A teoria do direito penal do inimigo e sua influência na legislação brasileira

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“Todo direito no mundo foi adquirido pela luta; esses princípios de direito que estão hoje em vigor, foi indispensável impô-los pela luta àqueles que não os aceitavam[...]“

(Rudolf Von Jhering)

RESUMO: Esta monografia tem como objetivo fazer uma análise da Teoria do Direito Penal do Inimigo, idealizada por Günther Jakobs, a qual entendia que, de forma resumida, era possível a supressão de certos direitos e garantias do infrator dependendo das circunstâncias do delito e da personalidade do mesmo, com a finalidade de eliminar riscos futuros. Além disso, também tem como objetivo a análise de suas influências na legislação atual brasileira e, por fim, a possibilidade de aplicação de tal teoria em uma sociedade democrática de direito.

Palavras-chave: Direito Penal do Inimigo, Velocidades do Direito Penal, Teorias das Funções da Pena, Lei dos Crimes Hediondos, Princípio da Individualização da Pena.

ABSTRACT:This monograph have the objective to analyze the theory of the Law of the Enemy, idealized by Gunther Jakobs, which says that, in short, it was possible to supress some rights and guarantees from the criminal, depending on the circunstances of the crime and his personality, in order to prevent future risks. It also have the objective to analyze its influences on the current laws in brazilian society, and, lastly, the possibility to apply this theory in a democratic State governed by the rule of law.

Keywords:  Law of the Enemy, Speeds of the Criminal Law, Theory of Punishment Functions, Law of Heinous Crimes, Individualization of the Punishment.

SUMÁRIO: Introdução..1) Fatores Históricos.1.1) Evolução do Direito Penal.1.1.1) Fases da Vingança Penal .1.1.2) Período Humanitário.1.1.3)Direito Penal no Século XX.1.2) Evolução do Direito Penal Brasileiro.1.3) Evolução do Direito Penal do Inimigo - Primeira versão da Teoria-1985. 1.4) Evolução do Direito Penal do Inimigo - Segunda versão da Teoria-1999. 2) Teorias relacionadas ao Direito Penal do Inimigo e sua importância..2.1) Teorias da Pena.2.2) Teorias do Direito Penal do Fato e Direito Penal do Autor.2.3) Velocidades no Direito Penal.2.4)Teses contratualistas que tem similaridade com o Direito Penal do Inimigo.  3) Direito penal do Inimigo..3.1) Conceito de Direito Penal do Inimigo.3.2)Teorias que embasam a Teoria do Direito Penal do Inimigo.3.3) Repercussão da Teoria do Direito Penal do inimigo.4) Teoria do Direito Penal do Inimigo e Legislação Atual.4.1) Disposições esparsas.4.2) Lei dos crimes Hediondos.5) Discussão sobre a Teoria do Direito Penal do Inimigo e sua importância..5.1) Binômio Cidadão versus Inimigo.5.2)Aplicação da Teoria do Direito Penal do Inimigo: Garantia de um Estado de Direito ou Absolutismo puro?5.3)Garantia dos Interesses Individuais versus Pacificação Social.5.4)Individualização da pena.6)Possibilidade de aplicação do Direito Penal do Inimigo na atualidade.7) Conclusão .Referências Bibliográficas.


INTRODUÇÃO.

Como ensina Cesare Beccaria[1], o surgimento do direito se deu com o sacrifício de parte da liberdade individual para usufruir do restante dela com mais segurança, e, com isso, facilitar a convivência harmônica em sociedade através da criação de leis. Nesse sentido, entende que[2] ninguém deseja estar preso por tais normas e convenções que se aplicam aos outros, mas assim o fazem unicamente para garantir o restante de seus direitos.

Ocorre que, com as mudanças que ocorrem rotineiramente na sociedade, por vezes, o direito passa a perder sua eficácia na repressão de crimes e manutenção da paz social, pois, com o passar do tempo, ocorre também o avanço da criminalidade, que passa a cometer crimes de maior gravidade e complexidade, tornando o direito penal obsoleto em sua função primordial.

Diante de tais informações, fica fácil de compreender que, assim como a sociedade, o direito deve ser modificado, avançar, e se adequar às novas realidades, através da criação de novos meios de contenção da criminalidade e manutenção da paz social.

Também nesse sentido, afirma Kelly Cardoso da Silva[3], que com a transformação da sociedade, deve haver a alteração do direito, que não pode permanecer estagnado diante de tais alterações sociais, sob pena de se tornar ineficiente perante o novo modelo social. Além disso, alega que[4], com a crescente globalização, houve o aumento da macro e microcriminalidade, ao mesmo tempo em que enfraqueceu-se o sistema político e a segurança pública. Por fim, afirma que[5], os novos riscos trazem grande situação de insegurança na sociedade, e, com isso, acaba sendo exigido uma resposta mais dura do direito penal.

Diante dessa perspectiva, inúmeros doutrinadores propuseram teorias alternativas buscando a contenção da criminalidade, prevendo alterações principalmente no âmbito penal e processual penal. Uma dessas teorias, que é exatamente o foco deste trabalho, é a Teoria do Direito Penal do Inimigo, idealizada por Günther Jakobs, uma teoria amplamente criticada por inúmeros doutrinadores, mas de relevância inquestionável.

Tal teoria, embora controversa e amplamente criticada por inúmeros doutrinadores, é de grande importância, tendo seus fundamentos, inclusive, sido utilizados na elaboração de algumas das leis atuais.

A análise de tal teoria e de sua influência na legislação atual é o objetivo deste trabalho.


1)    FATORES HISTÓRICOS.

Primeiramente, antes de se tratar da parte histórica, importante explicar de maneira sucinta sobre o que é a Teoria do Direito Penal do Inimigo. Tal teoria prevê, em breve síntese, um tratamento penal e processual penal mais rigoroso para aqueles indivíduos considerados como “inimigos”, e não como “cidadãos”. De modo bem resumido, JAKOBS entendia como inimigo aquele que não apresentava garantias comportamentais mínimas[6], ou seja, aquele que não poderia ser reabilitado para a vida em sociedade, e que continuaria a delinquir.

Dito isto, para entender a Teoria do Direito Penal do Inimigo, é preciso compreender o contexto histórico na qual se originou.

Primeiramente, como explica Vicente Greco Filho[7], ao citar a teoria do Professor Antonio Cândido de Mello e Souza, os movimentos sociais se dão como movimentos pendulares: de uma ideia, se passa para uma ideia oposta, que ganha intensidade, se esgota, e volta para a ideia inicial, ligeiramente modificada para se adequar à realidade.

Ainda nesse sentido, afirma que[8], com o fim da segunda guerra, superados o nazismo e fascismo, os direitos e garantias individuais e sociais passaram a ser o foco do direito, momento em que surgiram teorias, como, por exemplo, a teoria do garantismo penal.

Porém, conclui que[9], com os atentados de 11 de setembro de 2001, vieram a tona as questões do terrorismo e da criminalidade organizada, o que demonstrou grandemente a ineficácia do Direito Penal na contenção de tais delitos, e, com isso, o pêndulo se volta para um Direito Penal de garantias reduzidas, conhecido pelo nome “Direito Penal do Inimigo”.

1.1)       EVOLUÇÃO DO DIREITO PENAL

Com o passar do tempo e com as mudanças sofridas pela sociedade, se tornou necessário que o Direito também evoluísse, sob pena de se tornar ineficaz. Tais mudanças ocorreram no Direito como um todo, mas tal evolução foi de grande importância na área penal.

Nesse sentido, leciona Miguel Reale:

As regras éticas existem para serem executadas. Se a obediência e o cumprimento são da essência da regra, é natural que todas elas se garantam, de uma forma ou de outra, para que não fiquem no papel, como simples expectativas ou promessas. As formas de garantia no cumprimento das regras denominam-se “sanções”. [10]

Também nesse sentido, preleciona Kelly Cardoso da Silva:

É importante ressaltar que a sociedade, assim como o Direito (inclua-se o Direito Penal), não configura algo certo e determinado –estanque-, mas sim algo dinâmico, alçando novos bens jurídicos e configurações conforme sua evolução histórica.

Os novos tempos e a modificação do Direito Penal direcionam para a proteção das demandas surgidas e para a alteração de sua dogmática, que até o momento era fundamentada em um modelo clássico.[11]

Levando-se em consideração que as sanções são de suma importância para o cumprimento das regras, o Direito Penal deve sempre se adaptar para que tais sanções continuem sendo efetivas, no sentido de garantir o cumprimento das regras impostas pelo Direito.

Ocorre que, de maneira frequente, a efetividade das sanções acaba por necessitar de certas flexibilizações no âmbito penal e processual penal, sob pena de não servir para o fim ao qual se destina, ou seja, a garantia de pacificação social.

Diante de tais fatos, importante estudar a evolução histórica do Direito Penal, demonstrando o contexto histórico que fez com que surgissem inúmeras teorias penais, desde aquelas que buscavam resguardar ao máximo os direitos e garantias do criminoso, quanto àquelas que buscavam limitar seus direitos para garantir a pacificação social, como, por exemplo, a Teoria do Direito Penal do Inimigo.

1.1.1) FASES DA VINGANÇA PENAL

Conforme preleciona Cezar Roberto Bitencourt[12], antes da existência do Direito como conhecemos hoje, o que existia era a “vingança penal”, a qual tinha um viés punitivo, vingativo, que se dividiu, historicamente, em três períodos: Vingança Privada, Vingança Divina e Vingança Pública.

Cabe ressaltar que, conforme leciona Ana Clélia Couto Horta[13], apesar do fato de que tais divisões se deram em fases, elas não se sucederam de forma linear ou rígida, sendo que, muitas vezes, as características de um dos períodos também se encontrava em outro.

Ainda nesse sentido, Bitencourt ensina que[14] a fase de vingança divina se deu nas sociedades primitivas, sendo que, nesse período, alguns tipos de fenômenos naturais eram tidos como manifestações divinas, ou punições dos deuses, diante do cometimento de atos que exigiriam reparação, e, com isso, o infrator deveria “desagravar a entidade”, o que era feito com o sacrifício da vida do infrator.

Com isso, termina o assunto[15] explicando que, em tal sistema, a pena representava apenas um revide para a agressão sofrida pela coletividade, que se dava de maneira desproporcional, com grande influência religiosa e sem a menor preocupação com a aplicação de justiça.

Porém, com o avanço da sociedade, a fase da vingança divina deu lugar à fase de vingança privada, com menor influência da religião.

Explica Bitencourt que[16], com a evolução social, surgiu a famosa lei do talião, que permitia uma reação mais “proporcional” ao mal praticado, dando origem à famosa expressão “olho por olho, dente por dente”. Ainda nesse sentido, afirma que[17] tal lei promoveu um tratamento “igualitário” entre infrator e vítima, “humanizando” a sanção criminal.

Ainda quanto à tal período e a lei do talião, também ensina Ana Clélia Couto Horta[18], que, diante da enorme quantidade de lutas entre famílias e tribos, surgiram regras para evitar o aniquilamento total, o que se deu com a instituição da Lei do Talião, que buscava delimitar o castigo, tanto em sua forma quanto em sua intensidade. Por fim, leciona que[19] tal lei evoluiu posteriormente, permitindo que o agressor compensasse a vítima mediante uma indenização, o que era chamado de “composição”.

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Apesar de tais argumentos, é difícil aceitar que a amputação de membros por cometimento de furtos possa ser considerado uma “humanização” da sanção criminal, muito menos um tratamento “igualitário” entre infrator e vítima. Porém, levando-se em consideração o contexto da época, foi, de fato, uma evolução no Direito Penal que o tornou, ao menos, mais “proporcional” que nos períodos anteriores.

Quanto à evolução para o período de vingança privada, leciona Miguel Reale:

De certa maneira, esta já representa um progresso, porquanto personaliza a responsabilidade. Com o decorrer do tempo, o fenômeno da vingança privada veio sendo submetido à regras, a formas delimitadoras. Há uma passagem lenta do período de vingança privada, como simples força bruta, ao período em que as contendas passam a ser resolvidas obedecendo a certas injunções ainda de força, mas já contida em certos limites.[20]

Por fim, termina Bitencourt[21] explicando que, com o avanço da sociedade, foi afastada a vingança privada, dando lugar à vingança pública, o qual dava ao Estado o poder-dever de manter a ordem e segurança da população. Ainda nesse sentido, afirma que[22], a finalidade da pena, nessa fase, era garantir a segurança do soberano, estando ainda manchada pela crueldade e desumanidade, com fulcro político e religioso.

Quanto à tal período, conclui Ana Clélia Couto Horta[23], que as penas buscavam unicamente proteger o monarca, sendo que, quase sempre, eram cruéis e sem a garantia do direito de defesa dos cidadãos, tudo com a finalidade de intimidação dos mesmos.

1.1.2) PERÍODO HUMANITÁRIO

Leciona Bitencourt[24] que, por volta do século XVIII, também conhecido como século das luzes, os doutrinadores passaram a estudar o direito tendo como fundamento a razão e a humanidade. Afirma que[25], ainda no início do referido século, as leis eram de excessiva crueldade, prevendo castigos corporais e penas capitais. Porém, ensina[26] que, a partir da segunda metade de tal século, filósofos, moralistas e juristas passaram a criticar tal legislação, defendendo, portanto, liberdades individuais e a dignidade humana.

Ainda nesse sentido, preleciona que[27] tal evolução histórica se deu junto do avanço do iluminismo, sendo que, as principais propostas de tal teoria, no âmbito penal, seria de que a pena deveria ser proporcional ao crime, levando-se em consideração as circunstâncias do crime e do criminoso, demonstrando ser eficaz e, ao mesmo tempo, menos cruel.

Nessa época, surgiram inúmeros doutrinadores defendendo a racionalização das penas, tendo como destaque, principalmente, Cesare Beccaria, que, em seu livro “Dos Delitos e Das Penas”, discute sobre a necessidade da pena, sua proporcionalidade e sua finalidade.

1.1.3) DIREITO PENAL NO SÉCULO XX

Porém, após os sucessivos avanços da lei penal buscando, cada vez mais, garantir os direitos daqueles que cometem delitos, conforme explica Kelly Cardoso da Silva[28], surgiu um sentimento na sociedade e, em certo ponto, até mesmo dentre os juristas, de que tal tratamento dado à criminalidade era demasiadamente leve, e, com isso, servia para aumentar a criminalidade, ao invés de contê-la.

Leciona Eugenio Raul Zaffaroni que[29], durante o século XX, surgiu um autoritarismo decorrente da globalização, o qual criou um direito penal de características autoritárias e antiliberais, o qual pregava o exercício do poder punitivo de maneira mais repressiva e discriminatória, que se disseminava em escala mundial, afirmando que tal modelo teve como uma de suas influências mais consideráveis, a mídia e a publicidade.

Já quanto ao que chama de “autoritarismo cool do século XXI”, explica Zaffaroni[30] que o mesmo surgiu após a segunda guerra mundial e a guerra fria, sendo que, neste período, a globalização e influência do capital gerou grande fluxo de imigrantes, e, com eles, o preconceito e o racismo, que influenciaram profundamente a legislação penal e na sua efetiva aplicação.

Já Bitencourt, ao mencionar o Sistema teleológico-fundamental de Roxin, afirma que[31], com tal teoria, surgiu o pós finalismo no Direito Penal, tendo como principal objetivo adequar o direito aos fins político-criminais ao qual se destinava, atendendo sua real finalidade, se afastando, portanto, do Direito Positivo.

Percebe-se que, as alterações no direito penal e processual penal que ocorreram nessa época, embora não sejam pensamentos dominantes, existiram, e seguiram o caminho oposto percorrido durante os períodos anteriores, buscando, ao invés de garantir os direitos e garantias do indivíduo acusado, garantir seu encarceramento e, supostamente, a pacificação social através do mesmo.

Com esse mesmo fundamento, surgia a Teoria do Direito Penal do Inimigo, de Günther Jakobs, em 1985, a qual será explicada posteriormente.

1.2) EVOLUÇÃO DO DIREITO PENAL BRASILEIRO

Levando-se em consideração que este trabalho trata do tema da Teoria do Direito Penal do Inimigo e sua influência na legislação atual, com foco na legislação brasileira, torna-se imperioso contextualizar o tema com um breve resumo da evolução do Direito Penal no Brasil.

Conforme preleciona Bitencourt[32], durante o período colonial do país, vigoravam aqui as normas do Direito Lusitano, sendo que, primeiramente se aplicaram as Ordenações Afonsinas, publicadas em 1446, que foram sucedidas pelas Ordenações Manuelinas, publicadas em 1521.

Ainda nesse sentido, afirma que[33] tais ordenamentos não tiveram a eficácia esperada, levando-se em consideração as peculiaridades da colônia, as quais geraram a criação de inúmeros decretos e leis para solucionar tais problemas, sendo que o direito a ser aplicado era baseado no arbítrio dos donatários, responsável por instalar, posteriormente, um regime feudal despótico.

Além disso, ensina que[34] tais “senhores feudais” eram independentes e possuíam poder ilimitado de julgar e punir, gerando ampla criminalização e punições rigorosíssimas.

Ante a gravíssima situação mencionada, explica Bitencourt[35] que foi necessária a elaboração de um código criminal mais justo e equânime, o qual foi sancionado em 1830, sendo considerado o primeiro código autônomo da América Latina.

Decorridos tais momentos históricos, iniciou-se o período republicano, o qual, conforme leciona Bitencourt[36], teve como seu primeiro projeto de código penal publicado em 1890, porém sendo considerado, de acordo com o mesmo, o pior código penal da história, ignorando o viés positivista dominante em todo mundo, e os avanços decorrentes do mesmo, sendo que, após inúmeras alterações, culminou na promulgação da “Consolidação das Leis Penais” de 1932.

Por fim, diante de toda essa evolução histórica, explica que[37] surgiu, finalmente, o código penal de 1940, o qual, apesar de ter sofrido alterações pontuais por todo este tempo, encontra-se vigente até os dias de hoje.

1.3) EVOLUÇÃO DO DIREITO PENAL DO INIMIGO - PRIMEIRA VERSÃO DA TEORIA - 1985

Conforme preleciona Kelly Cardoso da Silva[38], a primeira versão da Teoria do Direito Penal do Inimigo foi publicada em 1985, em um seminário de direito penal realizado em Frankfurt. Ainda nesse sentido, afirma que[39], nessa primeira exposição, Jakobs adotou uma postura unicamente descritiva sob tal teoria, sendo que, com isso, causou uma impressão majoritariamente positiva na doutrina alemã.

No mesmo sentido, segundo Luis Gracia Martín[40], conforme citado por Kelly Cardoso da Silva[41], o próprio JAKOBS entendia que sua teoria seria uma “luta”, uma “guerra”, e não um “direito” per se, deixando claro, também, que sua aplicação era incompatível com um Estado de Direito.

Assim também leciona Natália Berti[42], afirmando que, de início, Günther Jakobs criou uma concepção do Direito Penal do Inimigo, estabelecendo diferenças entre o Direito Penal do Cidadão e o Direito Penal do Inimigo. Porém, apesar da criação de tal teoria, afirma que[43] Jakobs entendia que o comportamento de um indivíduo somente tem relevância ao Direito Penal quando o mesmo for objetivado e exteriorizado, evitando que hajam punições por simples pensamentos. Por fim, deixa claro[44] que tal concepção de Direito Penal somente seria aplicável de maneira excepcional, como um “Direito Penal de Emergência”.

Portanto, conforme foi explicitado, nessa primeira versão da Teoria do Direito Penal do Inimigo, Jakobs criou o conceito de Direito Penal do Cidadão e Direito Penal do Inimigo, também mencionando as diferenças entre as garantias de ambos, porém, ele não defendia a aplicação de sua teoria como regra, mas sim como exceção. 

1.4)       EVOLUÇÃO DO DIREITO PENAL DO INIMIGO - SEGUNDA VERSÃO DA TEORIA - 1999

Por outro lado, após a primeira apresentação da Teoria do Direito Penal do Inimigo por Jakobs, que causou uma impressão majoritariamente positiva, Kelly Cardoso da Silva[45] explica que, em 1999, Jakobs apresentou uma teoria definitiva do Direito penal do Inimigo, a qual, diferentemente da primeira versão, possuía um teor mais contundente, afirmativo, legitimador e justificador da aplicação de sua teoria.

Além disso, explicam Ulfried Newmann[46] e Manuel Cancio Meliá[47], conforme citados por Natália Berti[48], que essa modificação da Teoria do Direito Penal do inimigo teve início em 1999, mas se deu principalmente em 2003, com o lançamento da obra “Derecho penal de enemigo”. Afirma, também[49], que o Direito Penal do Inimigo assumiu contornos mais concretos, perdendo seu valor pejorativo, afirmando Jakobs que seria um erro demonizá-lo.

Portanto, da análise de tais fatos fica evidente o grande contraste que surgiu entre as duas versões da mesma teoria criada por Günther Jakobs. Primeiramente, ele criou a base da referida teoria, porém, não defendia sua aplicação como regra geral. Essa teoria, conforme já explicado, causou impressões positivas na doutrina alemã.                                          

Porém, posteriormente, ele passou a defender a aplicação de tal teoria, justificando sua aplicação pela necessidade de conter aqueles que não oferecem garantias de comportamento pessoal mínimas[50], como uma contenção de um risco para a sociedade. Cabe ressaltar que, em face do caráter mais incisivo que foi utilizado na segunda versão da referida teoria, a qual não mais expunha, mas sim defendia tal supressão de direitos e garantias dos indivíduos que cometessem algum delito, quase sempre que se ouve falar da Teoria do Direito Penal do Inimigo, de Günther Jakobs, é em relação à segunda versão, a qual é considerada sua versão definitiva.

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Monografia apresentada à Banca Examinadora da Faculdade de Direito da Universidade Metodista de Piracicaba, para obtenção do título de Bacharel em Direito.Orientador: Prof. Eduardo Alberto Pinca

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