Assinatura digital em contratos: validade jurídica e executividade

30/01/2019 às 23:42
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Análise sobre a validade das assinaturas eletrônicas diante das leis vigentes e sobre a executividade desse título executivo criado eletronicamente.

A nova era digital e a necessidade quanto aos avanços tecnológicos deram surgimento a MP 2.200-2/2001 que foi a primeira iniciativa governamental tendente a regulamentar o documento eletrônico no Brasil. 

A medida provisória estabelece em seu art. 1° a criação da infraestrutura de chaves públicas brasileira - ICP-Brasil, garantindo a autenticidade, integridade e validade jurídicaa documentos em forma eletrônica que utilizem certificados digitais. As assinaturas digitais identificam os agentes que estão subscrevendo por meio de um sistema criptográfico assimétrico e dão autoria a um documento eletrônico. As declarações constantes nesses documentos presumem-se verdadeiras em relação aos seus signatários,indo de encontro ao que prevê o CC com relação aos contratos.

Nesse sentido prevê o § 1°do art. 10 da MP no. 2.200-2/2001:

"§ 1o  As declaraçõesconstantesdosdocumentosemforma eletrônicaproduzidoscomautilizaçãodeprocessodecertificaçãodisponibilizadopelaICP-Brasilpresumem-severdadeirosemrelaçãoaossignatários,naformado art. 131 da Lei no 3.071, de 1o de janeiro de 1916 - CódigoCivil."

Apesar do referido parágrafo mencionar o CC de 1916 nada éalteradoumavezqueoart. 219 do CC de 2002 repete ipsis litteriso texto do art. 131. 

Importante notar o Art. 8°e o § 2°do art. 10: 

"Art. 8º Observados os critérios a serem estabelecidos pelo Comitê Gestor da ICP-Brasil, poderão ser credenciados como AC e AR os órgãos e as entidades públicas e as pessoas jurídicas de direito privado."

"Art. 10. (…)

§ 2º O disposto nesta Medida Provisória não obsta a utilização de outro meio de comprovação da autoria e integridade de documentos em forma eletrônica, inclusive os que utilizem certificados não emitidos pela ICP-Brasil, desde que admitido pelas partes como válido ou aceito pela pessoa a quem for oposto o documento."

A MP adotou o modelo misto, admitindo a assinatura digital oriunda de certificadoras privadas (mediante delegação do poder público) e públicas e, ainda, admitiu a certificação baseada em certificados não governamentais, ampliando e facilitando relações comerciais inclusive internacionais, uma vez que já existem diversas empresas que fazem certificação digital e utilizam tecnologias próprias.

Diferentemente do Sistema misto implantado pela referida normatização, a OAB/SP apresentou um anteprojeto no qual estabelece que a presunção de veracidade da certificação digital privada é oriunda das certificações dos tabeliões. Veremos: 

"Art. 14. Considera-se original o documento eletrônico assinado pelo seu autor mediante sistema criptográfico de chave pública. 

Art. 24. Os serviços prestados por entidades certificadoras privadas são de caráter comercial, essencialmente privados e não se confundem em seus efeitos com a atividade de certificação eletrônica por tabelião, prevista no Capítulo II deste Título.

Art. 25. O tabelião certificará a autenticidade de chaves públicas entregues pessoalmente pelo seu titular, devidamente identificado; o pedido de certificação será efetuado pelo requerente em ficha própria, em papel, por ele subscrita, onde constarão dados suficientes para identificação da chave pública, a ser arquivada em cartório."

"Justificativa item 19. Dividiu-se, assim, a atividade de certificação, em dois grupos distintos, com eficácias diferentes: as certidões eletrônicas por entidades privadas, de caráter comercial, essencialmente privado; e as certidões eletrônicas por tabeliães, de caráter publico, e que geram presunção de autenticidade do documento ou da assinatura eletrônica.

"Justificativa item 20. Com essa disciplina distinta, se legitima a atuação das entidades privadas de certificação, importantes, mas que não têm fé pública, restringida esta aos tabeliães."

Dessa forma, como apresentado pelo anteprojeto, existiram dois grupos sendo que a presunção de veracidade seria somente da certificadora pública, sendo a certificadora privada subsidiária e sem fé publica. O anteprojeto nesse ponto vai contra ao sistema misto criado pela MP, limitando as relações comerciais e especialmente aquelas de cunho internacional nas quais diversas empresas privadas de altíssima tecnologia já atuam para conciliar assinaturas, manter a veracidade das partes envolvidas e segurança de seu conteúdo. No tocante a esse ponto acredito que a MP está muito mais atualizada e visando avançar com o desenvolvimento comercial eletrônico.

O objetivo desse artigo não é criticar o anteprojeto uma vez que o único ponto que considero inadequado para a realidade social é o mencionado acima. No demais o anteprojeto é muito bem elaborado tecnicamente, moderno e traz inúmeras regulamentações não abrangidas na MP, como a autorização da mediação dos conflitos eletrônicos por intermédio de arbitragem (art. 51), mecanismo esse que foge das tradicionais análises judiciarias e permite que profissionais técnicos, especialistas em determinados assuntos sejam aptos a solucionar, mediar e conciliar conflitos reais ou futuros. Mecanismos já muito utilizados em grandes companhias. 

Mas, avançando na análise das certificações eletrônicas, outro ponto de fundamental importância é com relação a executividade desse título criado muitas vezes sem a assinatura de testemunhas.

Estabelece o art. 784, III do CPC:

"São títulos executivos extrajudiciais: 

(…)

III - o documento particular assinado pelo devedor e por 2 (duas) testemunhas;"

A jurisprudência criada pelo recurso especial n°1.495.920-DF, tendo como relator o Ministro Paulo de Tarso Sanseverino, diminuiu os questionamentos sobre a eficácia do título criado eletronicamente sem assinatura de testemunhas e definiu que, excepcionalmente, levando em consideração o avanço tecnológico e a nova realidade comercial, "a assinatura digital de contrato eletrônico tem a vocação de certificar, através de terceiro desinteressado (autoridade certificadora), que determinado usuário de certa assinatura a utilizará e, assim, está efetivamente a firmar o documento eletrônico e a garantir serem os mesmos dados do documento assinado que estão a ser sigilosamente enviados”. O relator continua a afirmar que “em face destes novos instrumentos de verificação de autenticidade e presencialidade do contratante, possível o reconhecimento da executividade dos contratos eletrônicos".

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Com base nessa retórica, a Terceira Turma do Superior Tribunal de Justiça (STJ) deu provimento a recurso para determinar o prosseguimento de uma execução oriunda de contrato com assinatura digital uma vez que este prescinde a necessidade de assinatura de testemunhas como prescreve o CPC. Como mencionou o próprio relator, nenhuma legislação esta permeável à realidade vigente em virtude dos avanços tecnológicos.

Com tudo isso, me parece que estamos avançando bastante com relação aos antigos métodos oriundos da era pré-digital. Muitos tribunais ainda estavam decidindo de forma contrária e a decisão veio para sedimentar a comparação dos contratos digitais com os físicos para fins de cobrança. No meu ver, a decisão foi ainda além, conferindo as autoridades certificadoras um grau de confiança superior aos dos cartórios oficiais uma vez que o contrato físico mesmo com reconhecimento cartorial, só se torna título executivo com assinatura de duas testemunhas e isso ainda será ponto para muito debate entre os juristas. 


Bibliografia

BRASIL. Lei n°11.419, de 19 de Dezembro de 2016. Dispõe sobre a informatização do Processo Judicial; altera a Lei n°5.869, de 11 de Janeiro de 1973 – Código de Processo Civil; e dá outras providências.

BRASIL. Medida Provisória n°2.200-2, de 24 de Agosto de 2001. Institui a Infra-Estrutura de Chaves Públicas Brasileira – ICP-Brasil, transforma o Instituto Nacional de Tecnologia da Informação em autarquia, e dá outras providências.

BRASIL. Recurso Especial n°n°1.495.920-DF da Terceira Turma do STJ, tendo como relator o Ministro Paulo de Tarso Sanseverino.

Armani, Wagner José Penereiro, Artigo Assinatura Digital em Contratos

PARENTONI, Leonardo Netto, Artigo A regulamentação legal do documento eletrônico no Brasil – jus.com.br

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Sobre a autora
Priscila Monteiro

Advogada do escritório Farah, Mansur & Sampaio Advogados Associados, OAB N°276125, formada pela Facamp em 2007, pós graduada em Processo Civil em 2009 e em Direito Imobiliário e Registral em 2011. Paralegal certificada na Universidade do Golfo da Florida em 2020.

Informações sobre o texto

Este texto foi publicado diretamente pelos autores. Sua divulgação não depende de prévia aprovação pelo conselho editorial do site. Quando selecionados, os textos são divulgados na Revista Jus Navigandi

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