Plano de saúde - indevida a recusa do tratamento com base em uso off label de medicamento

04/03/2019 às 15:17
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A cláusula contratual constante nos contratos de plano de saúde, que restringe as doenças passíveis de cobertura é válida, porém à operadora de saúde é vedado limitar os procedimentos, técnicas e materiais a serem utilizados.

Inicialmente é importante esclarecer que medicamentos off label, refere-se ao uso de medicamentos para situações não previstas em sua bula, porém diferentemente dos experimentais, possuem registro sanitário e são comercializados em território brasileiro.

A cláusula contratual constante nos contratos de plano de saúde, que restringe as doenças passíveis de cobertura é válida, porém à operadora de saúde é vedado limitar os procedimentos, técnicas e materiais a serem utilizados pelo médico do segurado em seu tratamento de saúde.

O STJ já se manifestou no sentido, senão vejamos:

AGRAVO REGIMENTAL NO AGRAVO EM RECURSO ESPECIAL. PLANO DE SAÚDE. COBERTURA. NEGATIVA. MEDICAMENTO EXPERIMENTAL. INCIDÊNCIA DA SÚMULA 83/STJ. 1. O acórdão recorrido está em conformidade com o entendimento desta Corte no sentido de que o plano de saúde pode estabelecer as doenças que terão cobertura, mas não pode limitar o tipo de tratamento a ser utilizado pelo paciente. Precedentes. (AgRg no AREsp 345433 / PR, Ministro LUIS FELIPE SALOMÃO, Quarta Turma, Data do Julgamento 20/08/2013)

No que se refere à ausência de previsão do tratamento no rol de procedimentos da ANS, tal alegação não pode servir de escusa para a cobertura, tendo em vista o eminente risco de agravamento da doença e até mesmo de morte do paciente.

E ainda, a falta de previsão da lista da Agência Nacional de Saúde Suplementar – ANS, da terapia recomendada não significava sua exclusão tácita da cobertura contratual, uma vez que a referida listagem apresenta rol exemplificativo. (EREsp 1151500/MS, Relator Ministro Moura Ribeiro, Terceira Turma, data de publicação: 3/10/2017.)

Importante destacar que a escolha da melhor terapia pressupõe não apenas o conhecimento técnico a respeito da viabilidade e da eficiência do tratamento, mas, também, das condições específicas e particulares do paciente que somente o médico e sua equipe que o acompanham têm condições de escolher, prescrevendo, assim, a melhor orientação terapêutica ao caso.

“Autorizar que a operadora negue o tratamento sob a justificativa de que a indicação não está contida na bula representa inegável ingerência na ciência médica, em odioso e inaceitável prejuízo ao paciente enfermo”. (REsp 1721705/SP, Rel. Ministra NANCY ANDRIGHI, TERCEIRA TURMA, julgado em 28/08/2018, DJe 06/09/2018).

Em consequência, firma-se a jurisprudência no sentido de que não cabe ao plano de saúde, substituir-se o crivo científico do médico especialista, a fim de recusar o tratamento por este indicado.

De acordo com a súmula nº 608 do Egrégio Superior Tribunal de Justiça, in verbis:

“Aplica-se o Código de Defesa do Consumidor aos contratos de plano de saúde, salvo os administrados por entidades de autogestão.”

Em razão do caráter cogente do Código de Defesa do Consumidor e da presumida vulnerabilidade dos consumidores, as cláusulas limitativas ou obstativas das obrigações assumidas pelas seguradoras de saúde devem ser interpretadas à luz da boa-fé objetiva, e sempre da maneira mais favorável ao consumidor, em consonância com o art. 47, da Lei 8.078/80.

É abusiva, portanto, e nula de pleno direito, qualquer cláusula que limite a assistência e tratamento do consumidor devidamente aprovado pela ANVISA, permitindo que a ré escolha cobrir apenas os tratamentos mais econômicos, substituindo a figura do médico e lesando o consumidor, pondo em risco o basilar direito constitucionalmente garantido à vida e à saúde e, colocando em inegável vantagem exagerada a operadora, em afronta ao art. 51, inciso XV e o § 1º, do CDC, a seguir transcrito:

“Art. 51. São nulas de pleno direito, entre outras, as cláusulas contratuais relativas ao fornecimento de produtos e serviços que:

 (...) XV - estejam em desacordo com o sistema de proteção ao consumidor;

(...) § 1º Presume-se exagerada, entre outros casos, a vantagem que:

II - restringe direitos ou obrigações fundamentais inerentes à natureza do contrato, de tal modo a ameaçar seu objeto ou equilíbrio contratual;

 III - se mostra excessivamente onerosa para o consumidor, considerando-se a natureza e conteúdo do contrato, o interesse das partes e outras circunstâncias peculiares ao caso. ”

Entenda a diferença - uso off label e o tratamento experimental

“O art. 10, incisos I, V e IX, da Lei n. 9.656/1998 expressamente exclui da relação contratual a cobertura de tratamento clínico ou cirúrgico experimental, fornecimento de medicamentos importados não nacionalizados e tratamentos não reconhecidos pelas autoridades competentes; no tratamento experimental, o intuito da pesquisa clínica não é propriamente tratar, mas alcançar resultado eficaz e apto ao avanço das técnicas terapêuticas atualmente empregadas, ocorrendo em benefício do pesquisador e do patrocinador da pesquisa.

O uso off label justifica-se em situações específicas e casuísticas e ocorre por indicação médica pontual, sob o risco do profissional que indicou. É considerado como hipótese em que "o medicamento/material médico é usado em não conformidade com as orientações da bula, incluindo a administração de formulações extemporâneas ou de doses elaboradas a partir de especialidades farmacêuticas registradas; indicações e posologias não usuais; administração do medicamento por via diferente da preconizada; administração em faixas etárias para as quais o medicamento não foi testado; e indicação terapêutica diferente da aprovada para o medicamento/material".

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Havendo evidências científicas que respaldem a prescrição, é universalmente admitido e corriqueiro o uso off label de medicamento, por ser fármaco devidamente registrado na Anvisa, aprovado em ensaios clínicos, submetido ao Sistema Nacional de Farmacovigilância e produzido sob controle estatal, apenas não aprovado para determinada terapêutica.” (REsp 1729566/SP, Rel. Ministro LUIS FELIPE SALOMÃO, QUARTA TURMA, julgado em 04/10/2018, DJe 30/10/2018)

CONCLUSÃO

A proteção à saúde não é apenas dever do Estado, estendendo-se como princípio ético, no qual se deve pautar o fornecedor de serviço que está interligado a esse direito fundamental.

Portanto, não se afigura correto ou legítimo que a paciente não tenha o direito de se submeter ao tratamento médico adequado, com os meios necessários, apresentando-se, pois, indevida a recusa manifestada pela Empresa operadora do plano de assistência à saúde.

Impõe-se, com isso, vedar o comportamento abusivo das operadoras em face dos consumidores e resguardar a finalidade básica do contrato, que é a saúde e a própria vida do segurado.

Andrea Vieira - advogada

Sobre a autora
Andrea Vieira

Andrea Vieira advoga há mais de 23 anos na área cível, prestando serviço jurídico de alta qualidade, com resultados expressivos em seus casos e atendimento humanizado, proporcionando uma experiência personalizada para cada novo cliente do escritório. Em constante busca pelo aprimoramento na profissão, encontra-se na mídia com diversos artigos publicados, além de E-books voltados para advogados iniciantes, os quais ensinam a prática jurídica. Nosso endereço eletrônico https://www.avadvocaciarj.com.br/

Informações sobre o texto

Este texto foi publicado diretamente pelos autores. Sua divulgação não depende de prévia aprovação pelo conselho editorial do site. Quando selecionados, os textos são divulgados na Revista Jus Navigandi

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