Leis de efeito concreto: natureza e controle de constitucionalidade

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As leis de efeitos concretos não deixam de ser leis em sentido formal. Possuem as características da imperatividade e do autorizamento. São leis, logo, passíveis de controle de constitucionalidade.

As leis de efeitos concretos não deixam de ser leis em sentido formal. Possuem as características da imperatividade e do autorizamento. São leis, logo, passíveis de controle de constitucionalidade.

O princípio da legalidade é a base de fundamentação político-jurídica do Estado de Direito. Sua ascensão derivou da necessidade de contenção do arbítrio das autoridades estatais.

Na época do surgimento do denominado Estado de Direito, a ausência de responsabilidade por atos emanados pela Administração surtiu o efeito de engessamento interpretativo, ou seja, a necessidade de aplicabilidade literal da lei. Não havia espaço para juízos valorativos por parte dos responsáveis por aplica-la. Era uma necessidade da época. A lei devia ser aplicada à risca sob pena de mais uma forma de arbítrio: a intepretação da lei conforme a conveniência.

Na contemporaneidade brasileira vemos o soerguimento forçado e desmedido do Poder Judiciário, principalmente do seu órgão de cúpula, o Supremo Tribunal Federal.

O Supremo, a pretexto de aplicar a Constituição, têm atravessado os demais Poderes e se desviado de suas atribuições. Munido de um espírito ditador, incorpora, sem qualquer pudor e respeito à Constituição, as demais atribuições dos Poderes de Estado: tem legislado no lugar do Poder Legislativo – criando direito novo, inovando no ordenamento jurídico – bem como atravessado a execução de Políticas Públicas, Sociais e Econômicas, que são de competência exclusiva do Poder Executivo.

Pode-se afirmar que existe uma efetiva e progressiva tentativa de supremacia do Judiciário em face aos demais Poderes de Estado, tanto que os Ministros justificam seus descalabros sob o fundamento de aplicabilidade constitucional, mas que não passa de uma hermenêutica de conveniência.

Alguns Ministros agem à margem da lei, à ponto de publicamente se intitularem “Supremos”, como se estivessem acima de tudo e de todos. Não pode imperar a irresponsabilidade. Todos estão sob o império da lei e da Constituição.

Não podemos olvidar que o Poder Judiciário (no caso estamos nos referindo aos Tribunais Superiores, principalmente ao STF) é, do Poderes, o de menor representatividade democrática. Nenhum dos seus Ministros sequer recebeu um único voto de legitimação para ali estarem. As escolhas são meramente por ideologia político-partidária. Esqueceram-se dos pressupostos de investidura: a reputação ilibada e o notável saber jurídico. A todos um ou outro entrave, quando não, óbices éticos e morais.

A configuração da soberania do judiciário se perfaz pela inaplicabilidade da temporariedade dos mandatos, no caso de suas competências, ou seja, da ausência de alternância no poder de julgar com base na Constituição, que é a principal característica da República.

São vitalícios como os reis e, aparentemente tem havido até hereditariedade, quando conseguem emplacar seus filhos, recém-formados em Direito, como desembargadores dos Tribunais de Segundo Grau, também sem o cumprimento dos pressupostos básicos: notório conhecimento, culturalismo e experiência. Entram pela porta dos fundos, sem méritos ou conhecimentos mínimos exigidos aos desembargadores que, em princípio, devem ser juízes, advogados ou membros do Ministério Público com grande culturalismo e cognoscibilidade.

Retomando ao que interessa, hoje, a cognoscibilidade e o culturalismo dos aplicadores da lei são levadas em conta. Os textos legais se tornaram propensos à abertura de maior juízo valorativo. Os conceitos indeterminados e as interpretações extensivas viabilizam maior juízo valorativo por parte dos hermeneutas.

A lei é um instrumento de controle social e político. Cidadãos e autoridades devem reverência aos atos emanados e resultantes do contrato social elaborados por seus legisladores (sentido amplo). Em síntese, o Estado de Direito é aquele regido por normas cuja observância o emanador se inclui.

A lei é a principal fonte normativa do Direito. É a expressão da vontade popular. É o resultado de um longo trabalho de campo sobre as necessidades sociais. Vige, na Teoria do Direito, o princípio da supremacia da lei. Todas as demais características dos atos normativos são extraídas da supremacia legal. Esta deriva da denominada representatividade democrática.

Entretanto, não são todas as leis que possuem as características elementares dos atos normativos propriamente ditos: a generalidade, abstração, imperatividade e bilateralidade atributiva.

Importante frisar que uma das principais características do ato normativo é o autorizamento. E esta característica é encontrada também nas leis de efeito concreto.

A generalidade da lei se relaciona à sua extensão objetiva e subjetiva. Poderá ser territorial, por exemplo, como as leis estaduais que não podem ferir o princípio federativo e exigir sua aplicabilidade pelos demais estados. Pode se referir, subjetivamente, à determinado grupo de pessoas. Como exemplo, temos a Lei nº 8.112/90, cuja generalidade se aplica aos servidores públicos civis estatutários da União. Portanto, não é uma lei subjetivamente nacional. Não se aplica aos servidores dos Estados Membros e Municípios por exemplo, devendo, cada qual, ter o seu regime.

A imperatividade da lei deriva da sua fonte de criação: o Estado. Ao Estado compete impor e obrigar o cumprimento das leis por ele tecidas. As leis, repisamos, são produto da legitimidade democrática, do contrato social, logo, da soberania popular. A imperatividade é a característica coativa da lei, que impõe obrigações, deveres aos seus destinatários.

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Outra marca importante das leis deriva do princípio da continuidade, que se relaciona ao instituto da lei no tempo. A lei vige até que outra a revogue ou substitua. Enquanto isso, permanece gerando efeitos, vigendo. No curso da vigência da lei tem-se a sua obrigatoriedade.

Por fim, apesar de as leis de efeitos concretos não possuírem a impessoalidade, generalidade, abstração, possuem imperatividade e autorizamento. Este, consiste na viabilidade de se atribuir ou autorizar a pessoa a que é dirigida se valer de meios para que tal lei seja cumprida.

As leis de efeitos concretos, adentrando no assunto, possuem características próprias e de exceção. Não possuem os mesmos adjetivos das leis de efeito abstrato, impessoal e generalizado. Sob o aspecto formal são leis, sem dúvida. Derivaram de um processo legislativo, expressando-se como espécie normativa primária (art. 59. da CF). Todavia, a sua particularidade, inerente ao seu grau restrito de aplicabilidade torna-a materialmente um mero ato.

Repisando, as leis de efeito concreto não são abstratas, impessoais e não possuem generalidade. Entretanto são imperativas e possuem autorizamento. Incidem sobre destinatários específicos e se exaurem no ato autorizante. A perda instantânea de sua vigência, quando atinge a sua única finalidade, exclui as características da impessoalidade e abstração. Sob o aspecto material, tais leis se assemelham aos atos administrativos: são imperativos, possuem presunção de legalidade e veracidade e limitam ou concedem direitos.

Apesar da semelhança material, por derivarem de um processo legislativo e estarem municiadas pela imperatividade, autorizamento e normatividade, são leis. Poderíamos conceitua-las como leis capengas.

Leis que concedem pensão políticas especiais, que criam municípios e leis orçamentárias são exemplos de leis de efeitos concretos. Exemplos outros podemos dar: leis de desafetação; leis de tombamento; leis que instituem autarquias ou fundações públicas, etc.

Após a noção, duas indagações têm importância ímpar:

  • a) O sistema constitucional permite a edição de leis de efeitos concreto? Sim, pois, inclusive, as resoluções podem se enquadrar no conceito de leis de efeitos concretos.

  • b) Tais leis podem ser objeto de controle concentrado de constitucionalidade das leis?

Antes STF não permitia que leis de efeitos concretos pudessem ser objeto de controle de constitucionalidade, pois lhes faltavam as características essenciais dos atos de natureza normativa: a impessoalidade, abstração e generalidade. Todavia, houve mudança de concepção.

Em decisões que analisavam o caráter material do ato de criação de Município, o STF tem assentado o entendimento de que a fiscalização da constitucionalidade das leis e dos atos normativos – quando houver um tema ou uma controvérsia constitucional suscitada em abstratoindependentemente do caráter geral ou específico, concreto ou abstrato de seu objeto. Assim, tanto as leis que criam municípios quanto as que tratam do orçamento público podem ser objeto de controle abstrato de constitucionalidade.

Extrai-se de todo exposto, que não há óbice para a edição de leis que não tenham as características da abstração e generalidade, podendo também ser abarcado pelo conceito as que materialmente possuem características concretas e individualizadas. Ante a importância das matérias tratadas – tipicamente constitucionais – o controle de constitucionalidade não adentrará no mérito da natureza normativa do ato, mas do seu conteúdo – se constitucional ou não – e se o ato derivou ou não de um processo legislativo. Enfim, sendo lei, independentemente de ser abstrata ou concreta, e tratando de matéria constitucional, poderá ser objeto de controle concentrado de constitucionalidade (alínea “a”, inciso I, art. 102 da Constituição Federal).

Sobre os autores
Bruno Mariano Frota

Possui graduação em Direito pela Universidade Católica de Brasília. Advogado e Servidor Público. Pós-graduado em Direito Penal e Processual Penal. Especialista em Direito Civil. Possui constante atuação na jurisdição de segundo grau junto ao TJDFT e ao TRF da 1ª Região. Foi membro integrante da Comissão de Defesa do Consumidor da Ordem dos Advogados do Brasil, Seccional do Distrito Federal – OAB/DF.

David Augusto Souza Lopes Frota

DAVID AUGUSTO SOUZA LOPES FROTA Advogado. Servidor Público Federal. Pós-graduado em Direito Tributário. Pós-graduado em Direito Processual. Especialista em Direito Administrativo. Especialista em Licitações Públicas. Especialista em Servidores Públicos. Foi analista da Diretoria de Reconhecimento Inicial de Direitos – INSS – Direito Previdenciário. Foi analista da Corregedoria Geral do INSS – assessoria jurídica e elaboração de pareceres em Processos Administrativos Disciplinares - PAD. Foi Analista da Diretoria de Recursos Humanos do INSS - Assessor Jurídico da Coordenação de Recursos Humanos do Ministério da Previdência Social – Lei nº 8.112/90. Chefe do Setor de Fraudes Previdenciárias – Inteligência previdenciária em parceria com o Departamento de Polícia Federal. Ex-membro do ENCCLA - Estratégia Nacional de Combate a Corrupção e à Lavagem de Dinheiro do Ministério da Justiça. Convidado para ser Conselheiro do Conselho de Recursos da Previdência Social - CRPS. Convidados para atuação junto ao Grupo Responsável pela Consolidação dos Decretos Federais da Presidência da República. Assessor da Coordenação Geral de Recursos Logísticos e Serviços Gerais do MPS - COGRL. Elaboração de Minutas de Contratos Administrativos. Elaboração de Termos de Referência. Pregoeiro. Equipe de Apoio. Análise das demandas de controle interno e externo do MPS. Análise das demandas de Controle Interno e Externo do Ministério da Fazenda - SPOA. Assessor da Coordenação Geral do Logística do Ministério da Fazenda - CGLOG – SPOA. Assessor da Superintendência do Ministério da Fazenda no Distrito Federal - SMF-DF. Membro Titular de Conselho na Secretaria de Direitos Humanos para julgamento de Processos. SEDH. Curso de Inteligência na Agência Brasileira de Inteligência - ABIN. Consultoria e Advocacia para prefeitos e demais agentes políticos. Colaborador das Revistas Zênite, Governet, Síntese Jurídica, Plenus. Coautor de 3 livros intitulados "O DEVIDO PROCESSO LICITATÓRIO" tecido em 3 volumes pela editora Lumen Juris.

Informações sobre o texto

Este texto foi publicado diretamente pelos autores. Sua divulgação não depende de prévia aprovação pelo conselho editorial do site. Quando selecionados, os textos são divulgados na Revista Jus Navigandi

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