ADPF 442 STF: quando o ativismo judicial chega ao cume da perversão militante

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07/01/2019 às 21:54
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3. CONCLUSÃO

No decorrer deste trabalho foi questionada a legitimidade da ADPF 442 apresentada perante o STF pelo Partido Político PSol, visando a legalização do aborto no Brasil.

A falta de representatividade popular do próprio partido envolvido e, principalmente, da ideia ali defendida foi apresentada como sério argumento para que sequer se cogitasse do conhecimento do pleito.

Inobstante, o STF acatou o pedido de conhecimento e instalou um procedimento de audiências públicas prévias ao efetivo julgamento do caso. Nessas audiências também se verificou a irregularidade patente da aceitação como “Amicus Curiae” de entidades promotoras do aborto e divulgadoras de meios abortivos com atuação inclusive em território nacional, infringindo as leis vigentes e, até o momento, válidas. Entidades, portanto, que claramente praticam crimes e contravenções penais em território nacional, ligadas à questão do aborto e do anúncio de meios abortivos, são admitidas como “amigas da corte” (na tradução literal da expressão), revelando escandalosa parcialidade na apreciação da matéria já em seu início.

Finalmente foi analisada a legislação brasileira sob o ângulo ordinário, constitucional e convencional, restando evidente que a vida humana é tutelada em nosso país desde a sua concepção, não havendo espaço para alterações que não infrinjam a legalidade e a tripartição de poderes. Ademais, o conceito constitucional de “dignidade humana”, como “Princípio Fundamental”, embora sujeito a interpretações equívocas (reducionistas ou mesmo extensivas demais), certamente alcança o ser humano a partir da concepção, pois que os dispositivos constitucionais relativos à proteção do direito à vida humana e da dignidade humana somente podem ser corretamente delineados em conjunto harmônico com o dispositivo convencional do Pacto de São José da Costa Rica.

No caso de eventual decisão esdrúxula da Suprema Corte, caberá a reação do legislador na qualidade de legítimo representante da vontade popular, reiterar a criminalização do aborto na forma como se encontra em nosso ordenamento, bem como o reconhecimento dos direitos do nascituro, inclusive os mais básicos que são os direitos à vida e à existência. Deverá o Legislativo demonstrar ao Judiciário que houve abuso ativista e, se a reiteração da legislação ordinária não for o suficiente para provocar uma autocrítica do Judiciário, então uma emenda constitucional deverá ser elaborada, não deixando margem para qualquer dúvida ou desconstrução por meio de expedientes exóticos e impertinentes.


4. REFERÊNCIAS

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Notas

1 O Psol tinha na última legislatura apenas 6 deputados eleitos. Agora subiu seu número para 10 deputados, o que não o retira da zona de baixíssima representatividade. Cf. MELO, Débora. Psol passa a ter 10 deputados na Câmara Federal. Disponível em https://www.pragmatismopolitico.com.br/2018/10/psol-deputados-camara-federal.html , acesso em 05.01.2019. Outro fator importante é que o Psol sequer tem representante (um único) no Senado. Cf. BARRETO, Waldemir. Composição do Senado salta de 15 para 21 partidos em 2019. Disponível em https://www12.senado.leg.br/noticias/materias/2019/01/03/composicao-do-senado-salta-de-15-para-21-partidos-em-2019 , acesso em 05.01.2019. Note-se que mesmo com a junção com outros partidos de esquerda, o projeto não teria viabilidade no Congresso Nacional.

2 Cf. BARBOSA, Renan, DRECHSEL, Denise. Novas Pesquisas confirmam que brasileiro é contra o aborto. Disponível em https://www.gazetadopovo.com.br/justica/novas-pesquisas-confirmam-que-brasileiro-e-contra-o-aborto-5gld9xyv0eztairju3ºldlp05/ , acesso em 05.01.2019.

3 NOELLE – NEUMANN, Elisabeth. A Espiral do Silêncio. Trad. Cristian Derosa. Florianópolis: Estudos Nacionais, 2017, p. 39.

4 Op. Cit., p. 65.

5 FERNANDES, André Dias. Modulação de efeitos e decisões manipulativas no controle de constitucionalidade brasileiro – possibilidades, limites e parâmetros. Salvador: Juspodivm, 2018, p. 318.

6 MARTINS, Ricardo Marcondes. Neoconstitucionalismo. Disponível em https://enciclopediajuridica.pucsp.br/verbete/134/edicao-1/neoconstitucionalismo , acesso em 05.01.2019.

7 In: FERNANDES, André Dias. Modulação de efeitos e decisões manipulativas no controle de constitucionalidade brasileiro – possibilidades, limites e parâmetros. Salvador: Juspodivm, 2018, p. 8.

8 FERNANDES, André Dias. Modulação de efeitos e decisões manipulativas no controle de constitucionalidade brasileiro – possibilidades, limites e parâmetros. Salvador: Juspodivm, 2018, p. 16.

9 Op. Cit., p. 16.

10 FIUZA, Gulherme. Manual do Covarde. Rio de Janeiro: Record, 2018, p. 143.

11 SARMENTO, Daniel. Dignidade da Pessoa Humana. Belo Horizonte: Fórum, 2016, p. 14 – 15.

12 Op. Cit., p. 16. O autor aponta temas controversos em que a dignidade da pessoa humana acaba sendo utilizada dos dois lados do debate: aborto, prostituição, pornografia, eutanásia etc.

13 Frise-se, contudo que a perda de força dos Estados não se deu tão intensamente como previam os cientistas políticos. Como aduz Gray, “a ideia de que o Estado Soberano estava chegando ao fim era absurda”. Cf. GRAY, John. Missa Negra. Trad. Clóvis Marques. Rio de Janeiro: Record, 2008, p. 150.

14 NEVES, Marcelo. Transconstitucionalismo. São Paulo: Martins Fontes, 2009, p. 83.

15 BETIOLI, Antonio Bento. Bioética a ética da vida. 2ª. ed. São Paulo: LTr, 2015, p. 77.

16 NEVES, Marcelo, Op. Cit., p. 70.

17 SARMENTO, Daniel, Op. Cit., p. 18.

18 TRIGO, Luciano. Guerra de Narrativas. Rio de Janeiro: Globo Livros, 2018, p. 230.

19 SARMENTO, Daniel, Op. Cit., p. 58.

20 Op. Cit., p. 70.

21 FERNANDES, André Dias, Op. Cit., p. 83.

22 FRANKENBERG, Günter. Técnicas de Estado. Trad. Gercelia Mendes. São Paulo: Unesp, 2018, p. 33.

23 MORAIS, Carlos Blanco de. Justiça Constitucional: o direito do contencioso constitucional. Tomo II. 2ª. ed. Coimbra: Coimbra Editora, 2011, p. 422. Pode-se afirmar que Canotilho também é avesso a essa espécie de atuação judicial, salvo em casos excepcionais. Cf. CANOTILHO, J. J. Gomes. Direito Constitucional e Teoria da Constituição. 7ª. ed. Coimbra: Almedina, 2006, p. 1018 – 1020.

24 RAMOS, Elival da Silva. Ativismo Judicial: parâmetros dogmáticos. São Paulo: Saraiva, 2010, p. 168.

25 MÜLLER, Friedrich. Métodos de Trabalho do Direito Constitucional. Trad. Peter Naumann. 3ª. ed. Rio de Janeiro: Renovar, 2005, p. 64 – 65.

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26 NUNES JÚNIOR, Flávio Martins. Curso de Direito Constitucional. São Paulo: RT, 2017, p. 130 – 140.

27 LASSALLE, Ferdinand. O que é uma Constituição? Trad. Leandro Farina. Campinas: Minelli,2003, p. 64.

28 Op. Cit., p. 79.

29 Cf. COUTINHO, João Pereira. As ideias conservadoras explicadas a revolucionários e reacionários. São Paulo: Três Estrelas, 2014, “passim”.

30 Cf. MERCADANTE, Paulo. A consciência conservadora no Brasil. Rio de Janeiro: Saga, 1965, “passim”.

31 FERNANDES, André Dias, Op. Cit., p. 171.

32 ANGOTTI NETO, Hélio. Disbioética Volume III: O extermínio do amanhã. Brasília: Monergismo, 2018, p. 55 – 56.

33 HABERMAS, Jürgen. O conceito de dignidade humana e a utopia realista dos direitos humanos. In: IDEM. Sobre a Constituição da Europa. Trad. Luis Werle, Luiz Repa e Rúrion Melo. São Paulo: Unesp, 2012, p. 17.

34 CORÇÃO, Gustavo. A Descoberta do Outro. Campinas: Vide Editorial, 2017, p. 83.

35 Op. Cit., p. 203.

36 ANGOTTI NETO, Hélio, Op. Cit., p. 100 – 101.

37 BARRETO, Vicente Paulo. O Fetiche dos Direitos Humanos.2ª. ed. Porto Alegre: Livraria do Advogado, 2013, p. 63 -77.

38 A frase é da “Tragédia de Julio Cesar”, de William Shakespeare. Cf. BARROSO, Luís Roberto. A tragédia de Júlio César: poder, ideal e traição. In: PACHÁ, Andréa, et al. Ele, Shakespeare, visto por nós, os advogados. Rio de Janeiro: Edições Rio de Janeiro, 2017, p. 52.

39 TODOROV, Tzvetan. A vida em comum: ensaio de antropologia geral. Trad. Maria Angélica e Norma Wimmer. São Paulo: Unesp, 2013, p. 115.

40 ASSY, Behânia, FERES JÚNIOR, João. Reconhecimento. In: BARRETO, Vicente de Paulo (coord.). Dicionário de Filosofia do Direito. São Leopoldo: Unisinos, 2006, p. 705.

41 FRASER, Nancy. From redistribution to recognition? Dilemmas of justice in a ‘postsocialist’ age. In: IDEM. Justice Interruptus: critical reflections on the ‘postsocialist’ condition. New York: Routledge, 1997, p. 11 – 40.

42 ANTOTTI NETO, Hélio, Op. Cit., p. 50.

43 Op. Cit., p. 52.

44 Op. Cit., p. 62 – 63.

45 Apud, CARPEAUX, Otto Maria. A Cinza do Purgatório. Balneário Camboriú: Danúbio, 2015, p. 31.

46 Apud, Op. Cit., p 74.

47 Cf. JONAS, Hans. El Principio de Responsabilidad. Trad. Javier Maria Fernández Retenaga. Barcelona: Herder, 1995, “passim”.

48 WOLFF, Francis. Três Utopias Contemporâneas. Trad. Mariana Echalar. São Paulo: Unesp, 2018, p. 42. E o mesmo autor nega o dever de reconhecimento do feto e até de humanos moribundos existentes mais adiante em sua obra. Ou seja, promove uma contradição interna incrível sem o perceber. Op. Cit., p. 68.

49 JONAS, Hans, Op. Cit., p. 82.

50 FERNANDES, André Dias, Op. Cit., p. 310.

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Sobre o autor
Eduardo Luiz Santos Cabette

Delegado de Polícia Aposentado. Mestre em Direito Ambiental e Social. Pós-graduado em Direito Penal e Criminologia. Professor de Direito Penal, Processo Penal, Medicina Legal, Criminologia e Legislação Penal e Processual Penal Especial em graduação, pós - graduação e cursos preparatórios. Membro de corpo editorial da Revista CEJ (Brasília). Membro de corpo editorial da Editora Fabris. Membro de corpo editorial da Justiça & Polícia.

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