Técnicas de argumentação jurídica

Exibindo página 1 de 2

Resumo:


  • Argumentação jurídica é essencial para a prática do Direito, visando a persuasão do destinatário da mensagem.

  • O realismo jurídico destaca a influência de fatores externos e pessoais nas decisões judiciais, além das normas jurídicas.

  • A teoria psicológica da decisão judicial sugere que juízes também são afetados por vieses cognitivos e heurísticas no processo de julgamento.

Resumo criado por JUSTICIA, o assistente de inteligência artificial do Jus.

O sucesso na defesa de uma tese depende de um raciocínio fundamentado por meio de estratégias adotadas pelo argumentador. O objetivo deste trabalho visa demonstrar que uma argumentação jurídica eficiente dependerá do planejamento textual adequado.

  1. INTRODUÇÃO

Argumentar representa para a área jurídica uma exigência profissional específica, um fator decisivo da melhor prestação jurisdicional chamado de habilidade para “saber dizer o Direito”, estendendo-se a advogados, defensores, procuradores, promotores, juízes e desembargadores. Entretanto, muitos profissionais têm utilizado uma retórica vazia, vocabulário erudito e tortuoso à inteligibilidade, ou ainda, invariavelmente, o emprego de jargões e clichês envelhecidos e sem qualquer função, a não ser, é claro, a de dar volume sem objetividade a suas peças.

Sem a pretensão de esgotar o tema, este trabalho busca compreender a redação do texto jurídico de um modo mais consistente e em conformidade com o novo perfil esperado dos profissionais do Direito, que pressupõe, além da capacitação técnica, a habilidade de tornar comunicável a sua ação profissional valendo-se de técnicas de argumentação que almejam o convencimento do destinatário final.

A argumentação jurídica e o Estado de Direito são duas categorias indissociáveis. Onde há em uma dada comunidade um corpo de normas jurídicas estabelecido e reconhecido, destinado a governar os arranjos entre todas as pessoas nessa dada comunidade, a estrita observância dessas normas jurídicas por aqueles que detêm o poder do governo é de valor inestimável. Onde o Direito é estritamente observado, o Estado de Direito se estabelece. Entre os valores que ele assegura nenhum é mais importante que a certeza jurídica, exceto talvez os princípios que a acompanham: a segurança de expectativas jurídicas e a garantia do cidadão contra transferências arbitrárias por parte do governo e de seus agentes. Isso porque uma sociedade que alcança esses ideais de certeza e segurança jurídica permite que seus cidadãos tenham vidas autônomas em circunstâncias de mútua confiança.[1]

Não há dúvidas de que a argumentação jurídica deixou de exercer papel secundário e, hoje, funciona como premissa fundamental de todo aquele que pretende obter sucesso nas lides em que atua.

Este trabalho visa mostrar a importância da utilização de técnicas de argumentação jurídica em favor do operador do Direito, com base especificamente na construção textual de suas peças processuais. Petições, contestações, contrarrazões, sentenças, pareceres, habeas corpus, apelações e inúmeras outras peças contém, em sua estrutura, uma parte argumentativa. Assim, o uso adequado de técnicas de argumentação visa aumentar a intensidade de adesão do auditório a uma tese, de maneira que desencadeia nele a ação desejada (ação positiva ou abstenção).

Diante dessas considerações, como traçar técnicas e estratégias para a produção de um texto argumentativo competente não apenas do ponto de vista da persuasão, mas também do domínio de estruturas de raciocínio lógico? Casos simples e concretos podem ser argumentados com o mero uso de silogismo? Os processos cognitivos de persuasão racional de magistrados distinguem-se dos das demais pessoas?

É o que verificará o presente trabalho ao examinar aspectos relevantes da argumentação jurídica, sobretudo, quanto ao uso do silogismo, as diferenças entre demonstração e argumentação, exemplos de tipos de argumento e o uso da técnica de dedução para produzi-los. Serão examinados erros comuns extraídos da prática forense decorrentes do habitual prolixismo carregado pelos operadores do Direito, bem como serão tratadas as teorias que explicam como os juízes decidem na prática (Realismo Jurídico e Teoria Psicológica da Decisão Judicial).

Portanto, pretende-se utilizar os resultados desse trabalho como auxílio na elaboração de peças jurídicas a favor do argumentador, valendo-se de raciocínio fundamentado por meio de uma serie de associações, planejamento textual adequado e seleção apurada de informações. Para tanto, a pesquisa foi dividida nas seguintes seções: introdução; breves considerações da proposta positivista na aplicação do Direito; aspectos relevantes da argumentação jurídica; tipos de argumento; Realismo Jurídico; Teoria Psicológica da Decisão Judicial e conclusão.

  1. BREVES CONSIDERAÇÕES DA PROPOSTA POSITIVISTA NA APLICAÇÃO DO DIREITO

Historicamente situada, a doutrina positivista ganhou força a partir da metade do século XIX. Suas bases desenvolveram-se na confiança de que o progresso somente seria possível se pautado na técnica e na ciência. Assim sendo, propunham os positivistas uma reforma completa da sociedade, de maneira que a ordem fosse alcançada soberanamente.

No campo do Direito, acreditou-se que a ordem e a segurança somente seriam garantidas se a técnica cooperasse na elaboração de leis gerais capazes de antever os acontecimentos sociais sobre os quais o Estado deveria atuar. Essa proposta prosperou porque a ciência e seu rigor metodológico mostravam-se extremamente promissores nas soluções de problemas que impediam o progresso.

Para a escola positivista clássica, os profissionais que atuam na solução de conflitos levados ao Judiciário - em especial o juiz - deveriam encontrar o sentido do direito no sistema de normas escritas que regulam a vida social de um determinado povo, em um dado momento histórico.

Essa crença reforçava também a ideia de segurança jurídica, uma vez que, se as normas criadas pelo Estado eram conhecidas pela sociedade, o seu descumprimento - em certas circunstâncias - por um determinado sujeito, que não observou a conduta descrita, deveria ser punido por tal descumprimento. Como se acreditava ter um sistema jurídico perfeito, estava reforçada a tese de que havia plena segurança jurídica.

De acordo com os adeptos dessa teoria, portanto, a prática jurídica deveria limitar-se à aplicação objetiva das normas vigentes ao caso concreto que se pretenda analisar, por meio de um método previamente determinado. Esse método caracterizava-se por uma operação lógica em que competia ao juiz amoldar os acontecimentos da vida cotidiana ao suporte normativo eleito pelo Estado.

Hans Kelsen, ícone do positivismo jurídico, tratou de diferenciar o justo do injusto ao abordar esta corrente:

Nesse sentido, a “justiça” significa legalidade; é “justo” que uma regra geral seja aplicada em todos os casos em que, de acordo com seu conteúdo, esta regra deva ser aplicada. É “injusto” que ela seja aplicada em um caso, mas não em outro caso similar. E isso parece “injusto” sem levar em conta o valor da regra geral em si, sendo a aplicação desta o ponto em questão aqui. A Justiça, no sentido de legalidade, é uma qualidade que se relaciona não com o conteúdo de uma norma jurídica, mas com sua aplicação. Nesse sentido, a justiça é compatível e necessária a qualquer ordem jurídica positiva, seja ela capitalista ou comunista, democrática ou autocrática. “Justiça” significa a manutenção de uma ordem positiva através de sua aplicação escrupulosa. Trata-se de justiça “sob o Direito”. A afirmação de que o comportamento de um indivíduo é “justo” ou “injusto”, no sentido de “legal” ou “ilegal”, significa que sua conduta corresponde ou não a uma norma jurídica, pressuposta como sendo válida pelo sujeito que julga por pertencer essa norma a uma ordem jurídico positiva.[2]

Assim, dissipou-se a ideia de que caberia ao juiz desenvolver um raciocínio silogístico para poder “dizer adequadamente o direito”. Consiste o silogismo em apresentar três proposições - premissa maior, premissa menor e conclusão - que se dispõe de tal forma que a conclusão deriva de maneira lógica das duas premissas anteriores.

             

  1. Críticas à lógica formal e à doutrina positivista

O raciocínio positivista parece bastante adequado, mas não se pode supor que todos os acontecimentos da vida social com repercussão no mundo jurídico conseguiriam ser previstos com exatidão pelo legislador, ou mesmo que todos os casos em que um ato semelhante fosse praticado teriam necessariamente as mesmas consequências jurídicas.

O uso da razão a uma lógica excessivamente matemática precisava dar lugar a outra postura.

Vimos que o cenário em que se desenvolveu a doutrina positivista era fruto do momento político em que prevalecia forte tendência autoritária. Exemplos dessa tendência na política eram o nazismo, o fascismo e as demais formas de autoritarismo e a política de guerra-fria. Por todas essas barbaridades cometidas, a sociedade não mais aceitou a intolerância predominante[3].

Chaïm Perelman foi quem propôs uma metodologia mais afinada com o tratamento dos problemas trazidos ao Judiciário, em que a ponderação dos valores até então relegada ao plano irracional e da imprecisão possibilitava uma nova concepção de razão que não a formal, mas a razão prática.

Não obstante, valores sociais como a função social, dignidade da pessoa humana, boa-fé, entre outros, reforçam que “cada caso é um caso” e, portanto, não se pode dar tratamento sistemático, paradigmático, a situações aparentemente semelhantes. Vale dizer, não seria justo que uma mesma conduta praticada por pessoas diferentes e em contextos distintos fosse avaliada da mesma maneira pelo juiz, com a mera subsunção do fato à norma.

O contexto em que se deram os fatos, as influências que o motivaram, o estado psicológico de quem praticou a conduta, etc., sejam também considerados. A ponderação de tais situações, por exemplo, foge à previsibilidade de um sistema formal, previamente concebido com precisão absoluta. Daí porque atualmente é insuficiente a interpretação da norma baseada apenas na leitura gramatical da letra da lei, como o quis a corrente positivista jurídica.

Hart chama a atenção para uma série de questionamentos que podem surgir mesmo quando a norma geral aparentemente é clara, citando o seguinte exemplo hipotético: antes de ir à igreja, todos os homens e meninos devem tirar o chapéu.

Fará diferença se, para tirar o chapéu, eu usar a mão esquerda em vez da direita? Que a ação seja executada lentamente ou com rapidez? Que o chapéu seja colocado debaixo do assento? Que, dentro da igreja, não seja recolocado na cabeça?[4]

A indeterminação do Direito exige que o profissional capacitado se valha de técnicas de argumentação jurídica, não se limitando a simplesmente deduzir a pretensão de seu cliente em mero silogismo jurídico, sob pena de sua tese não ser acolhida. É inegável que o uso do silogismo é uma importante ferramenta de persuasão, mas não a única.

  1. ASPECTOS RELEVANTES DA ARGUMENTAÇÃO JURÍDICA

Se a mera subsunção dos fatos à norma nem sempre se mostra como a solução mais adequada para cada caso concreto, o que deve então fazer o operador do Direito para dar status argumentativo ao seu texto?

Tudo começa pelo planejamento textual com enfoque na argumentação jurídica. Por certo que a produção do texto jurídico não pode ser fruto da improvisação e do amadorismo. Aquele que conta com o famoso método denominado brainstorming (tempestade de ideias) incorre numa série de riscos que o leva invariavelmente a uma produção truncada, incoerente e pouco persuasiva. Apenas o profissional muito qualificado em termos redacionais e bastante conhecedor da temática em pauta pode, quando muito, se arriscar a produzir um texto sem planejamento redacional e argumentativo.

Manuel Atienza aduz que:

Ninguém duvida que a prática do Direito consista, fundamentalmente, em argumentar, e todos costumamos convir em que a qualidade que melhor define o que se entende por um “bom jurista” talvez seja a sua capacidade de construir argumentos e manejá-los com habilidade. Entretanto, pouquíssimos juristas leram uma única vez um livro sobre a matéria e seguramente muitos ignoram por completo a existência de algo próximo a uma “teoria da argumentação jurídica”.[5]

Na produção das peças processuais, o prejuízo pela falta de organização de um plano textual talvez fique ainda mais evidente porque a persuasão do magistrado e o consequente sucesso na demanda são favorecidos pelo encadeamento. A coerência e a validade de determinados institutos jurídicos dependem, não raro, da ordem em que são apresentados. Exemplificando: imagine-se uma consumidora cujos cabelos caíram quando da utilização de uma tintura capilar. Pretende a parte lesada indenização por danos morais em virtude do fato do produto. Como elaborar adequadamente a tese argumentativa?

É comum na prática forense iniciar-se teses colacionando precedentes jurisprudenciais e lições doutrinárias sobre o que são danos morais, sem, contudo, expor com precisão qual foi o direito violado. Nesses casos, como poderia ser considerada adequada a argumentação sobre os danos morais se sequer o magistrado tomou conhecimento de qual obrigação foi descumprida?

Nesse passo, compreender a diferença entre argumentação e demonstração é de suma importância para os próximos capítulos.

  1. Diferença entre argumentação e demonstração

Argumentar e demonstrar não são exatamente sinônimos. Enquanto a demonstração busca a verdade, a argumentação busca a adesão do auditório, ou seja, a argumentação é uma atividade que tem por objeto o estudo das técnicas que permitam provocar ou aumentar a adesão dos espíritos às teses que se apresentam nas mais variadas atividades humanas.

A demonstração pode ser vista como um meio de prova, fundada na proposta de uma racionalidade matemática que visa a delimitar os passos a serem percorridos - isto é, método silogístico - para deduzir premissas de outras já existentes. Deste modo, a demonstração opera-se por premissas consideradas evidentes e que, por isso, não precisam ser comprovadas, enquanto a argumentação recorre às teses cuja aceitação dependerá da capacidade de persuasão do argumentador.

E o que isso representa? Bem, a demonstração possibilita que alguém formalize um sistema cujas regras são previamente delimitadas e controladas, não importando em que contexto seja aplicado. O resultado almejado sempre será tido como verdade.

De modo distinto, o argumentador não pode ignorar fatores exteriores para alcançar a adesão de seu auditório, pois o contexto em que atua é determinante de quais valores prevalecem e de quais estratégias são acatadas com mais facilidade para alcançar a permeabilidade do ouvinte.

Em sua obra clássica, Perelman expôs bem as características particulares entre argumentação e demonstração:

Quando se trata de demonstrar uma proposição, basta indicar mediante quais procedimentos ela pode ser obtida como última expressão de uma sequencia dedutiva, cujos primeiros elementos são fornecidos por quem construiu o sistema axiomático dentro do qual se efetua a demonstração. De onde vêm esses elementos, sejam eles verdades impessoais, pensamentos divinos, resultados de experiência ou postulados particulares ao autor, eis questões que o lógico formalista considera alheias à sua disciplina. Mas, quando se trata de argumentar, de influenciar, por meio do discurso, a intensidade de adesão de um auditório a certas teses, já não é possível menosprezar completamente, considerando-as irrelevantes, as condições psíquicas e sociais sem as quais a argumentação ficaria sem objeto ou sem efeito. Pois toda argumentação visa à adesão dos espíritos e, por isso mesmo, pressupõe a existência de um contato intelectual.[6]

O que se pretende asseverar é que o argumentador, para sustentar sua tese, inúmeras vezes necessita de um conjunto de informações prévias (base probatória mínima), a partir do qual produzirá seus argumentos. Ou seja, a demonstração poderá ser utilizada a serviço da argumentação.

A titulo de exemplo, suponha-se que o advogado necessite comprovar o nexo de causalidade entre a conduta de uma construtora - que é acusada de agir com negligência na utilização de materiais considerados de baixa qualidade - e o desabamento de um edifício, evento em que morreram vários moradores. Não há dúvida de que o argumentador só conseguirá convencer o julgador de que existe a responsabilidade civil do construtor se recorrer, por exemplo, a laudos produzidos por profissionais de áreas específicas da construção civil.

Nesse sentido, a argumentação se servirá de pareceres de especialistas que demonstrem, por exemplo, que o ferro utilizado na sustentação das colunas não era adequado para suportar o peso esperado. Este é o mérito da demonstração.

Por outro lado, nem sempre a mera demonstração é apta, por si só, a dar ensejo à reparação por dano moral, sobretudo em se tratando de sua quantificação baseada na extensão do dano. No exemplo, o advogado deverá se valer de informações externas ao evento, como o perfil econômico das partes, o grau de culpa da construtora e a repercussão causada à vítima. É um raciocínio persuasivo e essencialmente argumentativo sem o qual as chances de persuasão do auditório serão remotas, sendo geralmente insuficiente à tal pretensão o mero silogismo entre fato e norma.

Perelman desenvolveu sua teoria ao assinalar que:

O objetivo de toda argumentação, como dissemos, é provocar ou aumentar a adesão dos espíritos às teses que se apresentam a seu assentimento: uma argumentação eficaz é a que consegue aumentar essa intensidade de adesão, de forma que se desencadeie nos ouvintes a ação pretendida (ação positiva ou abstenção) ou, pelo menos, crie neles uma disposição para a ação, que se manifestará no momento oportuno.[7]

A partir de tais considerações pode-se dizer que a demonstração não abre espaço à discussão, pois é baseada na evidência, não exigindo maior esforço do orador em função de impor ao auditório o acolhimento de uma conclusão, como ocorre, por exemplo, com o uso das provas ou de um laudo pericial. Já a argumentação privilegia a discussão das ideias tendo como objetivo a adesão do auditório às teses propostas, valendo-se de técnicas fundamentais para o sucesso da lide.

Portanto, argumentação e demonstração não são sinônimos, mas ferramentas que devem ser utilizadas em conjunto para tornar uma tese vencedora à rival. E nesse ponto, a argumentação jurídica pode ser mais bem compreendida à luz da Teoria Tridimensional do Direito e seu objeto de estudo: fato, valor e norma.

  1. O texto jurídico à luz da teoria tridimensional do direito

A Teoria Tridimensional do Direito de Miguel Reale é responsável pela orientação sobre como os profissionais do Direito da atualidade devem encarar o fenômeno jurídico para serem eficientes na atividade advocatícia.

A teoria tridimensional, na plenitude de sentido deste termo, representa, por conseguinte, a tomada de consciência de todas as implicações que aquela verificação estabelece para qualquer gênero de pesquisa sobre o direito e suas consequentes correlações nos distintos planos da Jurisprudência, da Sociologia Jurídica ou da Filosofia do Direito.[8]

O autor sustenta que para existir um fenômeno jurídico deve haver sempre um fato social e histórico relevante sobre o qual deverá atuar a prática jurídica. Esse fato, para representar algo de significativo ou relevante para a ciência jurídica, deve receber certa significação que o valore de maneira a contextualiza-lo como adequado/inadequado, justo/injusto, nocivo/benéfico às finalidades pretendidas pela sociedade. Assim, haverá uma norma ou uma regra que integre a relação entre o fato e o valor a ele atribuído. Estas três dimensões - fato, valor e norma - são fundamentais para que o Direito possa ser entendido tal como é atualmente.

Mas qual a relação da Teoria Tridimensional do Direito com a estrutura do raciocínio argumentativo que os operadores devem desenvolver?

Ora, se argumentar é conseguir aumentar a intensidade de adesão do auditório de maneira que desencadeie nele a ação pretendida, não há como persuadir um auditório acerca da adequação de uma tese se o argumentador não buscar, no conjunto probatório à sua disposição, fatos a serem valorados, de maneira tal que a aplicação de uma determinada norma possa ser adequada e convincente.

Por exemplo, a simples juntada de um contrato aos autos (demonstração) não evidencia necessariamente a obrigação do contratado em face do contratante. É preciso também apontar qual obrigação foi descumprida, o nexo de causalidade entre o fato e o dano e, conforme o caso, comprovar a culpa. Há a necessidade de que o argumentador desenvolva um raciocínio, pois não se pode esperar que este seja construído apenas pelo juiz, cabendo ao orador trilhar os caminhos adequados para sustentar sua tese.

Desta forma, o advogado não pode deixar de realizar a ponderação dos valores subjacentes à norma que evoca sob pena de ser pouco técnico, pois o Direito, como atividade social, não tem condições de ser articulado sozinho.

Esta questão é da maior importância porque é muito comum advogados citarem inúmeros artigos de determinados diplomas legais - apenas isso - e julgarem que com esse procedimento desenvolveram uma argumentação. O ideal é que cada questão abordada seja devidamente valorada complementando as fontes utilizadas.

Em suma, o argumentador deve em primeiro lugar expor os fatos importantes para que o próprio magistrado possa apreciar/ponderar/valorar os acontecimentos. Uma vez conhecidos os fatos, sua valoração deverá ser feita em seguida na peça processual.

Ao pretender indenização por danos morais, geralmente não basta que o advogado narre os fatos por meio de silogismo (norma geral + ato lesivo = dever de reparar) e os comprove (demonstração), com exceção dos danos presumidos (in res ipsa).  É imprescindível valorá-los de tal modo que convença o magistrado de que a situação concreta extrapola os limites do mero aborrecimento e enseja a reparação extrapatrimonial.

Noutro exemplo, os Tribunais somente acolhem o pedido de exoneração da obrigação do alimentante em prestar alimentos aos filhos que completarem a maioridade quando bem valorados os fatos que serão subsumidos à norma. É o que se colhe da ementa do seguinte julgado do colendo Tribunal de Justiça de São Paulo:

ALIMENTOS - Exoneração - Alimentos devidos a filha maior, com vinte e um anos de idade, que concluiu o ensino superior - Extinção do poder familiar, que altera a causa da obrigação alimentar - Inscrição em curso de pós-graduação que não justifica a manutenção dos alimentos - Alimentada jovem, sadia, com formação superior e capaz, apta a prover as próprias necessidades e pagar futuros cursos de especialização e pós-graduação ? Pai cozinheiro, que não deve, em razão da própria condição social, arcar com cursos diversos para a filha, a quem já garantiu formação superior - Recurso provido.[9]

A eficácia da argumentação tem guarida na Teoria Tridimensional do Direito e ganha relevo quando aliada ao método dedutivo na produção dos argumentos, conforme se verá adiante.

  1. O método dedutivo na produção dos argumentos

Em primeiro lugar, a dedução é uma inferência que parte do universal para o particular. Considera-se que um raciocínio é dedutivo quando, a partir de determinadas afirmações (premissas) aceitas como verdadeiras, o advogado chega a uma conclusão lógica sobre uma dada questão discutida no processo. Vê-se, pois, o uso de silogismo.

A dedução parte de uma verdade geral (premissa maior), previamente aceita, para afirmações particulares (premissas menores). A aceitação da conclusão depende das premissas: se elas forem consideradas verdadeiras, a conclusão será também aceita. Por isso, todo conteúdo da conclusão deve estar contido, pelo menos implicitamente, nas premissas.

Veja-se o seguinte exemplo:

Premissa Maior: Sem autorização, não se pode usar o nome alheio em propaganda comercial. (art. 18 do Código Civil)

Premissa Menor: João usou nome alheio em propaganda comercial sem autorização.

Conclusão: João deverá responder civilmente pelo ato praticado.

Tradicionalmente, o método dedutivo tem sido privilegiado na prática jurídica. Existem situações em que a pretensão da parte é acolhida de forma quase inequívoca pela norma: o dispositivo legal não tem interpretações ambíguas ou díspares. Tanto a doutrina quanto a jurisprudência já fixaram entendimento favorável ao interesse da parte. Enfim, em lides com esse perfil, recorrer à norma e realizar a subsunção dos fatos a ela (método dedutivo manifestado pelo silogismo) é, com certeza, a melhor opção.

No entanto, Ingo Voese adverte que a premissa maior só faz referência importante quando se submete aos limites que a sociedade estabelece com base nos deônticos é permitido, é proibido e é obrigatório:

O apelo à lei, à jurisprudência ou às presunções pode, pois, facilitar a sustentação da tese, porquanto é um instituto social que, de certa forma, não se discute. Não garante, porém, o sucesso: apenas garante a construção mais tranquila da coerência do raciocínio.[10]

O silogismo por meio do método dedutivo orienta a estruturação lógica do raciocínio, fixando uma combinação de lugares e relações entre as partes de modo que haja coerência, coesão e congruência, ou seja, o modelo lógico é orientação para a sustentação de uma justificativa, para o que é fundamental ter argumentos que produzam os efeitos desejados (VOESE, 2006, p. 60).

Esta é a chamada fundamentação simples porque o caso concreto não exige maior esforço argumentativo do advogado, ao contrário do que ocorre na fundamentação complexa. Daí porque se faz necessário salientar a distinção entre casos simples e casos complexos, e as razões pelas quais nem sempre o silogismo por meio do método dedutivo pode ser utilizado como única ferramenta argumentativa.

  1. Casos simples e casos complexos

Como visto, a argumentação é um tipo de texto que se materializa em todas as peças processuais. Para tanto, conforme a oportunidade, ora deverá ser utilizada a fundamentação complexa, ora a fundamentação simples.

A doutrina jurídica endossa amplamente essa discussão quando distingue os casos concretos entre difíceis e simples. A relação é bastante clara: quando se enfrenta um caso concreto simples a melhor argumentação para ele será a simples; quando se enfrenta um caso difícil a fundamentação será complexa.

Casos simples são aqueles em que o argumentador já possui estruturado no ordenamento jurídico todo o repertório a que necessitará recorrer na fundamentação: a legislação rege de maneira clara e a doutrina e jurisprudência mostram-se uniformes quanto à solução mais adequada acerca do assunto.

Nesse sentido, os casos simples requerem do advogado esforço argumentativo reduzido. Quanto aos argumentos, geralmente são necessários a introdução, argumentos de autoridade, argumentos de oposição e conclusão, cujos quais serão analisados mais adiante em capítulo próprio.    Há quem defenda que uma boa petição inicial, em toda sua estrutura, para os casos simples, não demanda mais do que dez laudas.

Por sua vez, os casos difíceis não cabem em soluções prontas, previsíveis, resolvidos com a mera subsunção do fato à norma por meio de silogismo. Não se trata de propor uma nova estrutura para a fundamentação complexa, mas de partir daquela utilizada para a fundamentação simples (introdução, argumentos de autoridade, argumentos de oposição e conclusão) e agregar outros tipos de argumento dependendo de cada caso concreto.

Acerca disso, argumenta Atienza:

Nos casos simples, pode-se considerar que o respaldo consistiria simplesmente na enunciação da proposição normativa correspondente. Mas, nos casos difíceis, isso não basta; é preciso também apresentar uma combinação de enunciados descritivos, normativos e avaliativos.[11]

Aulis Aarnio, professor emérito da University os Tampere na Finlândia, toma em conta a distinção entre casos fáceis e difíceis. Nos primeiros, a decisão é de tranquila formulação, sendo evidente o lastreamento legal e jurídico. Já nos casos difíceis, o julgador cai em um dilema de complexa solução já que sua decisão deve atender a expectativa de certeza jurídica, tanto em sua feição mais superficial quanto em sua concepção mais profunda, é dizer, deve atender a expectativa de que todo cidadão tem o direito de proteção jurídica, bem como a de que esta proteção não seja arbitrária e que a decisão que a manifesta seja substancialmente correta (Aarnio, 1991, p. 27), isto é, que tenha assento jurídico e extrajurídico (moral, social, etc.), permitindo assim que os cidadãos estejam habilitados a planejar suas vidas com bases racionais. Para Aarnio (1991, p. 60), tem-se certeza jurídica quando as decisões judiciais demonstram satisfatoriamente a aceitabilidade racional das interpretações.

Em ambos os casos a objetividade é a melhor forma de persuadir o auditório, mormente ao se considerar o infindável número de processos que tramitam nos tribunais pátrios. Nesse diapasão, convêm destacar um grande problema corriqueiro na prática jurídica hodierna: o prolixismo dos operadores do Direito na elaboração das petições.

  1. O mau do prolixismo e o excesso de “juridiquês” na elaboração das petições

O portal Conjur[12] publicou em 2016 notícia que pertine à prolixidade das petições como fator negativo ao sucesso na prática jurídica.

Ex-advogado, o juiz Douglas Lavine, do Tribunal de Recursos de Connecticut (EUA), pediu que advogados não façam o que ele fazia: falar e escrever muito. Em artigo publicado pelo Jornal da ABA (American Bar Association), ele tenta entender a prolixidade dos operadores de Direito, incluindo promotores e juízes.

Com base em sua autocrítica e em conversas com colegas, o juiz formulou algumas hipóteses para essa prática: “uma teoria é a de que os advogados pensam que devem formular sentenças longas e complexas, recheadas de juridiquês, quando falam ou escrevem, para soarem como advogados”.

Outra teoria, afirma, “é a de que nós pensamos que somos mais eloquentes do que realmente somos”. E há mais uma, provavelmente a mais generalizada: “Sentimos receio de deixar alguma coisa de fora que poderia ser relevante. Mas, ao falar ou escrever muito, corremos o risco de perder o argumento central no meio de tantos argumentos periféricos”.

Autor dos livros Cardinal Rules of Advocacy e Questions From The Bench, ele coletou algumas citações para “enriquecer” seu artigo: “A concisão é a alma da sabedoria” – Hamlet; “Seja sincero, breve e sente-se” – Franklin Roosevelt; “O segredo de um bom sermão é um bom começo e um bom fim e ter esses dois o mais perto possível um do outro” – George Burns.

Regina Toledo Damião assenta que alguns operadores exageram o uso do “juridiquês” na formulação de suas peças e em seus atos. Porém, ressalva Damião (2009, p. 29) que  “o mundo jurídico prestigia o vocabulário especializado, para que o excesso de palavras plurissignificativas não dificulte a representação simbólica da linguagem”.

Na mesma senda, Eduardo Sabbag analisa os vícios comuns da redação jurídica cometidos pelos argumentadores. Sabbag afirma que “para levar a cabo tal mister, não pode se valer da fala pedante, com dizeres mirabolantes, na qual sobejam a terminologia excessiva e enrrolativa que vem de encontro à precisão necessária à assimilação do argumento aduzido” (2011, p. 28).

Como se nota, Lavine não está sozinho nessa luta a favor da concisão. Há quase uma “campanha” nos Estados Unidos, para convencer operadores do Direito a abandonar a prolixidade e adotar a concisão. Mas ele tem suas próprias ideias sobre como fazer isso e destaca sugestões.

Ainda segundo Lavine, um dos fundamentos para uma redação persuasiva é selecionar dois ou mais dos melhores argumentos e trabalhar arduamente neles. É difícil um caso em que são necessários mais de dois ou três argumentos ganhadores. Escolher os argumentos com maior probabilidade de prevalecer e concentrar-se neles. Argumentos fracos são contraproducentes, porque levam o argumentador a “perder pontos” com quem vai decidir o caso, diminuem o impacto dos argumentos fortes e reduzem sua credibilidade.

Manter a simplicidade reduzindo o ponto principal em uma sentença ou duas. Mesmo o caso mais complexo tem um ponto central, que deve ser bem articulado.

Ele exemplifica: em vez de “Este processo levanta a questão sobre se, de acordo com o Artigo 6º da Constituição do Estado e com a Quarta Emenda da Constituição dos Estados Unidos, bem como com decisão precedente, a busca feita pela polícia no carro de meu cliente, em 22 de novembro de 2016, se baseou em causa provável ou se, conforme alegamos, o policial que conduziu a busca se valeu inapropriadamente de sua intuição, para concluir que havia contrabando no porta-malas”, seria melhor “Este processo se refere a uma busca ilegal no porta-malas do carro de meu cliente”.

Evitar longas citações também é fundamental. As facilidades do uso de computador não significam que se deva copiar e colar longas citações na peça processual. Isso é frequentemente desnecessário. Por exemplo, não citar cinco precedentes na petição, se duas forem o suficiente.

Além de um imperativo da atualidade, a objetividade e a brevidade decorrem diretamente dos princípios processuais da razoabilidade, eficiência, oralidade e celeridade.

Evitar o juridiquês é outro ponto importante. Muitos advogados pensam que têm de falar e escrever de maneira intrincada, legalista, embebida em jargões da área, porque isso é próprio da classe. A verdade é que a maioria dos advogados bem-sucedidos escreve de uma forma clara e direta, usando sentenças curtas. Em algum momento, o uso de palavras ou frases em latim ou mesmo de um conceito mais complexo será necessário. Mas essa será uma exceção à regra.

Victor Gabriel Rodríguez é outro autor com densa obra sobre as nuances da argumentação jurídica. Corroborando com os fundamentos supramencionados, Rodríguez (2005, p. 23) lembra que “existe a tendência, entre os pseudo-eruditos, de construir argumentos com excessos de citações e referências” e complementa: “os excessos podem ter efeito deletério, aliás como todo excesso”.

Tanto é assim que uma decisão proferida pelo juiz de Direito Gustavo Coube de Carvalho, da 5ª vara do Foro Central Cível/SP[13] ganhou destaque: ele criticou a inicial extensa e referências em língua estrangeira. Trata-se de um processo de extravio de bagagem ajuizado por seguradora contra uma companhia aérea alemã. A causa foi distribuída ao juízo em agosto de 2016 e, em setembro, foi proferida a decisão.

No despacho, o ilustre magistrado solicitou que a parte autora esclarecesse, de forma resumida e em língua portuguesa, “qual a necessidade de petição inicial de trinta e sete páginas e com referências à doutrina alemã para cobrança de ressarcimento de R$ 1.386,70".

Em outro julgado[14], um desembargador alertou o advogado de que uma peça enxuta tem mais chance de ser acatada. "Direito é bom senso. Há bom senso em peças gigantescas, em um momento em que o Judiciário está assoberbado de processos e que tanto se reclama da demora nos julgamentos? Evidente que não!" A afirmação é do desembargador Luiz Fernando Boller em decisão de sua relatoria na 2ª câmara de Direito Comercial do TJ/SC. O colegiado manteve sentença que determinou a um advogado a emenda de petição inicial vinculada a ação de revisão de contrato bancário, de forma a reduzir a peça de 40 para, no máximo, 10 laudas.

O recorrente alegou que tal restrição desrespeita a liberdade profissional do advogado. A câmara entendeu por conhecer do recurso, mas negou-lhe provimento.   Para o desembargador, a redução da petição inicial, desde que mantido o adequado entroncamento dos argumentos jurídicos voltados para a concretização do pleito, não causa óbice ao exercício da jurisdição.

Na mesma esteira dos exemplos anteriores, o magistrado alertou que uma peça enxuta tem mais chance de ser acatada.

Uma peça enxuta, clara e bem fundamentada é lida e tem chance de ser acatada. Já outra, com 20, 35 ou 50 folhas, provavelmente não. (...) Em verdade, petições e arrazoados começaram a se complicar com a introdução da informática no mundo forense. O 'copia e cola' estimulou longas manifestações. Além disto, as discussões abstratas dos cursos de mestrado trouxeram aos Tribunais pátrios o hábito de alongar-se nas considerações.

Certo de que o princípio da celeridade processual deve se concretizar – o que, na opinião do magistrado, se materializa, dentre outras formas, na proposição de embates mais sintéticos –, o desembargador manteve a sentença, que considerou apontar para os "novos parâmetros norteadores da hodierna prestação jurisdicional".

"Não há artigo explícito no CPC sobre a delimitação do tamanho. E na ausência de norma, o juiz não está obrigado a receber uma inicial com o tamanho de um livro, pois o julgador tem o dever de velar pela rápida solução do litígio (CPC, artigo. 125, II)", concluiu.

Outro caso emblemático ocorreu em 2012. O juiz de Direito Roger Vinicius Pires de Camargo Oliveira, da 3ª vara da Fazenda Pública de Curitiba/PR, determinou em ação civil pública que o MP reduzisse a inicial a uma versão objetiva.

A petição inicial do parquet era de 144 folhas, o que, no entendimento do magistrado, constitui um "livro".

Tudo que o autor disse cabe perfeitamente em um número muito menor das páginas que escreveu. Classificando a petição de prolixa, o julgador diz que o tempo que o juiz gasta lendo páginas desnecessárias é tirado da tramitação de outros processos.

O MP pediu a reconsideração ao magistrado, que negou. "Não vislumbro, inclusive, que a devida exposição dos fatos e fundamentos jurídicos do pedido, em laudas reduzidas, possa prejudicar a prestação jurisdicional, pelo contrário também". O juiz concedeu prazo suplementar de mais cinco dias para a redução da inicial. (Processo: 0001394-92.2012.8.16.0004 - TJ/PR).

É claro que em cada área do conhecimento há termos técnicos inevitáveis, com significado próprio. O que merece reprovação é a linguagem pomposa que nada contribui para o esclarecimento da controvérsia.

No mundo contemporâneo, marcado pela busca da produtividade e da eficiência, não se pode desperdiçar o bem mais precioso do mercado, e também da vida: o tempo. Parece fato incontroverso que todos que atuam no Poder Judiciário nunca trabalharam tanto e também nunca foram tão cobrados a prestar contas como nos dias atuais. Aliás, com a facilidade da tecnologia, os profissionais do Direito trabalham a qualquer hora e em qualquer lugar.

Com a globalização e com a universalização do processo eletrônico e a prevalência da eficiência no Poder Judiciário, a simplificação da linguagem jurídica está deixando de ser uma questão de estilo para se tornar uma exigência operacional.

Portanto, em uma sociedade caracterizada pela velocidade e pela cobrança de resultados, os profissionais da área jurídica têm o desafio de simplificar a linguagem jurídica e harmonizá-la com a realidade atual de um Poder Judiciário atolado em processos.

A despeito das teorias vistas sobre como devem argumentar os operadores do Direito, o capítulo a seguir demonstrará como a argumentação jurídica ocorre na prática, quais seus tipos e as razões pelas quais se argumenta predominantemente de determinada maneira.

  1.  A argumentação prática dos advogados

Noel Struchner e Fábio P. Schecaira examinam de modo pioneiro a argumentação prática dos operadores do Direito, sobretudo a dos advogados, dividindo-a em dois tipos: argumentação substantiva e argumentação institucional. Como espécies da argumentação prática, ambas visam estabelecer conclusões sobre o que deve ser feito; mas, se elas compartilham um fim, não compartilham os meios. “A argumentação substantiva e a argumentação institucional visam estabelecer suas conclusões práticas por meio de razões de tipos diferentes” (STRUCHINER; SHECAIRA, 2016, p. 35).

A argumentação substantiva apela livremente a razões de natureza moral, politica, econômica, social, etc. O cientista politico, o filósofo moral, o jornalista que escreve um artigo, o leitor que manda a sua opinião para o jornal, o motorista de táxi, o amigo que bebe uma cerveja no bar, todos costumam argumentar de maneira substantiva. Se algo lhe desagrada - o imposto de renda, por exemplo -, eles o criticam por ser injusto, ineficiente, inibidor da iniciativa privada ou algo do tipo. Se algo lhes agrada - a condenação de um politico corrupto, por exemplo -, eles comemoram dizendo que a impunidade é um grande mal social, que o político lesou os cofres públicos, enganou o povo, e assim por diante.

A argumentação institucional, por outro lado, não apela livremente a considerações morais, políticas, econômicas e sociais. Ela é mais burocrática, engessada. Quem argumenta institucionalmente não está preocupado em defender aquilo que parece mais justo, mais democrático ou mais eficiente no caso em questão. Quem argumenta institucionalmente, em geral, ocupa uma posição social que exige certo respeito na relação a regras e procedimentos estabelecidos.

O juiz de direito é um exemplo óbvio de indivíduo cuja posição social exige respeito em relação a regras e procedimentos previamente estabelecidos. Advogados, promotores e defensores, por trabalharem rotineiramente com o objetivo de convencer os juízes, acabam falando a mesma língua. Até os juristas estudiosos seguem esta tendência. Por exemplo, no que tange ao imposto de renda, seja ele justo ou não, economicamente eficiente ou não, os profissionais do direito normalmente querem mesmo é saber se ele é legal ou não, se é constitucional ou não.

Como disse certa vez um advogado: “como cidadão, tenho simpatia pela forma como o STF lidou com o caso do mensalão. Aqueles políticos detestáveis precisavam de uma lição. Mas, como advogado, vejo problemas jurídicos graves nas decisões do Tribunal”. A cisão entre as perspectivas do cidadão e do advogado corresponde à cisão entre os modos substantivo e institucional de argumentar.  Pode-se afirmar que os profissionais do direito argumentam de modo predominantemente institucional.

O seguinte diálogo hipotético serve para ilustrar o caráter institucional - e, portanto, burocrático, engessado, artificial - da argumentação jurídica.

- Autor: O Réu me deve 500 reais.

- Réu: Discordo do autor. Não reconheço que exista um contrato válido entre nós.

- Autor: O Réu me deve 500 reais porque realizamos um contrato válido de compra e venda, eu forneci o produto e ele não pagou.

Assine a nossa newsletter! Seja o primeiro a receber nossas novidades exclusivas e recentes diretamente em sua caixa de entrada.
Publique seus artigos

- Juiz: Autor, prove que vocês têm um contrato válido.

- Autor: Eis um documento assinado por nós dois.

- Réu: Não conheço a autenticidade deste documento.

- Juiz (ao Réu): Visto que o documento parece ser autêntico, prove que ele não é.

- Réu: Este laudo feito por um laboratório atesta que a minha assinatura foi forjada.

- Autor: O relatório não serve como prova, pois eu tive conhecimento dele muito tarde no processo.

- Juiz: Concordo. A prova não é admissível.

Há alguma resposta para o fato de, em geral, os operadores do Direito argumentarem rotineiramente de modo burocrático. O ensino jurídico dentro e fora do Brasil é amplamente dogmático. Isto é, os estudantes de direito passam muito mais tempo aprendendo o conteúdo de regras e procedimentos estabelecidos por autoridades legais do que refletindo sobre o justo, o bom, o economicamente eficiente, etc.

Há também o fato de que diálogos hipotéticos como o usado há pouco costumam ser recebidos como exemplos realistas e representativos da prática jurídica contemporânea. O juiz do diálogo hipotético tomou uma decisão favorável a um potencial forjador de assinatura só para respeitar regras processuais relativas ao momento certo de apresentar uma prova (princípio da eventualidade).

Isso pode ser modificado. Os juízes, por exemplo, frequentemente usam argumentos substantivos. Contudo, é crucial notar que, quando os juízes recorrem a argumentos substantivos, eles normalmente o fazem com o objetivo de corroborar argumentos institucionais já formulados. Mesmo quando apelam a considerações explícitas sobre o que é justo ou bom, por exemplo, normalmente encontram meios de passar sobre estas considerações certo “verniz” institucional.

Nestes termos, não raro é notar que a argumentação jurídica muitas vezes ofende o bom senso. Isto decorre da própria argumentação institucional como aquele tipo de argumentação cujo objetivo não é produzir a melhor resposta possível (no sentido moral, político, econômico, etc.) para cada questão que se apresente e sim corresponder ao direito positivado, a pretexto da segurança jurídica e da previsibilidade das normas.

Como explicitado em passagem anterior, a argumentação jurídica deve se pautar na Teoria Tridimensional do Direito que possui como um de seus vetores o valor, ponto congruente com a ideia central da argumentação prática substantiva que apela livremente a razões de natureza moral, politica, econômica, social, do justo, etc. Hoje desprezada, a argumentação substantiva pode provocar ou amentar a adesão do auditório à tese proposta deve se aliada à argumentação institucional, potencializando o discurso jurídico do argumentador.          

  1. O condicionamento do auditório ao discurso jurídico

O papel do advogado é fazer o tribunal ou o júri, seu auditório, admitir a tese que está encarregado de defender. Terá mais sucesso se adaptar sua argumentação ao auditório do qual depende o desfecho do processo que lhe é imposto.

É digno de nota que, dentre as partes da argumentação, o exórdio é uma opção importante do texto jurídico pois poderá ter o papel de aumentar a atenção do auditório sobre a tese deduzida. Seu objetivo será conquistar o auditório, captar a atenção e preparar o auditório. Somente a partir do momento em que o auditório estiver preparado para escutar o que constitui a matéria própria do discurso, cumpre começar por arguir a tese defendida.

Inicialmente, para condicionar o auditório é necessário conhecê-lo, ou seja, entrever tanto as teses que ele admite de antemão como a intensidade de adesão a essas teses, de forma que elas possam servir de gancho à argumentação e possibilitar ao orador sopesar os argumentos que serão porventura aventados àqueles a que o auditório adere com maior intensidade.

Significa dizer que estudar os precedentes e a orientação firmada sobre o tema em debate por determinada Corte é um grande passo para condicionar o auditório adaptando o texto jurídico à tese que se defenderá.

Porém, haverá situações em que nem mesmo o consenso quanto as teses iniciais garantirá a aceitação do discurso, pois não é por estar de acordo sobre as teses gerais que o auditório também estará de acordo sobre sua aplicação.

Considerando que para garantir a adesão do auditório deve-se, sempre que possível, partir das teses aceitas por aqueles que ele pretende convencer, o orador que não conhecer seu auditório correrá o risco de incorrer em uma petição de princípio, ou seja, em um erro de argumentação.

Imagine-se que uma objeção grave possa pesar sobre todo o desenvolvimento do discurso. De nada serviria adiantar argumentos que seriam todos interpretados pelo auditório em função dessa objeção. Cumpre antes de tudo refutá-la, para deixar o campo livre à interpretações mais favoráveis. Este é o objetivo visado ao se condicionar o auditório.

Além de ferramenta auxiliar ao condicionamento do auditório, o estudo da jurisprudência ganha maior relevo quando tratada como argumento de autoridade, conforme será demonstrado detalhadamente em tópico específico. Antes, contudo, pertine realçar alguns aspectos importantes desta fonte do direito.

  1. Uso da jurisprudência: quantidade e qualidade

Quando se trata da citação da jurisprudência como auxílio à argumentação, é válida a exposição de julgados de tribunais diversos, para demonstrar que tal orientação tem apoio em autoridades diversas. Busca-se então a ideia de unanimidade do posicionamento defendido, na mesma medida em que se persuade o julgador, qualquer que seja, que decidir de forma diversa seria ir contra uma maioria, o que geralmente não é recomendável.

Na doutrina de Reale, jurisprudência alcança o seguinte significado:

A jurisprudência é uma ciência normativa (mais precisamente, compreensivo-normativa) devendo-se, porém, entender, por norma jurídica bem mais que uma simples proposição lógica de natureza ideal; é antes uma realidade cultural e não mero instrumento técnico de medida no plano ético da conduta, pois nela e através dela se compõem conflitos de interesses, e se integram renovadas tensões fático-axiológicas, segundo razões de oportunidade e prudência (normativismo jurídico concreto ou integrante).[15]

Entretanto, ainda que se possa firmar o entendimento de que é relevante encarar o uso da jurisprudência como argumento de autoridade, o excesso de julgados recortados em um discurso judiciário raramente contribui para a persuasão. Sabe-se que o trabalho intenso do Poder Judiciário produz decisões em grande número, e então não é bem a quantidade, por si só, que representa fato de convencimento.

Quando à qualidade, a jurisprudência persuadirá como argumento de autoridade desde que haja proximidade e atualidade entre o tema discutido no julgado e o caso concreto. Isto serve de alerta a muitos operadores do direito que constroem discursos escritos com recortes de ementas, que pouco contribuem para a efetiva persuasão do destinatário.

Victor Gabriel Rodríguez, por sua vez, destaca importante reflexão quanto ao uso da jurisprudência como meio de persuasão:

Dosar a citação na jurisprudência é mais um trabalho de coerência argumentativa. Se muito curta, ela perde seu valor de analogia e não persuade o interlocutor. Se muito longa, desestimula a leitura ou a atenção do ouvinte e, por mais detalhada que seja, cairá no vazio (muito provavelmente, no texto escrito, o leitor não terá o menor escrúpulo de pulá-la, partindo para o próximo texto).[16]

Por outro lado, não há uma delimitação exata do que se considera adequado em termos de quantidade de excertos jurisprudenciais colacionados numa petição. Aqui irá preponderar o bom senso e a coerência do operador do Direito em face de cada caso concreto.

Caso se esteja, por exemplo, diante de uma cobrança indevida que deu azo à negativação do nome da pessoa lesada, a jurisprudência é uníssona e sedimentou o entendimento de que o dano moral é presumido (in res ipsa). Nesta situação hipotética, não se mostra necessário colacionar mais do que dois precedentes análogos em função de se tratar de um tema pacífico perante os Tribunais, portanto, neste caso, juntar dez ementas se mostra à evidência excessivo. Por outro lado, se o caso concreto remete a tema sobre o qual haja dissídio jurisprudencial ou ampla divergência, pode ser adequado o uso de um número maior de precedentes com o fito de corroborar a tese defendida.

Em suma, a qualidade deve ser compreendida objetivamente: o grau de persuasão dependerá da proximidade e atualidade entre o tema discutido no julgado e o caso concreto. A quantidade, por sua vez, deve ser interpretada subjetivamente: o uso menor ou maior de julgados irá variar conforme as particularidades de cada caso.

           

  1. O órgão judicante como auditório na visão de Perelman

O conceito fundamental da teoria de Perelman é o de auditório, sendo este um conjunto daqueles sobre os quais o orador quer influenciar por meio de sua argumentação. O papel do auditório é o que distingue a argumentação da demonstração, sendo a demonstração a dedução lógica.

Para que uma argumentação se desenvolva, é preciso que aqueles a quem ela se destina lhe prestem atenção. Para tanto, é imprescindível prender a atenção do destinatário alvo da argumentação. O destinatário, portanto, é o que Chaïm Perelman chama de auditório.

O autor define o conceito de auditório em sua obra clássica:

É por essa razão que, em matéria de retórica, parece-nos preferível definir o auditório como o conjunto daqueles que o orador quer influenciar com sua argumentação. Cada orador pensa, de uma forma mais ou menos consciente, naqueles que procura persuadir e que constituem auditório ao qual se dirigem seus discursos.[17]

Destaca-se ainda o fato de que, para que um orador consiga reter a atenção de seus ouvintes, de forma a poder ser ouvido e, consequentemente, desenvolver a argumentação, é necessária alguma qualidade (PERELMAN, 1996). Ou seja, o orador deve conseguir exprimir suas ideias com certa habilidade, visando sempre o auditório e sua resposta.

Vale dizer, “o auditório presumido é sempre uma noção de certa forma sistematizada, já que o orador pode pesquisar suas origens sociológicas ou psicológicas” (PERELMAN, 1996, p. 22). Fato é que a argumentação, para ser efetiva, deve conceber o auditório presumido da forma mais real possível. Somente assim aquele que fala poderá saber com maior certeza quais argumentos utilizar, evitando o uso de imagens inadequadas, o que pode gerar “as mais desagradáveis consequências” (PERELMAN, 1996, p. 22).

Isso se explica pelo fato de que são as reações do auditório e dos indivíduos que o compõe que determinam os rumos do discurso. Importa também a capacidade dos membros do grupo ouvinte de compreender os argumentos ou raciocínios ordenados. Obviamente, um bom orador não insistirá em um argumento que já notou ser incompreensível ou inaceitável para seu auditório, modificando sua estratégia para o convencimento.

Ressalte-se que o ouvinte único pode também encarnar outro auditório, um auditório particular, na medida em que represente o corpo de um grupo maior, sendo seu porta-voz e por ele podendo tomar decisões; ou quando é considerado como uma amostra de todo um gênero de ouvintes (PERELMAN, 1996), sendo raros os casos em que não há essa encarnação.[18]

O papel dos advogados é diverso daquele dos juízes. Um advogado visa demonstrar ao juiz ou ao tribunal que a tese que está a defender é correta. “Para consegui-lo, adaptará sua argumentação ao auditório, do qual depende o desfecho do processo” (PERELMAN, 2004, p. 217). Assim sendo, não utilizará dos mesmos artifícios para dirigir-se a um juiz de primeiro grau e ao tribunal, em sede de apelação, ou às instâncias superiores. Mudando o auditório, portanto, deve o advogado modificar sua argumentação.

Por assim dizer, o auditório tratado neste trabalho é o órgão judicante, a quem o orador deverá influenciar com suas técnicas de argumentação jurídica. Importante que se diga, contudo, haver outros auditórios com suas peculiaridades, como ocorre nos casos do tribunal do Júri e que não são objeto do presente estudo.

Ademais, Giovanini Reale (2007, p. 163) demonstra que a tese criada por Perelman possui influência da Retórica de Aristóteles, ao apresentar a seguinte síntese aristotélica: “O retórico deve conhecer as coisas sobre as quais quer convencer, assim como deve conhecer a alma dos ouvintes na qual deve introduzir a persuasão”.

O conceito de auditório é, portanto, básico à Teoria da Argumentação perelmaniana, sendo que a finalidade de toda argumentação é conseguir ou aumentar a sua adesão a determinada tese. Como o orador tem a necessidade de adaptar seu discurso ao auditório, diz-se que a argumentação é função deste.

Por tudo isso, o advogado deve estar atento às constantes modificações do Direito e, principalmente, atualizar-se sobre como os Tribunais decidem determinados casos, de tal modo que possa adaptar sua argumentação jurídica à tese que irá propor.

  1. TIPOS DE ARGUMENTO

Nicola Abbagnano[19] afirma que argumento “[...] é qualquer razão, prova, demonstração, indício, motivo capaz de captar o assentimento e de induzir à persuasão ou à convicção”. Manuel Atienza[20] define a prática argumentativa como “[...] uma atividade que consiste em dar razões a favor de ou contra uma determinada tese que se trata de defender ou de refutar”.  Para Leda Corrêa (2008, p. 121), “argumento é uma manifestação linguística que inclui uma asserção capaz de levar a uma conclusão”.

A busca da persuasão do órgão judicante, o auditório tratado neste trabalho, pode ser alcançada por meio de vários tipos de argumento: a) argumento de autoridade; b) argumento de oposição; c) argumento de analogia; d) argumento de causa e efeito; e) argumento ad hominem f) argumento a fortiori e g) argumento por absurdo.

De acordo com Perelman:

Portanto, a ordem dos argumentos deverá ser tal que lhes dará maior força: o orador principiará geralmente por aquele cuja força é independente da dos outros. Na defesa dupla, que abrange a um só tempo o fato e o direito, a ordem não é indiferente: sempre se começara pela defesa mais forte, esperando que a convicção estabelecida pelo primeiro ponto contribua para aceitação do segundo. Em geral, devem-se apresentar os argumentos numa ordem tal que pareçam plausíveis, dado o que já se sabe dos elementos do debate[21].

No mesmo sentido, Rodríguez:

A ordem dos argumentos é de escolha do orador ou do autor do texto escrito. Depende dos momentos de ênfase que pretende estabelecer, da coerência em seus mais diversos níveis, ritmo do texto, da estrutura lógica. Como já se afirmou no capítulo referente à coerência, o mais importante é que a estrutura seja planejada anteriormente, com o maior nível de consciência possível do transcorrer do texto[22].

Cabe dizer que não existe um rol taxativo de tipos de argumento pois a classificação destes não segue na doutrina uma regularidade, no entanto os exemplos a seguir perfazem uma linha argumentativa comumente elencada em diversas obras.

  1. Argumento de autoridade

O argumento de autoridade, como a própria nomenclatura sugere, é aquele que invoca o prestigio dos atos ou juízos de determinada pessoa ou grupo a partir do qual a afirmação ganha relevância.

Importante identificar quem são as pessoas ou os grupos de onde provém a fala da autoridade. Não há dúvidas de que a lição de um profissional conhecido e reconhecido em determinada disciplina - um psicólogo para tratar de questões ligadas à personalidade; um médico para opinar sobre uma patologia; um historiador para avaliar as consequências de um dado evento de grande relevância para a sociedade de uma época, etc. - possui grande valor.

Portanto, a doutrina, a opinião fundamentada de especialistas em geral e a legislação podem ser utilizadas como fundamentos relevantes na redação de argumentos de autoridade.

Ainda sobre a doutrina, seu papel é exatamente o de trazer legitimidade ao que se está defendendo. É uma maneira de se dizer que algum jurista, cuja autoridade já foi reconhecida pela maioria, pensa como você e que, por isso, sua tese deve ser acolhida.

É fundamental tomar cuidado, entretanto, com uma postura cada vez mais comum na prática forense: alguns operadores do Direito se iludem com a ideia de que a simples referência a um dispositivo legal já caracteriza a fundamentação de uma tese pelo argumento de autoridade. Isso não é verdade.

Não bastaria, portanto, em dada fundamentação, dizer que “o que se verifica, no caso em análise, é a verificação da carência de ação por parte do autor, conforme dispõe o CPC”. Fica evidente que há uma tese aqui sustentada, mas não há argumentos que garantam a existência da “carência de ação”. Melhor seria se o parágrafo argumentativo por autoridade fosse assim redigido:

O que se comprova, no caso em análise, é a verificação da carência de ação (art. 330, inciso III do CPC) por parte do autor, em virtude da ausência do chamado interesse de agir, condição indispensável para o regular exercício do direito de ação, uma vez que o autor nunca teve a posse efetiva da área, objeto do litígio. Isso impede que o seu pedido seja possessório.

É perceptível que no parágrafo anterior, a legislação reforça o que o argumentador sustenta por meio dos fatos.

É importante frisar que, apesar de muito persuasivo, o argumento de autoridade deve ser exposto de maneira a que se comprove seu percurso lógico. Ele não vale apenas porque está amparado pela legislação ou pela doutrina; espera-se que o ponto de vista sustentado seja também coerente e razoável. Por isso não se deve fazer da  argumentação um amontoado de citações. A colação de argumentos de autoridade deve ser utilizada adequadamente.

  1. Argumento de oposição

É consabido que todo profissional do Direito, quando argumenta, sabe que seu ponto de vista será contraposto por outro profissional que atua no polo adverso. O contraditório é uma realidade a ser enfrentada pelo argumentador na prática forense.

Nesse sentido, tentar prever alguns valores ou argumentos a serem utilizados pela outra parte ao longo da busca da solução jurisdicional para o conflito pode ser uma estratégia discursiva bastante útil, pois ao mesmo tempo em que o advogado argumenta a favor de sua tese, já conseguiria também mostrar que outra possibilidade de compreender os fatos - a do seu adversário - seria incompatível com a razoabilidade, como no exemplo hipotético a seguir:

No presente caso inexiste relação de consumo, ao contrário do que alega a empresa Autora. Não se ignora que a lei consumerista também respalda a Pessoa Jurídica como consumidora (art. 2º CDC), mas preconiza como pressuposto que consumidor é todo aquele que utiliza produto ou serviço como destinatário final, o que aqui não se vislumbra.

É justamente por essas razões que a oposição se mostra um tipo de argumento eficiente para a redação de uma boa fundamentação jurídica.  Ao assinalar objeções à sua própria tese, dá-se uma aparência de objetividade e imparcialidade. O indivíduo apresenta-se como sendo capaz de considerar outros pontos de vista que não o seu; valoriza a opinião do outro, e essa valorização parece um esforço de clarividência, de honestidade e não de propósito.

  1. Argumento por analogia

Antes de explicitar como a analogia pode ser utilizada como estratégia argumentativa e como se caracteriza esse tipo de argumento, é importante que se entenda o significado desse termo e quais as implicações de sua utilização.

Reale (2000, p. 17) leciona que “a analogia consiste, em sua essência, no preenchimento da lacuna verificada na lei, graças a um raciocínio fundado em razões de similitude, ou ainda, na correspondência entre certas notas características do caso regulado e as daquele que não o é”.

Analogia, portanto, é o procedimento por meio do qual se pode estabelecer uma relação de semelhança entre coisas diversas. Recorrer à analogia significa fazer uma espécie de comparação entre os termos em questão.

Observa-se também o raciocínio usado no parágrafo abaixo, quando se quer, por exemplo, sustentar que a Constituição da República Federativa do Brasil exerce sobre seus cidadãos poder soberano:

A Constituição protege os direitos fundamentais dos seus cidadãos e estabelece as normas de estruturação e organização do Estado, assim como a Bíblia reúne as orientações de Deus ao homem para que este viva em paz e seja feliz junto a seus pares.

Ora, se as orientações da Bíblia são soberanas em decorrência de quem as inspirou, por analogia, essa característica - soberania - passa a Constituição da Republica, por consequência da aproximação sugerida na argumentação.

Não é adequado, nesta hipótese, falar-se em lacuna, mas ainda assim a analogia mostra-se eficiente, pois é por meio dela que se podem transmitir características conhecidas - garantidas pelo conhecimento prévio do auditório - a situações novas, produzindo conhecimento novo.

O legislador, no artigo 4° da Lei de Introdução às normas do Direito Brasileiro, facultou ao julgador a utilização da analogia como fonte do Direito. O dispositivo legal prevê, textualmente, que “Quando a lei for omissa, o juiz decidirá o caso de acordo com a analogia, os costumes e os princípios gerais de direito”. Essa faculdade dada pelo legislador ao aplicador do Direito esclarece que a analogia ocupa um papel muito mais importante que o de “possibilitar a formulação de uma hipótese”. Em todos os casos em que houver lacuna na lei para o tratamento de uma determinada matéria, o magistrado não precisará declinar de sua jurisdição; poderá julgar com base na analogia.

Isso ocorre com muito mais frequência do que se pode imaginar. Atualmente, o tema dos direitos civis dos homo afetivos procedeu à argumentação por analogia para alcançar a tutela desses direitos, tendo em vista a ausência de legislação que tratava do assunto na época, apesar das inúmeras decisões favoráveis a essa minoria, especialmente as recentes decisões do Superior Tribunal Federal.

Logo, ao resumir esse raciocínio em um enunciado, teríamos o seguinte: assim como a entidade familiar composta por homem e mulher está amparada pela Constituição da República, a união entre dois homens ou duas mulheres - já que todos são iguais perante a lei - deve ser também amparada pelo Estado.

  1. Argumento ad hominem

Foi demonstrado que o argumento de autoridade invoca o prestígio de uma determinada pessoa ou grupo a partir do qual sua afirmação ganha relevância. O argumento ad hominem, de forma diametralmente oposta, consiste no ataque a uma pessoa cujas ideias, argumentos ou depoimentos pretende desqualificar. Ao invés de se enfrentar o argumento do adversário, ataca-se a pessoa do adversário. Ataca-se o homem e não a ideia.

Apesar de não possuir bases lógicas, este argumento constitui uma forte arma retórica. O ataque à pessoa pode ocorrer por duas diferentes estratégias:

a) ataque direto à pessoa (argumento ad hominem abusivo), quando coloca seu caráter e seus valores morais em dúvida e, portanto, a validade de sua argumentação, porque eivada de descredibilidade.

Dois exemplos desse argumento estão adiante:

1) As afirmações de Richard Nixon a respeito da política de relações externas em relação á China não são confiáveis, pois ele foi forçado a abdicar durante o escândalo de Watergate;

2) O Ministro Joaquim Barbosa, em sessão no Supremo, atacou o Ministro Gilmar Mendes quando disse que ele não tem condições de lhe dar lições de moral, já que conquistou sua condição de prestígio usando capangas cm sua cidade de origem e fazendo uso político da mídia, o que estava destruindo a credibilidade do STF. Fecha seu raciocínio recorrendo ao senso comum: “Saia à rua, Ministro Gilmar, e constate o que as pessoas dizem a vosso respeito”.

b) ataque às circunstâncias em que o adversário realiza certa afirmação (argumento ad hominem circunstancial), que ocorre quando a pessoa, não por seu valores morais ou pessoais, mas pelo contexto, mostra-se incapaz de fazer certas afirmações.

É esse o caso da desqualificação da chamada “testemunha ocular” pelas condições em que assistiu aos fatos sobre os quais testemunha.

1) Em um processo criminal, no qual se imputava o crime de homicídio a um policial militar, o defensor público questionava a única testemunha do crime, uma senhora de 72 anos, o seguinte: como a senhora - que tem 6,5 graus de miopia - pode garantir que foi o réu quem matou, se acabou de afirmar que levantou de madrugada, com o barulho do tiro, e olhou pela janela? A senhora dorme de óculos, ou sua miopia não a impede de reconhecer um rosto a noite a quase oitenta metros de distancia?

2) João disse: - Foi este o homem que vi roubando aquele carro! Maria respondeu: - Como pode afirmar isso, se você estava bêbado?

Percebe-se que o argumento ad hominem circunstancial pode ser muito eficiente quando a instrução do processo ainda está em curso, ou seja, quando a produção das provas depende da maior ou menor credibilidade de quem a oferece.

  1. Argumento a fortiori

O argumento a fortiori - com mais razão - é aquele que estabelece uma relação entre dois eventos, de maneira a orientar a conduta de um baseada no parâmetro estabelecido pelo outro.

O argumento a fortiori pode sempre ser resumido numa fórmula como esta: se a solução X é adequada para o caso Y, com maior razão deve ser também adequada para o caso Z, que é uma forma mais grave (ou mais evidente, ou mais ampla, ou mais intensa, ou maior) de X.

Em virtude disso, é comum recorrer-se à noção de proporcionalidade, que no direito tem natureza jurídica de princípio. Celso Ribeiro de Bastos é um dos juristas para quem o princípio da proporcionalidade tem o objetivo de coibir excessos desarrazoados, por meio da aferição da compatibilidade entre os meios utilizados e os fins pretendidos, a fim de evitar restrições desnecessárias ou abusivas. Para Bastos, citado por Tavares (2012, p. 551) “a proporcionalidade não é um princípio, mas um parâmetro interpretativo do direito”.

Lado outro, é lícito dizer, da mesma maneira, que o argumento a fortiori deriva do brocardo “quem pode o mais, pode o menos”. Quando o argumentador recorre a essa estratégia, seu objetivo é conseguir uma aplicação mais extensiva da lei, para que se aplique à situação fática que nela não está explícita.

Um exemplo que ilustra essa explicação:

Se a lei exige dos Promotores de Justiça que nas denúncias discriminem as ações de cada um dos acusados, com mais razão (a fortiori) se deve exigir que o Magistrado as individualize na sentença.

  1. Argumento por absurdo

O argumento por absurdo é aquele que não apenas mostra que o argumentador está certo, mas também que o advogado da parte contrária está errado.

Consiste, portanto, em demonstrar a não validade de uma tese. Para isso, é necessário não apenas pressupor que ela seja verdadeira, mas mostrar, dividindo sua explicação em pedaços, que sua aplicação leva a resultados contraditórios e inadmissíveis, ou seja, absurdos.

Trata-se de demonstrar a falsidade de uma afirmação ou a invalidade de uma ideia evidenciando que seus efeitos ou desdobramentos contradizem essa mesma ideia, ou conduzem ao impossível, ao inadmissível. Portanto, o argumento pelo absurdo aceita, provisoriamente, a tese que se quer combater, e desenvolve-a até conseguir demonstrar seus efeitos absurdos.

No campo hermenêutico, usa-se o argumento por absurdo para mostrar que a aceitação de uma interpretação da norma levaria a) a contrariar o fim visado pela mesma norma; b) a contradizer norma hierarquicamente superior; c) à antinomia entre a norma interpretada e o sistema em que está inserida; ou d) a uma inconstitucionalidade. Veja-se o seguinte exemplo:

A pretexto de se coibir o enriquecimento ilícito previsto no art. 884 do Código Civil, por muito tempo se permitiu que Associações de Moradores cobrassem compulsoriamente taxas daqueles que não anuíram com tais cobranças e ainda impedissem que os compradores se desassociassem de seus quadros. Tal entendimento não somente contraria o princípio da legalidade, como viola frontalmente o art. 5º, inciso XX da Constituição Federal o qual prevê que ninguém poderá ser compelido a associar-se ou a permanecer associado, o que não se admite.

Como se vê, há vários tipos de argumentos a serviço da argumentação, devendo o advogado avaliar a conveniência de usá-los conforme o grau de complexidade de cada caso, conforme já alinhado.

A Teoria Tridimensional do Direito mostra-se novamente oportuna quando se trata da caracterização das partes, ainda que não seja um tipo de argumento propriamente dito (REALE, 1994). Portanto, a contextualização dos fatos com fulcro na caracterização das partes é mais uma estratégia eficaz de valoração capaz de provocar a adesão do auditório .

  1. Caracterização das partes

Quando couber, importa que sejam objetivamente descritas as características físicas, econômicas e sociais das partes, uma vez que estas informações podem servir de argumento na defesa de uma tese.

É o exemplo de um líder comunitário de 45 anos, enfermeiro, que tenha atraído até sua casa uma jovem de 13 anos, moradora da mesma comunidade e que, ali, estupra-a. Seu ato assume uma proporção maior de culpabilidade do que se igualmente fosse protagonizado por um rapaz de 18 anos, colega de 7ª série da menina. Dimensionando os atributos de ambos os acusados, imputaríamos ao primeiro maior discernimento para o ato praticado, uma vez que se pressupõe ser mais experiente do que o segundo e, ainda, saber avaliar melhor as consequências dos seus atos. Além disso, era uma pessoa que inspirava a confiança dos moradores da comunidade que liderava. Usou, portanto, do abuso de confiança para atrair a jovem e alcançar seu intento.

A caracterização das partes também é habitualmente utilizada como argumento em diversas decisões judiciais, ocasião em que o magistrado explicita os motivos pelos quais chegou àquela decisão.

Num caso concreto que tramita sob segredo de justiça, o insigne magistrado Augusto Drummond Lepage indeferiu pedido de alimentos provisionais pleiteados pela requerente em caráter liminar, na ação de reconhecimento e dissolução de união estável, com suporte na caracterização das partes. Com efeito, a decisão interlocutória foi motivada na valoração dos fatos em evidente argumentação substantiva:

Indefiro o pedido de arbitramento de alimentos provisionais. Os contornos fáticos da união outrora mantida entre as partes merecem melhor definição. Não há certeza quanto à data do início da alegada união estável, sendo certo que a relação terminou há mais de um ano, em agosto de 2014, quando a requerida viajou ao Canadá às suas expensas, somente retornando no início do ano corrente. 

A autora conta 28 anos, tem curso superior, permaneceu por pelo menos seis meses no exterior às suas próprias expensas e, a princípio, é capaz de prover o próprio sustento, ainda mais diante da ausência de evidências de que tivesse relação de dependência econômica com o requerido. Portanto, não se vislumbra a necessidade de arbitramento de provisionais.[23]

Coaduna-se a este entendimento recente decisão[24] do egrégio Superior Tribunal de Justiça que fixou nova tese para arbitramento do dano moral, elegendo o método bifásico para analisar a adequação de valores. A sistemática analisa inicialmente um valor básico para a indenização, considerando o interesse jurídico lesado, com base em grupo de precedentes que apreciaram casos semelhantes. Em segunda fase, o juízo competente analisa as circunstâncias do caso para fixação definitiva do valor da indenização.

O eminente ministro Luís Felipe Salomão, em voto que foi acompanhado pelos demais ministros da turma, exarou que na segunda fase do método o juiz pode analisar a gravidade do fato em si e suas consequências; a intensidade do dolo ou o grau de culpa do agente; a eventual participação culposa do ofendido; a condição econômica do ofensor e as condições pessoais da vítima. Para o magistrado, o método é mais objetivo e adequado a esse tipo de situação.

Conclui-se que vários são os argumentos à disposição dos operadores do Direito, que por sua vez poderão uni-los às técnicas de argumentação jurídica com o objetivo de provocar ou aumentar a adesão do auditório, a depender de cada caso.

Cabe mencionar que igualmente importante ao que já fora tratado aqui, é a compreensão de como os juízes decidem na prática, por meio das teorias da decisão judicial, com destaque à teoria do realismo jurídico a seguir delineada.

5.REALISMO JURÍDICO: COMO OS JUÍZES DECIDEM NA PRÁTICA

O realismo jurídico foi um dos principais movimentos teóricos do século XX, sendo sua principal contribuição o estudo sobre como os juízes julgam os casos na prática, cujo objetivo fora analisar o funcionamento da tomada de decisão judicial.

A principal ideia do realismo jurídico consiste justamente em aproximar o direito da realidade dos litígios diários dos tribunais, ou seja, aproximar a realidade jurídica da realidade social do conflito e, a partir daí, buscar a solução mais coerente possível com os princípios fundamentais que regem o direito, como a busca incessante da concretização da justiça.

Segundo Luis Roberto Barroso:

Esse é o ponto de vista professado por movimentos teóricos de expressão, como o realismo jurídico, a teoria critica e boa parte das ciências sociais contemporâneas. Todos eles procuram descrever o mundo jurídico e as decisões judiciais como são, e não como deveriam ser. [...] Decisões judiciais refletem as preferencias pessoais dos juízes, proclama o realismo jurídico; são essencialmente politicas, verbera a teoria crítica; são influenciadas por inúmeros fatores extrajurídicos, registram os cientistas sociais. Todo caso difícil pode ter mais de uma solução razoável construída pelo interprete, e a solução que ele produzirá será, em última análise, aquela que melhor atenda a suas preferências pessoais, sua ideologia ou outros fatores externos, como os de natureza institucional. Ele sempre agirá assim, tenha ou não consciência do que está fazendo.[25]

Ao analisar o realismo jurídico, Barroso (2013) orienta que decisões judiciais, com frequência, refletirão fatores extrajurídicos. Dentre eles incluem-se valores pessoais e ideológicos do juiz, assim como outros elementos de natureza politica e institucional. Por longo tempo a teoria do Direito procurou negar esse fato, a despeito de muitas evidências.

Não se espera com isso prever precisamente como os tribunais irão se pronunciar amanhã, sobretudo porque na maioria das vezes não há uma única resposta correta ao caso apreciado. No entanto, o mérito desta teoria é antever determinados padrões que se traduzem como relevante argumento em favor do argumentador. 

Esta técnica é valiosa porque no mundo jurídico, especialmente, o uso do argumento certo, no momento certo e do jeito certo é decisivo, já que a linguagem é objeto e ferramenta de trabalho do profissional do Direito, que em diversas áreas de atuação, coloca em uso o recurso da língua e do discurso.[26]

Com muita propriedade, Perelman (1996, p. 27) afirma que “o importante, na argumentação, não é saber o que o próprio orador considera verdadeiro ou probatório, mas qual é o parecer daqueles a quem ela se dirige”. Isto faz todo o sentido e se amolda à ideia do realismo jurídico.

O argumentador apaixonado, que só se preocupa com o que ele mesmo sente, enquanto argumenta, o faz sem levar suficientemente em conta o auditório a que se dirige: empolgado por seu entusiasmo, imagina o auditório sensível aos mesmos argumentos que o persuadiram a ele próprio.

É, de fato, ao auditório que cabe o papel principal para determinar a qualidade da argumentação e o comportamento dos oradores. O que se vê é que o orador convincente deve estudar seu auditório para então decidir sobre quais argumentos lançar a fim de persuadi-lo. É partindo dos ouvintes que o orador desenvolverá sua argumentação, lançando mão daquela mais conveniente à situação concreta.

Tal estratégia argumentativa, portanto, converge à ideia do realismo jurídico, conforme se verá adiante.

5.1Holmes, o precursor do realismo jurídico

Oliver Wendell Holmes Jr., conhecido como precursor do realismo jurídico, faleceu em 1935, três anos após se aposentar como juíza da Suprema Corte Americana, onde exerceu suas atividades de 1902 a 1932. Sempre apresentando opiniões polêmicas em suas decisões, recebeu o titulo de The Great Dissenter[27], porém a importância de suas ideias foi preponderante para o movimento, sendo hoje respeitado como nome do pensamento jurídico norte-americano.

As obras de Holmes (1992, p. 166) incitaram a concepção realista ao afirmar que o Direito não é lógica, mas experiência. Em sua obra “The Commom Law”, Holmes se apresenta contrário ao Direito praticado e afirma:

A vida do Direito não tem sido lógica: tem sido experiência. As necessidades do tempo, as teorias morais e políticas que prevalecem, as instituições das políticas públicas, claras ou inconscientes, e até mesmo os preconceitos com os quais os juízes julgam têm importância muito maior do que silogismos na determinação das regras pelas quais os homens devem ser governados. O Direito incorpora a história do desenvolvimento de uma nação através de muitos séculos, e não pode ser tratado como se compreendesse tão somente axiomas corolários de livros matemáticos.[28]

O realismo critica o formalismo jurídico, a tendência do Direito como ciência, o objetivismo, a utilização lógica e a busca da certeza jurídica. Esse movimento discute o funcionamento do processo judicial, e seu interesse está no Direito que é e não no Direito que deve ser, distinguindo ainda o Direito dos livros do Direito de ação.

Além disso, não se deve perder de vista que hodiernamente restam superados os esquemas puramente lógicos de compreensão do Direito, sendo que a decisão judicial “deve ser compreendida como uma experiência axiológica concreta e não apenas como um ato lógico redutível ao silogismo” (REALE, 1979, p. 62).

Para os realistas, o importante é o que fazem os juízes e não o que dizem que fazem, considerando as decisões dos magistrados muito mais amplas do que se supõem. A doutrina da escola realista pode ser resumida da seguinte maneira: É Direito o conjunto de regras que são efetivamente seguidas numa determinada sociedade. Porém, quando os realistas dizem que Direito são as normas efetivamente cumpridas, eles não estão se referindo ao comportamento dos cidadãos e sim ao comportamento dos juízes no exercício de suas funções. Tanto é que não se preocupam tanto com o legislador e sim com o juiz que aplica a lei estabelecida pelo legislador.

Sobre o tema, Claudia Chaves Martins Jorge assevera:

Utilizando-se da metáfora do bad man, que seria a pessoa interessada em saber o que sofreria caso violasse a lei, Holmes apresenta sua “teoria da imprevisão”, para demonstrar a possibilidade de se antever as decisões proferidas pelos tribunais. A decisão judicial seria passível de ser antecipada, buscando-se conhecer como os juízes decidiram em outros casos semelhantes. E, como objeto de seus estudos, reuniu tratados, leis e estatutos vigentes em 600 anos de História e os denominou oráculos da lei. O pensamento de Holmes parte da perspectiva do Direito fundamentado na experiência.[29]

Salienta-se, contudo, que o realismo jurídico não pode ser confundido com o decisionismo, tendo em vista que este privilegia as arbitrariedades dos juízes, enquanto que aquele, tão somente, está relacionado com o poder de discricionariedade dos magistrados.

Assim defende Lorena de Melo Freitas:

[...] é exagero assemelhar o realismo ao decisionismo, pois este último sim é quem concebe o direito como fruto exclusivo da arbitrariedade do julgador, ao passo que para o realismo o direito é fruto não da arbitrariedade, mas discricionariedade do julgador (FREITAS, 2009, p. 36).

Os realistas, portanto, não defendem decisões arbitrárias e que beiram pela irracionalidade, mas sim se propõem a se apegar aos precedentes, considerando estes como verdadeiros elementos normativos para a solução do conflito.

Não é possível conceber, assim, que o julgador poderá decidir a seu bel prazer, o que levaria o pensamento realista à ideia de irracionalidade. Pelo contrário, após decidir, o magistrado tem a obrigação de fundamentar a sua decisão, tendo como auxílio o texto legal ou até mesmo os precedentes judiciais, dependendo do sistema jurídico no qual esteja inserido: civil law ou common law (STAACK; HEIL, 2017, p. 4)

Nestes termos, a adequação do orador ao auditório, além de condição prévia para persuadir os ouvintes, é também essencial para todo o desenvolvimento da argumentação. De fato, o desenvolvimento da argumentação deve ser realizado continuamente ao longo de toda a dialética, renovando-se os argumentos conforme seja modificado o auditório.

5.2Percurso racional da decisão judicial

Karl Llewellyn foi professor da Universidade de Colúmbia e se destacou no realismo jurídico norte-americano. Quando apresentou a conceituação de Direito, o definiu como sendo o que os funcionários da Justiça fazem com as disputas que surgem na sociedade.

Nesse ponto, o autor reflete o pensamento de Holmes com a afirmação de ser importante o que os juízes fazem e não o que dizem fazer. Pois, muitas vezes, o juiz primeiro chega a um resultado para então buscar razões legais de sua decisão. Para o jurista, a afirmativa de se estudar uma sentença, com o objetivo de se saber previamente o que determinada corte fará para resolver um caso semelhante, deve ser analisada sob alguns aspectos. Em primeiro lugar, deve-se identificar o que os tribunais têm decidido e qual é a regra derivada da sentença. Segundo, deve-se analisar como os tribunais têm interpretado as regras e o grau de precisão com que trabalham com o fato ocorrido, podendo essa sentença funcionar como precedente (LLEWELLYN, 1994, p. 244-293).

Numa síntese, Lídia Reis de Almeida Prado acentua:

Karl Llewellyn acredita que, geralmente, a mente do juiz antecipa a decisão que considera justa (dentro da ordem jurídico-positiva) e depois procura a norma que pode servir de fundamento a essa solução, atribuindo aos fatos à qualificação apropriada. Percebe-se, por essa percepção do autor, a admissão da existência no processo decisório - sem excluir o prisma legal e o valorativo -, de aspectos extralógicos, relacionados com conteúdos subjetivos do juiz.[30]

Outro autor pertencente ao movimento foi Jerome Frank, para quem a decisão judicial seria mecanismo de racionalização da decisão pessoal, o que o fez apresentar críticas à maneira como os juízes decidiam os casos. Segundo Frank (1970, p. 138), na visão realista os magistrados decidem de acordo com suas próprias convicções e não por regras gerais que levariam a resultados particulares.

Jerome Frank, pertencente à Escola do realismo americano que surgiu na primeira metade do século XX, ressaltou o caráter  criador da decisão judicial, bem como a relevância do papel do magistrado e de sua personalidade na decisão. Essa Escola, embora tenha incidido em exageros, que a história das ideias jurídicas veio  a apontar -  como insurgir-se contra a concepção do Direito como um sistema normativo - trouxe uma compreensão mais autêntica da prestação jurisdicional. Assim, desmistificou os padrões de neutralidade do juiz, de uniformidade e generalidade do Direito, bem como o de segurança jurídica inexorável.[31]

De acordo com esta corrente, as decisões estão fundamentadas nos impulsos do juiz, o qual extrai esses impulsos fundamentalmente não das leis e dos princípios gerais de Direito, mas, sobretudo, de fatores individuais. Ainda segundo Frank (1991, p. 27), Learned Hand, o mais sábio dos juízes, afirmou, depois de muitos anos de atuação como juiz de primeira instância, que, se fosse um litigante, temeria um pleito além de todas as demais coisas, salvo a enfermidade e a morte.

Afirma Atienza:

É possível que, de fato, as decisões sejam tomadas, pelo menos em parte como eles sugerem, isto é, que o processo mental do juiz vá da conclusão as premissas e inclusive que a decisão seja, sobretudo, fruto de preconceitos; mas isto não anula a necessidade de justificar a decisão tampouco converte essa tarefa em algo impossível (Atienza, 2006, p. 23).

Em sua tese de mestrado apresentada à Faculdade de Direito de Ribeirão Preto da Universidade de São Paulo, Roberto Tagliari Cestari realça o percurso racional para se chegar à decisão judicial:

Em síntese, os realistas concordavam com a seguinte tese acerca da adjudicação na decisão dos casos: (i) os juízes inicialmente centram a sua atenção e reagem aos fatos concretos do caso em questão, ao invés de reagirem à racionalidade e às normas jurídicas. (ii) Em seguida, os juízes buscam (consciente ou inconscientemente) argumentos jurídicos que confirmem sua intuição. Como na maioria dos casos (especialmente nos casos difíceis) é possível argumentar para um lado ou outro da questão, esta não é uma tarefa tão difícil como possa aparentar.[32]

Embora não integre a escola realista, Luis Recaséns Siches - adepto da teoria da lógica do razoável na interpretação jurídica - atribui relevância à criatividade e à intuição do magistrado nos julgados, os quais constituem o momento de individualização da norma aplicável ao fato submetido à jurisdição. Para o autor, na produção do julgado, destaca-se o papel do sentimento do juiz, cuja importância fica evidente até pelo sentido da etimologia da palavra sentença, que vem de sentire, isto é, experimentar uma emoção, uma intuição emocional.

Siches entende que:

A lógica tradicional não serve ao jurista para compreender e interpretar de modo justo os conteúdos das disposições jurídicas; não lhe serve para criar a norma individualizada da sentença judicial ou decisão administrativa [...] Realmente o juiz decide por intuição e não por uma inferência ou silogismo dos que se estudam na lógica; decide por uma certeza que se forma de modo direto e não em virtude de um raciocínio [...][33]

O autor observa ainda que, ao intuir, o julgador não atua de modo diverso dos advogados quando preparam suas alegações, com uma diferença: o advogado, por objetivar que seu cliente ganha a demanda, busca apenas as intuições direcionadas na concretização dessa finalidade, enquanto o juiz, embora interessado na solução justa do litigio, seguirá sua intuição onde quer que ela o leve.

Segundo Siches, a sentença, longe de ser um silogismo que se decompõe nos três juízos que integram as premissas e a conclusão, é um ato mental, uma estrutura, que constitui um exemplo da chamada Gestalpsychologie (psicologia das formas). Apenas quando a decisão foi tomada, pode a sua apresentação adotar a aparência de silogismo.[34] Mas convêm ressaltar que, conforme o autor, o Direito não se restringe ao mundo psicológico. Também não é ideia pura, nem valor puro, pois relaciona-se com a realidade. Mesmo porque - conclui - o magistrado, que não está acima da lei, deve acatar a ordem positivo-jurídica.[35]

Ademais, o realismo jurídico parece não se limitar ao Direito norte-americano e comporta abordagem na seara jurídica pátria atual:

O ministro Marco Aurélio, do STF, disse certa vez que, diante de um caso concreto, primeiro considera qual é a decisão mais justa para, em seguida, buscar um fundamento legal que possa justifica-la. É como se suas decisões fossem motivadas por razões substantivas que ficam escondidas atrás de sua argumentação retórica legalista.[36]

             “Sou um operador do Direito, percebendo-o como a reger a vida em sociedade, tomando as leis como confeccionadas para os homens, e não o inverso.” Foi como o ministro Marco Aurélio do Supremo Tribunal Federal, ao completar seu vigésimo ano na mais alta corte do país, perfilou seu próprio trabalho. “Idealizo para o caso concreto a solução mais justa e posteriormente vou ao arcabouço normativo, vou à dogmática buscar o apoio”[37], disse na solenidade em sua homenagem organizada pelos colegas ministros no ano de 2010.

A fala do ministro está em consonância com a tese defendida por Holmes e os demais autores do movimento. Ademais, Frank apresenta sua teoria centrada no juiz enquanto indivíduo, e a decisão judicial seria resultado direto de sua personalidade. Outra critica ao realismo jurídico se apresenta na maneira irônica como se referem à decisão judicial, considerando que ela é resultado do que o juiz tomou no café da manhã. (Frank, 1970, p. 104).

Para Frank, as sentenças judiciais são desenvolvidas retrospectivamente com base em conclusões previamente formuladas, não se podendo aceitar a tese do juiz aplicando leis e princípios aos fatos. Por esse entendimento, também não é aceitável estabelecer-se alguma regra ou princípio como premissa maior, empregando os fatos como premissa menor e, então, chegando à sua solução mediante processos de puro raciocínio. As decisões estão fundamentadas nos impulsos do juiz, o qual extrai esses impulsos fundamentadamente não das leis e dos princípios gerais do Direito, mas, sobretudo, de fatores individuais.

Martin Golding, filósofo do Direito, endossa:

O fato de que os fatores subjetivos desempenham um papel na decisão judicial e de que são elementos essenciais na explanação de tais decisões aparentemente mina a possibilidade de objetividade judicial. O “juiz completamente maduro” é meramente alguém que está ciente de seus preconceitos, mas essa ciência não faz dele mais objetivos do que um juiz inconsciente. Porque, num ou noutro caso, prevalece a “dominância da conclusão”, e a racionalização do juiz será direcionada a justificar uma conclusão que é escolhida, ao menos em parte, por causa de valores pessoais.[38]

Portanto, o cerne da crítica dos realistas sobre como o Direito é estudado, pauta-se no silogismo dos formalistas: premissa normativa dada pelo ordenamento jurídico, mais premissa fática dada pela realidade é igual à conclusão para o caso concreto. Para eles, não é dessa maneira que o Direito é aplicado. Os realistas denominam “teoria da racionalização” o fenômeno segundo o qual os juízes buscam fundamentação jurídica para justificarem a sentença dada.

Claudia Chaves ressalta ainda que, segundo os realistas, a teoria formalista usa excessivamente da lógica, e a generalidade das normas formais não pode estar logicamente determinada na decisão a adotar (Jorge, 2012, p. 22). Porém, diante da complexidade do meio social e sua permanente evolução, as normas gerais não podem prever as particularidades havidas em cada caso concreto.

O fato de os realistas apresentarem críticas às questões jurídicas não quer dizer que desconsiderem as normas do Direito positivo, ao contrário, a crítica está na maneira como as normas têm sido utilizadas. Os realistas reconhecem que, quando um fato pode ser compreendido juridicamente de várias maneiras, não há como se dizer qual a maneira mais correta. Quando um texto jurídico pode ser compreendido de duas maneiras, por exemplo, então, não há um único sentido.

Não obstante, Lídia Prado lembra que:

A respeito desse tema, o autor (Siches) transcreve a confissão feita pelo juiz Hutcheson sobre o modo efetivo como a mente funciona no processo judicial. Diz Hutcheson que, depois de haver ponderado minuciosamente sobre todos os dados à sua disposição e haver meditado cuidadosamente sobre eles, deixa que sua imaginação intervenha. Dorme sobre o processo; espera que se lhe apresente uma espécie de premonição, uma suspeita, uma iluminação intuitiva que aclare a conexão entre o problema e a decisão que indique qual a decisão justa [...] Assim, o magistrado decide por intuição e não por silogismo que se estuda na lógica. Decide pela convicção que ocorre de modo direto e não em virtude de um raciocínio. O raciocínio é articulado pelo juiz, que só depois passa a redigir sua sentença. O impulso que motiva sua decisão é um sentido intuitivo do justo e do injusto a respeito do caso particular que tem diante de si. “O juiz astuto depois de haver decidido dessa maneira, põe todas as suas faculdades mentais a postos para justificar aquela intuição diante da própria razão e para afrontar as criticas que possam ser dirigidas à sua sentença”.[39]

Em razão da tradição formalista, os julgadores omitem o verdadeiro modo como raciocinam ao decidir, ou seja, como meros seres humanos, ainda que conhecedores do Direito. Ora, os homens pensam, comumente, sem o uso do silogismo, partindo das conclusões para as premissas. Além disso, os fatos nunca são observados diretamente pelo juiz, que tem deles um conhecimento indireto, por meio do depoimento das testemunhas, da análise dos documentos, das opiniões dos peritos, etc. O juiz, ao analisar um depoimento, deixa-se influir, inconscientemente, por fatores emocionais de simpatia, de antipatia, que se projetam sobre as testemunhas, os advogados e as partes (PRADO, 2013, p. 42).

Por seu turno, José Renato Nalini aponta reflexos perceptíveis às decisões judiciais:

O juiz deve proferir a sentença com sentimento e não se reduzir a um mero burocrata repetidor de decisões alheias, com a finalidade de aderir á maioria. Embora não haja no Brasil estudos científicos sobre o perfil psicológico do magistrado, a origem social, as contingencias familiares, a situação econômica, raça, crença religiosa, refletirão na decisão a ser proferida, ao lado das influencias psicológicas (traços de personalidade e preconceitos).[40]

Assim, malgrado a crítica de alguns, o realismo jurídico reconhece o valor das normais jurídicas gerais, que cumprem sua função relevante. O que se nega, porém, é que o direito efetivo produzido pelos tribunais consista exclusivamente em conclusões tiradas das leis, devendo ser também considerada a influência da personalidade do juiz na produção da sentença.

Conforme se extrai da passagem relativa ao eminente ministro Marco Aurélio do Supremo Tribunal Federal, a ideologia do realismo jurídico norte-americano mostra-se plenamente atual, conforme pondera o também ministro Ricardo Lorenzetti da Suprema Corte Argentina.

  1. Os paradigmas da decisão judicial e a pré-compreensão do magistrado na visão de Ricardo Lorenzetti

Para explicar sua teoria da decisão judicial, Ricardo Lorenzetti, presidente da Suprema Corte de Justiça da Argentina, parte da ideia de paradigmas da decisão judicial, ou seja, um conjunto de perspectivas comuns que podem ser aferidas na forma de agir de um magistrado. Em outras palavras, a sua inclinação pessoal para decidir desta ou daquela forma, baseando-se na preferência subjetiva do julgador em proteger determinados bens ou valores sociais, em desprestígio de outros. Por isso, define paradigma, para sua investigação:

O vocábulo “paradigma” tem muitos sentidos diferentes. No nosso caso, fazemos referência aos modelos decisórios que têm status anterior à regra e condicionam as decisões. Quem se baseia apenas em paradigmas dá prevalência ao contexto em detrimento da norma, mediante um procedimento que consiste em subsumir um termo legal em um contexto que lhe empresta sentido, e que não é o ordenamento, mas o modelo de decisão adotado de antemão pelo intérprete.[41]

Elenca o autor a existência de seis paradigmas que norteiam os juízes: o protetor (proteger os débeis), o do acesso aos bens jurídicos primários (defender os excluídos), o coletivo (destaque nas relações grupais e aos bens coletivos), o consequencialista (avaliação das consequências da decisão), o do Estado de Direito (preferência dos procedimentos aos fins) e o ambiental (reconhece a natureza como sujeito de direitos), asseverando que são meramente exemplificativos, podendo existir vários outros.

Por serem encontrados no âmago do julgador, estes paradigmas condicionam a decisão mesmo antes da incidência de regras jurídicas. Isto porque tais paradigmas formam uma pré-compreensão de quem toma a decisão que leva a uma diferente interpretação das normas.

 Nesse espeque, “a atividade interpretativa se sustenta tão somente na subjetividade do intérprete, e as referências ao texto são meramente instrumentais, para fundamentar uma decisão que já foi tomada antes mesmo da leitura” (LORENZETTI, 2009, p. 68).

Tal conclusão coaduna-se com os estudos de Neil MacCormick[42], para quem a fundamentação da decisão não ocorre a partir de nada, mas sim de outras decisões e estudos anteriores. Em uma discussão jurídica, ninguém começa a partir de uma folha em branco e tenta alcançar uma conclusão razoável a priori. A solução oferecida precisa fundar-se ela mesma em alguma proposição que possa ser apresentada ao menos com alguma credibilidade como uma proposição jurídica, e essa proposição deve mostrar coerência de alguma forma em relação a outras proposições que possamos tirar das leis estabelecidas pelo Estado.

Como já mencionado, a melhor forma de adaptar o texto jurídico é conhecer o auditório a quem se destinará a argumentação jurídica, qual seja o órgão judicante.

  1. Consulta jurisprudencial: ferramenta da argumentação à luz do realismo jurídico

A argumentação, para ser efetiva, deve conceber o auditório presumido da forma mais real possível. Somente assim aquele que fala poderá saber com maior certeza quais argumentos utilizar. Além disso, para alguns autores o juiz primeiro chega a um resultado para então buscar as razões legais, sendo a decisão judicial, portanto, um mecanismo de racionalização da decisão pessoal.

Antonio Henriques dialoga bem com essa ideia ao examinar o uso de precedentes na argumentação jurídica:

Os chamados precedentes jurídicos, que formam jurisprudência, estendem a todos o que se concedeu a um em particular, quando em situação análoga. Tal argumento assemelha-se à indução e baseia-se no princípio de identidade (tratar da mesma maneira os seres da mesma categoria) e na reciprocidade (identificação das partes), o que o assemelha à equidade.[43]

Se o importante na argumentação não é saber o que o próprio orador considera verdadeiro ou probatório, mas qual é o parecer daqueles a quem ela se dirige, mostra-se efetivo deduzir a tese defendida com amparo nas decisões dos Tribunais que refletem o modo como o destinatário pensa o Direito.

Com efeito, ao se identificar como os tribunais têm decidido e qual é a regra derivada da sentença, passa-se a construir uma linha argumentativa com muito mais chance de ser acolhida, vez que as sentenças judiciais são desenvolvidas predominante e retrospectivamente com base em conclusões previamente formuladas.

Robert Alexy é um dos expoentes dos estudos da argumentação jurídica. Segundo Alexy (2001, p. 258), “uma teoria de argumentação jurídica que deixe de levar em conta a regra dos precedentes perderia um dos mais característicos aspectos da argumentação jurídica”.

O autor endossa essa posição ao lembrar que “a razão básica para seguir os precedentes é o princípio da universalizabilidade, a exigência de que tratemos casos iguais de modo semelhante” (ALEXY, 2001, p. 259)            . Os precedentes são, pois, um dos argumentos mais persuasivos à disposição do operador do Direito, razão pela qual preteri-los poderá prejudicar o planejamento textual argumentativo.

No mesmo sentido, Ricardo Rocha Viola:

Com efeito, não seria nada proveitoso para a sociedade que os inúmeros juízes investidos na função jurisdicional pudessem prolatar decisões divergentes para casos similares. Sem dúvida alguma, nesta situação estariam sendo frustradas as expectativas legitimas da sociedade, que não saberia como comportar-se em face da multiplicidade dos entendimentos decisórios, por vezes contraditórios entre si. É em função desse cenário que surge a necessidade de que uma decisão, na medida do possível, alinhe-se aos seus precedentes acerca da mesma matéria.[44]

Se a segurança jurídica é princípio abarcado pelo ordenamento jurídico, o estudo das decisões judiciais por meio de consultas jurisprudenciais mostra-se, inequivocamente, como uma estratégica argumentativa relevante aos advogados, com a possibilidade de se saber previamente o que o Poder Judiciário fará para resolver um caso semelhante, assim como identificar qual interpretação é dada às regras e o grau de precisão com que trabalham com o fato ocorrido.

Viola (2016, p. 90) faz ainda uma importante ressalva. Se a utilização dos precedentes promove o princípio da universalizabilidade, não podem os precedentes redundar em fossilização do discurso jurídico. Equivale dizer então, que sempre que um caso demonstrar a necessidade de afastamento de um precedente, este afastamento deve ser levado a efeito, e neste caso, o afastamento atrai o ônus do argumento, isto é, sempre que for necessário o afastamento dos precedentes, aquele que pretende o afastamento tem para si o encargo de trazer um elenco de argumentos que justifique esta novidade.

  1. TEORIA PSICOLÓGICA DA DECISÃO JUDICIAL

Existem diversas teorias sobre decisão judicial que buscam descrever como os juízes julgam os casos postos a exame. Tanto a academia internacional como a nacional produziram ao longo dos anos vasta obra descrevendo o percurso ideal para se chegar a uma decisão justa e coerente, amoldando o principio da livre persuasão racional à vinculação das normas jurídicas. No entanto, parte substancial destas teorias da decisão judicial é descritiva, isto é, descrevem como deveria ser uma decisão judicial e não como elas ocorrem de fato. Partindo-se desta premissa, a teoria a ser estudada neste trabalho confere enfoque na Teoria Psicológica por se tratar de estudo prescritivo, com maior proximidade, portanto, à realidade prática da atividade judicante.

Como já exposto, realistas como Jerome Frank reconheciam que não somente as regras e os princípios de direito produzem uma decisão judicial. Vieses e preconceitos políticos, econômicos e morais, também podem influenciar diretamente as decisões. Nesse sentido, a credibilidade que um juiz atribui a uma testemunha pode depender de idiossincrasias únicas, como um antagonismo racial, afeto ou animosidade por um determinado grupo ou indivíduo, ou mesmo uma experiência ou memória singular. Meros gestos por parte de um advogado ou testemunha podem alimentar esses vieses inconscientes que estão constantemente em funcionamento e, dessa forma, influenciar a decisão do juiz.

No entanto, da época em que Frank elaborou suas ideias, para os dias de hoje, muita coisa mudou em termos de investigação científica de escolhas e decisões humanas. As pesquisas na área da psicologia evoluíram de forma consistente e progressiva. Os psicólogos, hoje, sabem, por exemplo, que os seres humanos dependem de atalhos mentais para tomar decisões complexas. Estes atalhos são frequentemente chamados de “heurísticas”[45].

Ademais, juízes tomam decisões em condições incertas e pressionados pelo tempo, o que incentiva a dependência destes atalhos cognitivos que podem causar ilusões de julgamento. Ao tratar sobre a Teoria Psicológica da Decisão Judicial ou, simplesmente, Julgamento e Tomada de Decisão (Judgement and Decision  Making), Ricardo de Lins e Horta assevera:

Aqui, a “decisão” é compreendida como a escolha de um curso de ação, influenciado por heurísticas, vieses e processos cognitivos implícitos ou inconscientes. Essa linha se dedica a demonstrar que a racionalidade é “limitada”, no sentido de que os tomadores de decisão têm menos controle de si próprios do que julgam, e que usam informações incompletas em contextos de tempo e recursos mentais escassos.[46]

Para os estudiosos do tema, o Direito resulta de escolhas criativas do magistrado e seu discurso é uma justificação a posteriori para o resultado de processos extrajurídicos de decisão – como, de resto, são todos os discursos que visam a construir as narrativas que as pessoas utilizam para situar a si próprias no contexto social e para buscar conforto cognitivo ao confirmar suas crenças pré-existentes.

As correntes psicológicas das duas ou três últimas décadas descrevem o processamento de informação pelo cérebro humano como sujeito a heurísticas e vieses, isto é, a desvios sistemáticos em relação aos padrões normativos do pensar “correto”; que estes desvios não são corrigidos no nível decisório coletivo, mas em vez disso também se reproduzem nele; que a motivação do tomador de decisão pode influir na sua cognição; e que a maior parte dos processos decisórios em contextos sociais é implícita ou inconsciente, e não deliberada e consciente como se supõe.

Heurísticas são atalhos cognitivos empregados para solucionar problemas no contexto cotidiano, de informação incompleta, tempo e recursos mentais escassos; vieses, por sua vez, são desvios sistemáticos em relação a padrões normativos derivados da lógica clássica, das regras da estatística ou da probabilidade. A literatura aponta que todo tomador de decisão, leigo ou especialista, vale-se de heurísticas e está sujeito a vieses (KAHNEMAN, 2011; GIGERENZER, 2009; HARDMAN, 2009; BARON, 2008).

Pessoas que sustentam crenças fortes não costumam estar abertas ao contraditório – elas tendem a perseverar na sua crença mesmo diante de evidências em contrário. Em estudos sobre performance em contextos argumentativos, um achado comum é que os sujeitos costumam articular opiniões ou explicações em favor de suas crenças iniciais, mas são incapazes de apontar evidências genuínas que as fundamentem (HARDMAN, 2009, p. 42-45).

A percepção das informações e as crenças dos interlocutores influem fortemente no processamento dos argumentos. Um dos achados mais consistentes e replicados é que pessoas com opiniões fortes geralmente têm dificuldade de lidar com informações que não sejam coerentes com suas crenças. Os indivíduos tendem a refletir pouco sobre evidências favoráveis ao que acreditam, mas, diante de evidências que não se encaixam nas suas crenças, tendem a submetê-las a forte escrutínio, com o propósito de refutar sua veracidade ou confiabilidade, e assim manter sua opinião original. Trata-se do fenômeno de “perseverança da crença” (HARDMAN, 2009, p. 44; MOLDEN; HIGGINS, 2012, p. 393-394).

Investigando empiricamente decisões sobre a concessão de fianças na área criminal, outra equipe de pesquisadores concluiu que, devido ao excesso de informações disponível e à pressão de tempo, juízes tendiam a considerar não o conjunto probatório, mas apenas alguns aspectos específicos do caso como critério para manutenção da prisão (DHAMI, 2003).

Por fim, salutar a ponderação de Horta (2016, p. 183-184) quanto ao enfoque dado exclusivamente a juízes. Lembra o autor que a figura do juiz é uma imagem excessivamente idealizada e pouco coerente com a realidade atual dos tribunais. Para ele, um dos poucos autores na vasta literatura de decisão judicial que dedica reflexões sinceras sobre esse fenômeno da expansão da estrutura burocrática do Judiciário é Richard Posner. Sendo um juiz, Posner (2013, p. 36-54) descreve de forma aberta a realidade dos tribunais federais norte-americanos atualmente: há muito trabalho para assessores, estagiários são parte importante da equipe de trabalho, e não raro são esses, e não os juízes, os que redigem as sentenças e votos, não obstante serem mais jovens e inexperientes do que os magistrados. Para Posner (2013, p. 238-240), uma das decisões mais relevantes que o juiz deve tomar é se vai ser autor das próprias sentenças, ou se, em vez disso, atuará como um editor delas, além de “gestor” responsável pela organização de um gabinete hierarquizado.

Aqui no Brasil, em que gabinetes do Judiciário são formados por grandes equipes de assessores, escreventes, analistas e estagiários, o quadro não é diferente. Uma teoria da decisão judicial que passe ao largo dessa realidade teria muito pouco a contribuir para a compreensão desse fenômeno, de tal modo que as pesquisas destinadas a examinar o psicologismo judicial precisam evoluir e abarcar também estes fatores coadjuvantes abordados.

Dessume-se disso ser errôneo pensar que juízes, seres humanos falíveis que são, teriam um processo racional perfeito e não sujeito a fatores externos que possam afetar seu julgamento. Este ainda é um pensamento dogmático predominante na sociedade de um modo geral, absorvido (consciente ou inconscientemente) por muitos advogados, promotores e demais sujeitos da relação processual. Por isso, afastar essa imagem idealizada e buscar compreender o modo de funcionamento do processo dual cognitivo dos juízes é o próximo ponto a ser examinado.

  1. O processo dual cognitivo

O Direito e a psicologia se entrecruzam em vários pontos, como ocorre, por exemplo, com a psicologia e a psicopatologia forense. O ponto fulcral desta apresentação é entender como, genericamente, a tomada de decisão ocorre nas decisões judiciais.

Segundo Cestari (2016, p. 96), decisões e julgamentos são realizados por todos os seres humanos. Para o autor, o processo dual cognitivo é subdivido por (i) sistemas Intuitivo e Deliberativo; e (ii) alguns vieses cognitivos que impedem que o sistema deliberativo atue de modo isento para substituir julgamentos irrefletidos do sistema intuitivo.

Neste processo dual (dual process), existe consenso na literatura psicológica (CUSHMAN; YOUNG GREENE, 2010) de que os processos mentais humanos responsáveis pelos julgamentos, conclusões e soluções são divididos em dois sistemas psicológicos com funcionamento distintos. O primeiro deles é comumente denominado como sistema intuitivo, enquanto o segundo é denominado sistema deliberativo.

Esta teoria geralmente é reforçada por meio de testes empíricos com dilemas morais, pequenos problemas hipotéticos em que não existe uma única resposta pré-definida ou correta e que, geralmente, envolvem questões trágicas. Exemplo clássico - principalmente entre os filósofos - é o dilema do “Bonde” que se divide em dois enunciados explicitados a seguir. Este dilema ganhou notoriedade em tempos recentes por meio da obra de Michael J. Sandel, professor e filósofo da universidade de Harvard.

O primeiro enunciado traz que: “Você está num bonde desgovernado. Ele está indo em direção e irá matar cinco trabalhadores que estão nos trilhos. A única possibilidade para evitar que os cinco trabalhadores morram é desviar do trilho, mas fazendo isso o bonde irá atropelar e matar um único trabalhador. Você faria isso? A resposta padrão para esse dilema moral é sim. A maioria das pessoas desviaria o bonde para matar apenas uma pessoa, e não cinco pessoas.

Você percebe que pode desviar o bonde, matando esse único trabalhador e poupando os outros cinco. O que você deveria fazer? Muitas pessoas diriam: “Vire! Se é uma tragédia matar um inocente, é ainda pior matar cinco”. Sacrificar uma só vida a fim de salvar cinco certamente parece ser a coisa certa a fazer.[47]

O segundo enunciado basicamente traz a seguinte hipótese: “Você está em uma ponte e um bonde desgovernado está passando por baixo. O bonde irá matar cinco trabalhadores que estão nos trilhos. A única possibilidade de evitar que os cinco trabalhadores morram é empurrar um homem gordo que está ao seu lado na ponte para que ele seja atropelado e pare o bonde. Curiosamente, nesse caso, a resposta padrão das pessoas para esse dilema moral é não. A maioria das pessoas não mataria o homem gordo para salvar a morte dos cinco.

Empurrar o homem gordo pesado sobre os trilhos seria a coisa certa a fazer? Muitas pessoas diriam. “É claro que não. Seria terrivelmente  errado empurrar o homem sobre os trilhos”. Empurrar alguém de uma ponte uma morte certa realmente parecer ser algo terrível, mesmo que isso salvasse a vida de cinco inocentes. Entretanto, cria-se agora um quebra-cabeça moral: Por que o principio que parece certo no primeiro caso - sacrificar uma vida para salvar cinco - parece errado no segundo?

O que se percebe nestes casos é que geralmente os respondentes não conseguem produzir justificativa plausível para o padrão de seus julgamentos, conforme resultados comprovados por um estudo realizado com aproximadamente 5.000 respondentes via internet (HAUSER, et. al., 2007).

Outra espécie de dilema moral corrobora a teoria do processo dual conforme o seguinte enunciado criado por Haidt (2001): “Julie e Mark são irmãos. Eles estão viajando junto em uma excursão do colégio. Em uma noite, eles decidem que seria interessante e divertido experimentar fazer sexo. Pelo menos seria uma nova experiência para eles. Julie estava tomando pílulas anticoncepcionais e Mark utilizava preservativo. Eles gostaram da experiência, mas decidiram não mais repeti-la. Eles mantiveram aquela noite em segredo o que os tornou ainda mais próximos. Você acha certo o que Julie e Mark fizeram?”.

Neste experimento, a maioria das pessoas disse imediatamente ser errado o que os irmãos fizeram. Após feito esse julgamento, elas começaram então a buscar justificativas. O problema é que a maioria dos argumentos utilizados não era consistente. Por exemplo, o risco de terem um filho (embora Julie e Mark tivessem utilizado contraceptivos); o risco de julgamentos da sociedade (embora Julie e Mark tivessem decidido guardar segredo). Ao final, muitas vezes as pessoas simplesmente diziam: “Eu não sei, não consigo explicar. Eu só sei que é errado”. (HAIDT, 2001, p. 814).

Segundo este autor, o julgamento ocorreu sem ao menos aquele que o fez saiba suas razões em virtude da teoria do processo dual, em que o julgamento moral em si não se encontra no mesmo mecanismo ou mesmo momento da sua racionalização.

Assim, depreende-se no processo dual que o sistema intuitivo é rápido, espontâneo, inconsciente e opera sem esforço. Já o sistema deliberativo é lento, intencional, consciente e exige esforço e concentração (CESTARI, 2016).

Para Cestari, é possível transportar o modelo do processo dual para os tribunais. O autor defende que os juízes primeiro fazem julgamentos intuitivos (sistema 1) que podem ou não ser substituídos pela deliberação (sistema 2). A conclusão é evidente: juízes são humanos, portanto, não haveria razões para que eles possuíssem sistemas cognitivos diferenciados dos das outras pessoas.

Apesar disso, faz a seguinte ressalva.

Não há muitas duvidas, portanto, de que os juízes, assim como quaisquer outros seres humanos, possuem o mesmo processo duplo cognitivo (sistema 1 e sistema 2). Contudo, as conclusões não são surpreendentes: o que se comprovou no experimento dos autores é que os juízes ordinariamente possuem intuição e que juízes respondem questões ordinárias com a intuição. Isso não significa concluir, entretanto, que juízes julgam seus casos jurídicos com a intuição. Em outras palavras, a tomada de decisão ordinária dos juízes funciona, primeiro, de acordo com a sua intuição, para que só depois a deliberação entre em cena.[48]

O que é importante notar é que quando a intuição faz seu julgamento moral, outros mecanismos operam dificultando com que a decisão seja revertida. Esses mecanismos são denominados vieses cognitivos como será visto adiante

  1. Vieses cognitivos

Em um julgamento ou tomada de decisão, o primeiro sistema cognitivo entra em ação e é responsável por um julgamento automático e intuitivo. Apenas após entra em cena a fase deliberativa de racionalização. A questão é: é possível que o segundo sistema consiga deliberar imparcialmente de forma a anular e, sobretudo, substituir a decisão anterior intuitiva? No campo da psicologia, esta substituição é denominada de overriding, e provavelmente não ocorrerá de modo isento, à medida que seres humanos frequentemente são afetados por vieses cognitivos.

Cestari assim define:

Viés cognitivo (cognitive bias) é um erro sistemático que afeta as decisões e julgamentos de uma pessoa. Geralmente um viés cognitivo é resultado da tentativa de simplificação para o processamento de informações e podem se manifestar especialmente na tomada de decisão, em comportamentos sociais e em tentativas de resgatar uma memória.[49]

O principal viés cognitivo que impede a fácil substituição da decisão intuitiva (sistema 1) pela decisão deliberada (sistema 2) é o viés confirmatório. Em suma, o viés confirmatório é a inclinação que as pessoas têm ao “angariar e lidar com evidencia na deliberação ou argumentação para reforçar, de maneira inapropriada, hipóteses ou crenças cuja verdade está em questão” (BRANDO, 2013).

No mesmo norte, Nickerson (1998) traz evidencias de que as pessoas naturalmente não engendram estratégias de testes de hipótese ou de falseabilidade. Ou seja, é incomum que qualquer pessoa teste o próprio julgamento por meio de mecanismos. Isto porque a tendência natural das pessoas é buscar evidências que suportem a hipótese inicial a qual se é favorável, ao mesmo em que são procuradas evidências que desacreditem as hipóteses desfavoráveis (NICKERSON, 1998, p. 211).

A explicação se dá porque o ser humano geralmente se sente satisfeito e confortável ao alcançar uma explicação razoável e não sente a necessidade de buscar todas as possibilidades. Isto é, mesmo se a questão não for exaurida, se fizer sentido o argumento para o evento favorável, não haverá necessidade de outras provas.

Logo, de um modo geral, mesmo que posteriormente se inicie um processo de deliberação racional, uma pessoa dificilmente o fará de modo imparcial, mas agirá buscando confirmação racional para apenas o lado que parece ser intuitivamente correto.

A conclusão não poderia ser diferente. É difícil sustentar que a tomada de decisão judicial seja completamente independente dos sistemas de mecanismo cognitivos tais quais a Psicologia tem estudado.

Cestari faz ainda importante observação no ensino do Direito: não falar sobre modelos psicológicos de decisão é não aceitar a realidade que poderia fazer com que o sistema humano de tomada de decisão seja melhorado, em vez de simplesmente negá-lo.

Tribunais e universidades, a despeito de toda a evolução da psicologia e de outros ramos das ciências sociais, em grande parte utilizam o - já superado - modelo racional de decisão. Dentro do Direito dificilmente se discutem teorias da decisão mais complexas - ou mais realistas e descritivas, e pouco se fala sobre vieses e como lidar com erro (erro no sentido do que se é esperado) nas decisões. (CESTARI, 2016, p. 112).

A maioria dos estudos sobre decisão judicial é prescritiva e não descritiva, isto é, discorrem sobre como “deveria ser” uma decisão judicial correta, e não como de fato ela “é”. Nesse ponto, a critica de Cestari é pertinente ao afirmar que a pressuposição de que o juiz deve atingir uma racionalidade quase ilimitada é prejudicial no sentido de que, ao ignorar as limitações do julgamento, ignora-se as técnicas e práticas que possam ser utilizadas para minimizar vieses cognitivos e seus efeitos nas decisões judiciais.

Esta linha de raciocínio não apenas se coaduna com a ideia de análise do auditório criada por Perelman, como também se mostra congruente ao universo de fatores externos que influenciam a decisão judicial infirmando a concepção de que os juízes são neutros, consoante se infere da visão do ministro Luis Roberto Barroso.

  1. Valores e ideologia do juiz na visão de Luis Roberto Barroso

Luis Roberto Barroso (2013), ministro do Supremo Tribunal Federal, assinala que o realismo jurídico foi um dos mais importantes movimentos teóricos do direito no século XX, contribuindo decisivamente para a superação do formalismo jurídico e da crença de que a atividade judicial seria mecânica, acrítica e unívoca. Enfatizando que o direito tem ambiguidades e contradições, o realismo sustentava que a lei não é o único - e em muitos casos, sequer o mais importante - fator a influenciar uma decisão judicial. Em uma multiplicidade de hipóteses, é o juiz que faz a escolha de resultado, à luz de suas intuições, personalidade, preferências e preconceitos.

A decisão judicial está sujeita à incidência de valores pessoais e da ideologia do juiz:

Com efeito, a observação atenta, a prática politica e pesquisas empíricas confirma o que sempre foi possível intuir: os valores pessoais e a ideologia dos juízes influenciam, em certos casos de maneira decisiva, o resultado dos julgamentos. Por exemplo: na apreciação da constitucionalidade das pesquisas com células-tronco embrionárias, a posição contrária à lei que as autorizava foi liderada por Ministro ligado historicamente ao pensamento e à militância católica (Carlos Alberto Menezes Direito falecido em setembro de 2009), sendo certo que a Igreja se opõe às investigações científicas dessa natureza. Nos EUA, fez parte da estratégia conservadora, iniciada com a posse de Ronald Reegan, 1981, nomear para a Suprema Corte ministros que pudessem reverter decisões judiciais consideradas progressistas, em temas como ações afirmativas, aborto e direitos dos acusados em processos criminais. Inúmeras pesquisas, no Brasil e nos EUA, confirmam que as preferências politicas dos juízes constituem uma das variáveis mais relevantes para as decisões judiciais, notadamente nos casos difíceis. É de se registrar que o próprio processo psicológico que conduz uma decisão pode ser consciente ou inconsciente.[50]

O autor lembra que na literatura norte-americana, tem sido destacada a importância do gênero e da raça na determinação de certos padrões decisórios do juiz. No caso brasileiro, em tribunais superiores, em geral, e no STF, em particular, a origem profissional do ministro imprime características perceptíveis na sua atuação judicial: ministros que vêm da magistratura, do Ministério Público, da advocacia ou da academia tendem a refletir, no exercício da jurisdição, a influência de experiências pretéritas.

Exemplo disso é a composição histórica do STF: ministros que tenham sua origem funcional no Ministério Público - como foram os casos de Joaquim Barbosa e Ellen Grace - têm uma visão mais rígida em matéria penal do que os que vêm da advocacia privada ou da academia, como Carlos Ayres Brito e Eros Grau (BARROSO, 2013, p. 434).

Embora este trabalho defenda a validade do estudo do realismo jurídico para a prática forense, especialmente no que pertine à argumentação jurídica, não se está a dizer que os juízes estão liberados para fazer o que quiserem, haja vista que a Constituição, as leis, a jurisprudência, os elementos e métodos de interpretação sempre desempenharão uma função limitadora à arbitrariedade judicante.

Para fechamento, salutar trazer à baila o magistério de Barroso:

O discurso normativo e a dogmática jurídica são autônomos em relação às preferências pessoais do julgador. Por exemplo: o desejo de punir uma determinada conduta não é capaz de superar a ocorrência da prescrição. O ímpeto de conhecer e julgar uma causa não muda a regra sobre legitimação ativa ou sobre prejudicialidade. De modo que o sentimento pessoal de cumprir o próprio dever e a força vinculante do direito são elementos decisivos na atuação judicial. Mas há que se reconhecer que não são os únicos (Barroso, 2013, p. 432).

  1. CONCLUSÃO

Este trabalho demonstra a importância da utilização de técnicas de argumentação jurídica na construção textual em favor do operador do Direito. Observa-se que se de um lado a adoção de uma estratégia argumentativa objetiva e concisa aumenta a adesão do destinatário à tese proposta pelo argumentador, prestigiando-se a Advocacia, de outro a opção por facilidades decorrentes da era digital, em especial a larga utilização do recurso “copiar e colar”, acaba gerando uma preocupante distorção: a adoção de longas petições que geram apenas dificuldade na análise do direito controvertido, prejudicando a celeridade processual e impactando ainda mais um Poder Judiciário já abarrotado de ações.

Contata-se que saber argumentar é uma necessidade atual. Se na esfera social sua falta é tida como um dos fatores capazes de gerar desigualdade cultural, na seara jurídica não saber tomar a palavra torna-se motivo determinante para o insucesso do operador do Direito. A pesquisa explora equívocos comumente utilizados na prática jurídica como o mau do prolixismo e o excesso de “juridiquês”, e confirma que o Direito, como atividade social, não tem condições de ser articulado sozinho. Em outras palavras, a mera citação de dispositivos legais, lições doutrinárias e precedentes, ou o uso de modelos prontos de petições são insuficientes à persuasão do auditório sem que haja técnicas de argumentação jurídica que lhes deem fundamentação.

Como recomendação, deve estudar-se a jurisprudência com o objetivo de se saber, sempre que possível, como os tribunais têm apreciado casos semelhantes. Em primeiro lugar, deve-se identificar o que os tribunais têm decidido e qual é a regra derivada da sentença. Segundo, deve-se analisar como os tribunais têm interpretado as regras e o grau de precisão com que trabalham com o fato ocorrido, pois o importante na argumentação não é saber o que o próprio orador considera verdadeiro ou probatório, mas qual é o parecer daqueles a quem ela se dirige.

Assim, sem a pretensão de esgotar o tema, este trabalho visa compreender a redação do texto jurídico de um modo mais consistente e em conformidade com o novo perfil esperado dos profissionais do Direito, que pressupõe, além da capacitação técnica, a habilidade de tornar comunicável a sua ação profissional valendo-se de técnicas de argumentação que almejam o convencimento do destinatário final.

O conteúdo abordado na revisão bibliográfica demonstra que a retórica vazia, o vocabulário erudito e tortuoso à inteligibilidade bem como o emprego de jargões e clichês envelhecidos não têm qualquer função a não ser, é claro, a de dar volume sem objetividade ao texto jurídico. Quanto aos objetivos e pergunta de pesquisa proposta ao início deste estudo, dessume-se que a realização deste trabalho possibilitou identificar que a indeterminação do Direito exige que o profissional capacitado se valha de planejamento textual, não se limitando a simplesmente deduzir a pretensão de seu cliente em mero silogismo jurídico, sob pena de sua tese não ser acolhida.

Foram apresentadas as principais ideias do realismo jurídico, importante movimento que contribui para o estudo da decisão judicial e de como os juízes decidem os casos concretos na prática. A pesquisa expõe que embora o Brasil não adote o sistema da commow law onde o realismo jurídico é mais bem identificado, existem evidências de que em nosso sistema jurídico haja reflexos dessa corrente.

Diante disso, ao se analisar os pilares da Teoria Psicológica da Decisão Judicial, conclui-se que juízes não são seres infalíveis ou dotados de percurso racional diverso das demais pessoas, o que corrobora o fato de que quanto mais elaborado o planejamento textual voltado à eficácia argumentativa, inclusive compreendendo como funciona o processo cognitivo dual e seus vieses cognitivos, maiores serão as chances de adesão da tese defendida.

Por fim, a maioria dos estudos sobre teorias da decisão judicial é descritiva e não prescritiva, isto é, a maioria dos autores descreve como “deve ser” uma decisão judicial e não como ela realmente o “é”. Esta talvez tenha sido a maior dificuldade enfrentada neste trabalho para alinhar uma argumentação jurídica “realista” ao seu auditório, dificuldade esta que poderá ser revista em trabalhos futuros com a evolução de estudos prescritivos.

8.BIBLIOGRAFIA

AARNIO, Aulis. Lo racional como razonable. Un tratado sobre la justificatión jurídica. Madrid : Centro de Estudios Constitucionales, 1991.

ABBAGNANO, Nicola. Dicionário de Filosofia. 5. ed. São Paulo: Martins Fontes, 2007.

ALEXY, Robert. Teoria da argumentação jurídica. 2ª ed. São Paulo : Mandamentos, 2001.

ATIENZA, Manuel. As razões do Direito: teorias da argumentação jurídica. 3ª ed. São Paulo : Landy, 2003.

______________. El sentido del Derecho. 6ª. ed. Barcelona : Ariel, 2010.

BASTOS, Celso Ribeiro apud TAVARES, André Ramos. Curso de direito constitucional. São Paulo: Saraiva, 2002.

BARROSO, Luis Roberto. Curso de Direito Constitucional Contemporâneo. 4ª. ed. - São Paulo : Saraiva, 2013.

BRETON, Philippe. ARGUMENTAÇÃO NA COMUNICAÇÃO.  2ª ed. Bauru : EDUSC, 2003.

CESTARI, Roberto Tagliari. Decisão Judicial e Realismo Jurídico: Evolução das pesquisas sobre o comportamento judicial.  - Ribeirão Preto, 2016.

CORRÊA, Leda. Direito e argumentação. Barueri :  Manole, 2008.

DAMIÃO, Regina Toledo. Curso de Português Jurídico. - 10. ed. - São Paulo : Atlas, 2009.

FRANK, Jerome. Derecho e incertidumbre. Tradução de Carlos M. Bidegain, México D. D. : Coyocación, Fontamara, 1991.

FREITAS, Lorena de Melo. O realismo jurídico como pragmatismo: a retórica da tese realista de que direito é o que os juízes dizem que é direito. 2009. 168 f. Tese (Doutorado em Ciências Jurídicas) – Faculdade de Direito do Recife, Universidade Federal de Pernambuco, Recife, 2009.

GOLDING, Martin. Filosofia e teoria do Direito. Tradução Prof. Dr. Ari Machado Solon. São Paulo :  Sergio Antonio Fabris, 2010.

HART, H. L. A. O conceito de Direito. São Paulo : WMF Marins Fontes, 2009.

HENRIQUES, Antonio. Argumentação e discurso jurídico. 2. ed. São Paulo : Atlas, 2013.

HORTA, Ricardo de Lins e. Argumentação, estratégia e cognição: subsídios para a formulação de uma teoria da decisão judicial. Revista Direito e Liberdade, Natal, v. 18, n. 2, p. 151-193, maio/ago. 2016. Quadrimestral

JORGE, Cláudia Chaves Martins. REALISMO JURÍDICO E HART: um debate sobre a indeterminação do Direito. Rio de Janeiro: LumenJuris, 2012.

JURÍDICO, Revista Consultor. IDEALIZO DECISÃO JUSTA DEPOIS VOU ÀS NORMAS: Marco Aurélio vê sua homenagem como "estímulo".  2010. Disponível em: <http://www.conjur.com.br/2010-jul-06/idealizo-solucao-justa-depois-vou-ar-normas-marco-aurelio>. Acesso em: 27 jul. 2017.

______________. JUIZ AMERICANO ESCREVE RECEITA PARA ADVOGADO SER MAIS CONCISO.  2016. Disponível em: <http://www.conjur.com.br/2016-dez-23/juiz-americano-escreve-receita-advogado-conciso>. Acesso em: 27 jul. 2017.

KAHNEMAN, Daniel. Rápido e devagar duas formas de pensar; tradução Cássio de Arantes Leite  Rio de Janeiro. Objetiva, 2012.

KELSEN, Hans. Teoria geral do Direito e do Estado ; tradução Luís Carlos Borges. - 3ª ed. - São Paulo : Martins Fontes, 1998.

LLEWELLYN, Karl.  Una teoria del derecho realista: el seguiente passo. In CASANOVAS, Pompeu;  MORESO, José Juan (eds.). El âmbito de lo jurídico. Madrid :  Crítica, 1994.

______________. citado por SICHES, Luis Recaséns. Nueva filosofia de la interpretación del derecho. México: Porrùa, 1973.

LORENZETTI, Ricardo Luis, Teoria da decisão judicial: fundamentos de Direito. Tradução Bruno Miragem. São Paulo: RT, 2009.

MACCORMICK, Neil. Retórica e Estado de Direito: Uma teoria da argumentação jurídica. Rio de Janeiro: Elsevier, 2008.

MARTINS JORGE, Claudia Chaves. Realismo Jurídico e Hart: um debate sobre a indeterminação do Direito. 1ª ed. Rio de Janeiro :  Ed. Lumen Juris, 2012.

MIGALHAS.  JUIZ MANDA MP REDUZIR INICIAL COM TAMANHO DE "LIVRO".  2012. Disponível em: http://www.migalhas.com.br/Quentes/17,MI159982,21048-Juiz+manda+MP+reduzir+inicial+com+tamanho+de+livro>.  Acesso em: 27 jul. 2017.

MORAIS DA ROSA, Alexandre; BONISSONI, Natammy Luana de Aguiar. Argumentação jurídica e o direito contemporâneo. Itajaí : UNIVALI, 2016.

NALINI, José Renato. A formação da vontade judicial: fatores legais, sociais e psicológicos. In :  Revista do Supremo Tribunal Federal, Lex, 1997.

NAVARRO, Luize Stoeterau. A noção de auditórios na teoria da argumentação de Chaïm Perelman. Publica Direito, São Paulo, v. 1, n. 1, p.1-17, 01 ago. 2017.

PERELMAN, C.; OLBRECHTS-TYTECA. TRATADO DA ARGUMENTAÇÃO. São Paulo: Martins Fontes, 1996.

______________.  LÓGICA JURÍDICA.  São Paulo : Martins Fontes, 2000.

PRADO, Lídia dos Reis de Almeida. O juiz e a emoção: aspectos da lógica da decisão judicial - 6ª ed. - São Paulo : LTR,  2013.

REALE, Miguel. Teoria Tridimensional Do Direito, 5 ed. São Paulo: Saraiva : 1994.

______________. Teoria Tridimensional do Direito. São Paulo - 2ª ed. São Paulo - Saraiva, 1979.

REALE, Giovanni. Aristóteles. 10ª. ed. São Paulo : Loyola, 1994.

RODRÍGUEZ, Victor Gabriel, Argumentação Jurídica: técnicas de persuasão e lógica informal - 4ª ed. - São Paulo : Martins Fontes, 2005 - (Justiça e Direito).

ROSA, Alexandre Morais da; BONISSONI, Natammy Luana  de Aguiar. Argumentação jurídica e o direito contemporâneo : Itajaí: UNIVALI, 2016.

SANDEL, Michael J. Justiça - O que é fazer a coisa certa? - 6ª. ed - Rio de Janeiro : Civilização Brasileira, 2012.

SCHECAIRA, Fábio P.; STRUCHINER, Noel. Teoria da Argumentação Jurídica. Rio de Janeiro: Puc Rio, 2016.

SICHES, Recaséns. Panorama del pensamiento jurídico em el siglo XX. Mexico : Porrùa, 1963.

SOARES, Edvaldo. TEORIA DA ARGUMENTAÇÃO: LÓGICA, ÉTICA E TÉCNICA. In: Âmbito Jurídico, Rio Grande, XI, n. 53, maio 2008. Disponível em: < http://www.ambitojuridico.com.br/site/index.php?n_link=revista_artigos_leitura&artigo_id=2861>. Acesso em set 2016.

STAACK, André Luiz; HEIL, Danielle Mariel. O realismo jurídico norte-americano e sua influência argumentativa nas decisões proferidas pelo Supremo Tribunal Federal. Raízes Jurídicas. v. 9, n. 1, 2017.

VALVERDE, Alda da Graça Marques; FETZNER, Néli Luiza Cavalieri; TAVARES JUNIOR, Nelson Carlos. LIÇÕES DE ARGUMENTAÇÃO JURÍDICA: Da Teoria à Prática. 4ª. ed. São Paulo : Forense, 2015.

VIOLA, Ricardo Rocha. Teoria da Decisão Judicial  - Belo Horizonte :  D’ PLÁCIDO, 2016.

VOESE, Ingo. Argumentação jurídica. 2ª. ed. Curitiba : Juruá, 2006.

Sobre o autor
THIAGO RODRIGUES DE OLIVEIRA DA SILVA PIANTA

Advogado, consultor e parecerista. Graduado pela FMU (2018). Pós-graduando em Direito Imobiliário pela Escola Paulista de Direito (2019). Pós-graduando em Direito Civil pela Escola Paulista de Direito (2019). Pós-graduando em Revisão de Textos pela PUC MINAS.

Informações sobre o texto

Este texto foi publicado diretamente pelos autores. Sua divulgação não depende de prévia aprovação pelo conselho editorial do site. Quando selecionados, os textos são divulgados na Revista Jus Navigandi

Leia seus artigos favoritos sem distrações, em qualquer lugar e como quiser

Assine o JusPlus e tenha recursos exclusivos

  • Baixe arquivos PDF: imprima ou leia depois
  • Navegue sem anúncios: concentre-se mais
  • Esteja na frente: descubra novas ferramentas
Economize 17%
Logo JusPlus
JusPlus
de R$
29,50
por

R$ 2,95

No primeiro mês

Cobrança mensal, cancele quando quiser
Assinar
Já é assinante? Faça login
Publique seus artigos Compartilhe conhecimento e ganhe reconhecimento. É fácil e rápido!
Colabore
Publique seus artigos
Fique sempre informado! Seja o primeiro a receber nossas novidades exclusivas e recentes diretamente em sua caixa de entrada.
Publique seus artigos