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A sociedade, o neoconstitucionalismo, o ativismo judicial, o efeito “backlash” e o Direito

20/12/2018 às 19:52

Resumo:


  • A sociedade brasileira está dividida entre conservadorismo e progressismo, levando a uma instabilidade política.

  • O neoconstitucionalismo trouxe uma atuação mais enfática do judiciário na defesa dos direitos fundamentais, levando ao ativismo judicial.

  • O ativismo judicial gera reações sociais, conhecidas como efeito "backlash", que podem agravar as divisões e instabilidades sociais.

Resumo criado por JUSTICIA, o assistente de inteligência artificial do Jus.

O artigo visa fazer breves explanações sobre neoconstitucionalismo, ativismo judicial e seus efeitos no contexto social brasileiro. A análise da liminar em Medida Cautelar na ADC 54 serve como forma de exemplifcar a reflexão apresentada.

Como profere o brocardo jurídico “ubi societas ibi jus”, ou seja, onde há (está) sociedade há (está) o direito, tradução literal, mas um pouco mais contextualizada seria: A sociedade é o direito e o direito é a sociedade. Dessa forma, compreende-se que o Direito é o reflexo da sociedade e a sociedade o reflexo do Direito que a ela se aplica, mas aqui se faz válida uma indagação: - No Brasil dos dias de hoje tal “máxima” é completamente válida?

O país está marcado por uma grave instabilidade política o que leva a uma divisão social. Observa-se uma parcela significativa da sociedade que clama por conservadorismo e políticas mais reacionárias, poderia se dizer a maioria, uma também significativa parcela social extremamente revolucionária, que clama por políticas progressistas, e por uma parte da população que prefere se abster das questões e posicionamentos políticos. Isto é, a sociedade está completamente dividida e insegura juridicamente, o que se agrava com o ativismo judicial, será definido mais adiante no artigo.

Para adentrar ao assunto cabe a definição de neoconstitucionalismo, que pode ser conceituado como uma visão constitucional mais preocupada com a aplicação e ampliação dos direitos humanos e das garantias individuais e coletivas como um todo, contudo sem negar a visão constitucionalista liberal, garantias individuais das constituições francesa e americana 1781 e 1787, respectivamente, mas evoluindo a visão dessas (SOBRINHO, 2012).

Como cita Nunes Júnior (2018, p. 78):

O Neconstitucionalismo é um movimento social, político e jurídico surgido após a Segunda Guerra Mundial, tendo origem nas constituições italiana (1947) e alemã (1949), fruto do pós-positivismo, tendo como marco teórico o princípio da “força normativa da Constituição” e como principal objetivo garantir a eficácia das normas constitucionais, principalmente dos direitos fundamentais.

O neoconstitucionalismo trouxe uma atuação mais enfática e presente do judiciário na defesa dos direitos fundamentais, ou seja, uma judicialização das questões sociais (BARROSO, 2008). Contudo tal atuação tem se tornado cada vez mais exacerbada e excessiva sendo contrária muitas vezes ao cenário social, mas também ao papel do Judiciário na separação de poderes, ou seja, a atuação se torna exagerada e desregulada dando vez ao ativismo judicial.

Como cita Barroso (2008, p.4):

A ideia de ativismo judicial está associada a uma participação mais ampla e intensa do Judiciário na concretização dos valores e fins constitucionais, com maior interferência no espaço de atuação dos outros dois Poderes. A postura ativista se manifesta por meio de diferentes condutas, que incluem: (i) a aplicação direta da Constituição a situações não expressamente contempladas em seu texto e independentemente de manifestação do legislador ordinário; (ii) a declaração de inconstitucionalidade de atos normativos emanados do legislador, com base em critérios menos rígidos que os de patente e ostensiva violação da Constituição; (iii) a imposição de condutas ou de abstenções ao poder público, notadamente em matéria de políticas públicas.

Diante do exposto, cada vez mais se faz presente a atuação do judiciário frente aos demais poderes levando-se ao ativismo judicial que é a expressão utilizada para definir a atuação “além da conta” do judiciário, ou seja, há um protagonismo exacerbado desse poder, bem como uma extrapolação de suas funções constitucionais em suas decisões, pois esse passa a definir os rumos da sociedade e tão logo do Direito por seu arbítrio. É um excesso de protagonismo na separação de poderes (NUNES JÚNIOR, 2018).

As decisões judiciais podem ser majoritárias ou contramajoritárias, favoráveis ou não aos anseios da maioria social, mas como definir o principal anseio em uma sociedade tão dividida quanto à brasileira? Seria praticamente impossível. Tal fato leva a outro problema do ativismo, o qual seria o agravamento das instabilidades e divisões sociais, devido a extrema insegurança jurídica gerada, observada nas revoltas e reações na sociedade.

As reações sociais podem ser definidas como efeito “backlash”, como cita Nunes Júnior (2018, p. 88):

Uma reação ao ativismo judicial é o “efeito backlash”. A palavra “backlash” pode ser traduzida como uma forte reação por um grande número de pessoas a uma mudança ou evento recente, no âmbito social, político ou jurídico. Assim, o “efeito backlash” nada mais é do que uma forte reação, exercida pela sociedade ou por outro Poder a um ato (lei, decisão judicial, ato administrativo etc.) do poder público.

Em suma, o efeito “backlash” como cita Cavalcante (2017, p.1):

Em palavras muito simples, efeito backlash consiste em uma reação conservadora de parcela da sociedade ou das forças políticas (em geral, do parlamento) diante de uma decisão liberal do Poder Judiciário em um tema polêmico.

O caso mais recente de ativismo e reações sociais, efeito “backlash”, assunto da ordem do dia, foi a decisão liminar do Ministro Marco Aurélio de Mello na cautelar na ADC 54, em que, por decisão monocrática e no último dia de atividade judicial anterior ao recesso do judiciário, afastou a incidência da possibilidade de execução provisória da pena em segunda instância, suspendendo a prisão dos condenados em segunda instância, alegando o referido ministro pela inconstitucionalidade de tal execução, não atinente ao artigo 5°, inciso LVII, da Constituição Federal de 1988 (CF/88), bem como pela aplicação dos artigos 283 e 312 do CPP. A decisão foi rechaçada quase instantaneamente pelo Ministro Dias Tofolli, Presidente do STF, o qual acatou o pedido da PGR suspendendo a liminar até o dia 10 de Abril de 2019, data que tal ADC já seria julgada definitivamente pelo plenário do Supremo com fundamento na contrariedade de decisões plenárias com Repercussão Geral.

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Tal situação citada alhures gera extrema insegurança jurídica na sociedade e nos aplicadores do Direito, juristas, pois envolve casos de inúmeros políticos, pessoas públicas idolatradas por uns e odiadas por outros, levando a reações majoritárias e contramajoritárias bem como representa uma equivocada atuação do Poder Judiciário, o qual deveria protagonizar a defesa dos direitos fundamentais da população e não gerar mais divisão e instabilidade social através de sua atuação frente aos demais poderes.

Logo, a atuação exagerada do judiciário divide ainda mais a sociedade, pois não envolve uma questão meramente formal de aplicação jurídica, mas também de anseios político-sociais, ou seja, uma “cascata” de reações das mais diversas, piorando a sociedade em vez de melhorá-la. A função do juiz não é de decidir pelo povo, mas sim em prol do povo da melhor maneira possível dentro dos ditames constitucionais e legais, atuando de forma ativa e protagonista, mas sem excessos e “ativismos” a fim de não promover empasses e embates desnecessários em uma sociedade já completamente dividida e que se conflita rotineiramente. Afinal a sociedade é o Direito e o Direito é a sociedade.


Referências

BRASIL. Constituição Federal de 1988. Promulgada em 5 de outubro de 1988. Disponível em <https://www.planalto.gov.br/ccivil_03/constituicao/constituição.htm>.

NUNES JÚNIOR, Flávio Martins Alves. Curso de direito constitucional/ Flávio Martins Alves Nunes Júnior. 2°. ed. rev. atual. Ampl. São Paulo : Thomson Reuters Brasil, 2018.

GUTIERREZ SOBRINHO, Emílio. Aspectos teóricos do movimento neoconstitucional. Revista Jus Navigandi, ISSN 1518-4862, Teresina, ano 17, n. 3319, 2 ago. 2012. Disponível em: <https://jus.com.br/artigos/22345/aspectos-teoricos-do-movimento-neoconstitucional>. Acesso em: 20 dez. 2018.

BARROSO, Luís Roberto. Judicialização, Ativismo Judicial e Legitimidade Democrática. Disponível em: <https://www.conjur.com.br/2008-dez-22/judicializacao_ativismo_legitimidade_democratica>. Acesso em: 20/12/2018.

CAVALCANTE, Márcio André Lopes. Breves comentários à EC 96/2017 (Emenda da Vaquejada). Dizer o Direito, ano 8, 7 jun 2017. Disponível em: <https://www.dizerodireito.com.br/2017/06/breves-comentarios-ec-962017-emenda-da_7.html>. Acesso em: 20/12/2018.

Supremo Tribunal Federal. Medida Cautelar na ADC n° 54/2018 DF. Ministro Relator Marco Aurélio de Mello. Dje: 19/12/2018. Disponível em: <https://stf.jus.br/portal/cms/verNoticiaDetalhe.asp?idConteudo=399127&caixaBusca=N>. Acesso em : 20/12/2018.

Supremo Tribunal Federal. Suspensão De Liminar SL 1.188/2018 DF. Registrado Ministro Presidente Dias Toffoli. Dje: 19/12/2018. Disponível em:<https://stf.jus.br/portal/cms/verNoticiaDetalhe.asp?idConteudo=399141&caixaBusca=N>. Acesso em: 20/12/2018.

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