Síndrome do duplo Y: como a falta de perícia pode levar à injustiça no âmbito criminal

27/02/2019 às 18:12
Leia nesta página:

A síndrome do duplo Y causa distúrbios ao seu portador afetando diretamente o cromossomo Y, podendo tornar o indivíduo mais suscetível ao cometimento de crimes.

INTRODUÇÃO: A detecção de uma síndrome congênita em um indivíduo pode trazer diversos reflexos na área criminal. A síndrome do duplo Y se trata de uma aneuploidia cromossômica sexual que atinge os homens. Um portador dessa síndrome pode vir a cometer um crime e então, deverá ser punido com Pena ou Medida de Segurança? O mais justo para o indivíduo é que seja aplicada a medida de segurança, a fim de que obtenha o tratamento necessário em prol de que não seja mais um perigo para si ou para a sociedade.

OBJETIVOS: Este trabalho tem o objetivo de mostrar a importância da perícia genética em casos em que o réu apresenta as características congênitas. Há o compromisso de comprovar que o desconhecimento dessa condição pode acarretar uma punição injusta que pode se traduzir em um agravo na condição do portador.

METODOLOGIAS: Segundo Antônio Amador, a pessoa que porta essa síndrome não apresenta alterações fenotípicas importantes, mas possui estatura elevada dos demais. Também é possível detectar excesso de agressividade e comportamentos antissociais. O fato de haver um cromossomo masculino a mais faz com que o índice de testosterona seja elevado, o que pode causar sérios distúrbios físicos e mentais no portador. O livro Genetics, Crime and Justice, traz o primeiro caso que houve a análise do cromossomo XYY, em 1965, o réu Daniel Hugon, 29 anos, estava sendo acusado pelo homicídio de uma prostituta em Paris, França. Seu advogado supôs que Hugon poderia ser um portador da síndrome XYY. Após análise, foi indicado que o réu poderia ser julgado, mas a síndrome causou “problemas de comportamento e humor”. Com os relatos feitos pelos médicos, o júri fixou a pena em sete anos. O livro ainda traz o caso do australiano Lawrence Hannel que foi considerado inocente após matar Mary Redfern, “devido ao seu status XYY".

CONSIDERAÇÕES: A incidência dessa síndrome é baixa, uma vez que a cada mil nascidos homens, um apresenta um cromossomo Y extra. Um estudo com 3395 criminosos revelou que 2% possuem essa característica cromossômica. Tratando do Duplo Y podemos, de acordo com nosso ordenamento jurídico, enquadrá-lo como causa de inimputabilidade, mas para isso, é preciso que a perícia revele que há a falta de capacidade de entendimento ou de determinação, caracterizando uma doença mental com base no artigo 26 do Código Penal vigente, que adotou a teoria biopsicológica. Assim como a esquizofrenia a síndrome XYY é uma toxina metabólica, causando:

“Desvios puramente quantitativos, que nada mais traduzem que variedades da disposição física normal, a que correspondem funcionalmente desvios da normal conduta psíquica” (HUNGRIA, Nelson, Comentários ao código penal, v. I, t. II, p. 335).

Segundo o Código de Processo Penal o juiz deverá absolver o réu e ainda mencionar a causa absolutória reconhecendo, neste cenário, a existência de excludente de culpabilidade, porém o trabalho do julgador não está encerrado, ainda cabe a ele determinar, mediante a ordem dada pelo parágrafo único do artigo 386, precisamente no inciso III, do Código citado, de que deverá ser aplicada a medida de segurança.

“Daí dizer-se que tal sentença é impropriamente absolutória, uma vez que, embora absolvendo o inimputável, aplica-se-lhe medida de segurança” (GRECO, Rogério, Curso de direito penal parte geral, p. 500).

Embora um sujeito a prima facie não demonstre qualquer sinal de uma síndrome cromossômica, é importante que o operador do Direito não se cegue pelo que é superficial. O duplo Y é assintomático e por isso deve ser analisado por perito. Apesar da difícil detecção, esta quando feita, trará ao réu a chance de ser tratado com o fim de evitar que ocorram novos surtos e dá-lo uma vida digna – que é direito fundamental de todos.

REFERÊNCIAS: AMADOR, A. et al. Síndrome 47 XYY, Com Arco Aórtico Direito e Ligamentum Arteriosum. Lisboa: Revista Científica da Ordem dos Médicos, Acta Med Port 2007, 20: 575-579.

PORTAL SÃO FRANCISCO. Síndrome do Duplo Y. Disponível em: Acesso em: 15 de setembro de 2018.

CLEONICE DE SOUZA, Fátima. et al. Síndrome 47, XYY. Revista da AMRIGS, Porto Alegre, 58 (2): 147-149, abr.-jun. 2014.

SOARES, Gabriella. Síndrome do triplo X e duplo Y. Disponível em: Acesso em: 15 de setembro de 2018.

WILSON, Debra. Genetics, Crime and Justice. Edward Elgar Publishing, 2015.

HUNGRIA, Nélson. Comentários ao código penal. v. I, t. II. Rio de Janeiro: Forense, 1958.

GRECO, Rogério. Curso de direito penal parte geral. 17. ed. rev., aum. e atual. Minas Gerais: Impetus: 2017.

Assuntos relacionados
Sobre o autor
Informações sobre o texto

Este texto foi publicado diretamente pelos autores. Sua divulgação não depende de prévia aprovação pelo conselho editorial do site. Quando selecionados, os textos são divulgados na Revista Jus Navigandi

Publique seus artigos Compartilhe conhecimento e ganhe reconhecimento. É fácil e rápido!
Publique seus artigos