CNA, conforme determina o § 5º do artigo 50 do ECA, além das atribuições constitucionais que lhe são conferidas. No Estado há, em regra, a Autoridade Central Estadual, comumente denominada Comissão Judiciária de Adoção (C.E.J.A) e, conforme o Código de Organização Judiciária, cada comarca terá uma vara especializada para tratar de assuntos ligados à criança e ao adolescente (BARANOSKI, 2016).

 Obrigatoriamente, conforme determina o artigo 50 do E.C.A., no que tange aos requisitos formais, o primeiro deles é o cadastramento dos interessados em adotar em Juízo, sendo este cadastramento chamado de habilitação, a qual se revela um procedimento bastante burocrático com uma petição inicial, que deve ser acompanhada de uma série de documentos, como comprovante de renda, comprovante de domicílio, atestado de sanidade física e mental, certidão de antecedentes criminais e negativa de distribuição cível.

Ao efetuar o pedido para o cadastro de pretendentes à adoção na Vara de Infância e Juventude o pretendente passará por um atendimento psicossocial e jurídico, realizada por uma equipe técnica interprofissional (BARANOSKI, 2016).

O rigor da avaliação esta relacionada ao foco da justiça em satisfazer os interesses da criança, para que a mesma exerça o pleno direito à convivência familiar, por isso, devem ser observados os motivos e preparo dos pretendentes, sempre prevalecendo o interesse do menor sobre a vontade do adotando.

Imperiosa, portanto, a necessidade da participação de reuniões/cursos oferecidos pela justiça da infância e juventude e/ou grupos de apoio à adoção. A participação vai colaborar para que o interessado reflita sobre o ato da adoção, a constituição da pater/maternidade bem como no perfil da criança/adolescente desejados (BARANOSKI, 2016).

Esta intervenção é muito importante para conscientizar os futuros pais adotivos sobre as responsabilidades e obrigações referentes à filiação, e possam se capacitar para enfrentar os aspectos inerentes da infância e adolescência.

Cumprindo todo este processo e deferida a ação, o juiz fixa, em função das peculiaridades do caso, conforme determina o art. 46 do ECA,  a duração que deve ter o estágio de convivência entre as partes, com objetivo de proporcionar uma mostra de como será a vida em família depois da adoção, de modo a verificar se há a compatibilidade entre as pessoas envolvidas que mostrem a conveniência da medida (COELHO, 2012).

O propósito do estágio de convivência é promover a adaptação da criança ou adolescente à nova família para constituir uma relação afinidade e afetividade, aspectos importantes para que se efetive a proporcionar a proteção integral da criança e, consequentemente, determine o deferimento da adoção.

Conforme determina o ECA em seu art. 47, finalizado o processo de adoção, o mandado judicial ficará arquivado em cartório, mas dele não se dará certidão, a não ser por determinação do juiz para salvaguarda de direitos; igualmente não se fará nenhuma observação, nas certidões expedidas, da adoção, sendo tais medidas determinadas na lei para preservar o adotado de quaisquer preconceitos.

Em relação a quem pode adotar, o ECA dispõe no art. 42 que só a pessoa maior de 18 anos pode adotar, independente de seu estado civil, ou seja, mesmo que a pessoa seja solteiro e seja 16 anos mais velho que o adotando. Além disso,  não podem adotar os ascendentes e os irmãos do adotando. Não existe nenhum óbice para que o solteiro, viúvo, separado ou divorciado que viva sozinho possa adotar (adoção unilateral), o que se constituirá  em uma família monoparental.

Conforme esclarece Tartuce (2017), o artigo 42 do ECA trás uma novidade interessante ao substituir  a denominação “adoção bilateral”, realizada por duas pessoas, para adoção conjunta, modalidade de adoção em que é indispensável que os adotantes sejam casados civilmente ou mantenham união estável, comprovada a estabilidade da família. Porém em seu Inciso § 4.º, do art. 42, o Estatuto passou a prever que: 

“os divorciados, os judicialmente separados e os ex-companheiros podem adotar conjuntamente, contanto que acordem sobre a guarda e o regime de visitas e desde que o estágio de convivência tenha sido iniciado na constância do período de convivência e que seja comprovada a existência de vínculos de afinidade e afetividade com aquele não detentor da guarda, que justifiquem a excepcionalidade da concessão”

Tal medida inovadora reflete a aceitação das novas concepções familiares baseadas na afetividade, que direcionam mudanças de paradigmas e encaminham direitos antes nunca concedidos a estes novos arranjos de família, promovendo a inserção da adoção homoafetiva neste contexto.

Esclarece Tartuce (2017), que o Superior Tribunal de Justiça admite a adoção homoafetiva, conforme decisão publicada no seu Informativo n. 432. Na esteira da doutrina transcrita, pode-se dizer que o dispositivo citado constitui fundamento jurídico para se admitir a adoção por casal entre pessoas do mesmo sexo. Em reforço, pode ser utilizado o art. 43 do ECA, pelo qual “a adoção será deferida quando apresentar reais vantagens para o adotando e fundar-se em motivos legítimos”.

Desta forma, a orientação sexual não mais impossibilita a adoção, e as pessoas do mesmo sexo também podem ser habilitadas para adotar, baseado nas inúmeras decisões judiciais que podem servir de amparo para eventual recurso quando ocorrer a negativa às pessoas em união homoafetivas.

3.3 Os efeitos da adoção

A consolidação do instituto atribui a condição de filho ao adotado, com os mesmos direitos e deveres, inclusive sucessórios, sendo recíproco o direito sucessório entre o adotado, seus descendentes, o adotante, seus ascendentes, descendentes e colaterais até o quarto grau, observada a ordem de vocação hereditária (art. 41, § 2.º, do ECA). A norma representa aplicação do princípio da igualdade entre os filhos, o que atinge o filho adotivo na questão sucessória.

Em relação ao princípio da igualdade entre os filhos enunciado pela Constituição Federal (art. 227, § 6º), dispõe que os filhos são titulares dos mesmos direitos, tenham vindo do casamento, sejam oriundos de relação sem laços matrimoniais, nasçam à margem do casamento,  ou decorra da filiação de adoção.

Com a atribuição do pátrio poder aos adotantes, estes ficam encarregados de sustentar, guardar e educar os filhos menores, cabendo-lhes ainda a obrigação de cumprir e fazer cumprir as determinações judiciais quando for do interesse do adotando, como explica o artigo 22, ECA. O pátrio poder deverá ser cumprido em igualdade de condições pelos pais, como assevera o ECA em seu artigo 21, sendo direito inerente aos pais, no caso de discordância, recorrer à autoridade judiciária competente para resolver a desavença.

O direito do adotando de receber alimentos resulta do princípio constitucional da igualdade entre os filhos, disposto no artigo 227, § 2º, da Constituição Federal, e do dever constitucional que os pais tem de assistir, criar e educar os filhos menores, como ilustra o artigo 229 do mesmo texto legal, pois são devidos alimentos, reciprocamente, entre adotante e adotado, pois tornam-se parentes e a prestação de alimentos é decorrência normal do parentesco que então se estabelece.

Ao assumirem a condição de pais do adotando, consequentemente assumem o poder de administrar e usufruir os bens deste. Portanto serão os administradores legais dos bens do adotando. A administração não importa na alienação, hipoteca ou qualquer ônus aos bens, pois somente poderão ser praticados atos reservados à conservação e ao desenvolvimento desses (DINIZ, 2009).

Sobre os autores
Geraldo Guilherme Ribeiro de Carvalho

Bacharel em Direito pela Faculdade de Direito de Varginha, Estado de Minas Gerais, em 11 de fevereiro de 1995. Estagiário do Ministério Público do Estado de Minas Gerais. Bacharel em Filosofia pela FAJE - FACULDADE JESUÍTA DE FILOSOFIA E TEOLOGIA, de Belo Horizonte, MG, em Dezembro de 2008, Bacharel em Licenciatura Plena pela FAJE - FACULDADE JESUÍTA DE FILOSOFIA E TEOLOGIA, de Belo Horizonte, MG, em Dezembro de 2009 e Mestre em Filosofia, na área de concentração em Ética pela FAJE - FACULDADE JESUÍTA DE FILOSOFIA E TEOLOGIA, de Belo Horizontes, Estado de Minas Gerais. Atualmente, Professor de Filosofia Geral e Jurídica e Direito Constitucional, na Faculdade Presidente Antônio Carlos de Teófilo Otoni, Estado de Minas Gerais (UNIPAC).

Roberta Oliveira Silva

Acadêmica e formanda do 10º Período, Turma I, da Faculdade Presidente Antônio Carlos, da Cidade de Teófilo Otoni, Estado de Minas Gerais.

Informações sobre o texto

Este texto foi publicado diretamente pelos autores. Sua divulgação não depende de prévia aprovação pelo conselho editorial do site. Quando selecionados, os textos são divulgados na Revista Jus Navigandi

Mais informações

Trabalho oriundo do - TCC - da acadêmica e formanda do Curso de Direito da Faculdade Presidente Antônio Carlos, de Teófilo Otoni, Estado de Minas Gerais. Orientador e Revisor: Professor Me. Geraldo Guilherme Ribeiro de Carvalho, na Faculdade Presidente Antônio Carlos, da Cidade de Teófilo Otoni, Estado de Minas Gerais. UNIPAC-TO.

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