O recibo, a quitação e o pagamento

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09/01/2019 às 14:45

Resumo:


  • O recibo é a declaração de ter recebido algo, e o devedor que paga tem direito à quitação regular, conforme o Código Civil brasileiro.

  • A quitação é o reconhecimento pelo credor de que o devedor cumpriu com sua obrigação, podendo ser considerada um negócio jurídico unilateral e essencial para a prova do pagamento.

  • Em caso de recusa do credor em fornecer a quitação, o devedor pode recorrer à ação declaratória de consignação em pagamento para extinguir a dívida e obter a declaração judicial da inexistência do débito.

Resumo criado por JUSTICIA, o assistente de inteligência artificial do Jus.

3. EXISTÊNCIA, VALIDADE E EFICÁCIA DO NEGÓCIO JURÍDICO

Ao analisar os elementos que constituem o negócio jurídico, é fundamental partir da teoria criada por Pontes de Miranda, que desenvolveu uma estrutura única para explicar tais elementos, a denominada “ESCADA PONTEANA”.

Acompanhando as citações feitas por Priscila M. Degani (O plano da existência, validade e eficácia nos negócios jurídicos), tem-se que nessa escada o Negócio Jurídico tem três planos:

  1. PLANO DA EXISTÊNCIA – são os elementos essenciais, os pressupostos de existência;

  2. PLANO DA VALIDADE – são os elementos do plano da existência com alguma qualificações;

  3. PLANO DA EFICÁCIA – neste plano estão os efeitos gerados pelo negócio em relação às partes e em relação a terceiros. São elementos relacionados com a suspensão e resolução de direitos e deveres.

Como o Negócio Jurídico não surge do nada, para que seja considerado como tal, deve atender a certos requisitos mínimos, regulados pelo sistema normativo do Novo Código Civil. Assim, nenhum Negócio Jurídico existirá ante a ausência de algum dos elementos constitutivos essenciais, quais sejam:

  • MANIFESTAÇÃO OU DECLARAÇÃO DE VONTADE;

  • PARTES OU AGENTE EMISSOR DA VONTADE;

  • OBJETO;

  • FORMA;

No Plano da Existência não se avalia a invalidade ou eficácia desse fato jurídico, só se cogita a presença dos fatores existenciais mínimos.

3.1. PLANO DA VALIDADE

Os elementos que compõem esse plano são os mesmos que completam a lista do plano da existência, acrescidos àqueles substantivos alguns adjetivos, ou seja, não basta apenas a manifestação de vontade, ela precisa ser livre, sem vícios, as partes ou agentes deverão ser capazes, bem como o objeto deve ser lícito, possível, determinado ou determinável e a forma deverá ser prescrita ou não defesa em lei.

Imperioso acrescentar que a vontade livre não foi expressamente inserida no Código Civil de 2002, como os demais elementos constantes no art. 104, mas está implicitamente imposta ou na capacidade do agente ou na licitude do objeto do negócio.

Em geral, os Negócios Jurídicos que não apresentam esses elementos de validade são NULOS DE PLENO DIREITO, no entanto há a possibilidade do negócio ser anulável, nas hipóteses de nulidade relativa, como ocorre quando o ato é praticado por agente relativamente incapaz.

Interessante se faz analisar brevemente cada um desses elementos em separado:

  • 1º ELEMENTO: A declaração da vontade não pode estar impregnada de malícia, deve ser livre e de boa-fé.

    O consentimento pode ser expresso ou tácito. Nesse sentido rege o art. 111. do Código Civil que o silêncio importa em anuência, quando as circunstâncias ou os usos autorizarem e a declaração de vontade expressa não seja necessária.

  • 2º ELEMENTO: O agente emissor da vontade deve ser capaz e legitimado para o negócio. Na ausência de capacidade plena para conferir validade ao negócio celebrado, deverá o agente ser devidamente representado ou assistido.

    Não obstante goze de plena capacidade, é necessário que a parte não esteja circunstancialmente impedida de celebrar o ato, é preciso ter também Legitimidade.

    Nesse sentido já afirmara Beviláqua que além da capacidade geral, exige-se a capacidade especial para o negócio de que se trata.

  • 3º ELEMENTO: Referir-se à licitude do objeto significa dizer que seu conteúdo é lícito, não contrário aos bons costumes, à ordem pública, à boa-fé e à função social ou econômica de um instituto.

  • 4º ELEMENTO: A forma é o meio pelo qual a declaração de vontade se exterioriza. Nessa linha de raciocínio não há que se confundir forma como elemento existencial do negócio, com a forma legalmente prescrita – pressuposto de validade do ato negocial. A inobservância deste atinge o plano de validade e não o de existência.

    O art. 107. CC consagra o Princípio da liberdade das formas e como regra a validade da declaração não depende de forma, salvo quando a lei expressamente a exigir.

3.2. PLANO DA EFICÁCIA

Neste plano, interessa identificar se o Negócio Jurídico repercute juridicamente no plano social, isto é, a eficácia da declaração negocial manifestados como queridos.

No entanto, mesmo um ato eivado de nulidade absoluta produzirá efeitos jurídicos, ou seja, terá repercussão no plano da eficácia. Nesse sentido e bastante elucidativo pontifica Sílvio Venosa: “O negócio é juridicamente nulo, mas o ordenamento jurídico não pode deixar de levar em conta efeitos materiais produzidos por esse ato. Isso é verdadeiro tanto em relação aos atos nulos como em relação aos atos anuláveis.”

Os elementos que o compõem são acidentais, uma vez que sua presença é dispensável, são eles a Condição, Termo e Modo ou Encargo.

Quando se fala de eficácia do negócio jurídico, já se fala em existência e validade dele(pelo menos de não ser nulo, pois que o nulo, de regra, é ineficaz).

A eficácia do negócio jurídico consiste de direitos(e dívidas ou deveres), pretensões(e obrigações) e ações ou exceções, como ensinou Pontes de Miranda (obra citada, pág. 32). De modo que efeitos das obrigações são efeitos de efeitos. Disse ainda Pontes de Miranda: “Aliás, quando se diz que se trata de efeitos das obrigações, elipticamente se fala porque os efeitos são das dívidas e das obrigações. “Obrigações está aí por dívidas e obrigações, o que revela de quanto tempo se há mister para que o espírito humano se liberte de frases feitas e expressões inadequadas”.

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As dívidas são efeitos ou dos negócios jurídicos ou dos atos-fatos lícitos, ou dos atos strictu sensu lícitos, ou dos fatos stricto sensu lícito, ou de atos fatos stricto sensu ilícitos, ou dos fatos ilícitos. Só efeitos, já em pleno mundo jurídico.

A dívida é a relação jurídica vista pelo lado do sujeito passivo do jeito que a mesma relação é vista pelo credor como crédito: ele está no lado ativo.

As pretensões e ações pessoais só se dirigem a determinadas pessoas que são o polo passivo. Porém, podem terceiros ter de alegar e sofrer que se alegue a existência dessas pretensões e ações (eficácia probatória).


4. O PAGAMENTO

O pagamento é a forma normal de extinção das obrigações.

Como ensinou Roberto de Ruggiero (Instituições de direito civil, volume III, tradução de Ary dos Santos, pág. 77), alguns costumam ver no pagamento apenas um fato jurídico cuja consequência é a extinção do débito. Mas, quando se consideram as condições que a lei exige para a sua validade, a capacidade de alienar (se a prestação consiste num dare) ao elemento intencional que se requer no solvens, à manifestação de vontade que a execução implica, deve reconhecer-se e tratar-se como um verdadeiro negócio jurídico, o qual está sujeito a todos os princípios gerais que o regem.

A doutrina está dividida; uma parte entende o pagamento como um ato jurídico unilateral por consistir num ato voluntário do devedor, que, prestando, faz extinguir a relação obrigatória; outros veem nele um negócio jurídico bilateral.

Entende-se que a causa para a solutio se resume na intenção de dissolver o vínculo obrigatório. Mas exerceria influência a causa do negócio fundamental que gerou a obrigação a ser adimplida.

O destinatário do pagamento é credor, que tem a sua razão creditória.

A pessoa diversa do credor pode receber o pagamento caso o próprio credor tenha autorizado a receber ou quando a lei ou a autoridade judiciária assim determinarem.

Os romanos entendiam o pagamento (solutio) como sendo a execução voluntária da obrigação, o modo normal de sua extinção.

O pagamento deveria ser feito pelo devedor capaz. Mas excetuando-se as chamadas obrigações personalíssimas, admitia-se que um terceiro pudesse pagar por incumbência alheia, ou sem ela, até mesmo na ignorância do devedor ou contra a sua proibição.

O pagamento teria por objeto o próprio objeto da obrigação em sua totalidade. Assim, somente a convenção especial e a existência de litígio sobre parte da coisa legitimam o pagamento parcial.

Relatou Ebert Chamoun (Instituições de direito romano, 1968, pág. 312) que Justiniano admitiu, por exceção, o pagamento em imóveis arbitrados judicialmente quando o devedor sem culpa não conseguisse obter dinheiro. Era a chamada datio in solutum necessária. Mas diferia da datio in solutum verdadeira, que é a entrega com o consentimento do credor de um objeto diverso do convencionado. Mas houve, no direito romano, discussão acerca da eficácia dessa causa de extinção. Os Sabinianos asseveravam que a obrigação se extinguia ipso iure, ao passo que os Proculianos entendiam que o devedor continuasse ipso iure obrigado, mas que podia opor a exceptio doli ao credor que lhe exigira o objeto convencionado, conquanto tivesse consentido em receber um outro. Justiniano adotou a primeira posição. Modificou ainda o direito clássico no que tocava à evicção sofrida pelo credor. Segundo esse direito, a dação em pagamento era nula e a antiga obrigação renascia mesmo em face dos fiadores, que já se acreditavam liberados.

Para Justiniano a datio in solutum era assimilada a uma venda, considerando um emptor o credor e concedendo-lhe, em caso de evicção, a actio empti utilis contra o devedor, mas não contra os fiadores.

O pagamento devia executar-se no termo estabelecido. A existência do termo impedia, em princípio, que o credor exigisse a prestação antes do vencimento, mas não impossibilitava o devedor de a cumprir antecipadamente.

Não estabelecido o termo a prestação podia ser exigida a qualquer momento.

Na verdade, o pagamento representa a extinção da dívida e de todos os acessórios.

No direito justiniâneo, as testemunhas devem ascender a cinco e o recibo tinha plena eficácia probatória, levando em conta o entendimento de que o pagamento prova-se com o recibo ou com testemunhas, se o credor não o impugna, em trinta dias, com a exceptio non numeratae pecuniae, alegando que o entregou, mas não recebeu o pagamento.

A obrigação civil, no direito romano, também poderia ser extinta, sem ocorrer o pagamento, quando o devedor renuncia à obrigação.

No direito antigo ela só podia realizar-se por um ato solene e formalista, a solutio por aes et libram ou a aceptilatio. Mas no direito civil mais avançado, ensinou-se que as obrigações consensuais poderiam desaparecer por um modo não solene, o contrarius consensus. Finalmente, o direito pretoriano admitia eficácia exceptionis ope ao pacto de remissão, pactum de non petendo.

Lecionou-se que a solutio per aes et lilbram era um pagamento fictício, que se realizava, em correspondência, com a mancipatio, perante cinco testemunhas e um lilbripens. O devedor declarava liberar-se do credor, tocando na balança com um asse, que dava, em pagamento, ao credor. Originalmente, devia a solutio per aes et lilbram empregar-se para remetir os nexi, sendo que, durante o tempo de Gaio restringia-se às obrigações oriundas do iudicatum e do legado per damnationem.

Por sua vez, a acceptilatio era um modo de extinção das obrigações contraídas verbis e, provavelmente, litteris.

A acceptilatio verbal realizava-se através de formas inversas às da estipulação e em simetria com elas e consistia numa pergunta do devedor ao credor: Quod ego tibi promisi, habesne acceptum? E na resposta ao credor habio. Passou, mais tarde, a ser uma imaginária solutio, passando a consistir numa remisão de débito que nasceu verbis.

A acceptilatio era um ato formalístico típico, um actus legitimus. Não comportava termo e nem condição expressos, mas os admitia de forma tácita.

Sobre o autor
Rogério Tadeu Romano

Procurador Regional da República aposentado. Professor de Processo Penal e Direito Penal. Advogado.

Informações sobre o texto

Este texto foi publicado diretamente pelos autores. Sua divulgação não depende de prévia aprovação pelo conselho editorial do site. Quando selecionados, os textos são divulgados na Revista Jus Navigandi

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